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maio 3, 2016
Bruno Kurru e Ursula Tautz na Zipper, São Paulo
Dupla abertura na Zipper Galeria com Bruno Kurru e Ursula Tautz em 5 de maio
O título da quarta individual do artista Bruno Kurru remete a um duplo movimento, tal como uma seta que aponta para direções opostas: um sentido de referencialidade, daquilo que vem antes, mas que permanece cego; e um sentido de continuação e consequência que se pulveriza de maneira nem assertiva, nem definitiva.
Com curadoria de Galciani Neves, isso se dá porque apresenta um percurso poético do artista que se desenrola e expande a lógica, a estética e o entendimento de pintura como linguagem específica. Kurru coleta e se apropria de questões e atravessamentos sociais, políticos e culturais e os fragmenta e os reconfigura em narrativas. A colagem, a montagem e o pensamento por associação são alguns de seus principais recursos para tal empreitada. A lógica construtiva desses trabalhos se dá na tentativa de abordar os problemas comuns e tão urgentes sem lhes propor um solução, mas antes articulá-los em outros contextos: no campo da arte, para quem sabe possamos enxergá-los e discuti-los a partir de uma outra perspectiva.
Assim, acúmulos de imagens, de objetos do cotidiano, citações, camadas informes, situações casuais, manchas de cor, garatujas e imagens disponíveis na cidade são sobrepostos, intencionando pensamentos ritmados, percepções descompassadas e instigando um passeio um tanto incerto, um tanto fragmentado do público pelas “pinturas-instalações-objetos”. Estão juntos numa convivência nada consensual: Galuber Rocha, Tarkoviski, uma faixa de pedestre, citações, imagens desconcertantes provenientes da internet, registros afetivos, representações de paisagens. Nesse sentido, o espaço é também um componente para estes trabalhos: ao mesmo tempo que os trabalhos articulam fisicamente a arquitetura da galeria, o espaço é superfície de aderência dos trabalhos. Os trabalhos se deixam desenhar pelo espaço, enquanto desenham o espaço.
Em termos da visualidade construída pelo artista, está em questão uma espécie de jogo entre um “dentro e fora da pintura”, como afirma. Ou seja, entre o que de pronto poderia se reconhecer como esquema compositivo da pintura, e o que se expande para o espaço, para os objetos, para esquemas pictóricos disponíveis nas paredes, no chão, em vídeos e textos. O artista acredita que dessa maneira “não sobrecarrega o objeto”, mas antes lhe confere uma forma complexa que transborda para fora outros tantos esquemas visuais.
Bruno Kurru: A conflituosa combinação entre imagens e palavras e a sobreposição de diferentes espaços no suporte pictórico são algumas das características de sua obra. Sua pesquisa recente aborda questões como dispositivos de normatização, descodificação dos fluxos e capacidades de criação e diferenciação. Principais exposições individuais: “Potência de Deslocamento”, Elefante Centro Cultural, Brasília, 2015; “Temporada de Projetos”, Paço das Artes, São Paulo, 2013; “O Ser, Como Meta”, Zipper Galeria, São Paulo, 2012. Principais exposições coletivas: “Ondeandaaonda”, Museu Nacional da República, Brasília, 2015; “Quero te encontrar”, La Maudite, Paris, 2015; “WebArte.br”, Sesc Jundiaí, São Paulo, 2015; “O que seria do mundo sem as coisas que não existem?”, Trienal de Artes Frestas -Sesc Sorocaba, São Paulo, 2014; “Eu fui o que tu és, e tu serás o que eu sou”, Paço das Artes, São Paulo, 2013’; “Projeto Imaterial”, FILE – Festival Internacional de Linguagem Eletrônica, Centro Cultural Fiesp, São Paulo, 2012. Prêmios: Bolsa Funarte de Reflexão Crítica e Produção Cultural para Internet - 2011.
Galciani Neves curadora e pesquisadora em artes visuais. É mestre e doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Atualmente é professora do Curso de Artes Visuais da Faap, coordenadora da Pós em Práticas Artísticas Contemporâneas, é professora no Mestrado de Artes da Universidade Federal do Ceará, co-coordena a Escola Entrópica e também é coordenadora do Núcleo de Pesquisa e Projetos em Artes no Instituto Tomie Ohtake.
A inquietação de Ursula Tautz talvez seja a de muitos que estão na eterna busca de um pertencimento. O deslocamento, ou a sensação de um presente que não é preenchido, é uma das grandes questões trazida em Lugar Familiar, com curadoria de Isabel Portella. Primeira individual da artista carioca em São Paulo, a mostra faz parte do programa Zip’Up, dedicado a projetos mais experimentais e curatoriais inéditos.
A busca de Úrsula começa em uma viagem feita à cidade de Oldrzychowice Klodzkie, na Polônia, local de origem de sua família e antiga cidade alemã devolvida aos poloneses após os russos expulsarem as tropas germânicas na Segunda Guerra Mundial. Ao refazer essa trajetória, Úrsula foi ao encontro de um passado desconhecido, mas que nunca deixou de ser presente.
Na tentativa de recuperar esse espaço, a artista visual se funde na paisagem e na terra. Com um vestido vermelho e em posição fetal, constrói um novo cenário a partir de suas fotografias. Ao mesmo tempo em que este é seu local de aconchego, é também um ambiente estranho, onde as casas já não estão mais no mesmo lugar, as pessoas já não se mostram hospitaleiras e as cores e os cheiros não são os mesmos de outrora.
A individual conta com quatro fotografias em grande formato e uma videoinstalação, além de um objeto tridimensional na forma de um balanço estático. As fotos sobrepostas e manipuladas digitalmente resignificam o espaço e criam uma nova narrativa tanto para a cidade estrangeira quanto para a artista. Ao mesmo tempo em que ainda é estranha ao ambiente, a fotografia, pensada ao acaso, a regista como pertencente a ele. Sua inquietação quanto a este lugar de (não)pertencimento encontra-se em sua busca nesta exposição, fazendo com que a contradição entre o conforto e o incomodo seja sentida pelos visitantes.
Ursula Tautz nasceu no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha utilizando-se de fotografia, vídeo e instalações. Cursou a ESPM, além de ter frequentado oficinas da “School of Visual Arts /NY”, e a partir de 2005 a Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Em 2013 integrou o Programa Projeto de Pesquisa, coordenado por Glória Ferreira e Luiz Ernesto. Participou de várias exposições coletivas, como “Intervenções Urbanas Bradesco ArtRio 2015” e “Reminiscências” no CCJF com curadoria de Isabel Portella. além da individual “Fluidostática” na Galeria do Lago ( Museu da República). Foi também selecionada pelo crítico Fernando Cocchiarale para o “Programa Olheiro da Arte”.
Isabel Sanson Portella é museóloga e crítica de arte, Doutora e Mestre em História e crítica da arte pela Escola de Belas-Artes/UFRJ, Especialista em História da Arte e Arquitetura do Brasil pela PUC-Rio, Pesquisadora de acervo e Coordenadora e curadora da Galeria do Lago - Arte Contemporânea do Museu da República/IBRAM/MinC.