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outubro 23, 2006
Discurso do Ministro Gilberto Gil no Canecão
Discurso do Ministro Gilberto Gil no Canecão, no dia 17 de outubro de 2006
Originalmente publicado no blog de Jorge Bastos Moreno, no Globo Online
(...)Quem somos? Vejo no palco e na platéia artistas, pensadores, empresários, gestores, militantes vinculados a todas as áreas da cultura, a todas as formas de expressão.
Vejo integrantes de grupos, empresas e instituições culturais. Vejo famosos e anônimos, jovens e veteranos. Vejo o underground e o mainstream. Vejo o centro e a periferia.
Esta diversidade, que se afirma intensamente neste encontro, é a diversidade do Rio e do Brasil, a diversidade da nossa cultura; a diversidade que Lula e Sérgio Cabral simbolizam.
É, portanto, a diversidade do Rio e do Brasil que demonstra o seu apoio, nosso apoio, à continuação do governo Lula e a um governo novo para o Rio.
Foi aqui, nesta casa da música e do teatro, que realizamos, na campanha de 2002, uma reunião análoga. Há, porém, uma diferença significativa entre o encontro de 2002 e este. Naquela ocasião, tratamos principalmente de planos e sonhos.
Hoje podemos prestar contas de realizações e tratar do aprofundamento de uma proposta de gestão que deu protagonismo à Cultura, que deslocou a pauta tradicional do Ministério da Cultura, que abriu caminho para uma política modernizante, abrangente, aberta à inovação.
Os planos e sonhos de 2002 desaguaram num governo de verdade, num Ministério da Cultura real, numa equipe de carne e osso que fez um trabalho devotado e digno.
Realizamos a experiência de fazer migrar para a gestão da Cultura as grandes questões da globalização: o impacto das novas tecnologias; a economia da cultura e do lazer; a cultura digital livre, com seu forte potencial emancipatório.
Também trouxemos para a linha de frente do Ministério o entendimento da Cultura como cidadania, como fator de inclusão social, como veículo de reconhecimento social, capaz de reconstituir papéis sociais, tradições e conexões que pareciam perdidas. A exemplo do que cotidianamente testemunhamos nos Pontos de Cultura, com a valorização dos saberes e dos fazeres brasileiros.
Foram esses os nossos ambiciosos primeiros passos em busca de sedimentar, dentro e fora do governo, o entendimento da Cultura como o vetor privilegiado de desenvolvimento econômico atrelado ao desenvolvimento social e à promoção humana.
(...)Tivemos a coragem de incorporar à agenda tradicional do MinC as questões e desafios que a globalização, as novas tecnologias e a economia pós-industrial nos colocam. Refiro-me à convergência digital, a um novo conceito de propriedade intelectual, ao trabalho com os bens intangíveis, à economia da cultura e do lazer e ao protagonismo da sociedade civil.
No início, pensei que nossa tarefa era semear o novo, sem ter a ambição da colheita. Mas os resultados vieram. Temos uma colheita considerável. E novas semeaduras a empreender.
O MinC ganhou um protagonismo inédito e ampliou o seu campo de atuação, incluindo as questões centrais da cultura na agenda do governo e da sociedade brasileira.
O governo Lula praticamente dobrou os recursos orçamentários do MinC e das leis de incentivo; democratizou e republicanizou o acesso; criou novas formas de financiamento, como os Funcines e as linhas de crédito do BNDES; ampliou e qualificou os investimentos das empresas estatais.
Os investimentos em cultura bateram recordes históricos em todas as regiões do país e em todas as áreas e segmentos culturais. No Rio de Janeiro, por exemplo, o crescimento foi de 43% em relação ao governo anterior.
Hoje temos um ministério que formula e realiza políticas públicas efetivas de estímulo à cultura e que trata a cultura como um agente do desenvolvimento do Brasil.
Esta agenda baseou-se em três eixos complementares:
1.Cultura como inclusão social e cidadania;
2.Cultura como economia e fator de geração de renda, emprego e divisas;
3.Cultura como produção simbólica e expressão de identidade e diversidade.
Nos últimos quatro anos, o MinC conseguiu
1.Ampliar o acesso da população à produção e consumo de bens culturais, por exemplo através dos Pontos de Cultura e da requalificação dos museus;
2.Ampliar e democratizar o financiamento público à produção cultural, fortalecendo o caráter republicano da política de editais que conseguimos implantar em parceria com a SECOM;
3.Apoiar o intercâmbio cultural e a difusão internacional da cultura brasileira. Acabamos de criar o Comissariado da Cultura Brasileira no Mundo para coordenar a participação brasileira em eventos internacionais, divulgar a imagem do país no exterior e promover a exportação de bens culturais;
4.Apoiar o fortalecimento, dos grupos, das instituições e das empresas culturais. Abrimos a porta do diálogo permanente com as instituições culturais, firmamos diversos convênios, fizemos a aproximação necessária com as universidades;
5.Revitalizar boa parte do patrimônio histórico e dos museus, com investimentos recordes em ambos. Nunca as cidades históricas brasileiras receberam tanto apoio para promover seu desenvolvimento ;
6.Empreender ações concretas de proteção e promoção da diversidade cultural.
Os avanços conceituais e políticos se expressam:
1.No Programa Cultura Viva e nos Pontos de Cultura, que já são mais de 500 em todo o país, apoiando as atividades de grupos já atuantes, dentro da lógica de promover o empoderamento e a autonomia das comunidades produtoras de cultura do país.
2.No Programa Monumenta, que promoveu a revitalização do patrimônio histórico material e imaterial em 26 cidades;
3.No Programa Revelando os Brasis, no DOCTV, nos editais de audiovisual, no Prêmio Adicional de Renda para os filmes brasileiros, na recuperação da Cinemateca Brasileira, que são expressões de uma política inovadora e consistente para o audiovisual;
4.No Programa de reconhecimento e registro do Patrimônio Imaterial, que diz respeito aos diversos saberes, fazeres, tradições, lugares, conhecimentos, ritmos, linguagens, técnicas tipicamente brasileiros. Fizemos o registro do samba de roda, o ofício das baianas do acarajé, do Círio de Nazaré, da viola de cocho do Pantanal, do jongo, da cachoeira do Iauaretê, e outros estão em estudo.
5.Nas ações de apoio às comunidades indígenas e quilombolas, através da Fundação Palmares e da Secretaria de Diversidade e Identidade;
6.No Sistema Nacional de Cultura, que já tem a adesão de 2 mil municípios e 22 estados;
7.Na ação da FUNARTE, em programas como a Circulação Regional de Teatro, o Arte sem Barreiras, o Projeto Pixinguinha, os Prêmios de Dança e Teatro, os editais de apoio ao teatro, ao circo e à dança;
8.Na Política de Museus, atuante em todas a regiões do país com investimento recorde na modernização e na ampliação do acesso;
9.Nos Programas de Exportação de Cinema, Televisão e Música, em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio, a APEX e o SEBRAE;
10.Na ação de promoção da cultura brasileira no exterior com a Copa da Cultura e o Ano do Brasil na França;
11.No Programa de Economia da Cultura, que terá orçamento próprio a partir de 2007;
12.No CulturaPrev, a previdência dos trabalhadores da cultura em parceria com a PETROS;
13.No apoio a festivais dos diversos setores, no Brasil e no exterior, que promovem a formação de público e a circulação de artistas e produtos;
e em tantas outras iniciativas bem-sucedidas que conseguimos não apenas formular, mas realizar nos últimos quatro anos.
Também fomos eficazes no plano simbólico, afirmando alguns paradigmas que se legitimaram como referências para o debate cultural no Brasil, como os que cito a seguir:
1. A cultura não apenas estimula o desenvolvimento, gerando renda, emprego e bem-estar, como o qualifica. Se o desenvolvimento econômico expressa o bem-estar material de uma nação, é o desenvolvimento cultural que define a sua qualidade.
2. A produção e o acesso à cultura são direitos básicos do cidadão, tão importantes quanto o direito ao voto, à moradia, à alimentação, à saúde e à educação.
3. A sociedade brasileira deve ser o principal beneficiário das políticas de cultura, e não apenas os artistas e os produtores culturais.
4. A política pública de cultura deve estar integrada com as demais políticas governamentais.
Falei de economia da cultura e quero enfatizar este ponto. Uma das grandes inovações do MinC foi tratar as atividades culturais também como atividades econômicas.
O vigor, a diversidade e a alta qualidade de nossa produção cultural confirmam a vocação do Brasil para tornar a economia da cultura um dos motores do nosso desenvolvimento.
Atualmente, a cultura já responde por 5% dos empregos formais do país e estima-se que represente 5% do PIB nacional. Mas o potencial a realizar é ainda maior.
Em junho, o MinC incluiu o Programa de Desenvolvimento da Economia da Cultura no Plano Plurianual do governo.
Firmamos parcerias com o BNDES, o Ipea, o IBGE e o BID para desenvolver ações de fomento, capacitação, construção de indicadores e estatísticas, realização de estudos setoriais, promoção de negócios. Faremos em Recife, em fevereiro, a Feira Música Brasil, um grande evento de negócios que vai congregar toda a indústria da música do país.
A economia da cultura integra o que se chama de "Nova Economia", baseada em criação e inovação. Seus produtos têm alto valor agregado. As atividades relacionadas à cultura, ao lazer e à tecnologia não apenas são as que mais crescem, geram emprego e melhor pagam em todo o planeta. São também as que melhor combinam vantagens econômicas e sociais, pois estimulam as pessoas, produzem bem-estar. Constituem também um setor ecologicamente limpo, de baixo impacto sobre o meio-ambiente, já que seu principal insumo é a criação.
Por isso, uma das prioridades do próximo governo deve ser o estímulo à Economia da Cultura.
Mas não é só nesse setor que precisamos avançar. Nossa pauta para um novo mandato é extensa e eu gostaria de citar aqui seus pontos principais.
1. Elevar o Orçamento do MinC para 1% do Orçamento da União;
2. Ampliar o Programa Cultura Viva, chegando a 1.500 Pontos de Cultura, que atuam num universo de milhares de manifestações culturais presentes no país;
3. Implantar o Programa de Cultura do Trabalhador (o Tíquete Cultural), que visa estimular e democratizar o consumo de produtos e serviços culturais, especialmente dos setores de baixa renda;
4. Desenvolver o Sistema Nacional de Cultura e o Plano Nacional de Cultura;
5. Constituir um Sistema Público de Comunicação plural e consistente. Vamos realizar em dezembro o I Fórum Nacional de TVs públicas;
6. Ampliar o Programa de Inclusão Digital e o acesso a novas tecnologias. Os Pontos de Cultura são veículos que já estão trabalhando nessa direção;
7. Consolidar o novo Sistema de Financiamento Público da Cultura;
8. Ampliar o Cultura Prev, um antigo sonho do artista brasileiro, num momento em que o debate sobre a Previdência está na ordem do dia;
9. Ampliar os programas de exportação e inserção da cultura brasileira no exterior;
10. Rever os marcos legais de direito autoral e de propriedade intelectual;
11. Estabelecer parceria ativa entre o MinC e o MEC. Já assinamos um protocolo de intenções para iniciar os trabalhos conjuntos;
12. Adequar nossa legislação à Convenção da Diversidade Cultural da Unesco;
13. Implantar o Plano Nacional de Livro e Leitura;
14. Promover a capacitação de empreendedores e investir em novos processos e modelos de negócios. Firmamos convênios com o Sebrae e o Sesc, e outros estão sendo discutidos;
15. Trabalhar pela implantação os canais públicos de TV Digital;
16. Fortalecer o Conselho Nacional de Políticas Culturais e seus Colegiados;
17. Ampliar os editais de apoio à criação, à produção e à circulação de teatro, dança, artes visuais, audiovisual, circo, literatura e cultura popular;
18. Implantar o Instituto Brasileiro de Museus;
19. Implantar o Fundo Setorial do Audiovisual;
20. Expandir o Programa Monumenta de revitalização das cidades históricas e torná-lo uma ação permanente prevista em orçamento.
Posso dizer a vocês que finalmente o poder público começou a compreender a importância da cultura para o desenvolvimento econômico, social e humano do Brasil. Começou a compreender a importância da cultura para uma inserção soberana do Brasil na globalização.
A globalização, a convergência digital e a economia pós-industrial exigem um novo projeto de desenvolvimento para o Brasil. O modelo industrial, baseado no alto consumo de recursos naturais e no baixo aproveitamento do capital humano, chegou ao limite.
O poder público deve tratar as atividades relacionadas à cultura, ao lazer e à tecnologia como prioritárias, investindo em seu fortalecimento e na democratização do acesso da população à produção e ao consumo.
Nossa ação nestes quatro anos e as ações que reivindicamos para o futuro seguem exatamente essa direção.
Por isso, e pelo sem-número de avanços e conquistas em outras áreas, Lula merece o segundo mandato.
No caso do Rio, a presença de Sérgio Cabral aqui sinaliza seu compromisso com a priorização da cultura e com a agenda que procuramos desenvolver no MinC.
Poucos países têm uma cultura tão intensa, diversa e dinâmica quanto o nosso. Poucos países têm um povo tão criativo, perseverante e transformador.
O Rio e o Brasil estão vocacionados para a produção cultural, o turismo, a ciência, o esporte, a moda, o design e as demais atividades que simbolizam a nova era da economia mundial. Nossos governos devem entender e maximizar esta vocação.
Eis, presidente, o que temos a dizer aqui no Canecão, com a mente quieta, a espinha ereta e o coração tranquilo. Nos propusemos a trabalhar uma pauta inovadora e ambiciosa e colhemos os primeiros frutos. Mas é preciso ir além. É preciso estar preparado para transformar as mudanças em curso no mundo em oportunidades de desenvolvimento.
Nossa cultura é, nas palavras de Rodrigo Mello Franco de Andrade, o que legitima o direito de propriedade sobre o território que habitamos.
Como disse Adam Smith, grande pensador da Economia, "a riqueza das nações também é a cultura de seu povo".
Aproveito para agradecer publicamente a sua confiança, assim como a confiança e o apoio de todos os que nos ajudaram e torceram por nós. Quero também agradecer publicamente a toda a equipe do MinC e a todos que já passaram por ela.
Tenho o sentimento do dever cumprido. O MinC foi, na cultura, a cara do governo Lula, este governo que, por sua vez, tem a cara do Brasil e dos brasileiros. LULA SOMOS MUITOS!
Vida longa à capoeira dos mestres Bimba e Pastinha e de todos os seus discípulos espalhados pelo mundo. Vamos à luta!
Muito obrigado!