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novembro 25, 2019
Pedro Veneroso no Centro Cultural UFMG, Belo Horizonte
Pedro Veneroso entre linguagens, mídias e disciplinas: Mostra Recodificações reúne produção do artista mineiro em arte, ciência e tecnologia
Após circular pelo mundo com obras que exploram as relações entre a arte, a ciência e a tecnologia, Pedro Veneroso volta a expôr em Belo Horizonte com a mostra individual Recodificações, abrigada pelo Centro Cultural UFMG entre 19 de novembro e 12 de janeiro de 2020. A prolífica produção do artista nessa área, exibida em diversos países – entre os quais a Espanha, os Estados Unidos, a França e o México – e cidades brasileiras – como Rio de Janeiro, São Paulo e Belém –, até então permanece, em grande parte, inédita em Belo Horizonte. O artista, um dos expoentes da atual geração de arte eletrônica e digital brasileira, se propõe a reunir nesta mostra uma parte destacada de sua produção na área, abrangendo linguagens como a instalação, a net art, a arte computacional, o vídeo, a fotografia, a gravura e a literatura e tangenciando alguns dos temas centrais às suas pesquisas. As investigações das relações entre espaço e tempo e entre diferentes códigos, linguagens e notações humanas – assuntos que atravessam a carreira do artista desde o início – são acompanhadas por explorações mais recentes, como os sistemas complexos, os algoritmos generativos e a teoria das redes, fruto das pesquisas acadêmicas do artista formado pela UFMG.
Veneroso iniciou sua carreira em 2006, quando desenvolveu uma série de fotografias que inaugurou suas pesquisas nas zonas de interseção entre a arte, a ciência e a tecnologia. Utilizando as técnicas de light painting, em que é possível registrar rastros de luz em uma única imagem, e múltipla exposição, que permite sobrepor diversas cenas, as obras dessa série consistem em experimentos com técnicas que aprofudam as dimensões espaço-temporais das fotografias. Nesse contexto, uma fotografia não representa o registro de um instante, mas de durações, e se desliga da mera representação da realidade concreta. Essa produção embrionária influenciaria a atuação do artista nos anos seguintes, quando se uniu a André Mintz e Aline Xavier para criar o Marginalia Project, coletivo de arte e tecnologia fundado em 2008, e o Marginalia+lab, laboratório internacional de arte e tecnologia coordenado pelo coletivo que, sediado em Belo Horizonte, realizou inúmeras exposições, residências, workshops, encontros e publicações entre 2009 e 2012.
O período entre 2011 e 2012 – época em que Veneroso foi artista residente no Museu da Imagem e do Som de São Paulo – marcou uma importante transição na carreira do artista. Nesse momento, a sua produção em arte, ciência e tecnologia se tornou mais constante e aprofundou as relações entre técnicas tradicionais e contemporâneas. Representante de uma cultura maker, guiado pelo princípio do faça-você-mesmo, o artista utiliza suas obras como modos de pesquisa de técnicas, temas e linguagens, integrando a prática e a teoria artística a conhecimentos e técnicas de outras disciplinas. Não por acaso, no atelier do artista, localizado na região da Pampulha, computadores, câmeras e impressoras compartilham espaço com instrumentos de marcenaria e de laboratório, projetores, livros, placas e monitores de áudio, microscópios e componentes eletrônicos. Aspectos formais da arte, como cor e composição, situam-se lado a lado com o domínio de linguagens de programação, eletrônica e práticas acadêmicas e científicas, em relação de experimentação e contaminação permanente. As relações entre linguagens, mídias e disciplinas sempre estiveram presentes nas obras e pesquisas do artista, mas foi a partir dessa época que ganharam protagonismo em sua produção, tornando-se temas centrais de muitos trabalhos posteriores. Daí o conceito Recodificações, que dá nome a esta exposição e busca sublinhar os modos como as obras de Veneroso desconstroem sistemas de códigos convencionais e propõem novos modos de ver e interpretar o mundo.
A exposição se concentra justamente nesse período, com obras desenvolvidas a partir de 2012 e foco na produção mais recente do artista. Os destaques da parcela retrospectiva da mostra são as instalações Gogoame, de 2016, e Tempo: cor, lançada este ano no FILE – Festival Internacional de Linguagem Eletrônica, importante evento de arte e tecnologia que acontece em São Paulo e completou 20 anos nesta edição. Gogoame, nome que em japonês significa chuva à tarde, trata-se de um projeto de net art – desenvolvido para visualização e interação na web – que promove a interseção entre texto e imagem, criando uma chuva de letras onde se formam palavras e frases. Já Tempo: cor, exibida como uma instalação imersiva, aprofunda a pesquisa do artista sobre o tempo e o espaço com o desenvolvimento de um conjunto de relógios cromáticos que convertem horas em cores. Dessa forma, os visitantes podem imergir na representação das horas, experimentando a notação do tempo de modo espacial e sensorial.
Transitando pelas cinco salas que compõem a exposição, é possível apreender os modos como as pesquisas do artista são interligadas e os trabalhos se nutrem mutuamente. Nota-se, ainda, que vertentes da arte e da cultura contemporâneas – como a arte conceitual, a arte política, as instalações e a poesia concreta – são recuperadas e ressignificadas. A exposição é composta por 15 obras, entre as quais somente uma foi exibida anteriormente em Belo Horizonte. Dois trabalhos inéditos ainda serão lançados na mostra, a série de fotografias Contagem binária, desenvolvida em 2015 e finalizada recentemente, e a instalação generativa Estado das coisas, cujo protótipo será mostrado. Contagem binária propõe um modo de se contar de 0 a 31 nos dedos de uma mão, enquanto a instalação inédita Estado das coisas, se utiliza de algoritmos generativos e de análises de redes sociais em tempo real para controlar as rotações de imagens que se comportam como de bússolas descompassadas, em um comentário sobre a situação política e social do mundo na atualidade – do desmatamento na Amazônia brasileira à imigração entre a África e a Europa. Promovendo as relações entre som e imagem, Veneroso se une a Sara Não Tem Nome para a realização da apresentação audiovisual Ruínas, que mescla elementos da produção de vídeos de Veneroso com a prática musical de Sara. A performance acontecerá durante a abertura da exposição, às 20h, e, após o evento, a instalação continuará a funcionar pelo restante do período de visitação da exposição.
Pedro Veneroso é doutorando em Artes, mestre com distinção em Estudos Literários e bacharel em Artes Visuais, todos pela Universidade Federal de Minas Gerais. Ele investiga as interseções entre a arte, a ciência e a tecnologia a partir de perspectivas práticas e teóricas. Atualmente, pesquisa as aplicações dos sistemas complexos e da teoria da redes nas experiências humanas do espaço-tempo em ambientes virtuais e concretos. Entre 2009 e 2012, foi um dos coordenadores e curadores do Marginalia+lab – laboratório de arte e tecnologia sediado em Belo Horizonte. Foi curador e coordenador da exposição Polímatas, que reuniu dezenas de obras transdisciplinares na UFMG em 2019. Foi premiado no 4º Filme em Minas (Belo Horizonte), nomeado para o 8º Prêmio Sergio Motta (São Paulo), finalista do 7º Concurso Transitio_MX (Cidade do México, México) e semifinalista do 12º Prêmio Arte Laguna (Veneza, Itália). Participou de exposições nacionais e internacionais em instituições como MAM Rio e CCJF (Rio de Janeiro), MIS, Red Bull Station e Centro Cultural FIESP (São Paulo), Museu de Arte da Pampulha e Palácio das Artes (Belo Horizonte), El Museo Cultural Santa Fe, Indiana University e Washington University (Estados Unidos), Laboratório Arte Alameda (México), Centro Cultural Galileo e Mini HUB (Espanha), Forum Altice Braga (Portugal), Jingxi Province Museum (China), Monash University (Austrália) e Mains D'Oeuvres (França). Entre 2017 e 2019, foi professor do curso de Cinema de Animação e Artes Digitais na Escola de Belas Artes da UFMG.
Mais informações: Portfolio do artista e Site da exposição