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setembro 13, 2014
Ilusões na Daros, Rio de Janeiro
Exposição reúne cerca de 50 obras, entre instalações, vídeos, fotografias, desenhos e objetos, pertencentes à Coleção Daros Latinamerica, de Zurique, Suíça
A Casa Daros apresenta a partir de 13 de setembro de 2014 a exposição “Ilusões”, com curadoria de Hans-Michael Herzog e Katrin Steffen, que reúne cerca de 50 obras pertencentes à Coleção Daros Latinamerica, de Zurique, Suíça, dos artistas Fernando Pareja & Leidy Chavez (Colômbia), José Damasceno (Brasil), José Toirac (Cuba), Leandro Erlich (Argentina), Liliana Porter (Argentina), Los Carpinteros (Marco Antonio Castillo Valdés e Dagoberto Rodríguez Sánchez, de Cuba), Luis Camnitzer (Uruguai), Mauricio Alejo (México) e Teresa Serrano (México).
As obras irão ocupar todo o espaço expositivo principal da Casa Daros, no primeiro andar, em um circuito que irá provocar o espectador de múltiplas maneiras a respeito da ideia de ilusão, a partir de instalações, vídeos, fotografias, desenhos e objetos, e que trazem uma abordagem lúdica e muitas vezes bem-humorada. Desde o efeito “supostamente apenas óptico da mera ilusão sensorial”, como nos surpreendentes vídeos curtos de Mauricio Alejo; ao “caráter lúdico teórico-perceptivamente bem elaborado entre signo, significado e significante”, nos trabalhos de Luis Camnitzer; na “(des)-ilusão mental” de Leandro Erlich e Liliana Porter; ou a ilusão como “fenômeno social, político, cultural, religioso, mercadológico ou midiático”, visível nas obras de Teresa Serrano, José Toirac e Leidy Chavez & Fernando Pareja; como também “em toda a sua ambiguidade, na condição de mero paradoxo cheio de um absurdo de toque dadaísta”, em José Damasceno e Los Carpinteros.
“Ilusões são imagens do desejo, imagens fantasiosas ou também autoenganos. Nossa vida está cheia delas. Só que nem sempre gostaríamos de admitir que é assim. Por isso existe, quase como antítese para que seja possível sobreviver mais facilmente, o conceito de realidade, ao qual gostamos (às vezes com esforço e convulsivamente) de tentar nos agarrar”, diz Hans-Michael Herzog . “A exposição abre o olhar para os espaços multifacetados e complexos, difíceis de ser interpretados, que oscilam livremente entre uma suposta realidade e a assim chamada ilusão – espaços que estão cheios de inúmeras ficções e projeções, cuja definição mais detalhada foge completamente a qualquer categorização”.
“Será que a arte não é mais do que ilusão? Ou será que, no fim das contas, ela é antes real, talvez até mais real do que a assim chamada realidade? O que é, aliás, realidade? A pura ilusão?”, questiona o curador, logo acrescentando que “Ilusões” faz perguntas como essas, “sem poder nem querer respondê-las”. “A exposição é um convite à percepção mais consciente, a pensar e a compreender mais profundamente o que pode levar a descobertas mais abrangentes, que talvez agucem nossa capacidade de diferenciar o que significa realidade, o que significa ilusão”. “O observador poderá, ainda, em seu processo de percepção, conhecer e reconhecer um pouco melhor a si mesmo”, afirma.
MICROSITE
Um microsite foi criado especialmente para a exposição. Com conteúdo multimídia e ferramentas interativas, ele apresenta o tema e as obras da mostra, além de conter breves ensaios e entrevistas sobre os artistas e seus trabalhos. Para visitar, acesse: www.ilusoes.casadaros.net.
PUBLICAÇÃO
A exposição será acompanhada de uma publicação de 48 páginas, formato 15cm x 21cm, com fotos das obras e textos de Hans-Michael Herzog, dos artistas Luis Camnitzer e José Damasceno, do crítico Orlando Britto, e Katrin Steffen, que também fez entrevistas com os artistas .
OBRAS/ARTISTAS
Em seu trabalho “Sem título”, de 2012, a dupla de artistas colombianos Fernando Pareja & Leidy Chavez (Fernando Pareja, 1979, e Leidy Chavez, 1984, Popayán, Colômbia) constrói uma espécie de cinematoscópio, com luz estroboscópica, em que bonequinhos de cera aparentemente caem no buraco central da roda que gira sem cessar.
“O presságio seguinte (experiência sobre a visibilidade de uma substância dinâmica)”, do brasileiro José Damasceno (1968, Rio de Janeiro), criada em 1997, só foi vista no Brasil duas vezes: no ano em que foi feita, na coletiva “Intervalos”, no Paço das Artes, e em 2000, na Mostra do Redescobrimento: Brasil +500, ambas em São Paulo. No exterior foi apresentada em 2001, na exposição “Experiment Experiencia”, no Museu de Arte Moderna de Oxford, Inglaterra, e em “Al calor del pensamiento – Obras de la Daros Latinamerica Collection”, na Sala de Exposiciones Boadilla da Fundación Banco Santander, em Madri, em 2010. No texto “Un altro attimo”, escrito pelo artista em 2001, ele afirma que “a realidade, ou o que se convencionou chamar de real, possui um sem-número de estratos, camadas, dimensões, densidades, estados, porosidades, canais, com uma brutal complexidade estrutural que se move, que cresce e se modifica segundo um outro imenso universo de pontos de vista distintos”.
Em seu vídeo “Opus”, de 2005, com pouco menos de cinco minutos, o artista cubano José Toirac (1966, Guantánamo) mostra em preto-e-branco uma sucessão de números, todos eles acompanhados por um áudio retirado de discursos de Fidel Castro, com sua inconfundível voz. Dessa forma, a retórica interminável do discurso paternalista fica reduzida a um tipo de “ilusão minimalista sonoro-numérica”, com doses de humor.
Do artista argentino Leandro Erlich (1973, Buenos Aires) estarão três instalações: “Pedras” (2003), “Provadores” (2008) e “As portas” (2004). Em “Pedras”, o público vê pegadas em movimento sobre um chão coberto por seixos. Em “Provadores”, o artista constrói uma série de provadores de roupa em que, ao entrar, o visitante se vê confrontado com infinitas perspectivas e reflexos de si mesmo. Em “As portas”, o espectador se encontra diante de algumas portas fechadas, em que pela fresta entra uma luz, que o deixa intrigado. O artista observa que “o cinema influenciou nosso imaginário de múltiplas formas e foi capaz de gerar também uma memória coletiva”. “Há momentos nos quais podemos nos sentir vivendo uma ficção, e essa ficção identificamos como cinema. Nunca esteve tão vigente aquela resenha de Oscar Wilde sobre a vida imitando a arte”. Ele comenta que “evidenciar o truque é uma forma de reduzir a importância do fenomenológico e convidar a uma interpretação conceitual da obra”.
Liliana Porter (1941, Buenos Aires) cria nas gravuras “Prego” (1972), “Costura” (1970) e “Rasgo” (1974) um “truque visual”, em que pode se confundir um prego impresso com um prego real, ou a imagem de uma sombra com uma sombra verdadeira. “O que me interessa dessa confusão visual é questionar a substância da realidade e do tempo. A distância entre as palavras e as coisas, por assim dizer”, diz a artista.
Inteiramente inédita, a instalação “16m” (2010), de Los Carpinteros, dupla cubana formada por Marco Antonio Castillo Valdés (*1971, Camagüey) e Dagoberto Rodríguez Sánchez (*1969, Caibarién), é formada por 200 paletós de terno preto, furados irregularmente em seu lado direito, que, enfileirados e pendurados em uma haste de metal, criam um buraco de 16 metros de longitude.
“Ilusões” traz pela primeira vez ao Brasil um generoso conjunto de trabalhos do artista conceitual Luis Camnitzer (1937, Lübeck, Alemanha, criado em Montevidéu). São ao todo 31 obras, dentre elas doze de suas famosas “caixas”. Luis Camnitzer afirma em seu texto “O artista, o cientista e o mágico”, de 2011, que, “deixando de lado as deformações culturais, se nos referirmos a conceitos cognitivos, a única diferença entre arte e ciência está em que na arte podemos trabalhar sem ter de utilizar como referência a lógica, e podemos suspender a relação causa-efeito. Isso não significa que afastar essas duas condições nos exime das exigências propostas ao cientista. O artista também deve ser responsável, tem de servir ao bem comum, ser rigoroso e capaz de prestar contas”. “É o mágico, não o artista, quem está no extremo oposto do cientista. Isso porque a essência do ato mágico está na habilidade de esconder o processo e de mantê-lo secreto”, continua. “O cientista trata aqui de explicar o incrível. O mágico cuida de simular o incrível. O artista ocupa-se de apresentar o incrível para expandir o mundo do crível”.
Em entrevista a Katrin Steffen, o mexicano Mauricio Alejo (1969, Cidade do México) comenta que seus vídeos curtíssimos presentes na exposição – “Rachadura” (2002), “Linha” (2002), “Galho” (2003), “Vermelho” (2003), “Buraco” (2002) – “são sobre ilusão de óptica”. Mas ele ressalta “que o verbal também tem um papel importante: o título não é apenas uma descrição, mas uma instrução sobre o que se deve ver”. “O verbal tem uma estrutura e uma autoridade que faltam ao visual. Quando certo ponto da trama é atingido, existe uma fratura que vai do verbal ao visual, deixando o espectador vulnerável e aberto para se relacionar de maneira menos preconceituosa com os materiais. Quando isso acontece, eu gosto de como a experiência se torna básica”.
Três das quatro obras de Teresa Serrano (1936, Cidade do México) em “Ilusões” estão relacionadas com a cabeça: “5 Rolling Stones” (1999), cinco bolas revestidas de diferentes perucas; “Moldagem a sopro” (2012), quatro chapéus simbólicos da Igreja Católica – o solidéu, a mitra, o barrete e o chapéu Saturno – em vidro soprado; e “Do mesmo diâmetro” (2012), três coberturas de cabeça , do mesmo diâmetro, usadas pelas grandes religiões monoteístas: a cristã, a hebraica e a islâmica. Em “Boca de tábua” (2007), vídeo de quase treze minutos em preto-e-branco, vemos uma mulher em uma rotina de repetição dentro de uma casa.