|
março 1, 2018
Daniel Arsham na Baró Jardins, São Paulo
O ato de sentar e permitir o fluxo livre e contínuo de pensamentos recebe, no budismo, o nome de zazen. “Za” significa “sentar” e “zen” refere-se a um estado de concentração profunda. Zazen existe enquanto estado mental, no qual espaço e tempo são suspensos. Em Zazen, mostra individual do artista americano Daniel Arsham na Baró Galeria, os trabalhos reunidos propõem uma outra experiência e percepção do fluxo do tempo.
Conhecido por trabalhos situados entre arte e arquitetura, nos quais intervém em nossas impressões sobre o espaço, a poética de Arsham também tange a dimensão temporal. Os trabalhos do artista tensionam a temporalidade na qual se inscreve a arquitetura onde se instalam: suas obras apresentam-se, no momento e espaço contemporâneos, como objetos que tem permanência em uma escala temporal quase geológica. O tempo, para o artista, não parece ter início ou fim absoluto, pois ele é percebido como uma longa duração, que atravessa e suspende a espacialidade.
Dentre os trabalhos que compõe a mostra, destacam-se Ash and Rose Quartz Eroded Televisions e o video Future Relic. Tais trabalhos fazem parte da série Fictional Archeology, no qual o artista se coloca como um arqueólogo do futuro e convida os espectadores a fazerem o mesmo: objetos do presente são recriados como esculturas e expostos como relíquias. Nessa arqueologia ficcional, os artefatos contemporâneos parecem ter sido petrificados, pois são compostos por uma mistura de materiais rochosos, minerais e cimento. Ao contrário do que são hoje, objetos feitos em escala massiva e industrial, marcados pela rápida obsolescência do mundo do consumo, eles assumem um caráter único. Colocamo-nos diante deles como se estivéssemos diante de preciosidades, que resistiram ao tempo e às intempéries, mas que nos fazem rememorar nosso presente.
As obras Blue Gradient Teddy Bear e Blue Gradient Seated Female Figure integram uma instalação semelhante a Blue Garden, site specific realizado no Aterro do Flamengo em 2017, em que Daniel Arsham recria um jardim zen com areia e duas esculturas. Na cultura milenar japonesa, tal jardim é um refúgio para concentração e para o fluxo de energia. As marcas na areia realizadas com um restelo simbolizam, deste modo, o fluxo de água. No jardim de Arsham, a figura de mulher sentada e de um urso de pelúcia também petrificados substituem as tradicionais pedras como elemento decorativos e criam uma situação de simultaneidade entre o universo tradicional, que se estende temporal e espacialmente, e o mundo contemporâneo fugidio e acelerado.
Nos trabalhos que compõem a mostra, Arsham propõe ao espectador a experiência de um tempo que não é concreto - apesar da materialidade dos objetos de suas esculturas e instalações. O tempo, como no budismo, aparece como amplo e cíclico. Ele é, simultaneamente passado, presente e futuro, em um contínuo sem começo, meio e fim.
Sobre o artista
Daniel Arsham nasceu em Cleveland, Ohio, Estados Unidos, 1980. Vive e trabalha em Nova Iorque, Estados Unidos.
Conhecido por transformar o rotineiro em algo espetacular e surreal e guiado por conceitos arquitetônicos , o multiartista Daniel Arsham transita entre pintura, escultura, instalações, set design e performances de dança. ”De todos os produtos que os seres humanos fazem, a arquitetura é a maior e mais duradoura e importante forma de expressão cultural – é a única coisa que vai durar”, ele declara. Em 2007, desenvolveu o cenário para o espetáculo eyeSpace, o primeiro dos quatro que faria para a Merce Cunningham Dance Company, companhia lendária que outrora contou com colaborações de nomes importantes da arte como Robert Rauschenberg, Frank Stella e Bruce Nauman. Hoje é sócio e fundador da Snarkitecture, estúdio de design colaborativo que opera entre os territórios da arte e arquitetura.