|
janeiro 10, 2018
Marcela Flórido na Anita Schwartz, Rio de Janeiro
Mostra reunirá pinturas inéditas em grande formato da jovem artista carioca que há dez anos saiu do Brasil para estudar em Londres, e depois se radicou em Nova York, após dois anos de mestrado em pintura na Universidade de Yale. Com cores fortes e vibrantes, ela discute o papel da mulher, o afeto e o tabu da figuração na arte contemporânea brasileira.
Anita Schwartz Galeria de Arte apresenta a partir de 10 de janeiro de 2018, às 19h, a exposição Laços – Marcela Flórido, com pinturas inéditas em grande formato da artista carioca, nascida em 1988, e baseada em Nova York. Em 2008, estudante da Escola de Belas Artes da UFRJ, ela foi selecionada para uma bolsa na Foundation in Arts and Design na Central Saint Martins, em Londres, ingressando no ano seguinte no curso de pintura da prestigiosa Slade School of Fine Art, em Londres, onde se graduou em 2013. Em seguida, foi selecionada pela Yale School of Art, nos EUA, onde fez seu mestrado em pintura de 2013 a 2015.
Há um ano Marcela Flórido tem seu ateliê em um galpão industrial no Brooklyn, Nova York, que compartilha com outros quinze artistas dando continuidade a uma prática que sempre prezou: o convívio e a troca de informações e críticas com amigos de ofício. O local abriga todos os ateliês e propicia uma convivência de ideias na prática imersiva e solitária da pintura. Ela mantém constante contato com os amigos das três cidades em que tem vínculos profissionais: Rio de Janeiro, Nova York e Londres, e desde 2013 se corresponde com Anita Schwartz, que acompanha à distância sua trajetória.
Para sua primeira exposição individual na Anita Schwartz Galeria, Marcela Flórido produziu cinco pinturas a óleo em grande formato, em cores vibrantes, que trazem como elemento comum a figura de um coração, presente nos trabalhos recentes da artista. Suas pinturas densas evocam uma atmosfera emocional em cenas de romance e conflitos em paisagens familiares a ela. Apesar de morar fora do Brasil há mais de nove anos, ela não se desconecta das questões do país, e um de seus interesses é a presença da figuração na arte brasileira. A artista também discute em seu trabalho um excesso de elegância, a grande presença da herança construtivista, e um “certo tabu” com a figura feminina.
QUESTÕES EXPANDIDAS EM UM PROGRAMA DE VÍDEOS
Junto com a exposição “Laços”, Marcela Flórido desdobra sua pesquisa fazendo uma curadoria de uma programação no contêiner do terraço da galeria, com vídeos de seis artistas mulheres de diferentes países, que “exploram em seus trabalhos questões de representação do corpo, principalmente o corpo feminino, no espaço”. “Quero expandir as questões levantadas nas pinturas para o vídeo”, diz a artista. Quatro artistas, assim como Marcela Flórido, vivem e trabalham em Nova York: Florência Escudero (1987, Argentina) escultora, fotógrafa e videoartista; Cindy Ji Hye Kim (1990, Coréia do Sul), pintora e videoartista; e Kate Ruggeri (1988, Washington, D.C.), artista, curadora e engenheira de informática, e Colleen Asper (1980, Pensilvânia), pintora, videoartista e performance. As outras duas são as cariocas Katia Maciel (1963, Rio de Janeiro), artista, cineasta e poeta; e Anna Costa e Silva (1988), artista e cineasta. Marcela Flórido selecionou um vídeo de cada artista, que integrará uma sequência exibida em loop.
PRESENÇA NO CINEMA E NO CIRCUITO INTERNACIONAL DA ARTE
Apesar de jovem, Marcela Flórido já tem um respeitável histórico de exposições. Em 2013, já na mostra de conclusão de curso na Slade, em Londres, vendeu todos os trabalhos expostos, e ganhou a atenção da imprensa. A exposição despertou também o interesse da Marvel, que usou seus quadros no filme “The Avengers: Age of Ultron”, o sétimo filme de maior bilheteria na história. Em 2015, a artista recebeu o Prêmio Viridian – selecionado por Lauren Hinkson, curadora do Museu Solomon Guggenheim, em Nova York.
Até 23 de dezembro de 2017, Marcela Flórido participa com duas outras artistas mulheres da mostra “Slip”, na Stems Gallery, em Bruxelas. Em 2014, foi convidada pela sheika Hoor Al Qasimi – apontada pela revista Art Review como uma das 40 mais poderosas personalidades do mundo da arte – presidente da Sharjah Art Foundation, nos Emirados Árabes, para uma residência artística na instituição, que resultou na individual “Contos” e na aquisição de duas telas produzidas naquele período para a coleção permanente da Fundação.
LINGUAGEM CARTOON E CORES VIBRANTES
Na prática intensa e diária do ateliê que a escola londrina proporcionou, e diante da cena artística que encontrou lá – em que o humor e o grotesco são marcantes – Marcela Flórido desenvolveu uma linguagem mais liberta, e próxima à do cartoon, com cores vibrantes, sem a preocupação com o equilíbrio na composição e cores a que estava familiarizada no Rio. Para ela, essa heterogeneidade serve como um desafio feminista às hierarquias históricas da arte e às noções tradicionais de bom gosto. “Precisei me afastar do Brasil para finalmente me perguntar com honestidade sobre o Brasil”, conta ela, que observa que sempre gostou de ser “do contra”. Apesar de ter começado seu trabalho sob forte influência da abstração geométrica, ela percebia ali uma narrativa personificada, embora não se permitisse representar paisagens ou o corpo. A partir desta percepção, passou a pesquisar a razão de a figuração ser tema tabu, considerado exótico ou carnavalesco. Em Yale, por sua forte tradição pictórica, a artista encontrou o apoio necessário para levar suas questões mais a fundo. “Busquei encontrar minha voz própria”, salienta a artista que conta que se abriu “como nunca antes para explorações da figuração e de seus próprios questionamentos emocionais”.
Marcela Flórido ressalta que sua pesquisa sobre o corpo feminino, e a presença da mulher na arte brasileira, “passa sempre pela pintura.”. “Continuar desafiando tradições da pintura, para mim significa permanecer cada vez mais comprometida com suas possibilidades visuais e emocionais”. Ela questiona ainda o fato de artistas homens serem “mais bem recebidos do que as mulheres quando tratam de questões sobre o corpo”. “Não há tanto pudor no caso dos homens”, avalia.