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maio 1, 2016
Claudia Andujar na Vermelho, São Paulo
Em sua exposição na Galeria Vermelho, Claudia Andujar exibe imagens de quatro séries que, juntas, evidenciam sua atuação política militante pela causa Yanomami, bem como seu experimentalismo no campo da fotografia. Com diferentes tipos de filmes, como o infravermelho, e procedimentos técnicos como a refotografia, Andujar apresenta um recorte da complexidade de sua obra por via da revisão de sua produção aonde a artista transita entre a objetividade investigativa e subjetividade poética.
Minha vida em dois mundos
Nos anos 1970, Claudia Andujar registrou a cidade de São Paulo vista de cima, tal qual fez com a natureza exuberante das terras Yanomami. Usando filme infravermelho, interferiu na representação da cidade, fazendo-a aproximar de outra obra conhecida de sua trajetória, a Maloca em chamas - da série Casa (1976), também vista nessa exposição.
A queima da maloca para os índios representa renovação através da mudança. Quando a terra que ocupam já não dá mais frutos e a floresta ao redor não providencia caça, queimam suas casas para construir novas, em novos lugares, possibilitando, assim, um novo começo.
O sonho verde azulado
“Paxo+m+k+ é a menina verde-azulada em exposição. Tranqüila, deitada na rede, na floresta, perto do rio, sonha do mundo verde, exuberante, seu mundo, escutando o burburinho do rio, atravessando a densidade milenar das arvores, ela admira em silencio a cor densa, azulada do céu, filtrada pela copa das arvores, escuta o canto dos pássaros. É o mundo em que nasceram e cresceram todos os Yanomami como também Paxo+m+k+, pertencendo ao universo verde azulado.“ C. A.
Em 1974, Andujar realizou uma série de retratos de uma jovem índia chamada PAXO+M+K+ com filme preto e branco. Essas imagens fazem parte dos primeiros registros feitos por Andujar em suas viagens às terras Yanomami. Em 1982, re-fotografou o original utilizando filme infravermelho. A partir desse processo, recorrente em sua trajetória, Andujar busca atribuir aspectos idílicos às imagens, resgatando parte de sua memória desses primeiros encontros, conferindo-as a outro mundo pictórico, imaginário e subjetivo. Segundo Andujar, “Trago da minha memória o verde da vegetação e o azul do céu, elementos idílicos da Amazônia, que neste trabalho conferem cores às imagens e representam a virtude do índio em ainda defender a preservação do meio ambiente e sua luta para mantê-lo sadio e sem interferências, desde o garimpo ilegal até a invasão de áreas já demarcadas para o território Yanomami”.
Um triste fim
Em 1990, Claudia Andujar integrou uma grande exposição-evento no Memorial da América Latina, em São Paulo. Além das 34 imagens e textos aqui resgatados, o evento titulado “O índio / Ontem, hoje e amanhã”, contava com uma série de seminários com lideranças indígenas e intelectuais, encontro de documentaristas, ciclo de vídeos, além da colaboração do fotógrafo Charles Vincent. Pensava-se em criar um espaço para a divulgação de testemunhos sobre realidades diversas do continente americano, pois se acreditava que a flexibilidade da programação pudesse estimular a participação direta do publico com os integrantes dos ciclos.
Os textos da antropóloga Alcida Ramos, os testemunhos de figuras emblemáticas como o da liderança indígena Davi Kopenawa Yanomami, e de seus companheiros João Davi Yanomami, Ivanildo Wawanaweytheri e Tuxaua Brito Yanomami transmitem a angústia vivida desde então pelo povo Yanomami.
Claudia Andujar completava 11 anos de atuação junto aos Yanomami naquele momento, através da CCPY (Comissão Pró Yanomami), que contava com o apoio de organizações governamentais e não governamentais de diversas partes do globo. O principal objetivo da CCPY, desde então, era informar e sensibilizar a opinião pública, além de pressionar o Estado brasileiro a efetuar a demarcação das terras Yanomami. Depois de 13 anos desta campanha ininterrupta, iniciada em 1978, a Terra Indígena Yanomami foi oficialmente demarcada nos estados de Roraima e Amazonas em 1991, sendo homologada e registrada em 1992.
O conjunto de imagens selecionadas por Andujar buscava retratar a realidade das populações Yanomami que sofria com uma série de consequências da chegada da rodovia Perimetral Norte, além da crescente presença do garimpo e das madeireiras na região. Doenças e contaminações dos rios e das terras tomaram os índios - e seus próprios corpos -, deixando um rastro de destruição tanto física quanto cultural, com resultados que perduram até os dias de hoje.
Mesmo com seu território demarcado, as invasões à Terra Indígena Yanomami seguem frequentes, da mesma forma que as contaminações pelo mercúrio incorrido pela atuação dos garimpeiros. Tais questões pungentes fazem da reunião destas imagens, um comentário sobre a pertinência das denúncias retratadas sob as lentes de Andujar, entre os anos de 1970 e 1980, ainda latentes na época em que vivemos. Segundo Andujar, “a garimpagem ilegal continua e está crescendo. O resultado de uma análise científica recentemente realizada e divulgada pela Fiocruz, ao longo do Rio Aracaça, comprova que a contaminação de mercúrio usado no garimpo de ouro neste rio atingiu 90% da população. Um verdadeiro massacre. O governo brasileiro não está tomando as medidas necessárias para interromper as invasões ilegais. Se continuar assim, será um triste fim para os Yanomami e como afirma Davi Kopenawa em seu livro, será o fim do mundo”.