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agosto 14, 2021
Carlos Mélo na Kogan Amaro, São Paulo
Carlos Mélo reflete sobre o Nordeste em exposição inédita na Galeria Kogan Amaro - Obras em diferentes suportes utilizam-se de jogos de imagens e palavras para desmontar o estereótipo da região brasileira
As flexões semânticas são características marcantes no trabalho processual de Carlos Mélo. É a partir delas que o artista articula e ativa determinados assuntos, como a questão do lugar, especificamente o Agreste e o Nordeste, locais investigados pelo artista na exposição Transes, rituais e substâncias, em cartaz na Galeria Kogan Amaro, a partir de 14 de agosto.
Pinturas, fotografias, esculturas, desenhos e painel de neon são alguns dos suportes do conjunto de 16 obras inéditas exibidas na mostra. Em comum, elas buscam desfazer a ideia de nordeste, construindo um novo campo simbólico. “Todo meu trabalho artístico em torno das questões do nordeste tem como objetivo desmontar o estereótipo do Nordeste como o lugar com determinada comida, um sotaque determinado e com o chão rachado. A minha perspectiva é de uma região contemporânea, industrial e tecnológica, aonde as questões se dão a partir de uma realidade que não depende necessariamente da localização geográfica, mas sim de um campo simbólico.”, explica o artista.
Três esculturas têxtis da série ‘Overlock’, apontam para a forte produção da indústria de jeans no Agreste do Pernambuco. As obras são produzidas com diversos tecidos produzidos artesanalmente por uma cooperativa de costureiras que utilizam resíduos de fabricas de confecções. As esculturas criam uma forte referência às golas do maracatu, a mantos cerimoniais, e trazem uma reflexão em torno da modelagem e customização (paetês e spikes) das confecções de jeans na indústria no interior do estado.
Durante o período em que se aprofundava sobre a indústria têxtil, Carlos constatou o número crescente de motos com a finalidade de transporte de mercadoria, tanto no agreste, como no interior do Brasil, além do grande número de motoboys na cidade devido à pandemia. O resultado é a escultura com capacetes ‘Cascos’, produzidas com resíduos de capacetes em desuso pelos motoboys de Itu onde o artista residiu e coletou em cooperação com a Associação de Motoboys da cidade.
A série ‘Abismos’ apresenta três auto-retratos que carregam referências ao Nordeste. Em um deles, a figura com cabeça de carranca, cria uma forte relação com as mitologias do Rio São Francisco e seus projetos de transposição representado com a cabeça de uma carranca, em outro desenho o homem parece flutuar coberto de ossos bovinos carregando entres as mãos um ramalhete de flores, e a terceira imagem traz um corpo barroco onde é possível notar um conjunto de ossos, capacete e flores sobre parte do corpo vestido com uma calça jeans.
Uma série de fotografias e um backlight, advindos de uma performance de longa duração compõem a série “sapukaîa” (ave que grita ou galinha, no vocabulário TUPI). Nela, o artista aparece vestido com um paletó em meio a uma paisagem com galinhas vivas sobre o seu corpo. “Os meus trabalhos artísticos ocorrem a partir do ritual e do transe. Eles surgem a partir da ativação deste lugar, deste território. No caso, este trabalho ativa novos campos simbolistas em meio ao impacto cultural e ambiental causado pela presença das indústrias na região.”, pontua Carlos Mélo.
Sobre o artista
Riacho das Almas, Pernambuco – Brasil, 1969
Vive e trabalha em Recife, Pernambuco – Brasil
Carlos Mélo É um artista plástico brasileiro, nascido na província de Pernambuco, uma região formada por uma cultura complexa vista por várias nações africanas, algumas tribos indígenas e europeias de origem Moura. Seus trabalhos passam por vídeo, fotografia, desenhos, instalação, escultura e performance, em uma investigação do lugar que o corpo ocupa no mundo. Através de anagramas e ações de performance, o artista aborda imagens e palavras praticando o contorcionismo semântico. Busca convergir o corpo em situações de interação com o ambiente e imagens conceituais que sugerem que seja definido de forma relacional, operando simultaneamente um resgate de aspectos da formação cultural brasileira. Para Suely Rolnik, “a obra de Carlos demarca um território, ou melhor, o estabelece. Como nos animais, isso é feito por meio de dispositivos sempre ritualizados, que são, sobretudo, ritmos. No entanto, diferentemente dos animais. Aqui, o ritual e seu ritmo mudam constantemente; são inventados a cada vez, dependendo do ambiente em que são feitos e do campo problemático que procuram enfrentar, para isso o artista se instala na imanência do mundo, aos pés do real vivo, apenas apreensível pelo carinho.”
Idealizou e realizou a 1ª Bienal do Barro do Brasil, Caruaru (2014). Participou de exposições coletivas como a 3ª Bienal da Bahia, Salvador (2014); No Krannert Art Museum, Universidade de Illinois, Champaign, EUA. (2013); No Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães, Recife (2010 e 1999); No Itaú Cultural, São Paulo (2008, 2005, 2002 e 1999); Entre outras. Exposições individuais foram realizadas na Galeria 3 + 1, Lisboa, Portugal (2010); No Paço das Artes, São Paulo (2004); E na Fundação Joaquim Nabuco (Recife, Brasil, 2000). Foi vencedor do Prêmio CNI SESI Marcantonio Vilaça de Artes Plásticas (2006). Vive e trabalha em Recife.