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março 10, 2019
Ecos do Atlântico Sul no Pivô, São Paulo
Em parceria com o Pivô, o Goethe-Institut apresenta a coletiva Ecos do Atlântico Sul com a participação dos artistas Akinbode Akinbiyi, Ana Hupe, Anita Ekman, Antonio Társis, Ayrson Heráclito, Camila Sposati, Carol Barreto, Cássio Bomfim, Emeka Ogboh, Falke Pisano, Isaac Julien, Jonathan Dotse, Jota Mombaça, Sarojini Lewis, Tatewaki Nio, Yolanda Chois e curadoria de Ines Linke e Uriel Bezerra. A exposição é parte do programa Pivô Recebe, em que projetos concebidos previamente por artistas, curadores ou produtores culturais são co-produzidos e acolhidos nos espaços do Pivô.
Em sua segunda itinerância, a exposição coletiva que originalmente integrou a programação da conferência homônima organizada pelo Goethe-Institut em Salvador (2018), e, posteriormente o Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica, no Rio de Janeiro (2018), reúne vídeos, fotografias, esculturas sonoras, cartazes, objetos, e performances de um grupo internacional de 16 artistas que, por meio de seus trabalhos, comentam as relações complexas entre os países e as comunidades que compõem o Atlântico Sul. Cada artista criou uma espécie de "história alternativa" que desafia a historiografia oficial da região, examinando trocas, investigando relações, diluindo localizações geográficas e destacando suas ressonâncias no tempo presente. As perspectivas individuais, implícitas em imagens, sonoridades, documentos, vestígios, instrumentos e peças, ecoam as narrativas coloniais e pós-coloniais, as diásporas, migrações globais e processos transculturais.
Akinbode Akinbiyi (1946) participa com uma série de seis imagens do trabalho Passageways, Involuntary Narratives and the Sound of Crowded Spaces (2015-2017) exibido pela primeira vez em 2017 na Documenta 14 em Atenas e Kassel. A sequência de imagens produzidas em Kassel, Lagos e Osogbo é exibida em uma grade com a qual o artista cria uma cadência visual, concebida especificamente para esta exposição.
A artista Ana Hupe (1983), parte de uma ampla pesquisa sobre racismo, feminismo e migração. A artista espelha fragmentos da história de Romana da Conceição, que se muda de Salvador a Lagos em 1900, e Okwei Odili, que se muda de Lagos a Salvador, em 2018.
À Flor da Terra é uma continuidade da performance Tupi Valongo. Cemitério dos Pretos Novos e Velhos Índios, realizada pela artista Anita Ekman (1985) em Salvador, na conferência Ecos do atlântico Sul (Goethe Institut Salvador). A nova performance conta com a participação do Grupo Dyroa Báya e Anani Sanouvi. Através de rituais fúnebres africanos e indígenas, a artista propõe um olhar para o protagonismo histórico feminino, a partir do maior cemitério de africanos fora da África: o sítio arqueológico do Cemitério dos Pretos Novos no Rio de Janeiro.
Trabuco (2015) é um trabalho realizado por Antônio Társis (1995) que discute a violência praticada contra corpos negros. O artista coleciona e transforma vestígios dos conflitos armados que atestam a repressão histórica e cotidiana da polícia e do Estado.
Ayrson Heráclito (1968) participa com o vídeo díptico O Sacudimento: a reunião das Margens Atlânticas (2015), exibido na 57ª Bienal de Veneza em 2017. Neste trabalho, o artista exibe duas gravações de rituais de limpeza dos espíritos oriundos do período da escravidão realizadas em ações performáticas na Maison des Esclaves, na ilha de Gorée, Senegal e na Casa da Torre de Garcia d'Ávila, em Mata de São João, Bahia.
Camila Sposati (1972) e Falke Pisano deslocam questões de música, dança, história e arqueologia para o universo da arte. Elas revelam olhares sobre imagens coloniais e mostram como instrumentos e tradições musicais presentes em gravuras afetam nossas relações e ações atuais.
Carol Barreto participa com a obra Coleção Asè (2016), que investiga a relação entre moda e ancestralidade negra-feminina. O trabalho, apresentado inicialmente como performance colaborativa, que nasce da rica tradição têxtil do Nordeste, é empregado como ferramenta de luta antirracista.
A partir das experiências com a obra Salve Exú Motoboy (2016-2018), que envolve moda, fotografia, vídeos e performance de rua onde a figura contemporânea do motoboy é cruzada com os arquétipos de religiões de matrizes africanas, Cássio Bomfim (1984) propõe uma performance participativa com o acervo de sua coleção em que apresenta as possibilidades de “incorporação imagética”.
Na instalação sonora Lugares Comerciais (2016), Emeka Ogboh (1977) combina gravações de sons capturados em diferentes mercados dentro e nos arredores de Lagos, importando a soundscape da vibrante metrópole africana, capital econômica, comercial e cultural da Nigéria para a Bahia. Na Praça do Cacau, estes sons se transformam em um concerto ao ar livre, permeando e cruzando as sonoridades da cidade de São Paulo.
Isaac Julien (1960) cria uma linguagem visual que dialoga com elementos documentais do cinema. Em “Territories”, ele explora as relações de gênero, raça e sexualidade que atravessam o cotidiano do negro na Grã-Bretanha dos anos 1980.
Jonathan Dotse (1988), artista AfroCyberPunk, apresenta Pandora (2015-2018), um curta-metragem experimental apresentado em 360 graus e gravado em Accra, Tema e Aburi em Gana. O antigo mito grego de Pandora é re-imaginado em um contexto africano e recontado através das possibilidades da realidade virtual. A narrativa nos leva a um passeio que desloca tempos e lugares, levantando questões sobre o uso e acesso às tecnologias.
Jota Mombaça (1991) trabalha com práticas performáticas que abordam questões de violência, resiliência, necropolítica, entre outras. A peça exposta resulta de uma performance realizada em Salvador que consiste numa ação duracional, na qual manufatura as facas artesanais.
Sarojini Lewis (1984) apresenta o vídeo Procurando Madame Jeanette (2018), inspirado na pimenta Madame Jeanette, comumente consumida no Caribe, cujo nome foi dado a partir da fama de uma famosa prostituta brasileira. Poderia Madame Jeanette ter emigrado de Salvador para o Caribe quando do início do trabalho escravo na Bahia?
Tatewaki Nio (1971) apresenta uma seleçāo de quatro fotografias de uma nova série intitulada As Pegadas dos Retornados (2017), produzida em Lagos, Nigéria. Nela, o artista investe um olhar sobre edificações como igrejas, conjuntos habitacionais e prédios comerciais da cidade, cuja autoria é de ex-escravizados do Brasil colonial que retornaram a Lagos.
Yolanda Chois (1987) trabalha com redes de comunicação e visualidades alternativas. Sua pesquisa, realizada em rede interinstitucional no Sul global, lida com o contexto de migração contemporânea e os efeitos das narrativas coloniais. A série de cartazes intitulados Cayendo a la Periferia/ Dinámicas de la Migración (2018) foi criada a partir de conversas com seus colaboradores.
Os trabalhos que integram a exposição, cada um a sua maneira, participam do processo da (des/re)construção de histórias capazes de transformar nossa percepção acerca dos desenvolvimentos sociais, políticos, econômicos e culturais da região do Atlântico Sul, contribuindo para a revisão das dicotomias presentes nas narrativas históricas oficiais, para a democratização e a para os esforços de descolonização das relações entre as nações do Atlântico Sul.