|
março 5, 2020
Élle de Bernardini na Luciana Caravello, Rio de Janeiro
A artista abre sua primeira individual na Galeria Luciana Caravello que ocupará o terceiro piso da galeria com obras inéditas e traça uma relação com a civilização egípcia
No dia 5 de março a Galeria Luciana Caravello abre a exposição “Black and Gold”, primeira individual da artista gaúcha, Élle de Bernardini, que vive e trabalha em São Paulo. A mostra tem curadoria de Raphael Fonseca e traz 12 trabalhos inéditos da série, “Formas Contrassexuais”. Série de trabalhos que já foi apresentada no Masp, na exposição, “Histórias Feministas” (2019). Onde a artista desenvolve o que ela chama de “novo modelo de sociedade”, que pensa o sujeito sem as categorias de homem ou de mulher, e é baseado no conceito homônimo do filósofo transexual espanhol, Paul Preciado. “Em meu trabalho proponho rescrevermos a História da Humanidade e a História da Arte, por meio de um modelo de sociedade alternativo ao modelo vigente cis-branco-macho- heteronormativo-eurocentrado, que determinou o modo como a história no ocidente vem sendo escrita e contada a mais de 4000 mil anos. Este novo modelo é baseado em Paul Preciado”.
Na exposição a artista traça uma relação com a civilização egípcia, mais precisamente o modo como eles registravam a história. O uso dos símbolos na constituição de sua linguagem. Os famosos hieróglifos foram a referência crucial que levou a artista no começo de seu processo com a série das “Formas Contrassexuais” em 2018 a desenvolver uma legenda própria que representa graficamente às cinco principais zonas erógenas do corpo humano, e que caracterizam os gêneros, são elas: pênis, vagina, seios, escroto e ânus. Combinando e (re)combinando o alfabeto simbólico criado por ela mesma, a artista propõem escrever a história de uma civilização futura, baseada no conceito da contrassexualidade. Uma sociedade sem a necessidade de classificação dos sujeitos por gêneros. Uma sociedade não branca, não-binária, não eurocentrada, não patriarcal e nem matriarcal.
A artista escolheu como matérias-primas de sua nova pesquisa o couro e a pintura em acrílica com traços gráficos livres e simples que remetem à escrita. Então o que veremos exposto é uma série de acrílicas sobre couro que remetem ao modo como os egípcios registravam sua história nas paredes das tumbas a milhares de anos atrás. Porém trazida para a contemporaneidade e utilizada como referência para a inscrição de uma sociedade ainda em parte utópica, mas em processo lento de formação. As figuras icônicas da civilização antiga, como as três pirâmides e a múmia do faraó, aparecem desconstruídas e recriadas numa série de 4 esculturas de metal e tecidos. Placas de couro trazem desenhadas códigos que parecem contar uma história, mas que para a artista funcionam como dispositivos para (re)pensar a geografia corporal. A localidade das zonas erógenas, sua repetição, e como o corpo do homem e da mulher está socialmente determinado. As “Formas Contrassexuais” apresentam um corpo desconstruído, um corpo livre para ser o que quiser ser, relevando a artificialidade das normas impostas ao corpo, por meio da demonstração de uma linguagem que também é ela mesma artificial.
Na exposição, “Black and Gold” a artista utilizando da estética egípcia relaciona a artificialidade da linguagem com a corporalidade para demonstrar que a geografia corporal, ou seja, como o corpo está socialmente estruturado é também uma determinação artificial tal como a linguagem, e dependente da história. Ao passo que apresenta uma saída para o problema, a saída da contrassexualidade que vemos desenhadas nas peças expostas. E que nada mais são do modos de pensar um corpo que se constrói da forma que quer, com dois, três ou mais seios, nas costas ou na parte da frente, com clitóris em outras partes do corpo. “Esse rompimento com a geografia corporal é o caminho para a destruição das categorias de gênero, homem e mulher. Se nos deparamos com um corpo que possui três seios, um pênis, um clitóris no cotovelo, em qual categoria de gênero vamos coloca-lo, na de homem, ou na de mulher? Em nenhuma das duas é possível segundo a norma inerente a cada uma das categorias. Sobrando apenas duas opções, forjarmos uma categoria nova, ou não categoriza-lo. Não categoriza-lo está fora de questão, pois ele precisa existir na linguagem para existir no mundo humano que é determinado pela linguagem”. A arte para artista é uma linguagem que se utiliza de símbolos e códigos para comunicar a mensagem que se quer passar ao público.
Élle de Bernardini (Itaqui, 1991) vive e trabalha em São Paulo. Tem formação em ballet clássico pela Royal Academy of Dance de Londres. É uma mulher transexual com uma produção permeada por sua biografia. Suas obras abordam a intersecção entre, questões de gênero, sexualidade, política e identidade com a história da humanidade e da arte. Seu trabalho vem sendo exposto em instituições nacionais como, Museu de Arte de São Paulo/MASP, Pinacoteca do Estado de São Paulo, Museu de Arte do Rio/MAR, Museu de Arte do Rio grande do Sul/MARGS, Museu Nacional da República, Memorial da America Latina, MAC-RS, Pivô Arte e Pesquisa, Farol Santander, Centro Cultural São Paulo. Suas obras integram importantes coleções como, Museu de Arte do Rio Grande do Sul / MARGS, Porto Alegre. MAC-RS, Porto Alegre. MAC-Niterói, Rio de Janeiro. Coleção Santander Brasil, São Paulo. Museu de Arte do Rio, Rio de Janeiro. Museu de Arte Moderna do Rio, Rio de Janeiro. Fundação de Artes Marcos Amaro, Itu e Museu Nacional da República, Brasília. Pinacoteca do Estado de São Paulo, São Paulo.