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agosto 15, 2018

Histórias afro-atlânticas: lançamento e visita guiada com Adélia Borges na loja do MASP, São Paulo

A partir do dia 16 de agosto, o MASP loja exibirá uma coleção inédita de artigos garimpados em Moçambique e no Brasil, especialmente em comunidades quilombolas. A coletânea é resultado do trabalho de Adélia Borges, curadora, professora de design e escritora, que, desde 2016, é responsável pela seleção das peças expostas na loja do museu. Adélia estará presente na inauguração, a partir das 18h, para contar um pouco mais sobre o projeto e cada um dos objetos.

Em diálogo com o eixo curatorial do MASP neste ano, as histórias afro-atlânticas, os acessórios e itens de decoração englobam tanto produtos tradicionais de Moçambique, quanto outros que foram elaborados a partir de oficinas ministradas pelos brasileiros Renato Imbroisi e Cristiana Barretto, convidados por associações locais para coordenar projetos de revitalização de artesanato, além de peças feitas por artesãs e artesãos de comunidades quilombolas brasileiras.

A seleção representa, sobretudo, a valorização do feito à mão e traz objetos que são testemunhas do lugar de onde vêm. Um exemplo são os tecidos bordados por mulheres do grupo Vavasati, da cidade de Xai-Xai, no sul de Moçambique. Elas contam suas histórias de vida nos bordados e nas colagens de pedaços de capulanas -- como são chamados no país os tradicionais tecidos industriais estampados com motivos africanos.

De Pemba, no norte de Moçambique, vêm colares de pau preto (ébano, no Brasil) com pequenas reproduções de animais da fauna local, um projeto desenvolvido com sobras de esculturas de artistas Makonde.

Já da Ilha do Ibo, província de Cabo Delgado, chegam joias feitas com filigranas de prata, trabalho executado exclusivamente por homens. Há indícios de que originalmente eram usadas moedas de prata trazidas pelas marés dos navios naufragados na acidentada costa da região. Os métodos de elaboração continuam rústicos, todos manuais.

Além de projetos feitos em oficinas com a participação dos designers brasileiros, há também peças de artesanato tradicional, tais como pulseiras de ébano, pau rosa e sândalo, porta-celulares em fibras vegetais trançadas e representação de animais em lata reciclada de embalagens industriais, todos esses procedentes de Maputo.

De Pernambuco também vêm as cabeças de cerâmica moldadas por Cida Lima. No povoado de Sítio Rodrigues (município de Belo Jardim), ela produz suas peças fielmente à tradição (que remonta pelo menos até seu bisavô): dispensa o torno e queima é feita a céu aberto ---no chamado forno de cachimbo.

Dona Irinéia, reconhecida ceramista, também têm suas peças contempladas. A mestra artesã, que é patrimônio vivo de Alagoas desde 2005, começou fazendo panelas de barro e hoje cria cabeças, figuras humanas e esculturas que narram episódios do povoado quilombola Muquém, na zona da mata Alagoana, próximo à Serra da Barriga, terra do Quilombo dos Palmares.

A nova coleção também inclui um dominó de tecidos africanos, desenvolvido pelo Acervo África, espaço paulistano de pesquisa e exposição da cultura material africana.

A inauguração da venda especial dos produtos, não por acaso, coincide com a principal exposição do ano, também intitulada Histórias Afro-atlânticas, que apresenta uma seleção de 450 trabalhos de 214 artistas, do século 16 ao 21, em torno dos “fluxos e refluxos” entre a África, as Américas, o Caribe, e também a Europa, para usar a famosa expressão do etnólogo, fotógrafo e babalaô franco-baiano Pierre Verger. A mostra fica em cartaz até o dia 21 de outubro.

A programação de 2018 inclui ainda exposições individuais de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, Maria Auxiliadora e Emanoel Araujo, que ocorreram no primeiro semestre, e Rubem Valentim, Sonia Gomes, Lucia Laguna e Pedro Figari, programadas para o segundo semestre. Além disso, na sala de vídeo também serão apresentados, ao longo de 2018, autores de diferentes nacionalidades, gerações e origens capazes de contar outras histórias da diáspora negra. Os artistas que participam do programa são (em ordem): Ayrson Heráclito (19/4 a 17/6), John Akomfrah (28/6 a 12/8), Kahlil Joseph (23/8 a 30/9), Kader Attia, (11/10 a 25/11), Catarina Simão (13/12 a 27/01/19), Jenn Nkiru (08/02 a 24/03/19) e Akosua Adoma (14/6 a 18/7/2019).

CONCEITO

O MASP loja tem um perfil único entre os museus brasileiros: apresenta objetos provenientes de várias partes do país elaborados por comunidades de artesãos, povos indígenas e designers. Os produtos são apresentados de forma não hierárquica, em coerência com o posicionamento conceitual da instituição, definido por Lina Bo e Pietro Maria Bardi, e retomado por Adriano Pedrosa desde que assumiu a direção artística, em 2014.

“Os objetos são garimpados entre aqueles que melhor expressam a potência do objeto contemporâneo brasileiro. Vários deles vêm de inciativas recentes de inovação social e empreendedorismo, que trazem um novo impulso ao desenvolvimento sustentável local”, explica a consultora curatorial Adélia Borges. Alguns exemplos são as bolsas elaboradas com redes de pesca descartadas do Rio Grande do Sul e pássaros de umburana provenientes de Santa Brígida, no interior da Bahia.

A criação indígena está presente com cerâmicas, adornos e bancos. O portfólio de etnias já apresentadas inclui Waurá, Kayapó, Mehinako, Apurinã, Huni Kuin, Umutina e Baré, entre outros. Como os objetos não são feitos em série, o fornecimento muitas vezes é sazonal.

Há vários objetos concebidos em projetos colaborativos entre artesãos e designers brasileiros como Karine Faccin, Ronaldo Fraga e a dupla de irmãs Tina e Lui. A criação autoral de designers surge em peças como os adornos têxteis de Renata Meirelles e as joias em prata de Tissa Berwanger e de Áurea Sacilotto.

O mobiliário se faz presente em uma única tipologia: os banquinhos de sentar. A escolha se deve ao fato de que eles fazem parte da cultura brasileira desde os primórdios e ao propósito de mostrar a diversidade de soluções em um único objeto, tornando assim mais evidente a dimensão cultural do design. Na seleção exposta, estão presentes desde o banco Mocho, um clássico do design brasileiro, criado por Sergio Rodrigues em 1954, e o Girafa, de autoria de Lina Bo Bardi, Marcelo Ferraz e Marcelo Suzuki, em 1987, até releituras atuais do banco caipira por Carlos Simas e uso de papelão por Rona Silva, além dos exemplares indígenas.

Atenção especial vem sendo dada também a miniatura de móveis. Na loja, encontram-se criações de Sergio Rodrigues, Lina Bo Bardi, Indio da Costa, Paulo Mendes da Rocha e Flavio de Carvalho e artesãos da Ilho do Ferro, no sertão alagoano, entre outras.

Toda seleção tem consultoria curatorial de Adélia Borges, que viaja para garimpar peças ainda pouco conhecidas e identificar novos talentos nas várias regiões do Brasil. Esse trabalho integra um esforço de Adélia para divulgar e valorizar o objeto brasileiro.

A loja segue com a venda das publicações e produtos próprios do MASP, além de livros sobre artes, design e arquitetura.

Posted by Patricia Canetti at 12:25 PM