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fevereiro 6, 2014
Rafael França na Jaqueline Martins, São Paulo
Rafael França - Prelúdios, Galeria Jaqueline Martins, São Paulo, SP - 12/02/2014 a 15/03/2014
Como parte do calendário de exposições de 2014, a Galeria Jaqueline Martins apresenta de 12 de fevereiro a 15 de março a exposição “Prelúdios: Rafael França”, com obras do artista Rafael França (1957-1991) e curadoria de Vitor Butkus. Na seleção de obras aparecem peças gráficas produzidas em São Paulo, entre 1978 e 1981, e vídeos realizados entre 1982 e 1991, época em que o artista viveu em Chicago (EUA). Contando também com documentos e anotações processuais de França, a seleção é um recorte que sinaliza momentos de transição na produção do artista.
Rafael França teve participação fundamental nas experiências que aproximaram arte e tecnologia nas últimas décadas do século 20, no Brasil. Inquieto, já no final dos anos 1970 fazia uso inovador de meios como o off-set e a fotocópia. Nos anos 1980, depois de passar pela videoinstalação, pela performance e pela intervenção urbana com o grupo 3NÓS3, destacou-se pelas propostas inovadoras na videoarte, com uma produção em que subverte, por exemplo, as formas regulares de ficção - seja ela cinematográfica ou televisiva. Morto precocemente em 1991, França tratou questões como a sexualidade e o corpo em obras caracterizadas, também, por uma intensa pesquisa das possibilidades da narrativa.
Nos seus trabalhos gráficos, feitos ainda em São Paulo, sobressai-se uma atenção aos processos de reprodução técnica. A videografia de França acusa, contudo, um ponto de virada, um turning point: os problemas estritos do meio cedem espaço, ali, para inquietações de ordem subjetiva, posicionamentos éticos (statements) diante de assuntos polêmicos como o suicídio, moções de desconforto em resposta à dificuldade das relações interpessoais.
A partir do seu contato com o vídeo, como estudante e, depois, professor na School of the Art Institute of Chicago, França fez acontecer uma transformação no seu leque de preocupações artísticas. Esta exposição apresenta uma leitura renovada dessa transição entre um experimentalismo formal e uma decidida implicação subjetiva. As escolhas curatoriais visam justamente o momento de transição, priorizando trabalhos que imiscuem o raciocínio técnico e o transbordamento (ainda que silencioso) das paixões. Além de vídeos, colagens, off-sets e fotocópias, serão exibidos.
Vídeos presentes na exposição:
“Reencontro”, 1984”, vídeo, 7'
O primeiro trabalho de uma trilogia que investiga a linguagem da narrativa de vídeo. Homem solitário confronta-se com seu próprio passado traumático e sua mortalidade. Confundindo as convenções de narrativa, o vídeo não tem som sincronizado ou história linear. A linguagem reflete a condição humana pós-moderna e as negociações complicadas entre emoção e modernidade.
“Getting Out”, 1984, vídeo, 5'
Neste segundo experimento sobre a narrativa de vídeo, objetos do cotidiano assumem significância psicológica quando a protagonista combate a opressão de seu ambiente doméstico. O realismo aparente é uma estratégia artificial para o desenvolvimento de uma trama que não traz a realidade, mas um estado de espírito.
“Without Fear of Vertigo”, 1987, vídeo, 11'
A obra questiona os conceitos de "ficção" e "não-ficção". Um jovem cometeu suicídio por causa de uma doença terminal. Um amigo que documenta a morte a pedido do suicida é julgado e preso como cúmplice. O testemunho do personagem é pontuado por entrevistas com pessoas reais discutindo as questões que se apresentam. Nesse vídeo, o próprio França e vários amigos brasileiros e norte-americanos discutem as experiências do suicídio e do enfrentamento da morte, exatamente num momento em que a Aids começa vagarosamente a aparecer como um flagelo (até aquele momento) restrito à comunidade dos homossexuais.
“O Profundo Silêncio das Coisas Mortas”, 1988, vídeo, 7'15"
Combina inovações formais e experiências com narrativa de vídeo. Homens falam de suas memórias sobre outros homens e como lidaram com o final de seus relacionamentos. Filmagens com câmeras portáteis no Carnaval do Rio de Janeiro e imagens distorcidas ou alteradas interrompem as revelações pessoais.
“Insônia”, 1989, vídeo, 8'23"
Um homem acorda no meio da noite e não consegue voltar a dormir. O vídeo explora os pensamentos persistentes que o perseguem enquanto permanece deitado e acordado. Pontuado pela aparição de uma drag queen cantando uma música romântica, combina experimentação formal com a lógica dos sonhos para retratar o sono como uma atitude psicológica ameaçadora e desconcertante.
“Prelúdio de uma Morte Anunciada”, 1991, vídeo, 5'
é uma verdadeira celebração dos valores que norteiam sua vida e dos quais ele jamais abriu mão, nem mesmo nos momentos de maior agonia de sua doença. No vídeo, o próprio França troca carícias com seu companheiro Geraldo Rivello, enquanto aparecem na tela os nomes de todos os amigos brasileiros e norte-americanos que foram vitimados pela Aids e a trilha sonora deixa correr uma dilacerante interpretação de La Traviata pela soprano brasileira Bidu Sayão, gravada em 1943. A última coisa que aparece no vídeo é o texto: "Above all they had no fear of vertigo" (Acima de tudo, eles não tiveram medo da vertigem), que claramente interliga Without a Prelúdio.
Fontes das sinopses: Heloise Costa (org.). Rafael França: sem medo da vertigem, Marca d’Água, São Paulo, 1997.