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agosto 19, 2019

Anna Maria Maiolino expõe vídeos no Masp, São Paulo

MASP faz retrospectiva em vídeo de Anna Maria Maiolino: Museu expõe nove vídeos da artista, um dos principais nomes da cena contemporânea brasileira

Um dos nomes mais importantes da cena contemporânea brasileira, a artista multimídia Anna Maria Maiolino (Scalea, Itália, 1942 - vive em São Paulo) ganha uma retrospectiva de sua obra no MASP. A Sala de Vídeo: Anna Maria Maiolino, com nove trabalhos da artista, abre ao público no dia 23 de agosto, ao lado das coletivas Histórias das mulheres e Histórias feministas, ligadas ao eixo curatorial que pauta a programação do museu neste ano, Histórias das mulheres, histórias feministas.

Com curadoria de Horrana de Kássia Santoz, assistente curatorial do MASP, a mostra apresenta os nove títulos selecionados em três telas: duas laterais, com trabalhos dos anos 1970-1980, e uma central, com trabalhos dos anos 2000, criando uma espiral de acontecimentos. Os trabalhos dos anos 1970 têm em comum o Super 8, formato adotado por diversos artistas da época, porque, além de permitir maior experimentação, cria diálogos com o cinema e a fotografia, entre outras linguagens. “Eu fiz uso do Super-8 porque tinha necessidade de experimentar”, diz a artista Anna Maria Maiolino.

Os vídeos dos anos 1970 também têm em comum a ditadura militar como pano de fundo. A repressão, o silenciamento, a tensão, bem como o conflito e o clima de guerra -- que Anna Maria viveu na infância, na Itália -- perpassam a obra da artista. Em In-Out (Antropofagia), o primeiro filme da mostra, uma câmera focaliza duas bocas alternadamente. O vídeo, feito entre 1973 e 1974, inicia com uma boca tapada como um gesto de censura. Em X (1974), um olho coberto com renda preta ocupa toda a tela. Em outro recorte, veem-se tesouras e gotas de sangue pelo chão branco.

Outros vídeos, como Um tempo (uma vez), feito entre 2009 e 2012, e Aos quatro ventos, produzido entre 2001 e 2011, revelam outra característica da criação da artista: o peso maior dado ao processo do que à obra em si. Maiolino não tem pressa de terminar um vídeo, pode levar anos para concluir um trabalho. ”Posso começar um vídeo e pausar o trabalho, à espera de algo. A arte é, para mim, um meio de obter autoconhecimento”, conta a artista, que por vezes trabalha a partir de escritos poéticos de próprio punho.

Para a curadora da mostra, é notável como a palavra, o tempo e o silêncio se tornaram matéria-prima para Maiolino. “Boa parte dos filmes e vídeos recorrem ao enquadramento em close up de partes do corpo, como as mãos, os olhos, a boca, que enfatizam a narrativa política e histórica, reforçado por um elaborado trabalho de edição, seus cortes, montagens e trilhas”, diz Horrana de Kássia Santoz.

Trajetória da artista

Filha de pai italiano e mãe equatoriana, Anna Maria Maiolino nasceu em 20 de maio de 1942, em Scalea, Calábria, na Itália. Caçula entre dez filhos, Maiolino sempre foi um corpo em movimento. Em 1943, sua família se refugiou no interior do país fugindo dos bombardeamentos em Scalea, durante a Segunda Guerra Mundial. Duas bombas atingiram a casa dos Maiolino. Em 1954, a família emigrou para a Venezuela devido à escassez do pós-guerra. Entre 1958 e 1960, Maiolino passou a estudar no curso de Arte Pura, na Escola Nacional Cristóbal Rojas, em Caracas.

Aos 18 anos, chegou ao Brasil e se instalou no Rio, onde começou a fazer cursos livres de pintura e xilogravura na Escola Nacional de Belas Artes. Foi aluna de Adir Botelho e assistente do ilustrador e desenhista Oswaldo Goeldi. Participou da Nova Figuração, movimento de reação à abstração e tomada de posição frente à ditadura militar que se impunha no Brasil. Na mesma época, Maiolino conheceu Rubens Gerchman, com quem se casou em 1963 e teve dois filhos: Micael e Verônica.

Para artista, a década de 1970 foi significativa à experimentação e à utilização de diversas mídias como a poesia escrita, a utilização de filmes Super 8 — suporte de filmagem utilizado em alguns dos filmes apresentados no MASP —, performance e fotografia; além de continuar a utilizar o desenho, a pintura e a escultura como recursos para o seu ofício.

“Eu me esforçava para realizar meu trabalho de arte, ser esposa, mãe e cidadã. Percebia que me encontrava num momento rico da arte brasileira, apesar da sombra obscura da ditadura, que se anunciava”, conta.

Histórias das mulheres, histórias feministas

Todos os anos, a programação do MASP é guiada por um eixo temático pensado em torno de histórias, elaboradas a partir de diferentes perspectivas, incluindo narrativas reais, ficcionais, pessoais e documentais, vários suportes e distintas temporalidades e territórios — em 2016, foram as Histórias da infância, em 2017 as Histórias da sexualidade e em 2018, as Histórias afro-atlânticas. As histórias inauguram sempre uma grande coletiva e também pautam exposições individuais, oficinas, seminários, cursos e palestras ao longo do ano. Em 2019, o eixo Histórias das mulheres, histórias feministas destaca a produção de mulheres artistas, de diferentes nacionalidades, gerações e origens, com o objetivo de promover discussões sobre feminismos e representatividade nas artes.

SINOPSES DOS VÍDEOS
(pela ordem de exibição na sala)

In-Out (Antropofagia), 1973-74, 8’17”, Super 8, transcrito em vídeo em 2000
Roteiro, direção e montagem: Anna Maria Maiolino
Música: Laura Clayton
Fotografia: Sigmund Zehr (18 imagens por segundo, colorido)
Participação especial: João Eduardo Osório

A câmara focaliza alternadamente a boca de um homem e a de uma mulher, em um diálogo/não diálogo. O filme não possui história linear. Muda a mensagem, e a cor dos lábios. Figuram signos: o fio, os dentes, a boca tapada com esparadrapo, a impossibilidade da fala, a censura. O último suspiro.

X, 1974, 3’06”, Super 8, transcrito em vídeo em 2000
Roteiro, direção e montagem: Anna Maria Maiolino
Música: Vania Dantas Leite
Fotografia: Max Nauenberg (18 imagens por segundo, colorido)

A câmera focaliza um olho, que ocupa toda a tela. A câmera parada, fora da cena, é o outro olho, que observa desde fora. O outro elemento é o perigo — a tesoura cortante — e os traços de sangue.

Um Tempo (uma vez), 2009/2012, 7’34”, filmado em câmera digital
Música: Anna Maria Maiolino e Mateus Pires
Fotografia: Anna Maria Maiolino
Edição: Anna Maria Maiolino e Rafael Costa
Participação especial: Gabriel Gerchman, Verônica Gerchman e João Araújo

O interior de um carro em uma viagem por carreteiras.

Y, 1974, 2’23”, Super 8, transcrito em vídeo em 2000
Roteiro, direção e montagem: Anna Maria Maiolino
Música: Vânia Dantas Leite
Fotografia: Max Nauenberg (18 imagens por segundo, preto e branco)

Um grito e os olhos vendados de uma personagem se sucedem a espaços negros no tempo. Registro do momento presente, a repressão militar.

Um dia, 1976/2015, 4’, Super 8, transcrito e editado em 2015
Fotografia: Mônica Barbosa
Som e edição: Anna Maria Maiolino e Mateus Pires

Registro realizado em visita à Quinta da Boavista, no Rio, antiga fazenda particular, depois residência imperial e hoje sede do Museu Nacional e do zoológico da cidade. Ao seu lado, fica a caserna de um batalhão do Exército. Sons obtidos por pios artesanais de Tânia Piffer compõem a trilha.

09, da série LOG (Apresentações), 2013, 6’54”, vídeo digital
Roteiro, direção e fotografia: Anna Maria Maiolino
Edição: Anna Maria Maiolino e Mateus Pires

A série reúne autorretratos sonoros ou autodocumentários sobre experiências de vida. A voz da artista é o espelho da memória de realidades e fantasias. A narrativa tem linguagem híbrida, devido às sobreposições de fatos e emoções. A série de obras é uma e é múltipla, parte de um projeto maior de instalação visual e sonora, Sine Die [Sem Data], iniciado em 2003 e nunca exposto na totalidade.

+ - = - (mais menos: igual a menos), 1976, 3’23”, Super 8, transcrito em vídeo em 2000
Roteiro, direção e montagem: Anna Maria Maiolino
Fotografia: Maria do Carmo Secco (18 imagens por segundo, preto e branco)
Participação Especial: Paulo Herkenhoff e Bruno Tauz

Dois jogadores disputam uma partida de ovos sobre uma mesa. Os ovos rolam pelos campos adversários sob o risco de cair e quebrar. O filme não aponta o vencedor.

Ad Hoc, 1982/2000, 3’41”, sonorizado e transcrito em vídeo em 2000
Roteiro e direção: Anna Maria Maiolino
Música: Paulo Humberto Moreira
Fotografia: Regina Vater
Participação Especial: Paulo Bruscky

Ad Hoc; a propósito em latim. As mãos, sem o corpo do homem, aparecem sobre o fundo preto da blusa. A trilha traz trechos da obra de Antonin Artaud, ainda atuais por nossos problemas sociais.

Aos Quatro Ventos, 2001/2011, 4’32”, filmado em H8 e transcrito em digital em 2001
Argumento, edição e fotografia: Anna Maria Maiolino
Atriz: Marilena Bibas
Voz: Verônica Gerchman

O personagem principal e motivador dessa obra é uma mulher que caminha no parque do Aterro do Flamengo no Rio de Janeiro e fala com um personagem invisível.

Posted by Patricia Canetti at 2:16 PM