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setembro 4, 2018
33ª Bienal de São Paulo - Afinidades afetivas
Sob o título Afinidades afetivas, 33ª Bienal abre em 7 de setembro e privilegia questões sobre a atenção, a experiência do público e dos artistas participantes
Modelo alternativo ao de temática única traz doze projetos individuais selecionados pelo curador-geral Gabriel Pérez-Barreiro e sete mostras coletivas organizadas por artistas-curadores convidados
De 7 de setembro a 9 de dezembro de 2018, a 33ª Bienal de São Paulo – Afinidades afetivas vai privilegiar a experiência individual do espectador. O título escolhido pelo curador-geral Gabriel Pérez-Barreiro – apontado pela Fundação Bienal de São Paulo para conceber a mostra – remete ao romance de Johann Wolfgang von Goethe Afinidades eletivas (1809) e à tese “Da natureza afetiva da forma na obra de arte” (1949), de Mário Pedrosa. (ler texto curatorial)
O título não pretende direcionar a exposição tematicamente, mas caracteriza sua organização a partir de afinidades artísticas e culturais entre os envolvidos. Presença e atenção são as premissas dessa edição, numa reação a um mundo de verdades prontas, no qual a fragmentação da informação e a dificuldade de concentração levam à alienação e à passividade.
Para esta edição, ao lado dos doze projetos individuais eleitos por Pérez-Barreiro, o curador-geral convidou sete artistas-curadores para conceber mostras coletivas com total liberdade na escolha dos artistas e seleção das obras – a única estipulação foi que incluíssem trabalhos de sua própria autoria.
Proposições curatoriais concebidas pelos artistas-curadores
Alejandro Cesarco | Aos nossos pais
A partir de seu interesse em questões como repetição, narrativa e tradução, Alejandro Cesarco (Uruguai/EUA, 1975) realiza Aos nossos pais, que “propõe questionamentos acerca de como o passado (a história) ao mesmo tempo possibilita e frustra potencialidades e de como ele pode ser reescrito pelo trabalho do artista, gerador de diferenças a partir de repetições”, explica. Além de Cesarco, participam da mostra artistas de três diferentes gerações, entre os quais Sturtevant (EUA, 1924 – França, 2014), Louise Lawler (EUA, 1947) e Cameron Rowland (EUA, 1988).
Antonio Ballester Moreno | sentido/comum
Antonio Ballester Moreno (Espanha, 1977) aborda sua curadoria na 33ª Bienal como forma de contextualizar um universo baseado na relação íntima entre biologia e cultura, com referências à história da abstração e sua interação com natureza, pedagogia e espiritualidade. Dentre os participantes, encontram-se o filósofo e pedagogo Friedrich Fröbel (Alemanha, 1782-1852) e Rafael Sánchez-Mateos Paniagua (Espanha, 1979), que contribuiu também com a publicação educativa Convite à atenção.
Claudia Fontes | O pássaro lento
Para sua exposição intitulada O pássaro lento, Claudia Fontes (Argentina, 1964) parte de um livro fictício homônimo cujo conteúdo é desconhecido. Fontes e os artistas convidados apresentam trabalhos que ativam as aproximações entre artes visuais, literatura e tradução através de experiências que propõem uma temporalidade expandida. Todos os participantes, à exceção de Roderick Hietbrink, desenvolvem obras comissionadas.
Mamma Andersson | Stargazer II
Para sua exposição, Stargazer II, Mamma Andersson (Suécia, 1962) reúne um grupo de artistas que inspiram sua produção como pintora. “Estou interessada em artistas que trabalham com a melancolia e a introspecção como um modo de vida e uma forma de sobrevivência”, afirma Andersson. A seleção inclui Henry Darger (EUA, 1892-1973) e Dick Bengtsson (Suécia, 19361989); e artistas contemporâneos como a cineasta Gunvor Nelson (Suécia, 1931) e Åke Hodell (Suécia, 1919-2000), entre outros.
Sofia Borges | A infinita história das coisas ou o fim da tragédia do um
A curadoria de Sofia Borges (Brasil, 1984), A infinita história das coisas ou o fim da tragédia do um, parte de uma leitura sobre a tragédia para investigar os limites da representação e da impossibilidade da linguagem enquanto instrumento de mediação do real. Em seu projeto expositivo, a seleção de obras específicas é acompanhada por trabalhos comissionados. Uma das particularidades da proposta é sua ativação por um programa de experimentações ao longo da Bienal, realizados por artistas convidados que podem ou não ter obras permanentemente instaladas na exposição.
Waltercio Caldas | Os aparecimentos
Waltercio Caldas (Brasil, 1946) projeta um espaço em que obras de artistas de períodos variados são confrontadas com trabalhos de sua autoria. “Visto que a produção de um artista trata de inúmeras questões que variam ao longo do tempo, escolhi obras que desviam do que mais se conhece de cada um deles e se destacam por seu valor e especificidade.” A partir de uma visão desafiadora do artista sobre sua própria obra e de enfrentamentos muitas vezes inusitados — como entre trabalhos de Victor Hugo (França, 1802-1885), Jorge Oteiza (Espanha, 1908-2003) e Vicente do Rego Monteiro (Brasil, 1899-1970) — abrem-se novas possibilidades de leitura.
Wura-Natasha Ogunji | sempre, nunca
Para seu projeto expositivo, composto exclusivamente por obras comissionadas, Wura-Natasha Ogunji (EUA/Nigéria, 1970) convidou cinco artistas de diferentes origens e nacionalidades para criar, assim como ela, novos trabalhos em um processo curatorial colaborativo e horizontal. “Suas investigações criativas abrangem do íntimo (corpo, memória, gesto) ao épico (história, país, cosmos)”, explica Ogunji. Em sempre/nunca, as seis artistas apresentam novos trabalhos que exploram o espaço e o lugar em relação ao corpo, à história e à arquitetura. “Desenvolvidos em um diálogo aberto entre artistas, seus projetos individuais e práticas entrecruzam ideias e questões sobre coragem, liberdade e experimentação, aspectos centrais do processo artístico”, complementa.
Doze projetos individuais selecionados por Gabriel Pérez-Barreiro
Entre os doze projetos individuais escolhidos pelo curador-geral, três deles são homenagens póstumas a Aníbal López (1964-2014, Guatemala), Feliciano Centurión (Paraguai, 1962 – Argentina, 1996) e Lucia Nogueira (Brasil, 1950 – Reino Unido, 1998). “Eu queria artistas que fossem históricos, mas ao mesmo tempo não consagrados. Trazê-los à Bienal é uma forma de resgatá-los do desaparecimento da história da arte e mostrá-los para as novas gerações”, diz Pérez-Barreiro. Para o curador, a realização dessas exposições também significa uma contribuição expressiva da Fundação Bienal na pesquisa, catalogação e recuperação desses acervos.
Aníbal López, também conhecido por A-1 53167, o número de sua cédula de identidade, foi um dos precursores da performance em seu país. Sua obra, que inclui vídeo, performance, live act e intervenções urbanas, entre outras formas de expressão, tem forte caráter político e se volta para questões de disputas entre fronteiras nacionais, culturas indígenas, abusos militares e até do mercado de arte. Compõem a mostra registros em vídeo e fotografias de ações efêmeras, realizadas como forma de protesto à objetificação e fetichização da arte.
O universo queer é abordado com delicadeza por Feliciano Centurión, que deixou seu país natal, o Paraguai, para radicar-se na Argentina, onde se tornou expoente da chamada geração “Rojas” (primeiros artistas a expor na galeria do Centro Cultural Rector Ricardo Rojas, da Universidad de Buenos Aires) até ser vitimado por complicações decorrentes da AIDS, aos 34 anos. Descendente de uma família de bordadeiras, o artista se apropria de práticas artesanais como linguagem para expressar elementos de sua história pessoal.
Ainda pouco conhecida no Brasil, a goiana Lucia Nogueira é uma figura essencial para compreender a arte britânica de seu tempo e desenvolveu uma carreira internacionalmente reconhecida. Suas esculturas e instalações, foco da individual incluída na 33ª Bienal, subvertem o utilitarismo de objetos com um humor sutil, tanto pela associação inusitada entre elementos quanto pelo jogo semântico constantemente presente em seus títulos, criando uma atmosfera de estranheza e poesia.
Projetos individuais de outros nove artistas, dos quais oito foram especialmente comissionados, completam a seleção de Pérez-Barreiro. Do grupo, o único a exibir um corpo de trabalho histórico é Siron Franco (Goiás Velho, Brasil, 1950), com a série de pinturas Césio/Rua 57. Nela, Franco eterniza a impressão de horror e isolamento causada pelo acidente radioativo acontecido em 1987 no Bairro Popular, em Goiânia, com o elemento Césio 137.
Os oito artistas com projetos comissionados têm em comum o desenvolvimento de trabalhos que não se encaixam numa estrutura temática. “São pesquisas complexas que funcionam individualmente e não precisam de um contexto adicional para que o espectador se relacione com os trabalhos”, explica Pérez-Barreiro.
O portenho Alejandro Corujeira (Argentina, 1961) possui uma concepção formal leve e fluida, que parece querer captar o movimento da natureza. Ele terá esculturas e pinturas apresentadas na mostra. Denise Milan (Brasil, 1954) cria esculturas e instalações com grandes pedras e cristais. Na 33ª Bienal, a artista exibirá uma grande instalação inédita a partir desses elementos.
O cotidiano serve de inspiração às obras de Maria Laet (Brasil, 1982), que exibirá um novo vídeo na 33 a Bienal, e de Vânia Mignone (Brasil, 1967), que trará pinturas inéditas que ressoam o aspecto lírico da música popular brasileira. Nelson Felix (Brasil, 1954) mostrará uma nova obra composta de três momentos. Os dois primeiros (ausentes no espaço expositivo da Bienal) são uma ação física no continente americano que catalisa o projeto e uma peça subsequente que sintetiza o trabalho como um todo, situada em um espaço público na cidade de São Paulo. O terceiro momento, exibido no Pavilhão da Bienal, compreende uma série de esculturas concebidas pelo artista como uma canção para o projeto.
As pesquisas de Bruno Moreschi (Brasil, 1982) e Luiza Crosman (Brasil, 1987) se relacionam com a corrente da crítica institucional e fogem de suportes artísticos tradicionais. “Com esses artistas teremos, dentro da exposição, um olhar crítico sobre como a arte funciona, é exibida e justificada”, afirma Pérez-Barreiro. Moreschi propõe, com seu projeto, um convite para pensar sobre a Bienal de uma maneira não tradicional através de um arquivo de experiências não oficiais, composto por uma série de documentos resultantes de ações desencadeadas por ele. Crosman, por sua vez, atua sobre práticas que são constitutivas da Bienal, mas que, a seu ver, não requerem ser imutáveis. Colaborações com Zazie Edições, Pedro Moraes e Negalê Jones aparecem não apenas como forma de conectar diversas pessoas em um projeto, mas como forma de maximizar seus efeitos, abordando, portanto, o conceito de escala.
Partindo de uma abordagem pessoal e poética, Tamar Guimarães (Brasil, 1967), que une uma abordagem crítica sobre as instituições a preocupações poéticas e narrativas, apresentará um novo vídeo produzido a partir de uma leitura de Memórias póstumas de Brás Cubas de Machado de Assis, realizada em colaboração com atores profissionais e não profissionais e adaptada ao contexto institucional e à história da Fundação Bienal.
Programação pública
Um programa de encontros, palestras, performances e ativações de obra acontecem nos espaços da 33ª Bienal com periodicidade semanal. Para saber mais, acesse 33.bienal.org.br/agenda
Às quintas-feiras, o programa Des/re/organizações afetivas, organizado pela consultora Marília Loureiro, parte das investigações curatoriais para trazer encontros com instituições, grupos e iniciativas que efetuaram mudanças significativas em seus sistemas originais.
Em novembro, o simpósio Práticas de atenção, concebido por Stephanie Hessler e D. Graham Burnett, reúne conversas, oficinas e performances em torno de um dos temas centrais da 33ª Bienal.
Adicionalmente, os artistas Wura-Natasha Ogunji, Nicole Vlado, Lhola Amira, Tal Isaac Hadad e Luiza Crosman terão performances e ativações de suas obras distribuídas em eventos no espaço, e os artistas Bruno Moreschi e Rafael Sánchez-Mateos Paniágua têm ativações em plataformas online.
Cartaz e publicação educativa
Para conceber o cartaz desta edição, Raul Loureiro utilizou a reprodução da obra Formas expressivas (1932), de Hans (Jean) Arp, uma pintura com madeira em relevo, acompanhada por elementos tipográficos.
A 33ª Bienal apresenta ainda sua publicação educativa, elaborada pela equipe da Fundação Bienal com consultoria de Lilian L’Abbate Kelian e Helena Freire Weffort. Sob o título Convite à atenção, o material propõe atividades distintas, que podem ser realizadas individualmente ou em grupos, e que convidam a vivenciar a arte. A peça, com colagens inéditas feitas pelo artista-curador Antonio Ballester Moreno propõe um conjunto de experiências cujo uso não está restrito à 33ª Bienal, mas a diversas obras e contextos. A versão impressa será entregue aos alunos que visitarem a mostra, mas o público em geral pode acessar sua versão online, disponível no site bienal.org.br e no aplicativo da 33ª edição.
Antes e durante toda a Bienal, o programa educativo promove uma série de encontros entre os funcionários do Parque Ibirapuera interessados em participar das dinâmicas propostas no material educativo. Com essa iniciativa, a Fundação Bienal visa ampliar o alcance de público e fortalecer as relações com seu entorno.
Plataformas digitais – Spotify e aplicativo mobile
Em 2018, a Bienal aumenta sua inserção em plataformas digitais:
O tradicional site bienal.org.br está redirecionado para o hotsite da 33ª edição.
O audioguia audio33.bienal.org.br traz cerca de 50 faixas em que os artistas da 33ª Bienal utilizam o som e as narrativas como extensão de suas práticas. As transcrições e traduções dos áudios estão disponíveis abaixo dos players.
A plataforma de streaming Spotify fez parceria inédita com a instituição e também disponibiliza o conteúdo do audioguia como podcast, a ser acessado pelos celulares dos visitantes. Além disso, playlists de seleções musicais feitas pelos artistas participantes podem ser escutadas na plataforma.
No webapp app33.bienal.org.br, o usuário encontra os conteúdos da exposição, além de uma versão digital e jogável da publicação educativa Convite à atenção (que propõe quatro etapas de exercícios de atenção) e de atividades especialmente desenvolvidas para esse suporte.
Expografia
A expografia da 33ª Bienal, concebida pelo arquiteto Alvaro Razuk, prevê a criação de áreas livres para descanso e reflexão entre as diferentes proposições expositivas, em consonância com a proposta de Pérez-Barreiro de criação de espaços favoráveis a desacelerar, observar e compartilhar experiências.
Publicações
O projeto editorial da 33ª Bienal serve como uma plataforma que expande a atuação dos artistas da mostra, uma vez que permite aos mesmos explorarem o formato de livro de artista como complementar à exposição. O catálogo da 33ª Bienal reúne um conjunto de dezenove publicações, no formato de brochuras e pôsteres, desenvolvidas em colaboração com a equipe da Fundação Bienal e a consultora editorial Fabiana Werneck.
Com previsão de lançamento e circulação para o final de setembro, uma publicação complementar apresenta registros fotográficos da exposição, um ensaio visual do fotógrafo Mauro Restiffe, textos e entrevistas. Na peça, os artistas-curadores comentam o desenvolvimento de suas seleções para a edição e como seus próprios trabalhos responderam à proposta.
Residências artísticas
Por meio da parceria com o Programa Residência Artística FAAP, estabelecida a partir da 27ª Bienal (2006) e renovada a cada edição, cinco artistas da 33ª Bienal estiveram em residência em São Paulo para desenvolver seus projetos na mostra: Lhola Amira (África do Sul, 1984), Luiza Crosman (Brasil, 1987), Mame-Diarra Niang (França, 1982), Tal Isaac Hadad (França, 1976) e Tamar Guimarães (Brasil, 1967).