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novembro 8, 2013
Elisa de Magalhães no Oi Futuro Ipanema, Rio de Janeiro
"Todo homem é uma ilha /Nenhum homem é uma ilha". Esta é uma querela que aponta para distintas possibilidades, contraditórias, ambivalentes, de entendermos a construção do conceito de indivíduo. Sentido solitário ou desejo de agregação?” – Marcelo Campos, curador da mostra
Elisa de Magalhães - Nenhuma Ilha, Oi Futuro Ipanema, Rio de Janeiro, RJ - 10/11/2013 a 22/12/2013
A solidão, mesmo (ou principalmente) nos formigueiros humanos; o isolamento voluntário, a segregação social em guetos, a dissolução na grande paisagem são os temas que norteiam a exposição Nenhuma Ilha, de Elisa de Magalhães, que começa dia 9 de novembro no Oi Futuro Ipanema. A mostra – que tem curadoria de Marcelo Campos -foi criada, quase totalmente - em consonância com o conceito -, a partir de imagens captadas da janela da casa de Elisa, que, como uma ilha, observa o que se passa à sua volta.
A exposição, na verdade, começa no saguão do elevador que conduz à galeria – o espaço expositivo. Ali, ouve-se a narração de um estranho diálogo travado por dois religiosos, inspirado em personagens criados a partir de ficções de Lewis Carroll (Alice através do espelho) e de Umberto Eco (A Ilha do dia anterior). A narração é supostamente feita por um personagem da dupla Jorge Luis Borges e Adolfo Bioy Casares. Esse diálogo, que atravessa tempos (são livros escritos com muitos anos de diferença), já anuncia a suspensão temporal que a exposição Nenhuma Ilha vai provocar no visitante. É a obra sonora –Catedral -, recentemente apresentada no Mosteiro de Alcobaça, em Portugal, na exposição coletiva ObraNome III, com curadoria de Wagner Barja.
SEIS TRABALHOS – A VISÃO DA JANELA INDISCRETA
O primeiro trabalho, dos seis que compõem a exposição Nenhuma Ilha, de Elisa de Magalhães, é o vídeo que batiza o conjunto, exibido no saguão do Oi Futuro Ipanema. Projetado em uma tela de 4 metros, foi produzido em 2010 a partir da janela de sua casa/atelier, em Santa Teresa. Usando uma potente lente zoom, Elisa filmou o tráfego carioca no início da noite - carros nos viadutos que margeiam a Baía de Guanabara, a alguns quilômetros de distância, que parecem andar em círculos, como brinquedos, em viadutos que não levam a lugar nenhum.
A janela como posto de observação é personagem importante – desse seu posto, Elisa produziu ainda outros olhares. A instalação Mar Aberto apresenta duas fotos - semelhantes, mas feitasem dias diferentes - da paisagem da cidade vista do alto. Parece um mar, com rasgos de luz. O livro O Mar, de John Banville, completa a obra. Colocado em uma caixa de acrílico, aberto no meio, exatamente na página que separa o capítulo do capítulo 2, onde se lê: “(...) Tudo eram contornos de sal, luminância...Gotas de água caíam, formando um fio de prata na ponta do remo. Vejo o navio negro ao longe, assomando imperceptivelmente, aproximando-se cada vez mais. Lá estou eu. Posso ouvir o som de sua sirene. Lá estou eu, quase chegando”.
Já Iluminações é a foto feita de uma escadaria vazia, na comunidade dos Prazeres, em Santa Teresa, iluminada por um poste de luz. A distância e a pouca luz corrompem a imagem e transformam a paisagem em volta numa mancha azulada. O vídeo Escrita foi produzido a partir da leitura do conto de Jorge LuÍs Borges A Escrita do Deus. O monitor é instalado no chão da galeria, simulando um buraco onde está a própria Elisa, que olha para cima a cada vez que um personagem oculto abre a tampa desse lugar.
No quinto trabalho, A Vida dos Outros: Passagens, a janela da artista volta a ser protagonista - produzido especialmente para o videowall com uma câmera equipada com um potente zoom, mostra o registro de escadas e passagens das comunidades em seu entorno, de diae de noite, com gente ou sem gente. Elisa transforma o vIdeowall numa espécie de tabuleiro, onde dia e noite se opõem nas telas, num sobe e desce de escadas que não termina nunca.
O último trabalho, a foto O Olho da Ilha, funciona como uma espécie de marca visual da exposição – a foto de uma gota d’água caindo na superfície de uma piscina natural, que fica na vizinhança do estúdio. “E chamei de Olho da Ilha, por se tratar de uma ilha de água cercada de floresta por todos os lados”, explica.
“Elisa de Magalhães observa, de um ponto de vista insular, a janela de seu apartamento, o que acontece em seu entorno. Assim, faz do acontecimento comum, um advento do memorável. Aqui nos colocamos a questionar, quaisquer ações, quaisquer gestos são passíveis de narração?”- Marcelo Campos, curador.
Elisa de Magalhães (veja currículo no final do texto) desenvolveu este trabalho como continuidade de sua pesquisa que, a princípio, tece o próprio corpo como centro do olhar. Nenhuma Ilha é um desdobramento de um projeto desenvolvido entre 2010 e 2011 e, parte dele exposto em 2011,em São Paulo, chamado A Vida dos Outros. A artista foi selecionada para a Temporada de Projetos 2011, do Paço das Artes, ondeapresentou a instalação A Vida dos Outros: Parque laje – labirinto. Um livro será lançado em maio, a partir da exposição.