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junho 1, 2021
Fábio Baroli na Zipper, São Paulo
As pinturas que Fábio Baroli apresenta na Zipper Galeria podem dar a impressão de que o artista aboliu o retrato em sua produção. Reconhecido por representar cenas interioranas – o modo de vida “matuto”, como o próprio alcunha –, Fábio Baroli vem retirando a presença humana das pinturas desde o site specific “Pra lá de dois pé-de-gabiroba” (CCBB Brasília, 2015). Em 2019, em sua primeira individual na Zipper Galeria, também não havia pessoas representadas. O mesmo se repete, agora, na exposição Hotspots - Memória, imaginação e resistência, que pode ser visitada a partir deste sábado, dia 15 de maio.
Entretanto, a produção de Fábio Baroli caminha, cada vez mais, para a antropogenia, ou seja, para a investigação do que seja o humano. Árvores típicas do Cerrado brasileiro, como ipês e buritis, muitas em tamanho real, grandiosas, surgem na exposição individualizadas, como modelos, abstraídas de seu contexto e deslocadas para o espaço de contemplação. E é neste processo que o humano nesta produção se revela.
A própria abstração – ou seja, a operação intelectual de isolar objetos e fatores do seu contexto de existência – é essencialmente humana. Hotsposts, por sua vez, é um conceito das ciências ambientais passível de entendimento apenas a partir da ação antrópica: o conceito indica áreas de espécies vegetais e animais endêmicas, constantemente ameaçadas de extinção. O Cerrado, salvaguardado nas memórias do artista, é um dos 35 hotsposts demarcados no planeta.
O processo de Fábio Baroli é, talvez, o principal que aproxima sua produção naturalista à antropogenia. “Eu sempre trabalhei a partir do retrato. E isso se mantém, mas agora são retratos de plantas. Cada uma delas se passou por um processo de individualização e se transformou em um ente, com memória, inteligência e personalidade próprias”, diz o artista. Este “saber oculto” das plantas tem sido objeto de investigações de Fábio Baroli, que busca agora uma representação visual à altura: imponentes em dimensão, cor e luz, os ipês de Fábio Baroli revelam suas raízes a partir do desenrolar das telas pelo chão da galeria. O artista faz menção ao pergaminho, ao que está oculto aos olhos e escapa à razão humana.
Segunda individual do artista na galeria, a exposição “Hotspots - Memória, imaginação e resistência” fica em cartaz de 15 de maio a 12 de junho. Andréia Narciso assina o texto crítico da mostra.
Sobre o artista
O trabalho de Fábio Baroli (Uberada, 1981) descende do ramo artístico de Almeida Júnior (1850-1899). Fábio expressa uma visão de mundo ancorada na vivência interiorana e no imaginário regional. Gêneros tradicionais — como retrato, paisagem e natureza-morta — se misturam às cenas do cotidiano em pinturas com gestos bruscos e marcantes, em trabalhos que revelam marcas de edição (montagens, colagens e intervenções) características de programas digitais. A apropriação e a referência da imagem fotográfica fazem parte do processo do artista. Vencedor dos prêmios Funarte de Arte Contemporânea (2011) e Marcantonio Vilaça (2013), o trabalho de Fábio Baroli consta em coleções como MAM Rio, Museu de Arte do Rio e Museu Nacional de Brasília. Principais exposições individuais: Goliath, MuseumsQuatier, Viena (2017); Deitei pra repousar e ele mexeu comigo, CCBB Brasília (2016); Muito pelo ao contrário, CCBNB, Fortaleza (2014); Vendeta: a Intifada, Funarte, Recife (2013). Principais exposições coletivas: Contraponto, Museu Nacional de Brasília (2017); É tudo nosso, Casa da Cultura da América Latina, Brasília (2017); Vértices – Coleção Sérgio Carvalho, Centro Cultural Correios, Braslília, Rio de Janeiro e São Paulo (2015/2016); Prêmio Aquisições Marcantonio Vilaça, Museu de Arte Moderna MAM Rio, Rio de Janeiro (2013).