|
abril 26, 2017
Caravana Farkas: projeção e debate no Galpão VB, São Paulo
O que o olhar urbano já não consegue ver
Documentários da Caravana Farkas serão exibidos dia 29 de abril, às 17h, no primeiro programa público da exposição Nada levarei quando morrer, aqueles que me devem cobrarei no inferno.
No final dos anos 1960, um grupo de cineastas saiu de São Paulo em direção ao sertão nordestino com o objetivo de registrar os habitantes daquela região. Seus filmes integraram o que mais tarde ficaria conhecido como Caravana Farkas, conjunto com mais de trinta documentários produzidos entre 1964 e 1980 pelo fotógrafo e empresário Thomaz Farkas.
As obras resultantes dessa expedição foram inovadoras por mostrar partes do Brasil que nunca haviam sido filmadas antes, dando voz e rosto a personagens quase desconhecidos do público. Os filmes apresentam, retratados como protagonistas de suas histórias, homens e mulheres do povo que não cabiam nos ideais de ordem e progresso do Estado brasileiro reforçados com o golpe de 1964.
É o que se vê, por exemplo, em rastejador, s. m., de Sergio Muniz, um dos filmes que serão exibidos no Galpão VB (confira as sinopses abaixo). Após constatar a insuficiência das descrições do rastejador nos dicionários e na literatura, o documentário vai ao encontro de dois homens que dedicaram suas vidas à função de seguir as pegadas e os rastros de animais perdidos ou de cangaceiros procurados. Revela-se, então, um vasto conhecimento da paisagem e dos caminhos do sertão, ignorado pelo olhar urbano e modernizador do Brasil.
No dia 29 de abril, sábado, às 17h, o Galpão VB exibirá três filmes feitos a partir dessa viagem, no primeiro programa público da exposição Nada levarei levarei quando morrer, aqueles que me devem cobrarei no inferno. Após a exibição, os curadores da exposição, Solange O. Farkas e Gabriel Bogossian, mediarão um debate com o público. A entrada é gratuita.
FILMES
Visão de Juazeiro (1970, direção de Eduardo Escorel)
Romeiros, comerciantes, estudantes e militares se juntam em Juazeiro do Norte, um dos principais centros religiosos do país, para a inauguração da estátua do Padre Cícero, com 27 metros de altura. Imagens de arquivo mostram a cidade no começo do século 20 e o padre homenageado interagindo com fiéis. Esses dois momentos formam a visão de uma comunidade atravessada pela figura do homem religioso.
rastejador, s. m. (1969, direção de Sergio Muniz)
Dicionário são insuficientes para definir a profissão de rastejador. A câmera, então, entrevista dois homens que dedicaram suas vidas à função de seguir os rastros que pessoas e animais deixavam na caatinga. Joaquim Correia Lima lembra as guerras do sertão e seus embates com Lampião e Maria Bonita. Igualmente caçador de cangaceiros, Batista mostra como trabalhar e aproveitar o agreste. Ambos ligam o antigo ao atual e não são redutíveis a mistificações.
Jaramataia (1969-1970, direção de Paulo Gil Soares)
Jaramataia, na Paraíba, é uma típica fazenda do sertão nordestino. Por meio da anatomia do boi, da fala altiva do proprietário da fazenda e do dia a dia dos trabalhadores, com suas técnicas e instrumentos, o filme monta um panorama da criação de gado e da vida dos vaqueiros no sertão.
MEDIADORES
Solange O. Farkas, curadora e diretora da Associação Cultural Videobrasil. Em 1983, criou o Festival de Arte Contemporânea Sesc_Videobrasil, evento de que é também curadora-geral e que se tornou referência para a produção artística do Sul Global. Foi responsável por trazer ao Brasil exposições Cuide de Você, de Sophie Calle (Sesc Pompeia, São Paulo, 2009), A Revolução Somos Nós, de Joseph Beuys (Sesc Pompeia, São Paulo, 2010) e Geopoéticas, de Isaac Julian (Sesc Pompeia, São Paulo, 2012), do qual também foi curadora. Como curadora convidada, participou da 10ª Bienal de Sharjah (Emirados Árabes Unidos, 2011), da 16ª Bienal de Cerveira (Portugal, 2011) e do 6º Jakarta International Video Festival (Indonésia, 2013), entre outros. Ao lado de Gabriel Bogossian, foi curadora da exposição de Akram Zaatari, Amanhã vai ficar tudo bem (Galpão VB, São Paulo, 2016).
Gabriel Bogossian, editor, tradutor e curador adjunto da Associação Cultural Videobrasil. Investiga em sua prática as representações do território e dos povos indígenas, frequentemente aproximando produção artística e acervos documentais. Foi curador das exposições Nada levarei quando morrer, aqueles que me devem cobrarei no inferno (Galpão VB, São Paulo, 2017), com Solange O. Farkas, Resistir, reexistir (Galpão VB, São Paulo, 2017), Cruzeiro do Sul (Paço das Artes, São Paulo, 2015) e Corpo Estranho (Oi Futuro Flamengo, Rio de Janeiro, 2014), com Luisa Duarte, entre outras. Como editor e tradutor, foi responsável por publicações junto às editoras Rocco, Universitária da UFPE, Hedra e ao Festival Videobrasil.