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março 26, 2017
Sonia Andrade na Marcelo Guarnieri, São Paulo
Artista pioneira da videoarte passa a ser representada pela galeria e expõe um recorte dos trabalhos produzidos durante as duas últimas décadas
“It were but madness now t’impart the skill of spetacular stone”
(Seria loucura agora partilhar a matéria da pedra espetacular)
The undertaking – John Donne, 1572-1631
A partir do dia 30 de março, colecionadores e público em geral poderão ver de perto um recorte da produção mais recente da artista Sonia Andrade em Cristais, pedras e vídeos, exposição que acontece na unidade paulistana da Galeria Marcelo Guarnieri – nova representante da artista. Depois de mais de 40 anos dedicados à sua pesquisa e dezenas de exposições realizadas em museus de dentro e fora do Brasil, esta é a primeira vez que Sonia Andrade expõe os seus trabalhos em uma galeria comercial.
Logo quando iniciou a sua trajetória na década de 1970, ao lado de um grupo de vanguardistas cariocas, durante a ditadura militar, Sonia já conquistou reconhecimento internacional. Em 1975 participou da exposição Video Art, exibida em quatro instituições norte-americanase - Institute of Contemporary Art, Filadélfia; The Contemporary Arts Center, Cincinnati; Museum of Contemporary Art, Chicago e Wadsworth Atheneum, Connecticut. Depois disso esteve presente em diversas Bienais paulistanas (incluindo a 32ª Bienal de São Paulo realizada no ano passado), exposições no MAC-USP, MAM-RJ, CCBB-RJ, FAAP, Instituto Tomie Ohtake, e também no Louvre (Paris), MoMA-NY, Centre Georges Pompidou (Paris), Museu Reina Sofía (Madri), entre outras importantes instituições públicas de arte da Europa e Ásia. Dessa vez, em Sonia Andrade – Cristais, pedras e vídeos estarão reunidas seis obras produzidas entre 2001 e 2017, nas quais destaca-se a integração entre dispositivos de imagem e elementos da natureza. O que permanece ainda hoje em seus trabalhos é um interesse pelas questões políticas e estruturais da imagem, que se desenvolvem, por exemplo, a partir de ideias como opacidade e transparência, agora deslocando-se da televisão e do seu universo midiático, para a projeção e sua carga fantasmática. O encontro de tais projeções com as pedras e cristais que dispõe no espaço como anteparos, reforçam esse deslocamento, na medida em que ametistas, obsidianas, selenitas e cristais possuem, assim como a luz, propriedades mágicas.
Na videoinstalação de 2001, composta por um bloco de areia que serve de anteparo para a projeção da imagem de uma drusa de cristais que parece ser a mesma que repousa, materialmente, em sua superfície, Sonia Andrade propõe um jogo entre objeto e representação, imagem e coisa, material e imaterial. Ainda interessada nos significados da imagem formada a partir da luz e da sua projeção em cristais, a artista projeta uma Color Bar - sinal de vídeo em forma de barras coloridas que servem como padrão de teste para o departamento de engenharia do canal de televisão - em um conjunto de pontas de cristal de rocha, associando a propriedade óptica dos prismas de cristais, que decompõem, por refração, a luz branca em todo o seu espectro de cores, a um instrumento de medição e controle desse mesmo espectro.
A operação de justapor imagens e objetos, tensionando seus significados, é novamente encontrada na videoinstalação que recebe o visitante da exposição. Apresentada na entrada da galeria, a obra Sem Título, de 2005, é composta por uma projeção na parede da imagem do fogo e por uma obsidiana que é posicionada entre projetor e anteparo. A obsidiana - pedra que se forma a partir do resfriamento de lava vulcânica - recebe em sua matéria a imagem daquilo que a origina, causando, no anteparo, uma interferência a partir de sua sombra.
Poderão ser vistas também três outras obras, todas elas caracterizadas pela presença de pedras e cristais integrados à projeção de imagens ou apenas de luz, investigando o mistério do visível e convidando o expectador a se relacionar com os jogos poéticos que constroem, numa experiência quase imersiva.
A mostra Sonia Andrade – Cristais, pedras e vídeos, na Galeria Marcelo Guarnieri, começa uma semana antes do início da SP-Arte, onde também estarão expostos alguns vídeos produzidos pela artista na década de 1970. Além disso, sua instalação Hydragrammas estará na itinerância da 32ª Bienal de São Paulo – Incerteza Viva, da qual participou e que, em 2017-2018, será apresentada na Fundação de Serralves – Museu de Arte Contemporânea, em Porto (Portugal).
Sonia Andrade nasceu em 1935 no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha. Sua produção inclui obras em diversos meios: desenho, fotografia, objeto, cartão-postal e vídeo. Começou a trajetória ao lado de um grupo vanguardista também formado Anna Bella Geiger, Fernando Cocchiarale, Ivens Machado Letícia Parente, Paulo Herkenhoff, Ana Viória Mussi e Miriam Danowski. Na década de 1970 realizou exposições individuais no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo. Também nesse período participou da 14ª Bienal de São Paulo e das coletivas 8ª JAC e Prospectiva'74, ambas organizadas por Walter Zanini no MAC-USP e Video Art, exibida em quatro instituições norte-americanas - Institute of Contemporary Art, Filadélfia; The Contemporary Arts Center, Cincinnati; Museum of Contemporary Art, Chicago e Wadsworth Atheneum, Connecticut. Nos trabalhos desse período, Sonia toma o vídeo a partir de uma perspectiva crítica e insere o seu próprio corpo como protagonista das cenas: amarra fios em seu rosto de modo a desconfigurar sua imagem; corta pelos e cabelo pela raiz alterando a sua aparência; prende a própria mão com pregos em uma mesa; escova os dentes como se estivesse em um comercial de TV; prende-se em gaiolas e caminha cambaleante em direção à câmera. Em todos os trabalhos o corpo está capturado, ora pelo meio televisivo, ora pelos padrões midiáticos impostos ao espectador. Essas preocupações acompanham a artista em seus projetos futuros - de maneira mais poética em certas obras ou mais incisiva em determinados objetos. Em mais de quatro décadas dedicadas à arte, já participou de diversas Bienais (incluindo a do ano passado), exposições no MAC-USP, MAM-RJ, CCBB-RJ, FAAP e também no Louvre (Paris), MoMA-NY, Centre George Pompidou (Paris), Reina Sofia (Madri), entre outras importantes instituições no Brasil, Europa, Ásia e Israel. Este ano, Sonia participou da 32ª Bienal de São Paulo - Incerteza Viva e das exposições Video Art in Latin America: Selections from Brazil, na Rubell Family Collection, Miami, EUA e Dissonance no Getty Research Institute, Los Angeles, EUA.