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agosto 19, 2015
Xavier Veilhan na Nara Roesler, São Paulo
Galeria Nara Roesler passa a representar no Brasil o artista francês, agora em sua primeira individual na América Latina
Seis anos depois de conquistar o reconhecimento internacional com a exposição que sucedeu a de Jeff Koons no Palácio de Versalhes, o francês Xavier Veilhan ganha a sua primeira individual na América Latina. Entre 24 de agosto e 26 de setembro 31 de outubro, Horizonte Verde reunirá na Galeria Nara Roesler - que passa a representá-lo no Brasil - 17 obras do artista, considerado um dos mais originais da atualidade, sobretudo no uso da tecnologia.
Desde o fim dos anos 1980, a obra de Xavier Veilhan oscila entre o classicismo formal e a alta tecnologia, confrontando a herança modernista com o contexto contemporâneo. Por meio de um registro de formas, ele busca manter a tensão entre abstração e figuração; de um estado de espírito, ele extrai a energia típica das épocas de transição tecnológica. Através de uma grande variedade de registros e meios, certos temas recorrentes, como a velocidade, o movimento ou o progresso técnico, são desenvolvidos por uma sintaxe formal moldável: os móbiles, os raios, as litografias ou as esculturas lapidadas feitas com scanners 3D.
Para essa primeira exposição individual latino-americana, depois de coletivas em Quito, Caracas, Montevidéu e em São Paulo, no antigo Hospital Matarazzo (2014), Veilhan apresenta desdobramentos de algumas de suas séries emblemáticas. Uma grande instalação de litografias monocromáticas ocupa as paredes da Galeria Nara Roesler, fazendo fundo para um novo móbile com elementos pintados à mão, uma novidade no trabalho do artista. Numa segunda sala, uma instalação articula quadros e esculturas retratando parentes do artista.
Entre as duas salas, uma linha de 1,40m que parte do chão conecta os dois espaços, e corre ao longo das paredes como se fosse uma linha do horizonte. Embora artificial, esse processo visual unifica o espaço da galeria, transformando-o em palco: o público abandona sua posição de visitante passivo para se tornar ator da máquina visual que é a exposição. Uma maneira de reiterar a herança da cena artística francesa dos anos 1990, em que a exposição era vista como um meio, mas também de revelar os experimentos de Xavier Veilhan com dados imateriais, espaço e movimento. A sua prática ligada ao teatro será evidenciada na mostra através de projetos recentes: a performance artística Systema Occam (2013), seu último filme Vent Moderne (2015) e Architectones (2012-2014), um ciclo de intervenções in situ em edifícios emblemáticos da arquitetura modernista.
Horizonte Verde evoca uma evolução recente dentro do trabalho de Veilhan. Nela, a estética bem definida e faiscante dos anos 2000, um período caracterizado pela predileção pelo aço inox ou a resina, deu, há alguns anos, lugar a um trabalho mais bruto e artesanal, como os pedestais de madeira bruta, as esculturas de carbono e as litografias simplesmente penduradas nas paredes que serão apresentados em São Paulo.
Por sua extrema atualidade, ainda que sempre relacionada com a história da arte e do século 20, a obra de Veilhan é de difícil classificação. Escultura, estatuário público, instalação, móbile, pintura e vídeo são algumas das manifestações que ela já assumiu. Um exemplo é a sua antiga série de esculturas de animais em cores vibrantes, como Shark (2008) e The Rhinoceros (1999), cujas formas prismadas (e monocromáticas) as tornavam figuras cubistas tridimensionais. Com The Model T Ford (1997-1999), Veilhan reconstruiu, artesanalmente, o primeiro modelo de carro produzido em série por Henry Ford, no início do século 20, numa inversão de paradigmas: se no original de Ford a industrialização massiva era a causa de admiração, sua clonagem em processo manual sugere a união da tecnologia, levada hoje a extremos, a um tempo e espaço próprios da realização individual e da manufatura.
Suas instalações e ambientações exploram sempre as conexões entre história da arte, história universal, desenvolvimento tecnológico e uma certa forma de olhar para a natureza intermediada por essa tecnologia - e vice-versa. O modernismo, em sua abstração construtiva, é um dado constante em esculturas e instalações públicas.
Em duas de suas séries mais marcantes, Music e Maquettes, que terão exemplares exibidos na mostra na Nara Roesler, os elementos são reunidos como num museu do futuro. Music é uma antologia de esculturas de grandes personagens musicais desde o fim do século 20 até a atualidade, realizadas por escaneamento 3D e recorte eletrônico em materiais como madeira policrômica e um composto que remete a pedras do estatuário medieval. Maquettes traz diversas estruturas que lembram esculturas geométricas modernistas, formadas por bastões de madeira encaixados entre si por articulações de elástico. Pela instabilidade com que parecem se equilibrar as peças, há uma recusa à perfeição formal construtiva.
Com tantos entrefluxos atravessando a pluralidade de estilos de todas as épocas, formas e materiais, Veilhan propõe um frescor visual que possibilita a reinvenção da natureza pela tecnologia, usada de forma a desinstrumentalizar o olhar industrializado. Em vez de aceitar as regras impostas pelas técnicas da produção em massa, o artista joga com a noção de tempo, espaço e artesania para contestar a infalibilidade da máquina e inserir o dado humano e natural no quebra-cabeça da perfeição computadorizada.
Xavier Veilhan nasceu em Paris, em 1963. Participou das coletivas Simple shapes (Mori Art Museum, Tóquio, 2015), Une histoire, art, architecture, design, des années 80 à aujourd’hui (MNAM-Centre Georges Pompidou, Paris, 2015) e Made by... (Cidade Matarazzo, São Paulo, 2014), entre outras. Teve como exposições individuais mostras como Canal+ Xavier Veilhan, L’Expo des 30 ans (Palais de Tokyo, Paris, 2014), Maquettes (FRAC Centre, Orléans, 2014-15) e Systema Occam (performance com música de Eliane Radigue, Musée Delacroix, Paris, 2014).