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agosto 17, 2010
Curso O Corpo, A Roupa e a Linguagem Plástica Contemporânea no MAM-BA, Salvador
O Corpo, A Roupa e a Linguagem Plástica Contemporânea
Este curso propõe uma reflexão sobre a apropriação do corpo e da roupa pelas linguagens artísticas contemporâneas estabelecendo interfaces com a moda dos séculos XX e XXI. Será realizado no auditório do MAM - Bahia entre 15 setembro a 22 de
outubro de 2010 com três encontros semanais, quartas quintas e
sextas-feiras, de 9:00 às 12:00, somando 48 horas no total.
Inscrições até 10 de setembro de 2010
15 setembro a 22 de outubro de 2010, quartas, quintas e sextas-feiras, 9-12h
Instrutores: Almandrade, Ilber Acsis e Silverino Ojú
Museu de Arte Moderna da Bahia - Auditório
Av. Contorno S/N, Solar do Unhão, Salvador - BA
educativomam@gmail.com
www.mam.ba.gov.br
A LINGUAGEM E A TRANSGRESSÃO DA VESTE
“O traje veste a história”
Luiz XIV
A roupa desde sua origem foi determinada pela necessidade de abrigo e aparência para o corpo como a arquitetura, desde os tempos da caverna que o homem criou hábitos de pintar o corpo ou fazer uso de
indumentárias confeccionadas com peles de animais para expressar seu desejo de poder e exibição. A veste e seus acessórios são meios de comunicação que espelham o modelo social. A moda é uma linguagem simbólica que ultrapassa a sua função de proteção para significar o indivíduo na sociedade, é uma espécie de identidade que fala de sua condição e/ou opções social, profissional e sexual. Em todas as épocas a roupa, além de sua função, explicitou significados, como uma embalagem que protege, embeleza, decora e identifica o produto. Com suas cores e estilos, a vestimenta é um signo e um dispositivo da condição social e cultural através do qual o homem atende suas necessidades de comunicação e expressão.
As obras de arte do passado são o principal meio de informação do corpo e suas indumentárias. Grandes retratistas, como Velásquez, na Espanha de Felipe IV, registraram nas suas pinturas a moda de seu tempo, quando retrataram os nobres e sua corte. Em Velásquez podemos perceber como o preto era a cor predominante para ambos os sexos, veludos com ornamentos de prata e ouro. O vermelho também uma cor favorita e o branco era usado em raras ocasiões. No ocidente, surge durante o Renascimento o conceito de moda, quando o interesse pelo traje deixa de ser uma necessidade puramente funcional para afirmar posições hierárquicas de poder.
Roland Barthes e sua semiologia da moda, fala da existência de uma língua do vestuário, postulada em escritores como Balzac, Proust ou Michelet. Para Barthes: “A moda é uma combinatória que tem uma reserva infinita de elementos e de regras de transformação.” Uma língua falada por todos e ao mesmo tempo desconhecida de todos. A roupa não só protege (função) , informa, embeleza, contesta (significa), na condição de um fenômeno semiótico fala de seu usuário.
A leitura da vestimenta mostra a multiplicidade, diferenças e contradições da sociedade. Valores culturais e condições econômicas determinam as opções do figurino. Existem sistemas de codificação, tais como: a cor, o tipo de tecido ou o estilo do uniforme associados às profissões, crenças, identificação de classe, estações do ano. Podem informar o destino do usuário, a cada lugar um código ou um estilo.
A roupa além de ser “uma extensão da pele” (Mcluhan) é também uma necessidade de consumo criada pela publicidade da etiqueta. Waldemir Dias-Pino, um dos criadores da poesia concreta, faz relações entre os modelos da roupa e as formas da arquitetura: O homem moderno de calça e paletó com o arranha-céu, a tanga do índio e a palha que cobre a taba, o árabe se veste com a forma de uma tenda, a japonesa carrega nas mangas do vestido as formas dos beirais de seus telhados.
A moda do vestuário aproximou-se da vanguarda, no processo das revoluções nas linguagens artísticas, cada época tem as suas vestes e elas integram o individuo ao meio ambiente social, cultural, tecnológico e ao grupo social. A moda pode acentuar também a divisão de classes, ou ao contrario, participar das contestações sociais. Com os Beatles, o tropicalismo e os hippies com um estilo naturalista descontraído, nos finais da década de 1960, a roupa tinha um sentido crítico, em aparente contradição com a moda corrente, imposta pela indústria da moda, produto da revolução industrial.
A partir da modernidade designers e artistas interessam-se em desenhar roupas e objetos utilitários que atendam à funcionalidade do mundo moderno. Artistas transformam a roupa ou o ato de vestir em objeto de sua experiência artística. Os construtivistas russos criaram a roupa do trabalhador, cuja principal preocupação, era a funcionalidade. O professor da Bauhaus Johannes Ittens desenhou uma roupa para ser usada pelos seguidores de uma doutrina de vida, criada por ele, que tinha como objetivo a perfeição.
Os futuristas italianos pregavam a necessidade de uma roupa confortável, prática, agressiva ágil e
alegre, decorada eventualmente por lâmpadas elétricas.
Os surrealistas e dadaístas posicionaram ironicamente, apropriaram-se da roupa como um instrumento de transformação da linguagem da arte. Marcel Duchamp que já havia posado como Rrose Sélavy em 1921 numa pratica de “readymade”. Em 1938, numa exposição em Paris vestiu um manequim feminino com chapéu, paletó, colete, gravata e sapatos masculino.
No Brasil, algumas experiências são pioneiras, principalmente na obra de dois artistas: Flavio de Carvalho e Hélio Oiticica. Em uma movimentada rua do centro de são Paulo em 1956, o arquiteto e artista plástico Flávio de Carvalho, autor da coluna do Diário de São Paulo “A Moda e o Novo Homem”, desfilou com sua “indumentária do futuro”, por ele denominada “New Look”. Vestindo com meias rendadas de bailarina,
saiote, blusa de nylon com aberturas laterais, o artista lançou o novo traje para o verão dos trópicos, provocou pânico e escândalo na população. Artista, arquiteto, engenheiro e escritor, Flavio um personagem excêntrico na história da arte brasileira, apelidado de “divino louco”, não teve ainda o reconhecimento à altura do seu talento por nosso meio cultural.
Na década de 1960, as experiências de Hélio Oiticica e seu envolvimento com o samba resultaram em capas denominadas “Parangolés”. Propostas para o espectador/participante em lugar de simplesmente
contemplar a cor, vestir-se nela. Uma estética da existência e não do objeto/arte, o corpo não é o suporte da obra. "O objetivo é dar ao público a chance de deixar de ser público espectador, de fora, para
participante na atividade criadora" (Oiticica).
Lígia Clark e suas “máscaras sensoriais”, que integram a fase sensorial de seu trabalho, a exemplo da obra que consiste num macacão para ser vestido por um homem, contendo um zíper que ao ser aberto,
ele retira uma "barriga grávida", feita de borracha cor-de-rosa e de dentro dessa barriga, retira uma espuma de borracha. Ao praticar essa operação "cesariana", as pessoas experimentam reações mais
inesperadas.
Até os heróis das histórias em quadrinhos têm suas identidades garantidas pela veste. Essa embalagem que envolve o corpo ocupa um lugar no sistema da linguagem e sua leitura é uma necessidade do mundo
contemporâneo. Como forma de comunicação é abordada por várias teorias como: a antropologia, a semiologia, a sociologia e a teoria da informação.
Almandrade
(artista plástico, poeta e arquiteto)