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fevereiro 20, 2018
Dani Tranchesi na Galeria Estação, São Paulo
Exposição de fotografias de Dani Tranchesi inaugura a programação de 2018
Depois de inserir a produção não erudita brasileira na cena contemporânea nacional e internacional, ao realizar inúmeras exposições e publicações de criadores autodidatas sob o crivo de críticos renomados, a Galeria Estação passa a contemplar também novos artistas naturalmente observados pelo circuito das artes. Por isso, para inaugurar o ano de 2018, apresenta Caixa-clara, exposição de fotografias de Dani Tranchesi, com curadoria de Cassio Vasconcellos e Paula Braga.
A primeira exposição da artista paulistana é composta de 35 obras, séries desenvolvidas nos últimos dois anos que acessam um arquivo de fotografias digitais produzidas nos últimos dez, em viagens de Tranchesi por mais de sessenta países. Em sua forma particular de construir a fotografia, que parte da ação do fotógrafo, do fotografado e do espectador, a artista cria imagens complexas, que, segundo os curadores, sobrepõe memória à grafia da luz e explora o papel dos três agentes. “Mais do que imagens, os objetos produzidos pela artista são caixas-claras que desafiam o aparelho mesclando os três participantes do triângulo amoroso (que é também triângulo de dominação) formador das imagens de mundo”, ressalta Paula Braga.
Em uma das séries, o uso de camadas transparentes sublinha o processo de acúmulo de imagens mentais por cima da imagem física captada pelo olho. Ao acessar seu arquivo digital, Tranchesi mimetiza lugares da cidade pouco arborizados com paisagens naturais. “Assim, a fotografia de prédios em uma cidade pouco arborizada pode provocar a nostalgia e a memória da floresta, e o resultado é uma terceira imagem, que representa a paisagem urbana concomitantemente com o desejo pelo verde”, afirma Braga. Destaca a curadora, ainda, que, por cima dessa construção, a obra recebe a imagem do espectador, que se vê refletido numa camada de acrílico ou de espelho.
Nas grandes fotos coloridas de rostos, que exploram o tema da fotografia documental eurocêntrica sobre as culturas ditas exóticas, Tranchesi substitui os olhos dos retratados por olhos em preto e banco de quem os vê, muitas vezes os da própria fotógrafa. Em outra série o retratado aparece em caixas de acrílico, dissecado em lâminas. Penduradas no teto, as caixas trazem de um lado o retrato - habitante de um país distante – e do outro o olhar de quem o vê. “De um lado, o retratado congelado e do outro, o olhar congelante”, completa a curadora.
Já em Espelhos Negros, o corpo inteiro da fotógrafa aparece escondido entre a transparência das várias camadas da imagem. “Mas quem é o retratado nos espelhos negros? Essa é a questão, pois, ainda que as várias camadas mostrem pessoas, a câmera aponta para o espectador”, questiona Braga. Para a curadora essa série é uma referência também às telas dos celulares que abriram o capítulo da selfie na história da fotografia. “Os espelhos negros de Dani Tranchesi exploram a ideia da selfie com rara dignidade, convidando o espectador a se reproduzir em imagem para interagir com as camadas da composição. A selfie efêmera aparece na superfície refletora do acrílico preto e junta-se por alguns instantes às imagens do acervo de memórias fotográficas da artista, equiparando-se ao homem indiano, à menina dos balões, à velha chinesa que cozinha em frente a um espelho”.
Completa a exposição Galáxias, em que personagens estão sobrepostos a um espelho, fazendo com o espectador apareça atrás, na última camada. “Por mais que ele queira ser o sujeito observador, não passa de segundo plano, e tem que se procurar atrás das barreiras, olhar pelos vãos das grades, desviar das bolinhas de sabão, se quiser ser objeto”, completa Braga.