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outubro 14, 2020
Mariana Palma no Tomie Ohtake, São Paulo
Em Lumina, mostra retrospectiva e primeira individual de Mariana Palma em uma instituição cultural na capital paulista, estão reunidos cerca de 50 trabalhos que repassam os quase vinte anos de carreira da artista, fundamentada, sobretudo, na pintura e no desenho. Segundo a curadora Priscyla Gomes, o conjunto de obras demonstra a recorrência com que a artista se refere à ideia de integração de partes e de superfícies que se tocam e atritam dando forma a um novo corpo.
Articulando composições ricas em texturas, quase sempre com cores intensas, a obra de Palma provoca a ilusão de sensações táteis, seduzindo o olho do espectador. Segundo a curadora, Lumina, que dá nome à mostra, se refere ao mito de Orfeu, sintetizado no instante em que ele fica cara a cara com Eurídice e a luz dos seus olhos emite um raio em sua direção. (Orfeu foi buscar a amada no mundo dos mortos e conseguiu libertá-la com a promessa de não olhar para trás, mas sucumbiu).
Na exposição, como uma série de atos, tal qual uma ópera adaptada, o visitante percorre diversos momentos do trabalho de Palma. “Explorando elementos provenientes da botânica, de estampas, organismos marítimos e fragmentos arquitetônicos, Palma aborda a interpenetração de corpos, destaca alternâncias entre instantes de tensão e expansão, e compõe infindáveis universos frutos da exploração de luz e sombra”, pondera Gomes.
O percurso pelo espaço expositivo inicia-se com uma série de aquarelas, pinturas e fotografias que corroboram com a mitologia dos amantes. Aos poucos, a narrativa traz, por intermédio de pinturas em grande formato, as idas e vindas dessa trajetória. Para a curadora, o encontro é materializado por uma instalação em que frutos de palmeiras, tal qual duas cascatas, vertem-se em uma bandeja de líquido viscoso. “Palma constrói por intermédio do jorro das plantas uma metáfora pujante do possível encontro desses corpos fatidicamente cindidos”.
Os demais atos exploram a atmosfera da busca de Orfeu por Eurídice, destaca a curadora. Obscuridade e renascimento são fios condutores da aproximação dos trabalhos. Segundo Gomes, esses dois polos explorados são determinantes à compreensão da multiplicidade do léxico da artista. “Embora a profusão de elementos, aliada à intensidade do uso da cor, salte aos olhos no primeiro fitar das obras de Palma, a sutileza e rigor com que a artista articula cada camada sucessiva de tinta desvela um processo lento e meticuloso somente evidente quando nos debruçamos sobre a superfície planar de suas pinturas”, conclui.