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junho 14, 2018
Delson Uchôa na Anita Schwartz, Rio de Janeiro
Anita Schwartz Galeria de Arte apresenta a partir de 20 de junho de 2018, às 19h, a exposição Autofagia – Eu Devoro Meu Próprio Tempo, com seis trabalhos inéditos em grande formato do artista Delson Uchôa, nascido em 1956 em Maceió, onde vive e trabalha. Reconhecido e celebrado por sua pintura multicolorida, em que alia elementos da cultura popular e erudita, ele mostrará trabalhos inéditos de sua pesquisa iniciada em 2005, em que produz pinturas sobre uma camada de resina aplicada no chão de lajotas de cerâmica crua de seu ateliê, e que depois de meses é descolada dali, formando um “manto de pele” que serve de suporte para novas pinturas. Assim, trabalha sobre uma fina pele que habitou por meses o piso de seu ateliê, e que contém resíduos de terra e os desgastes sofridos com o uso do tempo. O público poderá tocar e manusear as obras, e muitas delas têm dupla face.
Esta é a primeira exposição do artista na Anita Schwartz Galeria, e a primeira individual do artista na cidade desde 2005, quando expôs na extinta Galeria Anna Maria Niemeyer. Desde então, suas obras têm sido vistas em mostras coletivas na cidade, como no Museu de Arte do Rio. Com forte presença em exposições no Brasil e no exterior, Delson Uchôa tem trabalhos em importantes instituições, como Inhotim, em Minas, Fundação Edson Queiroz, em Fortaleza, Pinacoteca do Estado de São Paulo, Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães (MAMAM), em Recife, Coleção Gilberto Chateuabriand/MAM Rio, Coleção João Sattamini/MAC Niterói, e Museu Nacional de Belas Artes. Na Alemanha, suas obras integram em Berlim as coleções York Stack e Vogt, e, em Koblenz, o acervo do Ludwig Museum. Em 1993, fez uma residência artística na Alemanha, onde expôs na galeria Springer, em Berlim. Participou da XXIV Bienal de São Paulo, em 1998, com curadoria de Paulo Herkenhoff, e da mostra "Como vai você, Geração 80?", organizada por Marcus de Lontra Costa e Paulo Roberto Leal, na EAV Parque Laje, em 1984.
AUTOFAGIA, PELE, CORPO, MEDICINA, PINTURA
Uma característica desta produção de Delson Uchôa é o que ele chama de “autofagia”. Frequentemente ele volta a um trabalho antigo e o amplia, enxertando outras pinturas ou pedaços de seu “banco de pele”, as sucessivas camadas de pintura sobre resina retiradas do chão. “Eu me alimento de mim mesmo, do meu próprio tempo, e a pintura se alimenta dela própria”, explica o artista. Ao longo dos meses, a pintura sobre a resina no chão acaba por se tornar um palimpsesto, o método de raspagem de um pergaminho para receber novo texto ou ilustração. Formado em Medicina, que abandonou para seguir seu caminho como artista, Delson Uchôa faz aproximações entre seu trabalho e o corpo humano. Lembra que a pele é o maior órgão de nosso corpo, e que seu processo é inicialmente pictórico “e depois cirúrgico”. “Faço um escalpelamento, um transplante, um enxerto, um implante, construindo uma nova pintura”, ao trabalhar contínua e incessantemente sobre seu “banco de pele”, recortando e recriando novas pinturas. “São mutilações, apagamentos, alargamentos contínuos das pinturas”, diz. Ele acrescenta dizendo que ainda usa agulha e linha, e que faz tipos de suturas, um “chuleio ancorado ou simples, como em uma cesariana. A isso chamo de autofagia”.
Na parede frontal do grande espaço térreo da galeria, estará a pintura “Flor do Cerrado”, com quase quatro metros de altura por cinco de largura, pesando 44 quilos. Nela, Delson incrustou com costura uma pintura de 1985, “Murano com Flores”. “Flor do Cerrado” contêm uma repetição em série da emblemática forma do Palácio da Alvorada, projetado por Oscar Niemeyer. “Eu queria uma forma geométrica que fosse reconhecida imediatamente em qualquer lugar do mundo”, explica Delson Uchôa sobre a obra.
Ele comenta que em seu trabalho há uma dualidade: “ou falo do peso, da matéria, da condição carnal da pintura, ou da alma, seu caráter espiritual, da cor e da luz”. “São testemunhos que foram feitos do cinto luminoso do planeta, pois meu ateliê fica em Maceió, que está a 9 graus da linha do equador”. Para uma das pinturas que está em Inhotim, ele fotografou o céu e imprimiu na resina aderida ao chão, que meses depois de ser retirada continha de um lado imagens do céu e do outro os vestígios da terra. “A fina camada da pintura então é como a frase de Shakespeare, em que entre o céu e a terra há mais coisas do que supõe nossa vã filosofia”, diz o artista.
Nas demais paredes do grande espaço térreo da galeria Anita Schwartz estarão outras quatro pinturas: “Oitavo Horizonte” (2017), com 210 x 220 cm; “Jardim Inventário” (2017), de 175 x 240 cm; “A Linha Alinha o Chão” (2006 / 2018), com 340 x 374 cm; e “Pequeno Corrupio” (2017), com 2,44m x 2,16m.
INSTALAÇÃO-PINTURA E VÍDEOS
O segundo andar da galeria será ocupado pela obra “Instalação Pintura-Objeto (2018)”, definida pelo artista como “escultura composta por couro, pele e membrana de tinta para o feitio de organelas na condição de pintura, posto que a matéria-prima é pigmento e resina”. A instalação cobrirá o chão, onde estarão objetos geométricos feitos com os recortes da pintura sobre resina.
No contêiner, no terraço da galeria, serão projetados vídeos mostrando o processo criativo do artista.
INTRATOSFERA – COLETIVO LOBA
Na abertura da exposição, haverá uma performance inédita do coletivo Loba, das artistas Flora Uchôa e Laura Fragoso. Dentro da pesquisa que fazem em torno da experiência sonora “como um resgate da experiência primitiva do ser humano”, elas apresentarão “Intratosfera”, com participação do guitarrista Victor Nogueira.
SOBRE DELSON UCHÔA
Delson Uchôa nasceu em 1956 em Maceió, onde vive e trabalha. Formou-se em Medicina em 1981, quando paralelamente iniciou seus estudos de pintura na Fundação Pierre Chalita. Viajou para a França, onde conhece as pinturas dos grandes mestres. Ao retornar ao Brasil vive por um período em Belo Horizonte e fixa residência no Rio de Janeiro, quando integra a mostra "Como vai você, Geração 80?", organizada por Marcus de Lontra Costa e Paulo Roberto Leal, na Escola de Artes Visuais do Parque Laje, em 1984. A partir daí passa a fazer parte dos artistas da Galeria Saramenha, onde realiza duas importantes individuais em 1985 e 1988, com texto do pintor Jorginho Guinle. Depois, a Galeria Thomas Cohn realiza duas individuais do artista em 1990 e 1993.
Retorna por breves períodos a Maceió durante essa temporada carioca, e ganha uma bolsa de estudos e a oportunidade de realizar uma exposição na galeria berlinense Springer, em agosto de 1993, resultado do Workshop 93, patrocinado pela Academia Teuto Brasileira de Verão (Deutsh-Brasilianische Kulturelle Vereinigung, DBKV)/Instituto Goethe/Fundação Pierre Chalita.
Volta da Alemanha e passa a morar em Maceió, com a intenção de reunir sua produção até então. Em 1996, realiza sua maior exposição individual em dois grandes Armazéns de Açúcar em Jaraguá, que abrange um período aproximado de quinze anos de pintura, desde a geração 80 até os trabalhos de 1996, denominados de "mestiços de última geração", e cujo convite feito ao público foi através de outdoors espalhados pelos principais pontos da cidade para dar uma mostra da escala e da dimensão de seus trabalhos.
Em 1998, participa da XXIV Bienal de São Paulo sob curadoria de Paulo Herkenhoff, que recoloca a questão antropofágica no intuito de discutir a pluralidade cultural e insere o trabalho de Delson Uchôa no projeto do Núcleo Histórico na questão da cor e latitude que vai do modernismo, passando pelo neoconcretismo até a contemporaneidade. Em 2001, a TV Senac realiza um documentário sobre sua obra, exibido na série Arte brasileira. Em 2002, participa do histórico programa de residência artística Faxinal das Artes, com curadoria de Agnaldo Farias e Fernando Bini, na vila serrana Faxinal do Céu, distante mais de 300 quilômetros de Curitiba. No ano seguinte é convidado por Agnaldo Farias para expor no Instituto Tomie Ohtake, em uma grande mostra junto a outros dois pintores de posições distintas: Caetano de Almeida e Cássio Michalany. Em 2005 ocupa os espaços do MAMAM (Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães), em Recife, sob curadoria de Moacir dos Anjos, mesmo ano em que passa a integrar o acervo do Museu de Belas Artes (MNBA), no Rio de Janeiro. Seus trabalhos integram ainda as importantes coleções Gilberto Chateaubriand/MAM Rio, João Sattamini/MAC Niterói, MAMAM Recife e da Infraero, que adquiriu um painel para o novo aeroporto internacional de Maceió.