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outubro 7, 2021
Thiago Martins de Melo na Millan, São Paulo
A Galeria Millan tem o prazer de apresentar Ouroboros sucuri, primeira exposição de Thiago Martins de Melo (São Luís, MA, 1981) na galeria. A mostra, com curadoria do islandês Gunnar B. Kvaran, reúne 19 trabalhos inéditos, incluindo pinturas e esculturas, e traz um olhar curatorial retrospectivo sobre a produção do artista, bem como suas distintas narrativas ao longo do tempo.
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A trajetória de Thiago Martins de Melo revela em si um projeto de múltiplos experimentos sobre o ato de narrar e suas possibilidades na ampliação da técnica pictórica. Tais características marcam o corpo de trabalhos apresentados na exposição ao integrar animações em stop-motion e peças escultóricas ao suporte tradicional. Na prática do artista, é o desenvolvimento do enredo de cada trabalho que distende e movimenta a técnica, elaborando, através de diferentes referências e signos, seu processo intuitivo.
A organização curatorial de Ouroboros sucuri é dividida em duas partes, sendo a primeira centrada na simbologia da serpente. Sua aparição em narrativas culturais e religiosas ao longo da história é evocada de diferentes maneiras nos trabalhos de Martins de Melo, a exemplo da obra que empresta seu título à exposição.
A imagem de representação do Ouroboros consiste numa serpente que morde a própria cauda, em formato circular. Este conceito milenar, tendo sido observado pela primeira vez no Egito antigo, alude à ideia de eterno retorno, da evolução e da reconstrução. No trabalho de Martins de Melo, tal signo é revisitado tanto como uma moldura quanto como protagonista das cenas - aqui a serpente é tanto narrada quanto enunciadora e antecessora da trama.
Já a segunda parte da mostra apresenta uma “constelação de novas obras” que, segundo Kvaran, refletem temáticas e soluções formais mais recentes na produção de Martins de Melo. Nesta seção, as poéticas perpassam o ocultismo, o espiritismo, elementos de culturas indígenas e afro-brasileiras, temas da política atual, entre outros temas, através de um viés pós-colonial.
Para o curador, esses trabalhos “formam uma construção complexa, em que o espectador passa por diferentes zonas da ficção baseada na realidade. É essa fusão de signos e símbolos, religiosos e espirituais, e referências sociais e políticas da memória coletiva que carregam essas obras com a sua energia singular e que as inserem na grande tradição da pintura histórica.”
Embebidas de significado, essas imagens povoadas de histórias se justapõem e inauguram camadas de representações simultâneas, como no trabalho Ascensão - Queda - Aliança – Redenção (2021), cujo título já antecipa uma sequência narrativa a desenrolar-se. Tais imagens desvelam, ainda, referências singulares, muito caras ao repertório construtivo do artista. Trabalhos como Ogum Corisco no útero da terra – para Glauber Rocha e Naná Vasconcelos (2020) e Ogum Xoroquê expulsa os demônios de Caspar Plautius - para Tuíra Kayapó, Sebastião Salgado e Marighella (2019) convidam o espectador a identificar e interpretar esses referenciais, bem como seus agenciamentos nas tramas apresentadas.
A exposição é acompanhada ainda de uma publicação que traz imagens de obras e o texto curatorial — uma extensa e rica conversa entre curador e artista, fruto de uma troca e parceria que a dupla vêm construindo ao longo de anos.
Galeria Millan is pleased to present Ouroboros sucuri, the first solo show by Thiago Martins de Melo (São Luís, MA, 1981) at the gallery. The show, curated by Icelander Gunnar B. Kvaran, gathers 19 unseen paintings and sculptures, delivering a retrospective insight on the artist’s creation, as well as his different expressions throughout time.
Thiago Martins de Melo’s trajectory reveals a project of multiple experiments on the act of storytelling and its possibilities, as it broadens pictorial techniques. These traces of the work can be seen in the exhibit combining stop-motion animation and sculpture pieces to the traditional support. The development of a plot in every piece expands and moves the technique, developing the artist’s intuitive process through references and signs.
The curatorial strategy of Ouroboros sucuri is divided in two parts, where the first centers the serpent’s symbology. Its appearances in cultural and religious narratives throughout history is evoked in different ways in Martins de Melo’s work, such as the work that entitles the exhibition.
The image representing the Ouroboros is a serpent that bites its own tale, composing a rounded shape. This remote concept was observed for the first time in Ancient Egypt and implies ideas such as the eternal return, evolution, and reconstruction. In Martins de Melo’s work the sign is revisited as a frame and a protagonist of the scenes - the serpent is as much the narrator as it is narrated, and it’s also a predecessor of the plot.
The second part of the exhibition presents a “constellation of new works”, that according to Kvaran, reflect recent themes and formal solutions in Martins de Melo’s production. In this section, the poetic composition navigates through occultism and spiritualism, Indigenous and Afro-Brazilians cultural elements, as well as current politics subjects and others, all based on Postcolonial theories.
To the curator, these works “form a complex construction, where the spectator goes through different zones of fiction based on reality. It’s this fusion between religious and spiritual signs and symbols, with social and political references of collective memory that construct this works with singular energy and insert them in the main painting tradition”.
Saturated with meaning, the stories in the images are juxtaposed, producing layers of simultaneous representations, as in Ascensão – Queda – Aliança – Redenção (2021), work in which the title anticipates a narrative sequence that unfolds itself. These images unravel singular references, familiar to the artist’s constructive repertory. Works as Ogum Corisco no útero da terra – para Glauber Rocha e Naná Vasconcelos (2020) and Ogum Xoroquê expulsa os demônios de Caspar Plautius – para Tuíra Kayapó, Sebastião Salgado e Marighella (2019) invite the observer to identify and interpret the references and their assemblages in the plot displayed.
The exhibition includes a publication with some of the work’s images and the curatorial statement – a substantial and significant conversation between the curator and the artist, product of a long partnership built over the years.