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setembro 28, 2020
Museu Casa do Pontal anuncia transferência de seu acervo para a nova sede na Barra da Tijuca
Museu Casa do Pontal, referência em arte popular no país, se prepara para transferir seu acervo para a nova sede, na Barra da Tijuca
Após dez anos de lutas contínuas para manter em segurança suas quase nove mil obras, de 300 artistas populares brasileiros, serão levadas a partir de outubro para o novo espaço as sete mil obras guardadas atualmente na reserva técnica da instituição. As demais duas mil peças, reunidas na exposição permanente na sede histórica do Pontal, no Recreio, poderão ser vistas pelo público, gratuitamente, a partir de 3 de outubro até 8 de novembro, na exposição Até logo, até já, antes de também seguirem para a nova sede.
O Museu Casa do Pontal, referência em arte popular, com o maior acervo deste segmento no país, com cerca de nove mil obras de 300 artistas brasileiros, anuncia a transferência de seu acervo para a nova sede, na Barra da Tijuca. A mudança se dará em dois momentos: em outubro, começarão a seguir para o novo espaço cerca de sete mil obras que estão atualmente na reserva técnica do Museu ou em itinerância fora (SESC Santos). Enquanto isso, o público poderá ver na sede histórica do Pontal, dentro de todos os protocolos exigidos no combate ao Covid-19, as obras reunidas na exposição permanente. Em novembro, seguirão para a nova sede na Barra também essas obras do acervo que ficavam em exposição para o público, com cerca de duas mil peças. Na nova sede, as obras ficarão acondicionadas em um espaço seguro.
A nova sede do Museu Casa do Pontal será inaugurada no segundo trimestre de 2021, com uma grande exposição de longa duração, com os destaques de seu raro acervo. A finalização da obra, bem como todo o processo de mudança do delicado e histórico acervo são possíveis graças aos recursos do BNDES, do Itaú, da Vale e das pessoas que entenderam a importância de preservar este importante patrimônio brasileiro. Em um edifício projetado pelos premiados Arquitetos Associados, responsáveis pelas galerias de Inhotim, em Minas, com paisagismo assinado pelo escritório Burle Marx, a nova sede do Museu Casa do Pontal está localizada em terreno já consolidado, cercado de parques e reservas naturais, como o Bosque da Barra, próximo a três importantes escolas, e vizinho ao condomínio Alphaville, em local acessível, que concentra cerca de um milhão de habitantes.
Distante apenas quatro quilômetros do Barra Shopping e da Cidade das Artes, o novo espaço tem 14 mil metros quadrados de terreno, e 2.600 metros quadrados de área construída. Com brisa constante, e voltado para uma área verde, a nova sede do Museu possui ainda vista privilegiada para a Pedra da Gávea e para um trecho do Gigante Adormecido (o mitológico conjunto de montanhas que se estende por 20 quilômetros, da Barra ao Pão de Açúcar).
“Até chegar neste sonhado momento, já se somam mais de dez anos de lutas contínuas emuitas apreensões, desde que em 2010 o Museu sofreu a primeira das muitas inundações que colocaram em risco seu precioso acervo”, diz Lucas Van de Beuque, diretor-executivo da instituição. Fundado em 1976 pelo artista e colecionador francês Jacques Van de Beuque (1922-2000), o Museu Casa do Pontal até então nunca havia sofrido nenhum alagamento.
RITUAL DE PASSAGEM PARA O FUTURO
Angela Mascelani, diretora-curadora do Museu, comenta que “a sede construída por Jacques e animada por Guy (Van de Beuque) com tantos amigos, foi espaço de lutas, trabalho e de muitas alegrias. Inspirados pelos artistas populares, levaremos para a nova sede a tradição, transformada e viva”. “Estamos dedicando esta reabertura na sede histórica, que durará um mês, aos afetos e aos corações. Aos que aqui se apaixonaram, aos que seguiram as trilhas da cultura popular, aos que dançaram em nossos jardins e terreiros. É o axé das festas, é a energia dos artistas, é a farra das crianças e jovens que levaremos para o novo espaço. Com o principal acervo brasileiro de arte popular a salvo, tempos bons se avizinham! Vemos esta despedida como um ritual de passagem para o futuro. Um futuro que sonhamos: respeitoso ao meio ambiente, solidário e sustentado por muitas mãos!”, destaca.
Lucas Van de Beuque observa que “este é um momento de agradecimento, o que parecia ser o fim, com as constantes inundações, acabou virando uma grande campanha dos apaixonados pela arte e cultura popular do Brasil pela permanência do Museu do Pontal, demonstrando que nós, brasileiros, nos importamos com nosso patrimônio”.“Agora um novo futuro se desenha, e pretendemos antes do fim do ano ter a maior parte do acervojá na nova sede, para que esta e as próximas gerações continuem a ter um espaço importante de valorização da diversidade cultural brasileira”, afirma.
O estabelecimento da nova sede foi fruto de cinco anos de negociações com a Prefeitura. Um estudo realizado pela Coppe/UFRJ determinou como causa das inundações constantes os aterros para a construção de grandes condomínios na região. A Prefeitura reconheceu sua responsabilidade na questão, e cedeu, em 2015, um terreno na Barra da Tijuca por um período de 50 anos renováveis, e garantiu R$ 7,5 milhões – parte dos recursos de R$ 11 milhões necessários para a construção da nova sede – enquanto o Museu do Pontal arcaria com os R$3,5 milhões restantes. A empresa construtora Calper, que estava em dívida com a Prefeitura, seria responsável por destinar para a obra o valor referente à parte da administração municipal.
As obras começaram em junho de 2016 e estavam previstas para terminarem em julho de 2017, mas em maio daquele ano a construtora Calper quebrou o contrato, quando faltava destinar cerca de R$ 2 milhões de sua responsabilidade, e interrompeu o trabalho, sem finalizar a parte já construída, e sem edificar um terço do projeto.
NOVAS ESTRATÉGIAS: FINANCIAMENTO COLETIVO
A paralisação da construção da nova sede interrompeu todos os projetos do Museu. A direção do Museu então reduziu ao mínimo operacional os gastos e a equipe, e para seguir adiante lançou mão da reserva própria de R$1,5 milhão, usada criteriosamente desde 2016 para a manutenção do Museu, em seus constantes alagamentos.
Em abril de 2019, ocorreu a sexta e mais grave inundação, e um grande volume de água barrenta tomou os corredores do Museu, só não pondo fim ao acervo por conta da rapidez de funcionários e ex-funcionários que conseguiram retirar 300 obras que estavam prestes a serem atingidas pelo alagamento. O fato chocou cariocas e amantes do Museu e da arte em geral.
A direção do Museu Casa do Pontal decidiu desenhar novas estratégias, entre elas a de assumir a finalização da obra, lançando a campanha de financiamento coletivo, que criou uma rede de mais de 500 apoiadores e entusiastas.
Depois de quatro meses fechado, o Museu Casa do Pontal realizou no final de julho de 2019um lindo arraial, em agradecimento às pessoas que possibilitaram sua reabertura parcial da sede histórica.
No mês seguinte, a campanha de financiamento coletivo teve como foco os recursos para dar continuidade às obras da nova sede, e deste modo salvar definitivamente o maior acervo de arte popular do Brasil.
Em dezembro de 2019, a campanha já reunia apoio não só de pessoas, que contribuíram com um total de R$ 200 mil, como de empresas como o Itaú, que doou R$ 700 mil, e a Vale, que aportou R$ 800 mil. O Museu também entrou diretamente com R$ 850 mil de outras fontes.
Com esta verba, a direção está finalizando a parte já edificada – 2.600 metros quadrados –com previsão de que em outubro já estejam concluídas as instalações dos telhados, sistema elétrico e hidráulico, de segurança, dados e voz, esquadrias metálicas para portas e janelas, além do piso. Ações essas que já garantem as condições necessárias para levar o acervo para lá em segurança.
Os recursos do BNDES, de R$ 2 milhões, são destinados à transposição do acervo e na elaboração e realização da nova exposição de longa duração do Museu do Pontal, prevista para 2021. Colaboraram para o sucesso de todos estes esforços, as parcerias do IBRAM [Instituto Brasileiro de Museus] e da Secretaria Especial de Cultura.
DEPOIMENTOS
Ao longo de seus 44 anos de história, o Museu coleciona fãs por toda parte. Entre os vários depoimentos que já recebeu, de artistas, pensadores, colecionadores, dirigentes de instituições culturais, empresários, entre outros, estão a seguir alguns trechos desses depoimentos.
Gilberto Gil, compositor – “Todos os que fazem esse trabalho, que participaram dessa história extraordinária, reunida com carinho especial por Jacques van de Beuque e seu filho Guy, produziram ao longo do tempo, camada por camada, essa obra que é um orgulho para o país. A Casa do Pontal é hoje uma realidade que pertence a todos nós e nós todos temos que cuidar dela”.
José Saramago (1922-2010), escritor– “O Brasil deveria considerar este lugar um tesouro, mais importante que o Corcovado ou o Pão de Açúcar. Porque é realmente um assombro. Porque arte popular está em toda parte, o povo está lá, portanto cria, tem sua própria expressão artística. Eu venho aqui há bastantes anos e conheço razoavelmente. Alguns exemplares de arte popular brasileira tenho em minha casa. Mas como se reuniu na Casa do Pontal é inimaginável”.
Marieta Severo, atriz – “Quando fui lá pela primeira vez, não tinha nenhum prédio, nada em volta. Era só a casa original. Sinto uma identificação com esta arte, como se eu fizesse parte disso, com seus personagens. Olho cada rosto e vejo as diferentes expressões: ali tem um ser humano, tem uma pessoa, um personagem vivo que me diz alguma coisa. O Museu traz um painel da vida brasileira, das camadas mais populares. Ali tem tudo: as profissões, as festas, o cotidiano, a história, está tudo ali, está retratado. Sempre me comoveu essa necessidade da beleza, da arte no cotidiano. Então, além do valor estético, além de olhar e falar: "Nossa! Que peça linda", o fato das peças trazerem o cotidiano da vida das pessoas me encanta. O acervo que tem o Museu do Pontal é essa expressão da vida cotidiana ligada ao social, ao que estava acontecendo no momento no país, retratando isso tudo. Jacques van de Beuque foi um dos primeiros a olhar, a enxergar, a valorizar de uma forma sistemática, intensa! Pois foi capaz de ver o que aquilo significava dentro da nossa cultura, o valor artístico daquilo”.
Bia Lessa, diretora teatral – “O que acontece dentro do Museu do Pontal é que é um espaço sagrado; quando você entra é como entrasse numa igreja, no Teatro Municipal. Outro dia eu estava conversando com Paulo Mendes da Rocha, arquiteto que eu amo, e ele falou que a melhor definição para um museu é que ele ‘contém todas aquelas coisas que tinham que ser vistas por todos os homens’. Esta é a melhor definição de um museu, aquilo que tem que ser visto por todos, aquilo tem que fazer parte de nós todos”.
Otto, músico – “Aprendi muito e o mais importante: eu me vi e me identifiquei como brasileiro, como ser humano. Um sonho! Acredito que, das coisas que vi no Rio de Janeiro, uma das mais relevantes é o acervo desse Museu. Que o Museu do Pontal se fortifique e que todos os que têm espaços para opinar, para influir, conceber, saibam que a existência do museu é primordial, é essencial e divina”.
Edgar Morin, filósofo francês – “Estou encantado com a visita a este museu de arte popular, cuja ingenuidade e o refinamento fazem dele um tesouro artístico inestimável. É por isso que desejo que este Museu seja protegido. Soube que ele está ameaçado pela especulação imobiliária, como frequentemente as mais belas coisas são ameaçadas. Penso que é necessário fazer todo esforço para protegê-lo e permitir sua continuação, porque se trata da memória viva da arte popular do povo brasileiro e suas diferentes regiões. Parabéns para esse Museu! Vamos fazer tudo o que for possível para salvá-lo!”
OSGÊMEOS (irmãos Otávio e Gustavo Pandolfo), artistas – “Aqui é uma escola! Ver as crianças chegando todo dia de ônibus, curtindo, participando, isso não tem preço! Isso é parte da cultura da história da arte do Brasil. Precisa ser preservado. E isso é história do Brasil, é história da arte brasileira, das gerações brasileiras. Tem coisas que se uma criança entrar lá, hoje em dia, não vai entender o que é. ‘Que tipo de câmera aquele bonequinho tá segurando? Eu nunca vi uma câmera dessas. Eu conheço a câmera do iPhone’. Tem até peças que reproduzem só brincadeiras de criança, inclusive brincadeiras que não se veem mais por aí. Cada pecinha, cada escultura que você vê ali... Tudo tem uma energia incrível. Até o fato de uma obra dialogar com a outra, meio assim, sem querer, já é um espanto. Nos chama atenção como vocês acreditaram nesse espaço, nesse Museu, na preservação disso, na continuidade disso. Não é qualquer um que acredita num negócio desse não! Vocês estão brigando com dragões. Isso não é para qualquer um! Reconhecemos o quanto é difícil fazer o que vocês fazem. O quanto é difícil manter isso, defender isso”.
Paulo Barros, carnavalesco – “Tive a felicidade de conhecer o Museu do Pontal através de um enredo que fiz na Unidos da Tijuca em 2012, sobre Luiz Gonzaga. Precisava me inspirar em alguma coisa e já tinha programado até uma viagem para Recife, mas, antes disso, algumas amigas me convenceram a ir ao Museu do Pontal. Chegando lá, tive a surpresa de encontrar aquele universo, de cuja existência não tinha a menor ideia. Ali tinha tudo: e foi o pontapé inicial para a gente falar do enredo, que tratava da cultura popular. Posso dizer que esse enredo nasceu ali, a partir da visita ao Museu, que trazia elementos de estética, de forma, de arte. Eu preciso das imagens para contar uma história. Então a visita ao Museu do Pontal foi exatamente isso; foi a primeira referência que tive do visual da arte popular, para poder falar de um tema que já tinha sido muito batido nas escolas de samba. Com o advento da internet, a gente tem uma proximidade das coisas muito rápida, a internet traz o mundo para a nossa casa. Mas é diferente de você estar de frente às coisas. Então eu acho que a minha obrigação de ter saído de casa para ir ao Museu do Pontal, ela foi extremamente necessária para eu realmente sentir, vivenciar a arte popular de perto”.
Danilo Miranda, diretor do SESC São Paulo– “Abriga-se atrás de uma proposta como essa do Pontal uma perspectiva utópica de uma sociedade melhor, de algo que possa ser mais importante, mais vital, que possa trazer elementos que tornem a sociedade mais capaz, digamos assim, de enfrentar os problemas que tem que enfrentar; de igualdade, respeito, valorização de todos; essa luta pela democratização permanente, essa possibilidade de termos realmente um país melhor para todos”.
João Maurício Pinho, colecionador de arte popular – “A grande qualidade do Pontal é ser um museu extremamente didático. Ele foi concebido para funcionar como uma escola. Não adianta eu chegar em um museu, vir aqui e ficar com a sensação de ‘não entendi nada, mas é bonito...’ Não, ao contrário! Ali é didático, ali é feito para ensinar. Aquilo tudo coloca sua cabeça no lugar. Muita gente não imagina o grau de dificuldade para fazer o museu se manter e funcionar. Parece fácil! O sujeito chega aqui, tá bonito, formidável! Ninguém sabe o que está para trás. O backstage ninguém vê. Eu acho que trabalhar com essas pessoas e situações foi uma sorte na minha vida. Foi o que me deu uma sobrevida. E espero que continue muito tempo!”
George E. M. Kornis, colecionador – “A coleção consolidada transcende a vida do seu criador. Ela torna rara uma coleção de arte transgeracional quando Guy (Van de Beuque) e sua mulher Ângela (Mascelani) assumem-na como projeto de vida. A vida do Guy foi, infelizmente, muito breve. No entanto a sua atuação foi ampla e consistente. Hoje, Ângela e o neto de Jacques, Lucas, conduzem esse percurso e protegem esse legado. Um desafio considerável”.
Emanuel Araújo, diretor do Museu Afro Brasil – “A primeira vez que estive com o Jacques van de Beuque foi em 1976. Ele estava fazendo a cenografia da exposição do Festac na Nigéria, e por conta disso tivemos uma convivência muito próxima”.
Alexandre Pimentel, criador do Museu Vivo do Fandango – “Como dizia Milton Santos, uma globalização que se apresenta como um rolo compressor visa a eliminação da diferença, ou vê a diferença de uma forma conservadora, em vez de a ver como possibilidade de outro mundo possível. Por isso a importância de termos a arte popular como referência, pois ela não perde a capacidade de refletir, de indicar, por meio do olhar de seus artistas, a complexidade da contemporaneidade”.
Paulo Knauss, ex-diretor do Museu Histórico Nacional – “O colecionador não é apenas um apaixonado que junta muita coisa, mas é sobretudo alguém que faz da prática de colecionar um motivo de estudo e pesquisa”.
Cafi (1950-2019), fotógrafo – “Quis fazer um trabalho fotográfico com Vitalino. Falei com um tio, o pintor Augusto Rodrigues (1913-1993), que tinha feito uma matéria com o Vitalino para a revista ‘Cruzeiro’, e ele me disse: ‘Procura o Jacques van de Beuque lá no Rio. Ele é um grande colecionador e pode te orientar’. Fui até o escritório dele na Rua São João Batista, em Botafogo. Ali já vi muita coisa. E, aos poucos, por causa da arte popular, fui ficando amigo do Jacques. Logo depois ele vendeu a casa da São João Batista e comprou a chácara no Pontal. Na época era no fim do mundo... muito longe, mas ir até lá era um passeio maravilhoso. Ele tinha uma relação de total amorosidade com a coleção, de uma total vontade de fazer um museu e saber que isso era a coisa mais importante que podia acontecer no Brasil. Era uma expressão do povo brasileiro. Assim Jacques formou um grande acervo nacional, pois não era uma coleção só de Pernambuco, nem só da Bahia, nem só do Rio de Janeiro. Era o Brasil inteiro”.
Luiza Trajano, empresária – “Imagine ver, em um só lugar, toda a história e desenrolar do Brasil através da arte popular. Mais de oito mil peças apresentadas de uma forma tão didática. É maravilhoso! Tenho falado para todas as pessoas: quero levar meus netos, porque conta a história do Brasil, de tudo o que aconteceu, de todos os segmentos, na área industrial, comercial, diversão... Fiquei muito feliz ao saber da mudança do Pontal para a Barra. Tenho certeza que no novo espaço vai ser possível mostrar essa maravilha toda para muito mais gente, especialmente para as crianças”.
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