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julho 10, 2005
A nova possibilidade inaugurada com a Ocupação
A exposição Ocupação, ou a "ocupação" Ocupação, ou
como se queira chamar, é certamente uma proposta
importante, se tiver continuidade, para as Artes
Plásticas em São Paulo e provavelmente no Brasil, pois
pode influenciar iniciativas semelhantes, além das
fronteiras do eixo cultural Rio-Sampa.
Há muito que algo assim era ansiado pelos artistas em
geral, e principalmente por aqueles que dificilmente
são escolhidos para curadorias, um espaço partilhado
humildemente entre instituição e artistas, ou seja,
uma atitude institucional bem diferente daquela a que
estamos acostumados, onde o peso do julgamento é
corriqueiramente exercido de modo ostensivo, e já faz
um bom tempo, pelos curadores unidos do mundo.
Digo do mundo por que não quero acusar este ou aquele
curador de exercer além da medida a autoridade que, de
algum modo, lhe foi conferida. É uma tendência geral,
até onde se sabe, e isso ressalta a importância de uma
atitude com moldes diferentes, pois pode significar um
renovo do papel da instituição, no que diz respeito à
arte contemporânea.
No caso da Ocupação, o papel de Daniela Bousso parece
ter sido, além de criar e viabilizar o projeto, ser
uma mediadora mais do que curadora.
O único limite, declaradamente imposto pelo Paço das
Artes, foi a exigência de que o espaço oferecido
estaria sendo cedido para ser "ocupado" com a
condição de que os artistas permanecessem cinco horas
diárias no prédio, durante os seus respectivos turnos.
Dada essa condição, eles poderiam desenvolver o que
bem lhes apetecessem, até mesmo não fazer nada,
acampar, cozinhar ou passar a noite no terreno
ocupado. O mínimo a ser cumprido eram cinco horas no
local, mas o limite máximo de permanência não
foi restringido, de modo que seria possível "morar" no
Paço, possibilidade hipotética que talvez, quem sabe,
tenha dado origem ao agora famoso título da exposição,
ou melhor, da "ocupação".
Mas precisamente essa exigência, por ser de algum modo
um limite, acaba assumindo uma importancia tal, que
nos leva a prestar atenção melhor em seu sentido, que
poderia ser dividido em sentido aparente e sentido
oculto.
Ora, estávamos, quando aceitamos o convite do Paço,
numa espécie de negociação com a instituição, pois
apesar de ela então nos oferecer um espaço sem
curadoria, isso certamente era mais do que uma oferta,
já que também não deixava de assumir, implicitamente,
ares de uma antiga reinvindicação da classe dos
artistas que agora, finalmente, estava sendo atendida.
Bem, se estamos em negociação, temos que dar o braço a
torcer em algum ponto. Sendo assim, aceitamos sem
grandes problemas ou questionamentos, sem "chiar", a
obrigação de estar cinco horas diárias na Ocupação. Do
ponto de vista da negociação, tendo em vista o
benefício de ocupar um lugar como o Paço, tal atitude
é perdoável e até mesmo muito compreensível.
Mas o que ninguém se perguntou foi o motivo que levou
a essa exigência, que aliás, muitos artistas
resolveram deliberadamente não cumprir.
Se não houvesse a obrigação de ficar todos os dias no
Paço, oitenta e cinco por cento dos artistas optaria
simplesmente por deixar expostas obras já prontas, ao
invés de exibir seus esforços criativos num "work in
progress".
Precisamente por isso foi uma exigência, por que se
sabia que se a obrigação não existisse o resultado
provavelmente seria uma exposição.
Uma mera exposição não poderia ter o apelo político da
óbvia idéia subentendida no nome Ocupação.
Se os artistas aceitam participar, então, bem ou mal,
o nome pode ser aplicado, e a presença deles é, de
modo indireto, usada politicamente, pois legitima o
nome e o nome tem uma conotação política que é bem
conhecida de todos.
É curioso reparar como o nome Ocupação foi alvo de
tantas polêmicas, pois muitos acham que esse nome não
se encaixa numa definição apropriada da situação real.
Resta saber se nas próximas edições da Ocupação (o nome
já pegou) a permanência dos artistas vai ser uma
exigência ou uma alternativa.
Se pensarmos democraticamente e em termos de
resultados, o mais interessante talvez seja convocar
todos os artistas de que se tem notícia, com o intuíto
de realizar um sorteio para a escolha dos "eleitos".
A única exigência seria deixar a cargo dos sorteados a
divisão do espaço e as regras de sua própria ocupação.
Vamos esperar para ver no que dá.
Roger Barnabé