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maio 19, 2021
A margem é mais larga que o vão na Central, São Paulo
A Central Galeria tem o prazer de apresentar A margem é mais larga que o vão, coletiva com curadoria de Talita Trizoli. Reunindo obras de artistas mulheres, cis e trans, a mostra propõe uma reflexão sobre a experiência do corpo feminino no contexto urbano, destacando as diferentes estratégias, desejos e limitações que mediam a presença desses corpos nos espaços de convivência.
No texto da exposição, Trizoli declara: “Não, nem todo corpo está autorizado a experienciar a multitude de espaços! Seja num breve deslocamento para afazeres cotidianos, seja na possibilidade do passeio, do lazer ou mesmo da tomada política das ruas, vivenciar a grade urbana é diretamente mediado por índices sociais: se o gênero é feminino ou dissidente, se o corpo não se adequa a padrões de desejo, se a pele não é alva ou se há signos de indicação de classe social de labor ou fragilidade, não há tomada das ruas, mas negociação de deslocamento”. Após reconhecer essas diferenças, prossegue a curadora, “resta a indagação de quais estratégias são mobilizadas para reclamar a presença desses indivíduos nos espaços de ruídos e atritos.”
O questionamento encontra diferentes respostas possíveis ao longo da mostra. A fonte invertida de Raphaela Melsohn (São Paulo, 1993), inspirada em monumentos públicos, traça um paralelo entre o fluxo da água e os desejos do corpo. Já Fabiana Faleiros (Pelotas, 1980) apresenta uma biruta de sinalização – similar àquelas de ambientes comerciais como postos de gasolina e empreendimentos imobiliários – tremulando em formato de bunda. O desejo também é explorado no trabalho de Natali Tubenchlak (Niterói, 1975), tanto no seu estandarte carnavalesco, quanto nas suas gravuras pornográficas impressas sobre recibos.
A condição do corpo trans, assim como suas estratégias de visibilidade e sobrevivência, são narradas nas performances musicais de Ros4 Luz (Gama, 1995), que exibe dois vídeos na exposição, e na produção “anarcatransfeminista” de Bruna Kury (1987), que apresenta uma série de capas de DVD de seus filmes eróticos.
Outros trabalhos lidam com a dimensão arquitetônica do corpo, como nas esculturas de Carolina Marostica (Porto Alegre, 1991), construídas a partir da premissa de contaminação e escape de elementos amorfo-orgânicos. Na pintura Kátia Fiera (São Paulo, 1976), a representação de edifícios icônicos salienta os contrastes entre as classes sociais e suas tragédias. Aline Motta (Niterói, 1974), por sua vez, retrata a paisagem de São Paulo emoldurada pelo cosmograma bakongo, iconografia milenar de marcação do tempo-espaço da tradição centro-africana.