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setembro 15, 2005
Indignação com arte, por Délio Rocha (sobre o Projeto Cortes de José Guedes)
Indignação com arte
DÉLIO ROCHA
Sobre o Projeto Cortes de José Guedes
Quem circula por algumas ruas da Aldeota, em Fortaleza, pode se deparar com intervenções do artista plástico José Guedes. As obras, que fazem parte do Projeto Cortes, vem transformando troncos de árvore em arte. E levando as pessoas a refletir sobre a derrubada indiscriminada de árvores na Capital cearense. Um protesto silencioso e poético sobre a devastação da natureza em nome de um suposto progresso
As intervenções estão nas ruas que fazem parte do caminho cotidiano de José Guedes. Foram criadas em cima de troncos de árvores que, durante anos e anos, fizeram parte da paisagem das vias da Aldeota, um dos bairros mais nobres da Capital cearense. As obras representam um protesto silencioso do artista, uma manifestação da indignação contra a devastação da natureza. Em cima de cada tronco, Guedes cola um espelho, com fita de dupla face. O resultado não deixa de ser um reflexo da cidade, um recorte feito no lugar onde antes existia uma árvore imponente.
A efemeridade característica das intervenções urbanas não desestimula o artista plástico cearense. Dificilmente, a obra resiste intacta por mais de dois dias. As pessoas danificam a intervenção, mas Guedes volta para reconstruir. Arrancam o espelho, mas ele recoloca outro no lugar. É um desafio permanente. Um protesto trabalhoso, isolado, mas que não é maior do que a determinação do artista em usar seu engenho para despertar no fortalezense o sentimento de preservação da natureza e, por extensão, da própria arte.
Mas José Guedes sabe que o trabalho de gato e rato, de construir e reconstruir as obras não pode ser eterno. O objetivo é continuar com esta luta poética ainda em setembro, criando e repondo as intervenções. "O ideal é que as obras ficassem para sempre como um protesto vivo, que despertasse uma reflexão nas pessoas que passam", explica. É certo que muitas pessoas ficam tocadas, mas, infelizmente, existem aquelas que se apropriam ou danificam a intervenção.
Para resguardar a longevidade do Projeto Cortes, todas as obras estão sendo fotografadas. O artista já tem guardado o registro de dez trabalhos, que podem ser mostrados posteriormente. "As fotos têm autonomia e, talvez, o Projeto Cortes culmine em uma exposição fotográfica para que, livre dos atos de vandalismo, deixe de ser efêmero". Enquanto a exposição de fotografias não ganha corpo, é possível, com sorte, contemplar as intervenções de Guedes em endereços badalados de Fortaleza, como as ruas Padre Valdevino e Oswaldo Cruz, as avenidas Padre Antônio Tomaz e Dom Luiz, além do Bosque Eudoro Correia.
"Sempre que passava por estes locais via os toquinhos, geralmente de árvores que foram cortadas desnecessariamente. Um ato de quem só pensa no momento, de quem esquece o futuro, dos filhos e netos que vão sofrer com a devastação. Ficava indignado, não entendia a razão para o corte indiscriminado", diz. Depois da revolta inicial, veio a idéia do protesto. Guedes resolveu tirar os moldes dos troncos e criar intervenções com a utilização de espelhos. "As obras refletem as imagens dentro do corte, revelam como a cidade está devorando a natureza de maneira desordenada", completa.
Esta não é a primeira vez que o cearense José Guedes trabalha o conceito do reflexo em suas obras de arte. Há quatro anos, ele participou da Bienal de São Paulo - comemorativa dos 50 anos - com trabalhos fotográficos que apresentavam a cidade refletida em poças de água. "As fotos eram invertidas. Desta forma, o que era virtual passava a ser real, ganhava a posição natural". Depois de apresentadas na Bienal, as fotografias formaram uma grande exposição individual na galeria Nara Roesler, em São Paulo.
No ano passado, José Guedes também fez intervenções nas ruas de Fortaleza para manifestar indignação, desta vez contra a violência banalizada na capital cearense. Ele criou réplicas de placas de trânsito, fixadas em ruas da Aldeota, onde se lia "Permitido assaltar". Uma maneira bem humorada e talvez mais eficiente de provocar as pessoas, de levá-las a uma reflexão. Uma maneira de utilizar a arte para discutir os problemas e a reestruturação da cidade.
Enviado por José Guedes jguedes@fortalnet.com.br
PARABENS AO JOSÈ GUEDES !!!!!!!!!!!!!!!
Pode-se chamar a atenção das pessoas de maneiras sutis e lindamente poéticas!!!!!!!!!