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abril 12, 2013
Alex Vallauri no MAM, São Paulo
Trajetória do precursor da arte de rua no país é enfocada na exposição Alex Vallauri: São Paulo e Nova York como suporte, que tem abertura no MAM em 16 de abril
Curadoria de João Spinelli inclui obras em técnicas e suportes tradicionais que mostram a evolução do artista até o grafite, a arte postal e a fotocópia
Irreverente, ousado e precursor, Alex Vallauri é tema da retrospectiva que o Museu de Arte Moderna de São Paulo abre em sua Grande Sala no dia 16 de abril, a partir das 20h. Com curadoria de João Spinelli, a mostra Alex Vallauri: São Paulo e Nova York como suporte explora em cerca de 170 obras em técnicas e suportes variados as diversas facetas do “enfant terrible” da arte dos anos 1970-80, que revolucionou a cena brasileira como um dos primeiros artistas do país a transferir a maestria visual para os muros, principalmente em São Paulo e Nova York.
O patrocínio da mostra Alex Vallauri: São Paulo e Nova York como suporte é da Sabesp.
Vallauri, nascido Alessandro Marco Vallauri em 1949, na cidade etíope de Asmara, teve uma carreira tão brilhante quanto meteórica, interrompida por sua morte precoce, aos 37 anos, em São Paulo. Nesse pouco tempo, teve um trabalho de grafite sobre embalagens de presentes elogiado por Andy Warhol; foi mencionado como um dos grandes nomes da arte de seu tempo pelo historiador de arte Edward Lucie-Smith, um dos mais influentes do século 20; participou de quatro Bienais de São Paulo (e não cinco porque perdeu o prazo para enviar obras para uma delas quando estava em NY); foi selecionado para a exposição Arte fantástica na América Latina pelo Indianapolis Museum; e teve seus livros de artista incluídos no acervo da Biblioteca Nacional de Washington.
Tudo aconteceu muito rápido na vida do determinado Vallauri, que segundo Spinelli, “contagiava a todos com sua energia e sua criatividade, fazia muitas amizades, como Keith Harring e Jean-Michel Basquiat (com quem grafitou ruas de NY), por exemplo”. Iniciou seus estudos em artes aos 14 anos na Associación Estimulo de Bellas Artes de Buenos Aires, onde a família morou até mudar-se para Santos em 1964. Assumiu o Brasil como seu país, naturalizando-se brasileiro.
De seu ingresso no curso de Comunicação Visual da Faculdade de Artes Plásticas da Faap (onde conheceu Spinelli, de quem se tornou amigo para toda a vida) à primeira participação como artista em uma Bienal, não se passaram nem cinco anos: “em 1968 ingressamos na faculdade; no ano seguinte, 1969, Vallauri foi monitor na Bienal de São Paulo; em 1971, ele já foi incluído na seleção de artistas da Bienal, em uma sala dedicada à gravura, ao lado de nomes consagrados. Ele tinha apenas 22 anos e já era reconhecido como um gravurista de técnica apurada”, conta João Spinelli. Tanto que em uma viagem que fez à Europa entre 1975-76 para aprimorar-se na técnica, foi estagiar no Litho Art Center, de Estocolmo, e acabou por ser convidado a trabalhar lá.
A transição das gravuras, que gradativamente ganharam uma temática kitsch, para os muros de São Paulo e, posteriormente, Nova York, foi uma consequência da inquietude e da necessidade de inovação presentes no trabalho e na personalidade do artista. Partindo das estampas da Santa Ceia em camisetas para as botas, luvas e o Mandrake que saía da própria cartola, Vallauri criou um universo colorido que fazia uma crítica bem-humorada e sutil do sonho da classe média, de costumes e de valores mediados pelo consumo e marcados pelo fetichismo dos anos 1970 e 80.
Mas os muros seriam pouco para ele, que grafitou também objetos como cadeiras, televisões e até um secador de cabelo um bidê e uma lixeira, que faziam parte de sua instalação “A rainha do frango assado” e estarão na mostra. Como muitos colecionadores queriam trabalhos de Vallauri, mas não queriam fixa-los diretamente em suas paredes, o artista criou a técnica de grafite em placas de PVC cortadas posteriormente no formato do desenho. Muitos desses exemplares, como a “Panterete”, o “Caranguejo” e um “Coração”, integram a exposição.
O grafite não foi a única forma precursora de arte encontrada por Alex Vallauri. Utilizando a fotocópia (xerox) colorida em tiragens limitadas e assinadas, ele criou livros de artista que muitas vezes traziam registros de seus trabalhos em fotos tiradas por ele mesmo. Cerca de 15 dessas cópias assinadas figuram na mostra, como também uma série de fotos tiradas por Vallauri de uma ação de grafitagem sobre carros nas ruas de NY, pela primeira vez exibidas em uma exposição. Arte postal e carimbos, todos devidamente representados entre os objetos em exposição no MAM, também foram meios de produção de Vallauri. O Educativo do MAM terá réplicas de um dos carimbos criados pelo artista para desenvolver atividades nas visitas mediadas com alunos de escolas públicas e privadas.
O curador já havia escrito um livro sobre a obra do artista, Alex Vallauri – Grafitti, mas fez questão de começar do zero a pesquisa para a mostra. “Não queria repetir a pesquisa, queria material novo, e consegui muita coisa que não está no livro, para fazer uma exposição dinâmica”, diz Spinelli. Assim, além de instalações, objetos, livros de artista, matrizes de suas gravuras iniciais, carimbos, xerox assinadas, grafites em PVC e fotos, vídeos com registros de grafitagens e imagens da vida e da obra de Vallauri completam o material em exibição.
A expografia é de Felipe Tassara e de Daniela Thomas. Para evidenciar o caráter transgressor e humorado de Alex Vallauri, a proposta do curador aos cenógrafos foi a de fazer uma retrospectiva ao contrário: “pedi a eles que começassem pela produção final e fossem regredindo até os primeiros trabalhos de Vallauri”. Dessa forma, o público faz um percurso que vai de suas obras icônicas até facetas menos conhecidas desse que foi um dos artistas mais irrequietos e inventivos do Brasil.
Sobre o curador
João Spinelli é historiador e crítico de arte, com doutorado pela USP e livre docência pela UNESP. Além de curadorias independentes, foi curador do acervo de arte do Palácio Campos Elíseos (1992-1995) e do acervo de artes plásticas da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo (1986-1992). Coordenou o programa de pós-graduação em artes da UNESP entre 1996 e 1999. É membro da Association Internationale des Critiques d’Art da UNESCO, da Associação Brasileira de Críticos de Arte e da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas. Entre os livros de sua autoria, destacam-se Alex Vallauri – Grafitti (Bei Editora, São Paulo, 2011); Carelli (Bei Editora, São Paulo, 2011); Informelle Kunst in Südamerika (Ed. Museu mam Ostwall, Dortumund, Alemanha, 2002); e Arte Pública – Apontamentos e reflexões (Editora Unesp, São Paulo, 1999).