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junho 16, 2015
Artur Lescher na Nara Roesler, Rio de Janeiro
Galeria Nara Roesler do Rio de Janeiro apresenta produção recente de Artur Lescher na individual Afluentes, com desdobramentos das pesquisas dos últimos dois anos
O ambiente iluminado da Galeria Nara Roesler do Rio de Janeiro é o cenário de Afluentes, nova individual do artista paulistano Artur Lescher. Entre 18.06 e 01.08.2015, ele exibe ao público carioca sua produção recente, cuja tônica são os desdobramentos das pesquisas dos últimos dois anos, em que mescla princípios da física e da mecânica à síntese semântica das esculturas que cria. O resultado é a subversão da fixidez e do peso próprios de suas matérias-primas em favor da leveza - e de impressões poéticas.
Lescher se apropria de matérias-primas e procedimentos industriais para criar um universo preciso e organizado de objetos, tensionado pelo deslocamento do espectador no espaço. Sem se dar conta, o observador dispara a possibilidade de alteração da perfeição matemática e do equilíbrio das obras pelo simples deslocamento do ar, que pressupõe o movimento de pêndulos, ainda que não se concretize, e pela leitura particular do que vê. Conceitos como balanço, igualdade e proporção são libertos do uso instrumental para reencontrarem seu caráter metafísico, amplificado pela pureza formal das obras.
O espaço expositivo será ocupado por nove trabalhos, alguns dos quais evocam imagens líquidas, como a obra Afluentes, desdobramento de O Rio, que integra o acervo do MAM de São Paulo. Se nessa última os rolos de monotipia e offset escorrem da parede até o chão, na versão atual os rolos de papel coloridos pelo artista, em tons de azul, preto e vermelho, por meio de processo industrial permanecem contidos, formando uma constelação de círculos.
A Cascata de metal parece escorrer, traduzindo a ideia de sua matriz natural em uma conformação geométrica. A tensão da imagem inspiradora contra material e forma utilizados na realização da escultura evidencia o jogo proposto pelo artista, que manipula a lacuna entre significante e significado. Em outras palavras, a impossibilidade de tradução perfeita da natureza pelo código cultural ganha liberdade poética, dando aos trabalhos um sentido quase primitivo, transcendente.
A obra Rio de Parede, formada por 17 roldanas e uma malha de metal que pende dessas estruturas, apresenta em sua dinâmica interna o desdobramento dos trabalhos da exposição Objeto Pantográfico, apresentada em 2013. As ondulações e fluidez de um rio ganham, dessa forma, uma representação estática capaz de transmitir o movimento do original. Nas palavras do artista, o trabalho se coloca em “relação com o estado líquido das coisas”.
Na mostra de 2013, Artur Lescher usou como fio condutor a figura do pantógrafo, instrumento que amplia ou reduz desenhos. Formado por dois vetores verticais e dois horizontais, reproduz em maior ou menor escala a figura desejada por meio do acompanhamento mecânico da mão, que traceja a forma original para o efeito se concretizar.
Naquela ocasião, a crítica britânica Isobel Whitelegg escreveu sobre o sentido amplo do pantógrafo como metáfora: "Outras obras têm em comum os princípios do mecanismo de extensão e retração dessa invenção em vez de sua forma literal. Elas evocam o pantógrafo enquanto corpo mecânico capaz de avançar e recuar, de mudar o seu alcance e regular sua densidade e, assim, ser percebido como sendo mais pesado ou mais leve: expandido para abranger o espaço em sua estrutura ou compactado para excluí-lo". Essa ideia ganha outras leituras nesta nova individual no Rio de Janeiro.
No âmbito da leveza extraída de materiais densos, os pêndulos Ann, em azul cobalto, e Suave, em alumínio anodizado, seguem a tradição de Lescher em criar esculturas extremamente delgadas que, suspensas, dão a impressão de flutuar por força própria. Mais do que isso, criam a tensão da possibilidade de se moverem a qualquer corrente de ar ou vibração sonora, apesar de seu peso as manter quase sempre fixas.
Utilizando-se da luz que entra pela claraboia da pequena sala anexa para potencializar seu efeito visual, o Pivô relaciona-se com o espaço onde se insere. “As peças tiram proveito de certas situações espaciais”, diz o artista. Em metal dourado, essa obra difere dos outros pêndulos pela forma como é suspensa, por seu ponto médio. Isso lhe confere um movimento irregular, como o ponteiro desorientado de uma bússola que não se move pela imantação da terra e, portanto, deixa de servir à sua lógica funcional.
Essa inversão dá sequência a conceitos abordados na mostra Nostalgia do Engenheiro (México, 2014), cujo título simboliza a remissão à formulação do mundo pela construção matemática, tão cara à filosofia moderna. Nela, a condição de possibilidade da ciência está atrelada à fundamentação metafísica de seus princípios, unindo universos que parecem antípodas na contemporaneidade. Na produção de Lescher, essa articulação é primordial.
Em sua obra, de maneira geral, e nesta mostra especificamente, o artista não suspende só os trabalhos, seja no teto ou na parede. Fazendo a manipulação ardilosa da percepção do espectador pelo contraste entre matérias e sentidos, entre forma e matriz, Lescher parece suspender o andamento do tempo.
Artur Lescher, nascido em 1962 em São Paulo, participou das edições de 1987 e 2002 da Bienal de São Paulo e da Bienal do Mercosul de 2005, em Porto Alegre, Brasil. Seus trabalhos estão incluídos em importantes coleções públicas, tais como Pinacoteca do Estado de São Paulo, São Paulo, Brasil; Instituto Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro, Brasil; Museu de Arte Moderna de São Paulo, São Paulo, Brasil; Biblioteca Luis Angel Arango – Bogotá, Colômbia; Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro, Brasil; Museu de Arte Contemporânea – MAC-USP, São Paulo, Brasil; Centro Cultural São Paulo, São Paulo, Brasil; Instituto Cultural Itaú, São Paulo, Brasil; Museu de Arte Latinoamericana de Buenos Aires, MALBA, Buenos Aires, Argentina; Museu de Arte Moderna de Buenos Aires, Buenos Aires, Argentina; Museum of Fine Arts, Houston, EUA; Philadelphia Museum of Art, Filadélfia, EUA.