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julho 31, 2018
Deyson Gilbert e Leopoldo Ponce na Jaqueline Martins, São Paulo
A partir do dia 4 de agosto, o trabalho inédito dos artistas Deyson Gilbert e Leopoldo Ponce, com curadoria de Bruno de Almeida, poderá ser visto simultaneamente no espaço da galeria e no Museu Santa Casa de São Paulo
Para esta edição do projeto, que explora a relação entre a galeria e o seu contexto urbano através de trabalhos que acontecem simultaneamente no espaço expositivo e em outros estabelecimentos existentes no bairro, os artistas Deyson Gilbert e Leopoldo Ponce apresentam uma obra que correlaciona a galeria ao Museu Santa Casa de São Paulo localizado no Hospital Central da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia.
A Santa Casa é uma instituição reconhecida por sua importante atividade na área de saúde e cuja vasta trajetória está fortemente relacionada ao desenvolvimento da cidade de São Paulo. O Museu Santa Casa procura preservar a memória dessa instituição, assim como narrar a história da cidade através do seu acervo documental e museológico com mais de 7000 itens. Tal coleção é formada por peças históricas relacionadas a especialidades clínicas, cirúrgicas e ao preparo de medicamentos, mas também é composta por itens cerimoniais, religiosos, indumentárias, mobiliário, esculturas e até pinturas de artistas tais como Almeida Júnior, Benedito Calixto e Tarsila do Amaral.
Deyson Gilbert e Leopoldo Ponce apresentam um trabalho que cria um profundo diálogo entre o espaço de exposição da galeria e uma sala específica desse museu, na qual se encontra o acervo médico. O trabalho tem como ponto de partida uma imagem que retrata o atentado contra o então presidente do Brasil, Prudente de Moraes. Essa imagem, um dos poucos documentos sobre esse acontecimento histórico, é um desenho publicado num jornal de sátira política da época. Nele encontram-se retratados os sujeitos e os objetos-chave desse episódio que aconteceu durante uma cerimônia militar, em 1897, na qual o presidente recepcionaria os batalhões que retornavam da Guerra de Canudos. Durante esse evento, o soldado Marcelino Bispo de Melo avançou contra Prudente de Moraes apontando um revólver a seu peito, acionou o gatilho algumas vezes, mas o revólver falhou. Com a sua cartola, o presidente desviou a mão do agressor que foi rapidamente agarrado por homens da comitiva presidencial. Mas mesmo retido, o soldado ainda conseguiu puxar um punhal e atacar fatalmente um ministro que protegia o presidente. Prudente de Moraes escapou ileso e o atentado fracassou. O soldado agressor foi preso e depois encontrado enforcado na cadeia. Especula-se que ele tenha sido uma peça de uma conspiração política maior, encabeçada pelo então vice-presidente Manuel Vitorino Pereira.
A “dissecação” da ilustração desse atentado político é o mote para o trabalho de Deyson Gilbert e Leopoldo Ponce. A partir dela os artistas ponderam sobre as narrativas implícitas aos principais sujeitos, ações e objetos retratados no desenho, tais como o revólver, a cartola, o punhal, entre outros. Estes tornam-se elementos-chave para a instalação que correlaciona a sala de exposição da galeria ao acervo médico do Museu. Em ambos os espaços combinam-se objetos banais com outros elementos cujos significados ou funções são quase indecifráveis. As duas salas são organizadas segundo lógicas dispositivas semelhantes, e cada um dos objetos expostos encontra o seu correspondente formal, simbólico e/ou semântico na outra sala. Esta estratégia de complementariedade entre os dois espaços cria uma sensação de repetição ou deja-vú ao visitar um local após o outro, fazendo com que o visitante tenha de sobrepor mentalmente ambos os locais de forma a deduzir algumas das narrativas implícitas ao trabalho. Através da conexão entre coisas de épocas e temas aparentemente desconexos o trabalho revisita tanto a história oficial quanto o imaginário social coletivo; alude a crenças e mitos populares assim como aos cânones da história da arte; cita o rigor científico, mas também beira o ocultismo; expõe determinados assuntos enquanto encobre outros. Tais estratégias aparentemente paradoxais possibilitam que os artistas falem sobre situações cujas relações de causalidade não se podem comprovar de forma estritamente objetiva ou factual. Relações que frequentemente não têm lugar nas narrativas oficiais, na simplificação própria da História, na economia das imagens e na crescente polarização de posições e opiniões dos nossos dias.
Sobre os artistas
Deyson Gilbert, 1985, Brasil. Vive e trabalha em São Paulo. Suas exposições individuais incluem: DCVXVI, Mendes Wood DM, São Paulo (2014); Non Ducorocud Non, Mendes Wood Dm, São Paulo (2014); The State of the Art, Galeria Elba Benítez, Madri (2013); Culatra, Mendes Wood DM, São Paulo (2012). Suas obras também foram incluídas em mostras coletivas institucionais como: Brasile - Il colltello nella carne, Milan (2018); XVI Yogyakarta Bienal, Yogyakarta (2017); QueerMuseu, Santander Cultural, Porto Alegre (2017); Jogo de Forças, Paço Das Artes, São Paulo (2016); Here There, Qatar Museum – Al Riwaq, Doha (2015); Imagine Brazil, Astrup Fearnley Museet, Oslo (2013/2014) / Foundation for Contemporary Art, Montreal / Instituto Tomie Ohtake, São Paulo (2015); Monument to Cold War Victory, New York (2014); 33º Panorama da Arte Brasileira, Museu de Arte Moderna de São Paulo, São Paulo (2013); Mitologias/Mythologies, Cité Internationale des Arts, Paris (2011).
Leopoldo Ponce, 1976, Equador. Vive e trabalha em São Paulo, Brasil. Bacharelado em Artes Plásticas- UNESP (1995-2001). Mestrado em Artes- UNESP (2015-2017). Suas exposições individuais incluem: epicentro: a margem, Galeria do instituto de artes da UNESP (2017); Supernova, Artists Unlimited Galerie Bielefeld (2014); Argonauta, Galeria Virgílio, São Paulo (2010); immigrant song, Galeria El Conteiner, Quito, Equador (2010);- Andarilho, Galeria Virgílio, São Paulo (2008)¬; Endoscópio, Centro Universitário Maria Antônia, São Paulo (2003); Plutão, Centro Cultural São Paulo (1998). E exposições coletivas tais como: Um Desassossego, Galeria Estação São Paulo (2016); o ponto de ebulição,PSM Gallery, Berlim (2015); [*!,–”/;+°], BLO-Ateliers, Berlim (2013); Smoke Signals, Ateliê da Barão, São Paulo Brasil (2012); Huasipichay, Galeria Virgilio, São Paulo e Centro Cultural Sono, Cuenca, Equador; aberto para re-forma, Casa Contemporânea, São Paulo; Vicissitudes, Galeria Virgílio, São Paulo (2011), entre outras.
Sobre o curador
Bruno de Almeida, 1987, Brasil/Portugal. Arquiteto e curador. Desenvolveu projetos com instituições tais como: Harvard University, Graduate School of Design, Cambridge, EUA; Storefront for Art and Architecture, Nova Iorque, EUA; Pivô Arte e Pesquisa, São Paulo, Brasil; Galeria Leme, São Paulo, Brasil, entre outras. Participou de residências de instituições tais como: Ideas City, New Museum, Nova Iorque, EUA, em colaboração com LUMA Foundation, Arles, França; Curatorial Intensive, Independent Curators International, Nova Iorque, EUA; IMPACT17, PACT Zollverein, Essen, Alemanha, entre outras. Próxima residência: TATE Intensive, TATE Modern, Londres, Inglaterra.