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junho 4, 2008
Acta Media 6 - Simpósio e Colaboratório no SESC Pinheiros, São Paulo
Acta Media 6 - Simpósio e Colaboratório
Autoria e textualidade na era digital
24 de maio a 19 de junho de 2008
SESC Pinheiros
Rua Paes Leme 195, Pinheiros, São Paulo - SP
11-3095-9400
www.sescsp.org.br
Programação: www.actamedia.org
O computador e o futuro da criação intelectual
A emergência de novas formas de produção intelectual, mediadas pelo computador, traz à tona uma questão desafiadora e instigante: será que as novas tecnologias estão transformando o nosso modo de escrever, pensar e criar?
A transição do analógico para o digital, que se encontra em pleno curso, provoca uma ampla e irreversível transformação nos modos de captação, geração, registro e circulação de informações. Neste contexto, o computador não pode mais ser visto como um mero suporte para armazenamento de dados, já que atua de fato como um agente artificial que participa do processo semiótico de aquisição, estruturação, compreensão e disseminação da informação, ou seja, da própria construção do conhecimento.
Entender, no entanto, o pensamento como um processo híbrido homem-máquina é algo que desafia os paradigmas dominantes, pois os conceitos estabelecidos que ora norteiam o pensamento, a reflexão, a expressão e a ciência são ainda insuficientes para o entendimento do processo de hibridização. A decodificação dessa realidade híbrida requer uma re-percepção aberta e apurada, e só se faz possível mediante a reformulação de estruturas fundamentais que informam nossos sistemas linguísticos e, por extensão, a cultura, a história, as identidades, a criação científica.
Paralelamente, as interações infotelemáticas homem-máquina e homem-máquina-homem proporcionam formas alternativas de comunicação e criação, incentivando a experimentação de estratégias de colaboração e co-autoria. Desse modo, as redes de comunicação constituem-se de fato em máquinas de articulação cooperativa, que possibilitam o surgimento de um sem número de experiências de produções inter-individuais, na construção de softwares, textos, publicações, enciclopédias, projetos artísticos. Na atualidade, a atividade criativa já pode prescindir de um centro ou de um comando para ocorrer. Uma vez deflagrada por um indivíduo ou grupo, ela desencadeia uma troca horizontal compartilhada, desestabilizando todo um modelo de produção anteriormente consolidado.
Em outras palavras, estas produções híbridas e colaborativas têm o potencial de questionar a noção tradicional de autoria, como uma atividade puramente humana e notadamente individual. Observa-se a instauração efetiva de um processo autoral que se dá através de um sistema planetário de redes e interfluxos, distribuído e descentralizado, que proporciona interação entre agentes humanos e sistemas computacionais cada vez mais complexos.
Cabe refletir também, portanto, sobre a política da instrumentação tecnológica, pensar a forma pela qual as inovações técnicas ordenam a atividade humana, instaurando configurações que propiciam o desenvolvimento de relações pautadas, por exemplo, na autoridade e na centralização, ou de outro modo, na igualdade e na cooperação, além de muitas outras diferentes combinações estruturais destas tendências, resultando em diversos tipos de constituição arquitetural.
As inovações tecnológicas não devem ser pensadas como processos puros e exatos, isentos de intenções. Seja de forma deliberada ou não, as sociedades sempre escolhem o tipo de técnica que vai estruturar e configurar o seu modus vivendi.
A história da Internet ilustra bem esta afirmação. Ainda que tenha se originado na Arpanet – uma rede de comunicação do Departamento de Defesa americano com fins estritamente militares –a Internet foi desenvolvida sob a influência da comunidade acadêmica e modelada para facilitar a troca de informações e o trabalho cooperativo entre diferentes centros de pesquisa. Por outro lado, muitos dos programas e das práticas que hoje povoam a rede de computadores foram criados pela comunidade hacker, um conjunto disperso de experts em tecnologia que participaram da invenção da rede e que assumem como um de seus principais valores o livre fluxo de informações e a cooperação produtiva.
Não é à toa que hoje, quando se faz um balanço do legado de maio de 1968, muitos enxergam na Internet a realização, em certo sentido, dos projetos utópicos daquela época. Afinal foram os ideais da contracultura das décadas de 60 e 70 do século passado que inspiraram o desenvolvimento de computadores mais acessíveis e de uma rede de comunicação que valorizasse a cooperação, a liberdade e as relações igualitárias, contestando arquiteturas que assumiam como parâmetros formas hierárquicas e autoritárias.