|
agosto 4, 2020
Marcius Galan na Luisa Strina, São Paulo
O atrito e a oposição entre materiais de naturezas contrárias são o assunto principal da próxima exposição solo de Marcius Galan na galeria. O artista apresenta esculturas inéditas feitas ou finalizadas com materiais que têm uma relação de incompatibilidade entre si, como por exemplo uma superfície áspera e outra lisa, um elemento de alta densidade e outro líquido/fundido.
[scroll down for English version]
As obras que dão título à exposição Fervor são três esculturas de madeira maciça em que Galan fez um sulco, retirando matéria do topo delas, sobre o qual jogou posteriormente bronze fundido, em maior ou menor quantidade, de modo que o metal derretido queimou parte da madeira ou transbordou o sulco e cobriu parte do hexaedro. Fervor (2020) é, portanto, um trabalho que parte de dois materiais clássicos da escultura para, gerando um atrito corrosivo entre eles, promover uma conversa das incompatibilidades.
A relação de calor ou pressão comparece simbolicamente na obra Desenho Explodido, que representa um esquema geométrico de um vulcão em erupção. Sob a lente matemático-abstrata de Galan, vulcão equivale a cone e erupção, a um sarrafo cilíndrico patinado de vermelho localizado no núcleo do cone, a que os olhos têm acesso devido ao corte de uma seção do volume. A ideia de diagrama isométrico já havia sido explorada pelo artista em trabalhos como Área Comum (2008), Equação em suposto equilíbrio (2013), e Ponto (2015).
Seção Diagonal (2008), uma das obras mais conhecidas do artista, trata das experiências que ele faz com planos de corte e outras apropriações da linguagem da engenharia. Galan opera no limiar entre a aplicação matemática e a sugestão do conflito e da destruição, uma vez que implosões, explosões, seccionamentos, quebras e partições estão subentendidos no vocabulário do desenho técnico. Na exposição Fervor, a coluna de concreto com cunhas de madeira da série Straight Segment é uma síntese de tal ambiguidade: “O que mantém uma estrutura em pé ou um plano apoiado em outro é o atrito”, analisa.
O curador Tiago de Abreu Pinto, que assina o texto sobre a mostra, comenta sobre Coluna (Straight Segment): “A cunha parece sublinhar as intenções, os equilíbrios; da intrusão, mas pertinente intervenção. Não bastasse isso, nesse corpo estranho encontramos a força da obviação dessa matéria. A presença dos fatos incontornáveis. E, por não se limitar a nenhum dos sentidos anteriores se amplia e se transforma em reduto impessoal, espaço de influxo universal. A cunha cavou seu espaço: resistiu”.
Mais adiante, Tiago define assim a pesquisa recente de Marcius: “ele nos apresenta o espaço de contato: atritivo, convulsivo, fervoroso”. As obras da série Contato (2020) consistem na convivência conflituosa entre superfícies automotivas impecavelmente lisas e um segundo plano de textura inconfundivelmente áspera. O atrito entre os dois planos é o que os torna únicos e humanizados, belos. Fervor é a quinta exposição individual de Marcius Galan na Galeria Luisa Strina.
Em respeito às recomendações das autoridades de saúde, a reabertura da galeria, a partir de 4 de agosto, acontece com horário de visitação reduzido (das 11h às 16h) e apenas com agendamento de horário. As exposições individuais de Marcius Galan (sala 1) e Muntadas (sala 2), assim como a coletiva Nuestra América, no anexo da Galeria Luisa Strina, podem ser visitadas presencialmente, com agendamento pelo Google Forms ou através do e-mail assistente@galerialuisastrina.com.br. A partir do dia 4, a galeria e o anexo voltam a operar, sempre com limite de pessoas dentro das salas expositivas e obrigatoriedade de uso de máscara para entrar nos dois espaços.
SOBRE O ARTISTA
Herdeiro, por um lado, da arte conceitual, pela crítica à experiência retiniana na arte, e, por outro, do construtivismo, pela aproximação da obra com o mundo real, Marcius Galan é um dos principais expoentes da arte experimental dos anos 2000. O artista não se restringe a uma linguagem ou suporte, assim como transita com liberdade entre campos do conhecimento (das ciências exatas, como a física e a matemática, às geociências e humanidades), e costuma opor a maneira como os objetos são percebidos às propriedades físicas dos materiais.
Exposições individuais recentes incluem: Água Parada, Auroras, São Paulo (2019); Instrumentos de Precisão, Instituto Figueiredo Ferraz, Ribeirão Preto, Brasil (2018); Mará-obi, Capela do Morumbi, São Paulo (2018); Line Weight, Galerija Gregor Podnar, Berlim (2017); Planta / Corte , Galeria Luisa Strina, São Paulo (2015); Arquitecturas del Desarraigo , Ideobox Artspace, Miami (2014); Diagrama , NC -Arte , Bogotá (2013); Geometric Progression, White Cube, Londres (2013).
Exposições coletivas recentes incluem: Stories of Abstraction: Contemporary Latin American Art in the Global Context, Phoenix Art Museum, Phoenix, EUA (programada – 2020); Visão Geral, Galeria da Mata, Instituto Inhotim, Brumadinho, Brasil (2019); Plural Domains – Selected work from the CIFO Collection, Bienal de Cuenca, Museo de la Ciudad, Cuenca, Equador (2018); MAM 70, Museu de Arte Moderna, São Paulo, (2018); Avenida Paulista, MASP – Museu de Arte de São Paulo (2017); El Arte y el Espacio, Guggenheim, Bilbao (2016); De lo espiritual en el arte, MAMM – Museo de Arte Moderno de Medellín (2016); Brazil, Beleza?! Contemporary Brazilian Sculpture, Museum Beelden aan Zee, Haia (2016); Imaterialidade, Sesc Belenzinho, São Paulo (2015); Empty House , Luhring Augustine, Nova York (2015); Question Centre, Pivô, São Paulo (2014); Inside, Palais de Tokyo, Paris (2014); Cruzamentos: Contemporary Art in Brazil , Wexner Center for the Arts, Columbus (2014); 30ª Bienal de São Paulo (2013); ’My Third Country’, Frankdael, Amsterdam (2013); Blind Field, Kannert Art Museum e Kinkead Pavillion, Illinois (2013).
Coleções das quais seu trabalho faz parte incluem: Museu Serralves, Portugal; Pinacoteca do Estado de São Paulo, Brasil; Museu de Arte Moderna de São Paulo e do Rio de Janeiro, Brasil; Museum of Fine Arts Houston, EUA; Phoenix Art Museum, EUA; Coleção Jumex , México; Instituto Inhotim, Brasil; Cifo Cisneros Fontanals, EUA; Coleção Zabludowicz Collection, Inglaterra; Instituto Figuereido Ferraz, Ribeirão Preto, Brasil; MUBE, Brasil.
Friction and opposition among materials from contrary natures are the main subject of Marcius Galan’s next exhibition in the gallery. The artist presents new sculptures made of or finalized with materials that have a relation of incompatibility between them, for instance a rough surface against a smooth one, a high-density element in opposition to another that is liquid/cast.
The title to the exhibition Fervor comes from the three solid wooden sculptures where Galan made a groove, removing material from their top, then subsequently he has poured molten bronze in different quantities, and as a result the molten metal has burned part of the wood or, as it overflowed the groove, has covered part of the hexahedron. Therefore, Fervor (2020) is a work that starts from two classic sculpture materials in order to generate a corrosive friction between them, to promote a dialogue about incompatibilities.
The heat and/or pressure relation appears symbolically in the piece Desenho Explodido (Exploded Drawing), which shows an erupting volcano geometric scheme. Under Galan’s mathematical-abstract lens, a volcano is equivalent to a cone and, eruption to a red patinated cylindrical batten, placed in the core of the cone, so the eyes have access through a cutting in the volume’s section. The artist had already explored the idea of an isometric diagram in works such as Common Area (2008), Equation in supposed balance (2013), and Point (2015).
One of the artist’s best-known works, Seção Diagonal (Diagonal Section, 2008) deals with his experiments on cutting plans and other appropriations of engineering language. Galan operates on the threshold between the mathematical application and the conflict or destruction suggestions, as implosions, explosions, sectioning, breaks and partitions are implied in the technical design vocabulary. In the Fervor exhibition, the concrete column with wooden wedges in the Straight Segment series is a synthesis of such ambiguity: “Friction is what keeps a structure standing or what keeps a plane supported by another one”, he analyzes.
The curator Tiago de Abreu Pinto, who writes the exhibition text, comments on Coluna (Straight Segment): “The wedge seems to underline the intentions, the balances; intrusion, but pertinent intervention. As if that was not enough, the strength of this material obviousness is found in this foreign body. The presence of compelling facts. And, being not limited to any of the previous meanings, it expands and becomes an impersonal stronghold, a space of universal influx. The wedge has dug its space: it has resisted”.
Further on, Tiago defines Marcius’ recent research: “he presents us the contact space: attractive, convulsive, zealous”. The pieces in the Contact series (2020) result from the conflicting coexistence between impeccably smooth automotive surfaces and an unmistakably rough texture background. The friction between the two planes is what makes them unique and humanized, beautiful. Fervor is Marcius Galan’s fifth solo exhibition at Galeria Luisa Strina.