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maio 2, 2011

Daniel Blaufuks na Progetti, Rio de Janeiro

Daniel Blaufuks na Progetti, Rio de Janeiro

Sobre a exposição e o artista

Extraído do texto de Paulo Reis, publicado no livro "O Arquivo" de Daniel Blaufuks, 2008.

...Daniel Blaufuks trabalha com os escombros do poder e usa a memória como arma definitiva, criando uma narrativa sobre outras narrativas, algumas anônimas, outras de seu círculo familiar.

Pensar na obra de Daniel Blaufuks leva-me a omnipresença intelectual de Walter Benjamin. O apego à memória tanto do filósofo quanto do artista, de forma inequívoca, revelam-nos a sensação da dor e da delícia de saber-se o que se é. Seja porque ambos, através de suas obras, ensinam-nos o valor da memória, do afeto, ou do desespero, ao lutar contra a escassez da memória, contra o hiato do tempo, agarrando-se aos fatos para que estes não escapem como uma água escorre pelo ralo. Um e outro, demiurgos, avisam-nos: sim, a memória deve ser cultivada, pelo bem da saúde e evitar a doença e não que corrói a alma. A deambulação em torno da obra de Daniel Blaufuks leva-me sempre aos escritos memoráveis de Walter Benjamin. Penso benjaminianamente que escrever é deambular sobre a própria história do que se escreve, naquilo que o filósofo chamou de “faire de la flannerie”. O interesse na fiel e na assente marca do filósofo em maximizar a capacidade mnemônica leva-me diretamente ao pequeno, precioso e intenso texto intitulado Escavando e recordando. Ipso fato, para quem não o conhece, ressalto sua eloqüência ao transcrevê-lo ipsis litteris:

"A língua tem indicado inequivocamente que a memória não é um instrumento para a exploração do passado; é, antes, o meio. É o meio onde se deu a vivência, assim como o solo é o meio no qual as antigas cidades estão soterradas. Quem pretende se aproximar do passado soterrado deve agir como um homem que escava. Antes de tudo, não deve temer voltar sempre ao mesmo fato, espalhá-lo como se espalha a terra, revolvê-lo como se revolve o solo. Pois “fatos” nada são além de camadas que apenas à exploração mais cuidadosa entregam aquilo que recompensa a escavação. Ou seja, as imagens que, desprendidas de todas as conexões mais primitivas, ficam como preciosidades nos sóbrios aposentos do nosso entendimento tardio, igual a torsos na galeria do colecionador. E certamente é útil avançar em escavações segundo planos. Mas é igualmente indispensável a enxada cautelosa e tacteante na terra escura. E se ilude, privando-se do melhor, quem só faz o inventário dos achados e não sabe assinalar no terreno de hoje o lugar no qual é conservado o velho. Assim, verdadeiras lembranças devem proceder informaticamente muito menos do que indicar o lugar exato onde o investigador se apoderou delas. Em rigor, épica e rapsodicamente, uma verdadeira lembrança deve, portanto, ao mesmo tempo, fornecer uma imagem daquele que se lembra, assim como um bom relatório arqueológico deve não apenas indicar as camadas das quais se originam seus achados, mas também, antes de tudo, aquelas outras que foram atravessadas anteriormente."(ii)

Como Walter Benjamin, Daniel Blaufuks é um artista que pensa numa escala temporal e percebemos que há na sua obra uma tendência para a paralisação do tempo, operando como uma Medusa: seu olhar congela o movimento para nos revelar novas facetas, novas interpretações, até então insuspeitas, do real. Por isso, a fotografia e o filme convertem-se neste olhar mediado entre o real e a interpretação. Com seu close-up nos pequenos detalhes das letras apagadas, dos papéis de parede com bolor, dos vidros partidos, do pó e da sujidade dos ambientes ou na câmara lenta que perscruta e releva o não revelado (vídeo "Traum"). A teoria da alegoria e da melancolia desdobra uma dialética tensa entre o verbal e o visual, entre o silêncio e o tautológico. Tal como Benjamin que criou uma obra oscilante entre o fonético e o imagético, Blaufuks realiza imagens do quiasma temporal, sempre ao ver cada fotograma como uma espécie de fóssil, uma história individual, mas também coletiva. O artista, tal e qual o filósofo, luta contra uma espécie de "história natural da destruição". ...

(ii)Benjamin, Walter. Obras Escolhidas II – Rua de mão única. 5ª ed. São Paulo: Brasiliense.

(i) citação de José De Almada Negreiros

Obras em exposição:

- Da série "Hoje é sempre ontem", 8 fotografias, 107 x 80 cm, 2011
Em 2010 o artista português-alemão visitou pela quarta vez o Rio de Janeiro e finalizou um trabalho fotográfico, iniciado anteriormente, a partir das suas impressões e vivências nesta cidade. Este projeto é assim uma leitura pessoal de uma cidade em transformação, entre a memória e a realidade e em constante debate com a sua realidade e a sua imagem de “cidade maravilhosa”.

Blaufuks, como estrangeiro, procurou trabalhar e pesquisar este espaço urbano de uma forma subjetiva, que é também poética. As imagens estabelecem relações próprias com algumas zonas da cidade, mas igualmente com trabalhos anteriores seus sobre histórias e memórias pessoais e coletivas. Ao serem apresentadas pela primeira vez no seu próprio espaço original, a cidade do Rio de Janeiro, serão motivo de novas memórias e interações com os espectadores
que aqui vivem. Esta leitura, que é não só pessoal como de “alguém de fora” será necessariamente diferente de a de qualquer habitante da cidade a que se refere.

- "A Primeira Imagem", série de 14 “polaroides”, 8.5 x 8.5 cm, 2011
Um trabalho que parte de uma imagem de Niépce e que é considerada por alguns a verdadeira primeira imagem fotográfica. Trata-se da reprodução de uma mesa com alguns objetos de uso doméstico. Este projeto em “polaroid” é inteiramente fotografado na casa/atelier do autor, utilizando alguns utensílios semelhantes. A película utilizada, fora do seu prazo de validade, foi ainda sujeita a tratamentos térmicos, criando provas únicas e irrepetíveis e levando assim para a fotografia uma “aura” e uma memória de objeto único, hoje perdida na era do digital.

- "Carpe Diem", dvd a partir de película super 8, 30’ min., 2010
Um filme rodado no Palácio do Marquês de Pombal em Lisboa, que hoje alberga o espaço expositivo Carpe Diem, criado pelo curador Paulo Reis. A obra filmada em película super 8 entrecruza os sons atuais do palácio, passos dos visitantes, da equipa, pássaros, aviões, etc., com as composições para piano de Luís de Freitas Branco, que aqui viveu e faleceu. Na sua apresentação original no próprio espaço do Carpe Diem, os registros gravados juntavam-se ainda aos ruídos em curso naquele próprio momento, criando uma certa confusão sonora entre o gravado e o real, entre o passado e o presente.

Sobre o artista

www.danielblaufuks.com
Nasceu em Lisboa

Estudos - AR.CO, Lisboa, 1989, Royal College of Art, London, 1993, Watermill Center, New York, 1994 - International Studio and Curatorial Program, New York, 2001, 2002, Location One, New York, 2003.
Professor e Orador - AR.CO, Lisboa, ETIC, Lisboa, EPI, Lisboa, Maumaus (co-founder), Lisboa, SESC, Rio de Janeiro, Universidade Nova de Lisboa, Faculdade de Belas-Artes, Lisboa, Biennale de la Photographie, Lyon.

PRÈMIOS Best Project, Loop, Barcelona, 2008
2007 -Shortlisted for the Pilar Citoller Award - Selected for the Deutsche Boerse Award - Best Photography Book of the Year in the International Category, Photoespaña - BES Photo Award – 2002 Best Director, Caminhos do Cinema Português, Coimbra – 2001 Best Director, Vila do Conde International Short Film Festival – 1990 Kodak National Awar

EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS 2010 Perecs Büro, Kunstverein Ruhr, Essen, (curated by Sérgio Mah) - A memória da memória, Carpe Diem, Lisboa - O ofício de viver, Galeria Carlos Carvalho, Lisboa – 2009 Viagens com a minha tia, Galeria Solar, Vila do Conde – 2008 Album, Centro Cultural Vila Flor, Guimarães - O Arquivo, Vera Cortês Agência de Arte, Lisboa – 2007 Terezín, Galeria Manoel Macedo, Belo Horizonte - Blaufuks, Galeria La Caja Negra, (Photoespaña), Madrid - Next to Nothing, Centro Cultural de Belém, Lisboa – 2006 Cinema Motel, Elga Wimmer PCC, New York City - No Próximo Såbado, Galeria Carlos Carvalho Arte Contemporânea, Lisboa – 2005 Motel, Agência Vera Cortes, Lisboa - A Perfect Day, Museu do Chiado, Lisboa, 2005 (curated by Pedro Lapa)- 2004 Tomorrow is a Long Place, Lurixs Arte Contemporânea, Rio de Janeiro - Sobre o Infinito, Centro Cultural Emmerico Nunes, Sines - Combo, Centro Cultural de Lagos - Tomorrow is a Long Place and a Perfect Day, Elga Wimmer PCC, New York City – 2003 Collected Short Stories, Centro de Arte Moderna, F.C. Gulbenkian, Lisboa, (curated by Jorge Molder) – 2001 Exile, Image Galery, Aarhus - Lisboa, Pessoa, Exílio, Saramago, Galeria Luís Serpa, Lisboa – 2000 Fotografias Recentes, Galeria Maria Martin, Madrid - Andorra, Galeria André Viana, Porto – 1998 Uma viagem a São Petersburgo, Encontros de Fotografia, Coimbra - Flores para Walt e otras historias, Galeria Maria Martin, Madrid - The White Sands Project/ion Room, Project Room, ARCO, Madrid – 1997 O Livro do Desassossego, Galeria Luis Serpa, Lisboa – 1996 Tasso, Mois de la Photo, Paris, 1996 (curated by Jorge Molder) - Ein Tag in Mostar, Haus der Kulturen der Welt, Berlin, Goethe-Institut, Madrid, (curated by Alfons Hug) – 1994 London Diaries, Primavera Fotografica,, Barcelona, Centro Cultural de Belém, Lisboa, The Akehurst Gallery, London – 1992 A Terra é azul como uma laranja, Galeria Cómicos, Lisboa – 1995 Fund. Athos Bulcão, Brasilía – 1991 Cinema Paraíso, Cinema Eden, Lisboa - My Tangier, Ministério das Finanças, Lisboa – 1990 Para mais tarde recordar, Galeria Ether, Lisboa

EXPOSIÇÔES COLECTIVAS 2010 - Entretiempos, Photoespaña, Madrid, 2010 (curated by Sérgio Mah) - Do outro lado do Atlantico, Centro de Artes Hélio Oiticica, Rio de Janeiro, (curated by Paulo Reis) – 2008 Parangolé: Fragmentos desde los 90 en Brasil, Portugal y España Patio Herreriano - Museo de Arte Contemporáneo Español, Valladolid (curated by Paulo Reis and David Barro) – BESart, Colecção Banco Espirito Santo, Centro Cultural de Belém, Lisboa – 2007 50 Anos de Arte Portuguesa, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa - Foto Rio, Rio de Janeiro - BES Photo Award, Centro Cultural de Belém, Lisboa, (winner) – 2006 Surrounding Matta-Clark, Galeria Carlos Carvalho, Lisboa, (curated by Paulo Reis) – 2005 Densidade Relativa, Fundação Calouste Gulbenkian, (curated by Leonor Nazaré) - Del Zero al 2005, Fundácion Marcelino Botin, Santander, (curated by David Barro) - Erich Kahn, Museu de Arte Moderna – Colecção Berardo, Sintra - Portugal: algumas figuras, Laboratório de Arte Alameda, Cidade do México, (curated by João Pinharanda) -[RE]Visitações a partir de Pontormo, Galeria Luís Serpa, Lisboa - Uma Extensão do Olhar, Centro de Artes Visuais, Coimbra - 2004 Horizont(e), Galeria Luís Serpa Projectos, Lisboa - 20 + 1, Centro Galego de Arte Contemporânea, Santiago de Compostela - We Are The World, Chelsea Art Museum, New York City, (curated by Elga Wimmer) - PhotoEspaña, Madrid, (curated by Horácio Fernandez) - RE-Location Shake, National Museum of Contemporary Art, Bucharest, (curated by Maria Bojan) – 2003 Flesh for Fantasy, Cantieri Culturali ex-Macelli, Prato, (curated by Lorenzo Fusi) - Rencontres Photographiques en Sud Gironde, (curated by Gabriel Bauret) - Pallazzo delle Libertà, Palazzo delle Papesse, Siena, (curated by Lorenzo Fusi) Arquivo e Simulação - Archive and Simulation, LisboaPhoto, Lisboa, (curated by Sérgio Mah) - Artists in Residence 2002-2003, Location One, New York – 2002 Vandskel - Watershed. KunstCentret, Silkeborg Bad, (curated by Beate Cegielska) – 2002 - Open Studios, International Studio and Curatorial Program, New York – 2001 -Think of your ears as eyes, Project Room, Rotterdam Art Fair - Rotterdam-Porto, Galerie Cokkie Snoei, Rotterdam – 2000 -FIAC, Galeria Maria Martin, Paris - Quinze en Europe, Théatre de la Photographie et de l'Image, Nice, (curated by Gabriel Bauret) - London Art Biennale, Shoreditch Town Hall, London, (curated by Isabel Carlos) – 1999 -O Autoretrato na Colecção, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, (curated by Jorge Molder) - Linha de Sombra, Centro de Arte Moderna, Lisboa, (curated by João Miguel Fernades Jorge) – 1989 -Arte Portugués desde 1960, Fundación Pedro Barrié de la Maza, (curated by Jorge Molder) – 1997 -Biennale Internazionale di Fotografia, Palazzo Bricherasio, Torino, (curated by Giorgio Persano) - En la piel de Toro, Centro de Arte Reina Sofia, Madrid, (curated by Aurora Garcia) - Carnets de Route, Galerie Contretype, Bruxelas, 1997 (curated by Jean-Louis Godefroid) – 1996 - European Photography Award, Kulturzentum Englische Kirche, Bad Homburg – 1993 Imagens para os Anos 90, Fundação de Serralves, Porto, Culturgest Lisboa, (curated by A. C. Pinto) – 1992 Lusitania, Circulo de Bellas Artes, Madrid, (curated by Teresa Siza) – 1991 - Portrait, Galeria Artforum, Praha - Fotografia Portuguesa, A Imagem das Palavras, Europália, Bruxelas, (curated by António Sena) – 1989 -Museu de Zoologia, with Jorge Molder, Encontros de Fotografia, Coimbra - European Kodak Award, Arles - Nível de Olho, Fotografia Portuguesa dos Anos 80, Ether / S.E.C., Lisboa, Porto, Macau.

VIDEO - Carpe Diem, 30', sound, super 8 mm on video, 2010 - The Square, various, 3 projections, loop, sound, video - 2009 - What is left is right and what is right is wrong, 5', loop, sound, video, 2009 -The Absence, 20', loop, sound, video, 2009 - A Perfect Day at Wannsee, video, 27’, 2008 - The Daily Practice, video, 23:29’, 2008 - Now Remember, video, 105', 2005-2008 - Theresienstadt, video, 90’, 2007 - Cinema Motel, video, 10.50’, 2006 - Slightly Smaller Than Indiana, video, doc., 78’, 2006 - Traum, video, 13’ loop, 2006 - Motel, video, 4’ loop, 2005 - A Perfect Day, video, 40’ loop, 2003-2005 - Mein Kampf, video, 10' loop, 2004 - Endless End, video, 10' loop, 2004 - Combo, music videos, 26', 2000-2004 - Paisagens Invertidas / Reversed Landscapes, video, doc., 37', 2002 - Under Strange Skies, digital, doc., 57´, 2002 - black > white, 35 mm, fiction, 21´, 2000 - Life is not a Picnic, video, art, 44', 1998.

COLEÇÕES PÚBLICAS - Byrd Hoffman Foundation, New York - Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa - Centro Cultural de Belém, Lisboa - Centro Galego de Arte Contemporânea, Santiago de Compostela - Centro Português de Fotografia, Porto - Centro de Artes Visuais, Coimbra - Colecção Berardo, Lisboa - Colecção BES, Lisboa - Fundação PLMJ, Lisboa - Museu Extremeno e Ibero Americano de Arte Comtemporaneo, Badajoz - Museu de Arte Contemporânea, Funchal - O Museu Temporário, Lisboa - Museu da Cidade, Lisboa - Palazzo delle Papesse, Siena - Sagamore Art Collection, Miami - The Progressive Collection, Ohio

Posted by Cecília Bedê at 5:40 PM