|
agosto 30, 2019
Cadu na Anita Schwartz, Rio de Janeiro
Artista paulistano radicado no Rio, destacado no panorama contemporâneo por sua produção que abrange desenhos, pinturas e esculturas resultantes de longos processos de pesquisa, ocupa os dois andares da Anita Schwartz Galeria mostrando cerca de 30 obras inéditas, em sua primeira individual na galeria
Anita Schwartz Galeria inaugura no próximo dia 4 de setembro de 2019, às 19h, a exposição Fábrica de Ratoeiras Concorde, com perto de 30 trabalhos inéditos, entre desenhos, pinturas, esculturas e duas obras interativas, do artista Cadu, nascido em São Paulo, em 1977, e radicado no Rio de Janeiro. No grande espaço do piso térreo estarão as obras das séries “Fábrica de Ratoeiras Concorde”, e as interativas “Chinese Whispers” e “Pantógrafo”.
A série que dá nome à exposição, “Fábrica de Ratoeiras Concorde” é um conjunto de nove pinturas sobre papel, em tamanhos que variam entre 1,90m x 1,50m e 1,80m x 1,50m. Partindo de dois conceitos distintos, uma ratoeira e o avião Concorde, o artista constrói uma imagem poética, “que leva a uma série de associações, uma relação entre duas criações do engenho humano”. “Uma forma pedestre, um objeto rudimentar de caça para controle de pragas, e a outra uma aeronave, uma desobediência aos deuses, da ambição industrial”, comenta, acrescentando que “os dois cedo ou tarde acabaram ficando obsoletos”. Ele busca criar imagens “que têm a ver tanto com esquemas de distorção de espaço, que sugerem circuitos fechados, gaiolas, grades de onde fica difícil escapar”. “São arapucas visuais, em que se pode ficar preso ou escapar, se for rápido como um Concorde...”. “São diagramas matemáticos de distorção do espaço, dialogam com pinceladas abstratas, em um estranho convívio entre ordem e caos, que ora oferecem volume ao conjunto, ora o planificam”, observa.
Chinese Whispers
Na obra interativa “Chinese Whisper”, ou “sussurro chinês”, a brincadeira popular conhecida entre nós como “telefone sem fio”, o público poderá movimentar um lápis acoplado a um inventivo sistema criado pelo artista que reproduz o gesto feito, o desenho, resultando versões aumentadas, diminuídas ou distorcidas do desenho original. “Tanto é escultura, gesto performático, como partitura de desenho, que usa este lugar que é eleito como a superfície do trabalho, a mesa, para pensar versões, distorções, reduções, ampliações, de imagem e de discurso”, diz.
Pantógrafo
Neste outro trabalho interativo, o “Pantógrafo” consiste em uma mesa de 2m x 2m, em que o público fará um pequeno desenho em um canto, e no lado oposto surgirá uma imagem ampliada em oito vezes. O atrito provocado pela ação da máquina, do bastão com a mesa, “que pode lembrar uma batuta de maestro”, provoca um som, que para o artista é “como se fosse o próprio instrumento musical imprimindo a partitura dele no momento de produção da música”. “Mais uma vez se trata de uma situação híbrida, em que se tem gesto, desenho, escultura, sonoridade, convivendo”, destaca Cadu. A palavra pantógrafo vem do grego pantos, que significa “tudo”, mais graphein, “escrever”, e é um aparelho utilizado para transferire redimensionar figuras, inventado possivelmente pelo astrônomo e jesuíta alemão Christoph Scheiner (1575-1650) em 1603.
SEGUNDO ANDAR
No segundo andar da galeria estarão quatro séries: “Ganga”, “Craca Ganga” (com Virgilio Bahde), “Ágata” e “Walden”.
A série “Ganga”, feita em parceria com o artista e ourives Virgilio Bahde, são dez esculturas em que se explorou o processo de galvanização, em que o metal é submetido a uma solução salina, eletrificada, e se dissolve, migrando por indução para outro lugar. Dez ganchos de metal passaram por demorados procedimentos que levaram meses, e passaram por esse processo, ganhando aglutinações que se assemelham a corais. Cadu lembra que na mitologia grega quando Perseu corta a cabeça da Medusa e a arrasta sobre as águas do mar, surgem os corais, “que são as pedras do mar que vão ornar os cachos das ninfas”. “Aquela que tudo transformava em pedra no seu último gesto produz beleza”, comenta. Há um ano o artista vem se interessando por questões de diluição, indução e coagulação, que são os princípios básicos da alquimia. Derivando de sua conhecida pesquisa sobre a paisagem e a passagem do tempo, o artista passou a explorar características telúricas dos elementos. Ele explica que “ganga” é o nome dado na mineração para as impurezas presentes no metal que se pretende refinar. Sua origem etimológica é matriz africana, e advém do termo “nganga”, que denomina o feiticeiro chefe dos antigos terreiros cabindas. Nas dez esculturas expostas, o público verá a progressiva metamorfose sofrida pelo metal no processo do trabalho.
Cadu lembra que seu sempre tem “um dado de diluição de autoria”. “Com Virgilio Bahde, partilhamos o próprio procedimento, a operação técnica, e o resultado do trabalho. A força vem daí. Em épocas de Medusa, temos que fazer os nossos escudos de Perseu. Arte é isso. É um escudo para a gente não olhar diretamente para o problema, mas para se olhar de lado, nos protegendo, com nossa esfera imunossimbólica, porque o real petrifica”, afirma.
“Craca Ganga”, também em parceria com Virgilio Bahde, é uma série de oito esculturas feitas em madeira, níquel, cobre e incrustação de pedras semipreciosas brutas, como ônix, malaquita, ágata, quartzo fumê e pirita. “É um mimetismo de construção entre algo que é mineral, vegetal, oceânico, marítimo, em um raciocínio mais formal de construção compartilhada, com etapas divididas no processo. No final temos um jardim mineral sobre tronco de árvores que são metalizados”, conta.
“Ágata” é uma série de 14 trabalhos de pintura em óleo sobre chapas de alumínio em tamanhos variados entre 60cm x 60cm e 25cm x 25cm, que recebem aplicação de lâminas de pedras semipreciosas brutas, como ágata, granada, quartzo, zurita e malaquita. As obras intrigam o espectador, por parecerem uma colagem, e não se saber ao certo onde está a pintura, se por baixo ou por cima das pedras. “A pessoa não sabe se foi feito à mão, ou se já estava pronto, e há uma certa relação óleo/água que embaralha o olhar”, diz o artista.
“Walden” é um conjunto de três gravuras relevo sobre papel, formando uma única peça, feitas a partir de páginas do livro “Walden ou A Vida nos Bosques” (1854), autobiografia do escritor transcendentalista Henry David Thoreau (1817-1862). A publicação acompanhou Cadu durante o ano em que residiu, a partir do primeiro dia do inverno de 2012, em uma cabana construída por ele mesmo, na região serrana do Rio de Janeiro. O artista queria recriar nas gravuras os caminhos percorridos pelos cupins, que devoraram as folhas de papel. Para isso, se dedicou a dois anos de pesquisa, para criar um sistema adequado, com um movimento constante para que o ácido criasse nas chapas de cobre as áreas determinadas. “De alguma forma, este trabalho reproduz o processo presente nas outras obras com metal, como também o processo de corrosão que o papel passou quando o cupim comeu, recriando este caminho”, destaca. Nesta obra, o artista trabalhou com o mestre gravador Agustinho Coradello, requisitado por artistas como Beatriz Milhazes, Cildo, Thereza Miranda, entre outros grandes nomes.
SOBRE O ARTISTA
Cadu (1977, São Paulo) é artista plástico, professor da PUCRio e da Escola de Artes Visuais do Parque Lage. A prática artística de Cadu lida com a criação de sistemas, máquinas, instalações, pinturas, desenhos e esculturas que incorporam elementos da natureza para impulsionar as barreiras da relação entre o homem e a paisagem. Esses sistemas também são utilizados para explorar a arte sonora. O artista recebeu a Bolsa Iberê Camargo, que lhe concedeu um programa de residência em 2001 no London Print Studio. Em 2008, foi artista visitante na Universidade de Plymouth, a convite do Arts Council (Reino Unido). Cadu foi finalista do Prêmio Marcantonio Vilaça em 2011. Foi indicado ao PIPA em 2010, 2011, 2012 e venceu a edição de 2013. Vive e trabalha no Rio.
Artista ativo na cena contemporânea nacional e internacional desde 2000, Cadu participou de muitas exposições no Brasil e no exterior. Exemplos são as individuais no Museo Jumex, na Cidade do México (2017), e na Galeria BWA SOKÓŁ, em Nowy Sącz, Polônia (2015); em Lima e Lisboa (2012); e Santiago do Chile (2010), entre outras. Integrou diversas bienais, como a Anozero 19 – Bienal de Arte Contemporânea de Coimbra (2019), 4ª Bienal do Fim do Mundo, em Mar del Plata, Argentina (2014), 13ª Bienal de Istambul, Istambul (2013), a 30ª Bienal de São Paulo (2012), a 7ª Bienal do Mercosul, em Porto Alegre, e a 27ª Bienal de São Paulo (2006), em colaboração no trabalho de Mabe Bethônico.
Recentes exposições coletivas destacadas são “Movilizando afectos: Coparticipación e inserción local, tres proyectos artísticos”, no Museu Amparo, em Puebla, México, “Projeto Cavalo – Quadrivium” no Instituto Tomie Ohtake e “Matriz do Tempo Real”, no MAC USP, São Paulo, em 2018; 35º Panorama da Arte Brasileira: Brasil por multiplicação – Museu de Arte Moderna de São Paulo, em 2017; “Wind Line – Pionner Works”, Nova York, em 2014; “Amor e ódio a Lygia Clark”, na Zacheta National Gallery, em Varsóvia, Polônia e IV Annual Hybrid Art, no Manage Exhibition Space, em Moscou, em 2013; “After Utopia”, no Museo Centro Pecci, Prato, Itália, em 2009; “Estratégia”, no Plymouth Art Centre, Inglaterra, “Paper Trail: 15 Brazilian Artists”, Allsopp Contemporary, Londres, “Champs D’expériences – L’artcomme expérience – Le 10neuf”, no Centre Régional D’art Contemporain, Montbéliard, França, em 2008, entre muitas outras. Ao longo dos anos participou de muitas mostras no Instituto Tomie Ohtake e Instituto Itaú Cultural, em São Paulo, e na Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre.
No Rio de Janeiro, sua última individual foi “Entardecer no Ano do Coelho”, em 2011, na Casa de Cultural Laura Alvin. Em 2013, integrou a mostra de finalistas do PIPA, no MAM Rio, em que foi o vencedor da categoria principal. Entre outras coletivas na cidade, participou em 2015 de “Silêncio Impuro”, na Galeria Anita Schwartz, “Singularidades/Anotações: Rumos Artes Visuais”, no Paço Imperial, “Ocupação Mauá – Cais do Porto”; em 2008, de “Nova Arte Nova”, no CCBB; em 2006 de “Linguagens Visuais 10 Anos”, no Centro de Arte Hélio Oiticica, e de diversas edições do projeto “Multiplicidades, no Oi Futuro.
De 2015 a 2017 foi artista em residência pela Fundação InSite (México) e realizou residência artística com o projeto Plataforma Atacama. Em 2017 foi artista comissionado pela National Endowment for the Arts, Robert Wood Johnson Foundation e XLab IDEAS para trabalho em Natchez (Mississipi, EUA). Em 2018, artista comissionado pela HaundenschildGarage (San Diego, EUA) para execução de projeto na sede da fundação e para residência artística com a Secretaria de Educação do Município do Rio de Janeiro, através de parceria com o Instituto República.
É professor pesquisador da PUCRio no Departamento de Artes e Design e do projeto Escola Sem Sítio, em parceria com o Paço Imperial e a Vila Aymoré. Lecionou no Instituto de Artes da UERJ e na Escola Artes Visuais do Parque Lage.
Suas obras estão nas coleções Middlesborough Institute of Modern Art [MIMA], na Inglaterra, no Museu de Arte do Rio [MAR], na Coleção Gilberto Chateaubriand/MAM Rio e no Museu de Arte contemporânea de Atenas.