|
agosto 21, 2018
Iran do Espírito Santo & Fred Sandback na Carpintaria, Rio de Janeiro
O artista brasileiro Iran do Espírito Santo (Mococa, 1963) exibe uma seleção de trabalhos inéditos ao lado de obras do norte-americano Fred Sandback (Bronxville, 1943 - Nova York, 2003) na Carpintaria, espaço da Fortes D’Aloia & Gabriel no Rio de Janeiro cuja vocação é a proposição de diálogos, encontros e exercícios de pensamento entre diferentes artistas, formas de expressão e linguagens. O dueto, Iran do Espírito Santo & Fred Sandback, realizado em conjunto com o Fred Sandback Estate e a David Zwirner Gallery, sublinha as afinidades criativas das vastas produções artísticas da dupla, ainda que suas trajetórias estejam separadas por intervalos geracionais e distâncias geográficas.
[scroll down for English version]
Um dos principais nomes vinculados ao Minimalismo norte-americano, Fred Sandback tornou-se internacionalmente conhecido por suas esculturas de fio acrílico, em que delineia o espaço tridimensional e cria formas volumétricas a partir de recursos mínimos. Na década de 1960, nos Estados Unidos, o minimalismo emerge no campo das artes visuais como uma reação às manifestações artísticas do pós-guerra. Artistas como Sandback, Donald Judd, Sol Lewitt e Agnes Martin questionavam, em suas obras, os preceitos do Expressionismo Abstrato, considerados por eles acadêmicos e já obsoletos. Deste modo, distanciavam-se dos simbolismos e da carga dramática das pinturas expressionistas e privilegiavam a materialidade dos objetos e aparatos que empregavam em suas criações, frequentemente de origem industrial.
Iran do Espírito Santo inicia sua obra na década de 1980, em São Paulo, após graduar-se pela FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado). Assim como na trajetória artística de Sandback, o momento inicial da carreira do artista é marcado pelo ímpeto em responder ao movimento artístico anterior – neste caso a pintura neoexpressionista, típica daquela década. Em seus desenhos, esculturas e instalações, Iran passa a questionar os códigos da representação visual, tensionando a relação entre o que é o visto e aquilo que é apreendido pela visão do espectador. É a questão que se apresenta, por exemplo, em Compressão horizontal (2018), pintura realizada diretamente na parede lateral direita da Carpintaria. Ao criar um gradiente de tons de branco, cinza e preto em uma parede com cerca de 15 metros de comprimento, o artista expande as possibilidades perceptivas do espaço expositivo.
A relação entre a obra e o ambiente em que esta se situa é questão fundamental também para as esculturas de Sandback. Ao esticar diferentes extensões de fio acrílico em disposições horizontais, verticais ou diagonais, o artista desenvolve uma sintaxe visual singular, criando planos pictóricos e volumes arquitetônicos capazes de subverter a experiência de determinado espaço. Em Untitled (Sculptural Study, Ten-part Vertical Construction) (c. 1991-2018), dez fios fixados precisamente do chão ao teto da sala expositiva desvelam uma prática artística que mescla rigor e simplicidade, exatidão e experimentação.
O interesse de ambos pela linha torna-se evidente na seleção de desenhos de cada um. Na série inédita UHT – sigla que designa “unidade de habitação temporária” – Iran desconstrói geometrias cúbicas ao desenhar extensiva e repetidamente linhas horizontais e verticais com grafite. Se para muitos artistas o desenho comumente ocupa o lugar de experimento e estudo anterior à confecção de esculturas ou pinturas, para essa dupla a prática do traço no papel revela-se como uma pesquisa das possibilidades intrínsecas do desenho enquanto plataforma em si. Empregando ora pastel ora lápis de cor, Sandback transcende o uso trivial do desenho enquanto esboço, projeto; busca, em contrapartida, transferir seu pensamento escultórico para o plano bidimensional.
Riscando o ar e as paredes, os trabalhos de Iran e Sandback adentram o campo da imaterialidade, transcendendo a fragilidade de seus materiais e tornando a luz e o espaço entrelinhas os agentes ativos do trabalho, elementos de alta solidez visual. Relacionando-se em uma situação instalativa no espaço da Carpintaria, as obras da dupla forjam não apenas uma correspondência ativa como instauram um estado de contaminação positiva entre si. Circunstâncias históricas e hiatos temporais à parte, trata-se do encontro de duas práticas artísticas que convergem no delicado território da precisão conceitual, da meticulosidade técnica e do rigor formal.
Brazilian artist Iran do Espírito Santo (Mococa, 1963) shows a selection of original works next to pieces by American Fred Sandback (Bronxville, 1943 – New York, 2003) at Carpintaria, Fortes D’Aloia & Gabriel’s venue in Rio de Janeiro, whose mission is to propose dialogues, meetings and think tanks, of various artists, expressions and discourses. The duet, Iran do Espírito Santo & Fred Sandback, performed in conjunction with the Fred Sandback Estate and David Zwirner Gallery, highlights the creative affinities of the duo’s vast artistic productions, even though their trajectories are separated by generational and geographical gaps.
One of the main names linked to American minimalism, Fred Sandback became internationally known by his acrylic yarn sculptures, with which he outlines three-dimensional space and creates volumetric shapes with minimal resource employment. In the US from the 60’s, minimalism emerges as a reaction to post-war artistic expressions in visual arts. Artists like Donald Judd, Sol LeWitt and Agnes Martin used their work to question the principles of Abstract Expressionism, which they considered scholarly and already obsolete. Therefore, they would keep away from the expressionist paintings symbolism and drama charge, and highlight the material aspect of the often industrially sourced objects and devices employed in their works.
Iran do Espírito Santo initiates his career in the 80’s, in São Paulo, after graduating at FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado). Like Sandback’s artistic journey, the artist’s career starting point is marked by the urge to respond to the previous art movement – in this case neoexpressionist painting, typical from the 80’s. In his drawings, sculptures and installations, Iran starts to question visual representation codes, tightening the relationship between what is seen and what is understood by the viewer’s sight. That’s the question that is presented, for example, in Compressão Horizontal [Horizontal Compression] (2018), a painting made straight over Carpintaria’s side wall. When creating a gradient of white, grey and black shades on a 50 feet wide wall, the artist broadens the exhibition room’s perceptive possibilities.
The relationship between work and the environment it occupies is a fundamental question for Sandback’s sculptures. While stretching various lengths of acrylic yarn in vertical, horizontal, and diagonal ways, the artist develops a unique visual syntax, creating pictorial planes and architectural volumes capable of subverting a certain space’s experience. In Untitled (Sculptural Study, Ten-part Vertical Construction) (c. 1991-2018), ten threads precisely pinned from floor to ceiling reveal an artistic practice that merges accuracy and simplicity, precision and experimentation.
Their interest in the line becomes clear with the selection of drawings by each one of them. In the original series UHT – acronym for “unidade de habitação temporária” [“temporary housing unit”] – Iran deconstructs cubic geometry while extensively and repeatedly drawing horizontal and vertical lines with a pencil. If, for many artists, drawing tends to occupy a place of experimentation and sketching prior to sculpture or painting production, for this duo the practice of tracing on paper seems to be a research of the inner possibilities of drawing as a platform itself. Sometimes using pastel, sometimes colored pencils, Sandback transcends the trivial use of drawing as a sketch, as a project; he seeks, instead, to transfer his sculptural mindset to a two-dimensional plane.
Streaking the air and the walls, Iran and Sandback’s pieces enter the immateriality field, transcending the frailty of its materials and making the light and the space between lines into elements of high visual solidity. Engaging in an installation-like situation at Carpintaria’s gallery, the duo’s pieces not only forge an active correspondence, but also establish a state of positive contamination between them. Apart from the historical conditions and time gaps, here is a meeting of two art practices that converge into the delicate area of conceptual precision, technical meticulousness and formal accuracy.