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julho 20, 2015
Lara Felipe na Matias Brotas, Vitória
A individual da artista, "O peso exato dessa leveza", com curadoria de Neusa Mendes, conta com mais de 30 obras entre objetos, colagens e pintura. A visitação é gratuita
O peso exato dessa leveza. Esse é o nome da individual da artista capixaba Lara Felipe, que fica em exposição na galeria Matias Brotas Arte Contemporânea até o dia 1º de agosto. A mostra, que marca a comemoração do aniversário de 9 anos da galeria, tem curadoria de Neusa Mendes, um dos nomes mais renomados das artes plásticas, visuais e da cultura do Estado.
A artista, que nasceu em Alegre e atualmente mora no Estado do Arizona, nos Estados Unidos, com uma incrível ousadia criativa, associa e recodifica objetos de diferentes naturezas alcançando em suas obras um universo poético singular. Através do uso de diversos materiais, a artista aborda nesta mostra o tema melancolia, afetos, memórias, buscando em outras referências artísticas e na literatura sua inspiração.
Lara Felipe já participou de exposições de arte e design no Brasil e na América Latina, e já recebeu prêmios como designer e artista plástica, sendo mais importante o Prêmio Phillips de Arte para Jovens Talentos no Brasil e América Latina. Sua mais recente exposição no Estado, em janeiro deste ano, foi a coletiva no Centro Cultural SESC Glória, intitulada ‘Corpo–Casa’. A artista capixaba possui obras no acervo da Galeria da UFES e já participou de coletivas em outros estados com artistas renomados como José Bechara, Manfredo de Souzanetto, Amilcar de Castro, entre outros.
Segundo a galerista Lara Brotas, a nova exposição da artista pede silêncio e convida para uma “pausa”. “Com delicadeza e originalidade, os trabalhos potencializam a reflexão, provocando no observador um resgate das suas próprias memórias”, explica.
Para a artista capixaba, a exposição representa um fechamento de um ciclo. “A cada série de trabalhos, abordo questões relacionadas às vivências pessoais, ao espírito humano e seus conflitos, às mudanças na nossa cultura. Para esta série me inspirei na gravura intitulada Melancolia de Albrech Dürer (1514), abordando a mesma temática, de uma forma poética, passando entre dor e o lúdico. Tracei um paralelo entre minha visão estética contemporânea e a linguagem alegórica adotada por ele durante o período da Renascença”, explica Lara.
Um dos destaques da exposição, que reúne mais de 30 obras entre objetos, colagens e pintura, é a peça logo na entrada da galeria que dá nome à individual da artista, a obra “O peso exato dessa leveza”. A artista explica que o nome veio de uma frase do livro ‘Seis propostas para o próximo milênio’ de Ítalo Calvino e se refere ao poema de Dante Alighieri.
Outra obra destacada pela própria artista é a "bile Negra" - um tapete feito de paninhos de crochê, novelos de retalhos de pano e esferas de vidro contendo tinta negra e vazios. Segundo Lara Felipe esta peça faz alusão ao pensamento da antiguidade grega, onde acreditava-se que o estado melancólico do sujeito era causado pela produção em excesso de bile negra no corpo, um dos quatros humores existentes no ser humano. A melancolia era atribuída aos artistas em geral, a conexão com o divino e a loucura.
Outro destaque é a peça "a dor dos Dias" - novelo de retalhos de pano em redoma de vidro. A "A dor dos dias" representa o processo sublimatório da dor e do pesar, consequentes da melancolia. “É a Purificação da alma através da passagem dos dias. Só o tempo e o esforço empenhado na recuperação do sujeito (simbolizados pelo movimento do enrolar de retalhos de panos surrados e marcados por nódoas transformando-os em novelos) detêm o poder de cura de todas as dores”, explica a artista.
A curadora Neusa Mendes conta que nesta exposição Lara Felipe se aproxima da maior criação estética de Albrecht Dürer, artista renascentista, cuja personificação alegórica, sobrecarregada de símbolos e mistérios, tornou-se a representação mais célebre da melancolia, afecção insubordinada à separação entre matéria e espírito.
“Esses objetos – cordas, roldanas, molho de chaves, pregos folheados a ouro, esferas de vidro e madeira recobertas de ataduras brancas e outras tantas em azul, objetos de madeira e pano e aparelho torcedor antigo – intermediam o estado entre seres e coisas, entram na matéria vertente da vida, solvem o presente na sua evanescência, nos paralisam os movimentos. Por mais diferentes que sejam os objetos reunidos, tudo conspira para que ao final se produza uma unidade impositiva, não tanto da ordem formal, mas afetiva. Eles nos falam do corpo, não da sua relação arrastada decididamente melancólica, mas como coisa do mundo, em direção à compreensão de um olhar de quem vê, e lhe parece pertencer a outro lugar. A artista tem o dom desconcertante de criar intimidade e delicadeza em tudo que organiza. Lara Felipe – uma guardiã de afetos”, explica Neusa.