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agosto 13, 2019
Adrianna Eu na Luciana Caravello, Rio de Janeiro
Artista criará uma grande sala de costura, que será usada como metáfora para falar sobre a construção da identidade de cada um e sobre lugar de pertencimento
A artista carioca Adrianna Eu transformará o térreo da Luciana Caravello Arte Contemporânea, em Ipanema, em uma grande sala de costura. Trata-se da exposição Costura-se para dentro, que será inaugurada no dia 15 de agosto, com cerca de 25 obras inéditas, produzidas este ano, que giram em torno da construção da identidade de cada um e do desejo de pertencimento. A artista relaciona a construção da veste com a construção de si e do seu lugar no mundo, pensando o desvio e a diferença. A mostra será acompanhada de um texto do crítico de arte Douglas de Freitas.
Para criar seus trabalhos, Adrianna Eu constantemente usa os objetos da costura, desviados de sua função original, para falar de afetos. E foram recentes encontros com a artista e travesti Agrippina R. Manhattan e com a cantora negra e não-binário (não é exclusivamente homem ou mulher, estando fora do binário de gênero) Majur que a levaram a pensar “na força de tudo aquilo que precisa negar as regras para simplesmente ser o que é”.
Utilizando elementos da costura, a artista vai construindo suas obras e tocando em questões que deseja ressaltar. Ela utiliza mapas de moldes de roupas, linhas, botões, tesouras, pedaços de tecidos e rendas, entre outros. Dentre os trabalhos apresentados estará uma grande instalação composta por seis milhões de metros de linha vermelha emaranhados no chão. Sobre ele, estará uma mesa com uma máquina de costura voltada para a parede. A instalação remete à imagem da linha que eventualmente embola na máquina de costura e precisa ser cortada e descartada. “A ideia de descarte, do que não deu certo, do que não seguiu em linha reta, é o que me interessa”, afirma.
Em muitas obras, a artista insere palavras – escritas ou bordadas – como é o caso do trabalho que traz um pedaço de viés rosa junto a um bordado onde se lê a frase: “a vida não é um mar de rosas”. Outro trabalho traz uma tesoura de costura cuja lâmina está envolta por linhas vermelhas, imobilizando o ato de cortar, criando uma inversão de força e de poder. A obra “Latifúndio” traz uma grande “casa” de botão, com um único pequeno botão ao lado. Já “O grande tabuleiro” é formado por botões de várias cores, como pretos, marrons e beges. Há somente um branco no meio deles. “É uma obra que fala sobre lugar de poder e sobre privilégio”, afirma a artista.
Adrianna Eu garimpa muitas peças de seu trabalho em feiras de antiguidade e muitas delas vêm carregadas de histórias. Uma das obras traz botões onde estão presos restos de linhas, que já estavam ali quando foram adquiridos pela artista. Ela se utiliza desses rastros para falar do quanto tudo aquilo que abandonamos, ou deixamos de ser, de alguma forma nos ajuda a compor o novo.
Completa a exposição o vídeo “A costura de si” (2005), em que a artista costura os próprios dedos da mão, ao som de uma música de Tom Zé. Esse é o único trabalho não inédito da exposição, mas que será apresentado de forma inédita, através de uma videoinstalação, composta por um monitor, um biombo e um banco com lugar para uma única pessoa assistir ao vídeo de cada vez. Para a artista, era fundamental que esta obra estivesse na exposição, pois ela se relaciona com todas as demais. “O vídeo é um dos meus primeiros trabalhos e fala da construção, desconstrução e eterna reconstrução de quem se é”, diz. Esse trabalho é marcante na trajetória de Adrianna Eu e foi visto pela artista Louise Bourgeois (Paris, 1911 - Nova York, 2010), com quem Adrianna encontrou por duas vezes e cujo encontro e descoberta de sua obra foram muito marcantes para a trajetória da artista.
SOBRE A ARTISTA
Adrianna Eu (Rio de Janeiro, 1972. Vive e trabalha no Rio de Janeiro) é formada pela Escola de Artes Visuais EAV – Parque Lage (RJ) onde frequentou cursos de Malu Fatorelli, entre 2003 e 2006; e em Filosofia, com Auterives Maciel, no Museu da Republica, entre 2003 e 2007. Desde 2010 frequenta o Grupo Alice de Estudos e Projetos, coordenado por Brígida Baltar e Pedro Varela.
Como nome artístico adotou “Adrianna eu” (nome que a representaria), pensando nisso como um nome-trabalho. Tendo como um de seus temas as relações das pessoas com a própria identidade, foi tomada por um desejo de ter no seu próprio nome uma “provocação” que já considera como um trabalho inicial. Adrianna Eu é um nome-trabalho que pretende provocar no outro um sentimento de reflexão. Com a intenção de gerar um estranhamento e levantar as questões dos limites do próprio eu, para cada lugar que a artista viaja, o pronome “eu”, por não se tratar de um sobrenome, é traduzido para a língua local, possibilitando assim que o processo de estranhamento intencionado se construa.
Dentre suas principais exposições individuais estão: “O mergulho de Narciso” (2015), na Luciana Caravello Arte Contemporânea; “O mais profundo pensamento é um coração batendo” (2014), na Casa Porto, no Rio de Janeiro; “Trabalhos recentes” (2005), no Paço Imperial, no Rio de Janeiro, entre outras.
Dentre suas exposições coletivas, destacam-se: “Lacunas preenchidas – As 7 Cornellys” (2019), na Villa Aymoré, no Rio de Janeiro; “De sangue e ossos” (2018), “Transformação” (2018), na Casa Firjan, no Rio de Janeiro; “Manjar: amar em liberdade” (2018), no Solar dos Abacaxis, no Rio de Janeiro; Trio Bienal (2017), no Rio de Janeiro; “Aquilo que nos une” (2017), na Caixa Cultural, em São Paulo; “In Memoriam”, na Caixa Cultural, Rio de Janeiro; “Aquilo que nos une” (2016), na Caixa Cultural, Rio de Janeiro.