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maio 22, 2018
André Parente na Jaqueline Martins, São Paulo
Música de Vinícius de Moraes e Toquinho dá voz às 19 obras selecionadas e empresta título: Kabuletê. Na Tonga da Mironga
A partir de uma seleção de 19 trabalhos feitos desde o final dos anos 1970 até hoje, a mostra Kabuletê. Na Tonga da Mironga é a primeira individual de André Parente na Galeria Jaqueline Martins. O artista vem utilizando meios variados em sua obra: filme, vídeo, instalação, fotografia, monotipias, pasteis, desenhos, objetos e assemblages. Nos anos 2000 André Parente tornou-se mais conhecido pela criação de dispositivos e instalações audiovisuais interativas e imersivas de grandes dimensões como Figuras na Paisagem, Circulado, Trilhos Urbanos, O Vento Sopra Onde Quer, Contorno, Estereoscopia e Entre Margens. Recentemente, o artista vem se dedicando a trabalhos de cunho político.
Em “Kabuletê”, ele procura explorar alguns problemas que atravessam todo o seu trabalho - o corpo, a paisagem, a circularidade, a desaparição, a especularidade – e que muito frequentemente se inter-relacionam. “A música do Vinícius de Moraes e do Toquinho é como a voz e o espírito da exposição, razão pela qual me apropriei do título, transformando-o”, diz André Parente.
A obra do artista realiza diversas passagens entre o corpo, enquanto signo da circularidade do afeto, e a paisagem, enquanto rede simbólica que remete a um emaranhado de forças informativas – históricas, literárias e pictóricas. Na linha do corpo podemos citar O Homem do Braço e o Braço do Homem, Circulado, Mulher Maravilha, O Vento Sopra Onde Quer” e O Artista Quando Jovem. Já na linha da paisagem, temos Visorama (nas versões Paisagem Carioca e Situação Cinema), Belvedere, E la Nave Va, Nau, Paisagem n. 1 e Trilhos Urbanos.
Em uma terceira linha de trabalhos produz-se uma articulação entre o caminho do corpo e o da paisagem, formando uma conjunção ou via de mão dupla. É o caso de Dona Raimunda, Curto-Circuito, Entre-Margens, Estereoscopia, +2 e o mais atual Ilhas de Pedra. Mas é em trabalhos como A Bela e a Fera e Figuras na Paisagem que se opera uma síntese das passagens entre corpo e paisagem, o lado de dentro e o lado de fora se atravessam e confundem. De modo que “o corpo, enquanto lugar da voz interior, é invadido pela voz de um “outro” – voz que informa. E a paisagem, enquanto lado de fora, pode ser na realidade um estado de alma, invasão da circularidade do afeto” afirma.
A questão da circularidade está presente em toda a obra de André Parente, em particular nesta exposição: circularidades dos dispositivos próprios do cinema, circularidade dos dispositivos psicológicos, circularidades dos corpos em rotação de santos, guerreiros, visionários e mulheres maravilhas que giram sem cessar. Estas circularidades se reforçam e se multiplicam quando inseridas umas nas outras.
A questão da desaparição é outro tema forte da exposição. Ela está presente na luta de Dona Raimunda contra a desaparição de sua casa, no corpo do personagem indefinido que aparece e desaparece em A Bela e a Fera, no seqüestro dos símbolos republicanos ameaçados pela pilhagem do Estado brasileiro em Irreal e em Bandalha, na desaparição da pauta do caderno de Escola Sem Partido.
Sobre o título da exposição: “Eles forjam esta expressão, a partir de expressões derivadas de línguas africanas, como um desabafo e uma praga rogada contra os militares da ditadura: vou lhe rogar uma praga / eu vou é mandar vocês / pra tonga da mironga do kabuletê”, completa.
André Parente (www.andreparente.net) é artista e pesquisador da arte contemporânea, cinema e novas mídias. Em 1987 obtém o doutorado na Universidade de Paris 8 sob a orientação de Gilles Deleuze. Entre 1977 e 2018, realiza inúmeros vídeos, filmes, instalações, performances sonoras e objetos nos quais predominam a dimensão experimental e conceitual. Seus trabalhos foram apresentados em mais de uma centena de festivais, mostras, exposições no Brasil e no exterior (Alemanha, França, Espanha, Suécia, Espanha, México, Canadá, Argentina, Colômbia, China, entre muitos outros). É autor de vários livros: Imagem-máquina. A era das tecnologias do virtual (1993), Sobre o cinema do simulacro (1998), O virtual e o hipertextual (1999), Narrativa e modernidade (2000), Tramas da rede (2004), Cinema et narrativité (L’Harmattan, 2005), Preparações e tarefas (2007), Cinema em trânsito (2012), Cinemáticos (2013), Cinema/Deleuze (2013), Passagens entre Fotografia e Cinema na Arte Brasileira (2015), entre outros. Nos últimos anos obteve vários prêmios: Prêmio Rumos do Itaú Cultural, Prêmio Petrobrás de Novas Mídias, Prêmio Sergio Motta de Arte e Tecnologia, Prêmio Petrobrás de Memória das artes, Prêmio Oi Cultural, Prêmio da Caixa Cultural Brasília, Prêmio Funarte de Artes Visuais, Prêmio Oi Cultural, Prêmio Marc Ferrez.