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junho 20, 2016
Rumos Itaú Cultural lança catálogo da pesquisa O Obscuro Fichário dos Artistas Mundanos
O trabalho de Clarice Hoffmann, contemplado na edição 2013-2014 do programa de fomento
à cultura do instituto traz registros originais do DOPS de Pernambuco sobre mais de 400 pessoas de vários países, consideradas suspeitas devido à profissão que exerciam ligada à alguma atividade artística, durante passagem ou residência no Estado, de 1934 a 1958. O levantamento chega ao público em versão impressa e com palestra aberta no instituto que também anuncia o resultado de três novas iniciativas relacionadas à pesquisa
O Recife da Era Vargas, e o registro de mais de 400 artistas investigados pela extinta Delegacia de Ordem Social e Política de Pernambuco (DOPS/PE), entre 1934 e 1958, são o tema do projeto O Obscuro Fichário dos Artistas Mundanos,da jornalista e produtora cultural Clarice Hoffmann, que no dia 21 de junho (terça-feira) é lançado em catálogo, com palestra, às 19h, no Itaú Cultural.
A pesquisa contemplada pelo Rumos Itaú Cultural 2013-2014, reúne 403 verbetes produzidos pelo DOPS/PE, de homens e mulheres de diferentes nacionalidades, residentes ou em passagem por Pernambuco, cuja profissão estaria vinculada à área artística e por isso, foram consideradas suspeitas pelo governo. O levantamento iniciado por Clarice em 2004, até então disponível somente no site http://obscurofichario.com.br, ganha versão impressa publicada pelo instituto e começasua última etapa de trabalhos com a divulgação dos resultados em plataformas digitais.
No dia 21, a jornalista explica para o público todas as etapas da pesquisa. Também recebe o professor e historiador Durval Muniz de Albuquerque Junior, autor de sete livros, entre eles A Invenção do Nordeste e Outras Artes, e a curadora do projeto Clarissa Diniz, atual gerente de conteúdo do Museu de Arte do Rio (MAR) para apresentar um panorama do Recife no contexto político abarcado pelo fichário. Nele, cinco cartografias revelam uma capital pernambucana subversiva, cuja cena cultural é efervescente com bares, restaurantes, albergues e cassinos, pouco mencionados na história oficial do Estado do Pernambuco, na Era Vargas.
O lançamento de O Obscuro Fichário dos Artistas Mundanos em catálogo vai para a sua última fase: o de divulgação do levantamento em meios digitais. De novembro de 2015 a janeiro deste ano, Clarice Hoffmann fez convocatória para artistas, coletivos e grupos interessados para inscreverem projetos inéditos com o fim de disseminarem os resultados do projeto em redes sociais e outros meios eletrônicos. Esta última fase também contou com apoio do Rumos Itaú Cultural e os três contemplados – dois deles de Pernambuco e um, do Rio de Janeiro – serão anunciados oficialmente na noite de lançamento do catálogo, também, a partir das 19h, na Sala Vermelha, do instituto.
O TRABALHO
Clarice Hoffmann começou O Obscuro Fichário dos Artistas Mundanos em 2004, quando pesquisava sobre mulheres negras em Pernambuco e teve acesso a 12 mil prontuários do DOPS/PE sobre 430 personalidades registradas em Recife entre 1930 e 1950, além de 2 mil recortes de jornais de diferentes hemerotecas digitais. Assim soube que sua avó, a atriz Gusta Gamer, havia sido fichada pela polícia durante o regime ditatorial da Era Vargas. Deste levantamento, ela chegou a 403 fichas de nomes de pessoas que vão da letra M a Z, além de 28 prontuários sobre homens e mulheres de diversas nacionalidades que habitaram ou apenas passaram pela cidade pernambucana e, em paralelo, formaram outras cartografias da cidade. São artistas circenses, cantores de rádio, bailarinas de salão, transformistas, ilusionistas, dançarinos russos, chineses e tantos outros.
A pesquisa tem ainda o apoio institucional do Arquivo Público Estadual João Emerenciano (Apeje), de Pernambuco, que detém mais 125 mil fichas e salvaguarda o Fundo DOPS/PE, composto por milhares de fichas e milhares de prontuários. Os verbetes do grupo de interesse de OObscuro Fichário dos Artistas Mundanosiniciados pela letra A até L foram perdidos pelos arquivos públicos, no entanto, percebe-se por meio de uma série de dados que em 1958, o DOPS/PE detinha aproximadamente 1,1 mil fichas, incluindo alguns prontuários.
OS SELECIONADOS NA CONVOCATÓRIA
Vaga de Irma Brown, de Francisco Baccaro e Moacyr Campelo (PE)
O trabalho, composto por vídeo, fotografia e intervenção urbana, foi idealizado com base no mapeamento dos espaços existentes na cidade do Recife fichados pela DOPS/PE, entrecruzando passado e presente, evidenciando ruínas e resistência. Ao subjetivar os lugares, os contextos e os ambientes do Recife e ao interagir com seus atuais transeuntes, a proposta apresenta a cidade como a grande protagonista.
Folhetim dos Encontros, de Juliana Borzino (RJ)
A artista entrecruza ficcionalização e arqueologia, criando novas edições de um folhetim que chegou a ser distribuído no período que abarca OObscuro Fichário dos Artistas Mundanos pela loja de seu bisavô pernambucano, a Livraria Mozart. Em edições atuais desses boletins, Juliana articula os arquivos de bisavô e do fichário criando uma nova narrativa da convivência e dos conflitos dos personagens frequentadores da livraria e dos artistas fichados pela DOPS/PE, lançando luz e ao mesmo tempo gerando ambiguidades produtivas nas já conhecidas redes e fluxos do campo da cultura de Recife.
Teta Lírica, de Marie Carangi (PE)
A obra se articula com as práticas e modos de vida de alguns artistas do fichário, sem se remeter a eles literalmente. Marie Carangi desenvolve uma poética do corpo e da subversão, como contraponto a disciplina – contemporânea ao arquivo e presente na contemporaneidade. Ela propõe um objeto-sujeito vizinho aqueles corpos perseguidos no fichário, por meio de uma performance-vídeo potente e livre, sendo ao mesmo tempo uma manifestação artística contraída, claramente em torno de repressões.