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março 14, 2014
Cristina Salgado e Renata de Bonis na Laura Marsiaj, Rio de Janeiro
A próxima exposição da artista Renata De Bonis (São Paulo, 1984) diz respeito a uma experiência recente que teve de residência por alguns meses na Islândia. Esse país, por vezes utilizado na cultura contemporânea como um ícone daquilo que poderia ser um espaço muito diferente do Brasil - gélido, pequenino e com paisagens espetaculares que ecoam os tons da pintura romântica do século XIX – foi recodificado pela experiência da artista. Ao observarmos sua trajetória, é possível associar sua produção à articulação entre pintura, paisagem e deslocamento. Ao observarmos sua nova série de trabalhos aqui reunidos na exposição de nome “Uma pedra por dia”, talvez possamos perceber uma nova nuance de sua prática, ou seja, de imagens que davam conta da amplitude de um espaço (natural ou doméstico), sua atenção agora se volta para detritos, pedras coletadas “no meio do caminho”. Esse pode ser considerado, então, um momento para que o público e a crítica apreciem as novas pinceladas inquietas dessa paleta que se repete, mas de nenhuma forma entedia o nosso olhar.
Sobre a artista
Renata De Bonis nasceu em 1984, em São Paulo, onde vive e trabalha. Formou-se no curso e Artes Plásticas da FAAP-SP em 2006. Embora resida em São Paulo, é na busca de espaços e temas distantes do meio urbano que a artista encontra suas principais referências pictóricas. Em suas telas, paisagens silenciososas e cores neutras nos remetem a situações de solidão e vazio existencial. Em busca de paisagens ermas para desenvolver seu trabalho, Renata viajou pelo mundo. Em 2009, passou uma temporada no deserto da Califórnia, frequentando parques nacionais como o de Joshua Tree. Em 2013 morou na Islândia buscando paisagens inóspitas para desenvolver suas pinturas. O uso opaco da tinta a óleo com cera e a paleta de cinzas lúridos estabelecem a melancolia e a ressonância lúgubre de suas imagens, equilibradas pela tensão sutil na passagem de tons, entre os planos da pintura.
A exposição “A mãe contempla o mar“, de Cristina Salgado que será apresentada no espaço anexo da galeria laura marsiaj a partir do dia 18 de março de 2014, se compõe de objetos realizados entre 1999 e 2002 e desenhos inéditos produzidos entre 2001 e 2012.
Mesmo sendo de séries com nomes e datas diferentes, são trabalhos surgidos a partir de uma mesma técnica, a modelagem em papel maché, e um mesmo inventário simbólico, com suas superfícies rosadas, que imitam a pele clara com algum realismo. Mas é importante mencionar que, ainda que estejam presentes alguns elementos realistas – além da "pele", sapatos e dedos com longas unhas vermelhas – essas obras se referem ao corpo psíquico, ou ao corpo traumático, o que talvez se possa dizer de todos os trabalhos da artista que se relacionam ao corpo humano.
A presença de uma dimensão feminina na obra da artista é uma questão importante, ainda que não seja a única, nem excludente de outras possibilidades de produção de sentidos. Todas as obras, com exceção do Homem bebê (série Instantâneos), estariam relacionadas ao gênero feminino de modo um tanto enfático pela presença dos scarpins ou pelas unhas vermelhas.
Há dois desenhos mais recentes, de 2012, que retomam essas formas, agora com mais representação de volume, mas volumes moles, pesando sobre cadeiras. Em cada um deles está presente uma pequena paisagem marinha. Em um desenho de 2003, o único com uma figura humana mais convencional, também sentada em uma cadeira, está a mesma paisagem marinha. Nessas imagens, é como se a contemplação de uma representação do mar envolvesse uma introspecção – um olhar para um horizonte interno. Esses desenhos têm o título de La mer.
Esse entrelaçamento de formas orgânicas, maternais e paisagens marinhas são, de certa forma, junto com a homofonia das palavras mãe e mar em francês, o motivo do título em português: A mãe contempla o mar. La mère regarde la mer funciona como uma circularidade – trabalhos antigos e recentes que volteiam por um mesmo território de vocabulário simbólico e formal.