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julho 1, 2013

Waldemar Cordeiro no Itaú Cultural, São Paulo

Waldemar Cordeiro e sua arte de extrema vanguarda são tema de mostra retrospectiva no Itaú Cultural

Cerca de 250 obras ocupam os três pisos do espaço expositivo do instituto em mostra que reúne, pela primeira vez, as principais obras do artista e perpassa o seu processo criativo – da pintura, o Concretismo e o Movimento Ruptura, nos anos 50, ao pioneirismo na arte computacional na década de 70 – com a exibição de obras inéditas, passando por seus projetos urbanísticos e de paisagismo

Waldemar Cordeiro - Fantasia exata, Instituto Itaú Cultural, São Paulo, SP - 04/07/2013 a 22/09/2013

“Tenha certeza de que essa exposição é o lançamento de um artista histórico.” Com esse entusiasmo Analivia, uma das duas filhas do artista, define Waldemar Cordeiro: Fantasia exata. A exposição mais completa que o artista ganhou até hoje abre no Itaú Cultural no dia 3 de julho, para convidados, e permanece em cartaz para o público a partir do dia seguinte e até 22 de setembro.

Com curadoria de Arlindo Machado e Fernando Cocchiarale, a mostra traça em cerca de 250 obras o percurso criativo desse artista visionário, arquiteto urbanista e paisagista, que atuou no movimento Concreto, engendrou o Ruptura, nos anos 50, e deu um largo passo, na década de 70 ao mergulhar na arte computacional – ou arteônica, segundo definição do próprio artista.

Ela ocupa os três andares do espaço expositivo do Itaú Cultural – um deles reservado para exibir a arte computacional, da qual Cordeiro foi pioneiro no Brasil e um dos primeiros a usar esta linguagem no plano internacional até a interrupção de sua produção pela morte prematura há exatos 40 anos. Reproduções de algumas de suas obras podem, ainda, ser apreciadas e manuseadas na exposição virtual criada pelo Núcleo Inovação do instituto. Fora da instituição, uma recriação ao natural de uma de suas criações paisagísticas, pode ser apreciada ao ar livre, ao lado do Auditório Ibirapuera.

Nascido em Roma em 1925, o artista veio viver no Brasil com pouco mais de 20 anos, em 1946. Trabalhou como jornalista, crítico e ilustrador para jornais. A sua arte produzida nos anos 50 reúne atributos de arte concreta nos materiais e processos usados e na linguagem em busca de uma redução nas formas de expressão. Seguindo o conceito do grupo Ruptura, e formado por outros artistas como Geraldo de Barros, Luiz Sacilotto e Judith Lauand em 1952, a sua produção se caracteriza pelo abstracionismo geométrico e pelo uso de materiais industriais. Em paralelo, o artista desenvolveu trabalhos urbanísticos e de paisagismo.

Ao desembocar na arteônica nos anos 70, em um tempo em que os equipamentos eletrônicos eram rudimentares, ele projetou internacionalmente a cultura artística brasileira. Morreu em junho de 1973, deixando dezenas de projetos em andamento. Analivia, ainda sem saber o que viriam a representar, os guardou em tubos de papel cartão e só os abriu passados quase 40 anos, quando começou a preparar esta exposição com os curadores e o Núcleo de Artes Visuais do Itaú Cultural. O instituto trabalha em parceria com a família, viabilizou o restauro de um grande conjunto de obras de arte, entre telas, objetos, estudos e desenhos, contratou uma pesquisadora para levantar a produção textual e fazer a catalogação das obras, e em 2014 lançará um livro com a organização de sua produção de textos publicados como jornalista e crítico desse singular artista.

A exposição

Waldemar Cordeiro: Fantasia exata passa por todas essas fases do artista, incluindo sua verve crítica, política e social, formando um painel abrangente de sua obra, além de estudos e desenhos inéditos. Aprofunda, assim, a compreensão do pensamento e o processo criativo do artista.

Começa pelo piso 1M – um acima do piso de entrada – com obras do Ruptura, tanto de Cordeiro, quanto de outros artistas do grupo. Além dos acima citados, estão Lothar Charoux, Judith Lauand e Hermelindo Fiaminghi. Fotos representam obras originais perdidas de Leopoldo Haar e também de Kazmer Féjer, que não deve ser exposta por necessidade de restauro. Logo na entrada, o visitante avista o importante Manifesto Ruptura, escrito por Cordeiro em 1952, assim como o artigo publicado por ele sobre o tema, no ano seguinte, no jornal Correio Paulistano.

Ainda neste andar, além das obras representativas deste movimento, o público já começa a entrar no universo criativo do artista podendo apreciar outros trabalhos, e em vitrines que também abrigam desenhos, objetos e fotos – algumas pessoais e de seu cotidiano.

Outros textos de Cordeiro permeiam os três andares. Ele era altamente teórico e embasava o seu ponto de vista social, patente em toda a obra, escrevendo para delinear a arte que ia produzindo. Os escritos, no entanto, surgem no espaço expositivo como fio condutor para os visitantes. “Esta é uma exposição pensada como um roteirista pensa no filme”, conta Cocchiarale. “A imagem prevalece.”

Acompanhando o processo de maturação do artista, mas não necessariamente em ordem cronológica, o andar seguinte – o 1S, um abaixo do piso de entrada –, apresenta as obras produzidas unicamente por ele antes da arte computacional. Elas apontam, segundo Cocchiarale, inflexões essenciais pelas quais o trabalho do artista passou entre 1962 e 1969: abandono dos princípios concretistas nas pinturas feitas com jatos de tinta e nas pinturas gestuais com colagens; uma caracterização da construção de obras a partir da apropriação de objetos (arte concreta semântica), também chamados popcretos por Augusto de Campos. Entre elas, Cor-relação e Quadrados Concêntricos.

Por fim, o 2S, logo abaixo, está inteiramente reservado para a arte computacional. “Muito cedo, Cordeiro se deu conta de que as formas artesanais de arte iriam sofrer um impacto sem precedentes com o advento das novas tecnologias (do computador principalmente), a absorção de processos industriais e a incorporação de novos circuitos de difusão”, observa Machado.De acordo com ele, especialista em arte eletrônica, embora a maior parte dos pioneiros da computerart, nos anos 1960 e 1970, tenha sido europeia e norte-americana, Waldemar Cordeiro não apenas descentrou esse movimento, deslocando-o para fora do Primeiro Mundo, como também deu uma dimensão crítica a essa corrente artística, acrescentando às imagens o comentário político-social.

Um exemplo é A Mulher que Não É BB (Brigite Bardot), a última realizada por ele. Em um tempo em que não existia computação gráfica nos moldes facilitadores de hoje, a obra reproduz graficamente, pontilhada com todas as nuances do preto ao branco em um computador IBM 360, o rosto da pequena vietnamita atingida por essa terrível bomba de Hiroshima, jogada sobre a aldeia que lhe dá nome, e cuja foto correndo nua e desesperada, rodou e chocou o mundo dos anos 70.

Exposição virtual e jardim

O Núcleo Inovação, do Itaú Cultural, recria virtualmente alguns trabalhos do artista. Um computador instalado no espaço expositivo abre caminho para acessar Parque Infantil do Clube Esperia, projeto de paisagismo apresentado em 3D. Por ali mesmo, o visitante acessa, via menu, a visualização de outras obras que formam a Exposição Virtual, igualmente criada por esta equipe. Na mesma linha, no Piso 2S é apresentado Beabá, programa que cria e imprime poemas formados por palavras geradas de forma aleatória, assinado por Cordeiro e Giorgio Moscati. Nesse caso, o computador imprime os poemas seguindo muito de perto o código original de Moscati e o público tem como disparar uma nova impressão.

Com concepção e adaptação de André Vainer, o instituto reproduz ao natural, ainda, ao lado do Auditório Ibirapuera, no Parque Ibirapuera, uma das obras paisagísticas realizadas por Cordeiro – esta para a residência Keutenedijan.

Posted by Patricia Canetti at 8:21 PM