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maio 31, 2004
hiPer>experimentação
de como tudo pode ser completamente diferente pelo simples fato de ser observado a partir de outro lugar
é minha primeira atuação como "artista etc." e, neste momento, o trabalho colaborativo com patrícia KUNST canetti se dá pelo envio via mail de algumas considerações sobre "quebra de padrão" às 2h50 da manhã do meu quarto, 1106, no master plaza de porto alegre, para o dela, 404.
jornalismo colaborativo. pautas que se discutem, que amadurecem ao longo do tempo, que se desdobram no espaço físico de exposição em constante mutação ao longo de cinco dias de montagem. pautas que podem virar texto em qualquer formato, textos curtos, textos longos, hipertextos, depoimentos em flash, cenas descritas, cenas fotografadas, encenações. pautas-liberdade em oposição às pautas-camisa-de-força do jornalismo impresso. reportagens que podem ser manipuladas ad infinitum, que serão também motivo de debate, de reflexão conjunta, passíveis de mudança de opinião. matérias orgânicas, deletáveis até.
logo na primeira "entrevista", que nada mais é do que um bate-papo que o acaso agendou concomitantemente ao primeiro café no cofre, a hipermodernidade de lipovetsky ganha força na leitura de daniela bousso. filosofia se transmuta em visões multifacetadas da subjetividade contemporânea. a rigidez das categorias filosóficas se transforma em matéria viva pelo viés libertário da arte, podendo até se materializar em um personagem denominado hiPer, "filho da modernidade e neto da pós-modernidade, paradoxal e solitário, em busca de relações de identidade, vivendo o presente com um olho no futuro, que vai depender de um triunfo da ética", palavras anotadas na conversa com a curadora.
o triunfo da ética se descortina no cuidado de jurandir muller e kiko goifman ao retratar gestos pelas ruas de porto alegre, conferindo dignidade ao anonimato. aos anônimos é dada a oportunidade de construir a obra de giselle beiguelman, alimentada e atravessada pela subjetividade pós-subjetiva de pessoas que se sabem mediadas pela tecnologia. estas informações são fruto da cooperação dos artistas no processo de montagem e descoberta dos próprios trabalhos, que generosamente põem de lado a afinação de projetores para falar ao canal.
"o canal é a memória viva da arte contemporânea brasileira." da memória em estado bruto constrói-se o trabalho de lucas bambozzi que decide, durante o projeto "o tempo não recuperado", frear a criação frenética de novas imagens para rever um arquivo em processo de deterioração e resgatar a vida capturada ao longo de duas décadas de trabalho. sua conclusão: que a vida nunca esteve capturada e resguardada naquelas fitas de vhs; o tempo não pode ser recuperado. a dimensão trágica da vida aparece na instalação dos irmãos adriano e fernando guimarães: a luz vira metáfora da existência e opera insuflando vida e aniquilando-a.
estamos no terceiro dia de quebra de padrão e tudo pode mudar.
Como a maioria dos artistas, sou monotemática. O tema em questão: padrões; sua formação e aplicação em várias esferas, que uso para pensar diferentes tópicos. Da construção da individualidade e da coletividade através de uma dinâmica de padrões - me ajudando a refletir, seja sobre a teoria psicanalítica lacaniana, ou seja, sobre a construção topológica do espaço cibernético - à percepção do novo, que ocorre quando da quebra de um padrão, geralmente dando início à formação de um outro.
A quebra de padrão proposta nesse trabalho procura novas maneiras de abordar, contar, mostrar e veicular informação sobre arte contemporânea no Canal. Maneiras contemporâneas, casando o uso do espaço cibernético e a descoberta de suas potencialidades com a reflexão e a experiência da arte.
Já falei anteriormente sobre ainda estarmos presos a padrões que se relacionam com meios de comunicação impressos e sobre o quanto deixamos de experimentar as possibilidades do Canal (Hora de crescer - a quebra de padrão, publicado em 4 de agosto de 2003); já tentamos timidamente, com a seção Circuito, sair do aprisionamento de apenas falar de um evento artístico quando este se inaugura; ou ainda, na época da última Orlândia, veiculei imagens de trabalhos e opiniões que respondiam a pergunta "Foi bom para você?", na tentativa de demonstrar que algumas estratégias podem ser criadas para levar a uma maior fruição do evento artístico na rede. Por fim, acabou caindo a ficha de que um trabalho deveria ser feito para tratar essa questão na prática.
Quando fui convidada pela curadora Daniela Bousso para participar da hiPer, o Quebra de Padrão começou a tomar corpo. Um mergulho na montagem, a experiência de vários trabalhos de arte, o contato com os artistas, com a curadora, com a arquiteta do espaço, com a produção, a equipe de mediadores, seminários, encontros, oficinas, enfim, com tudo que ocorre no prazo de três meses de uma exposição numa grande instituição, incluindo a revisitação dos trabalhos em diferentes momentos. Como artista-jornalista, eu iria vivenciar, fuçar, conversar, pensar, perguntar, fotografar, gravar, relatar a experiência da arte contemporânea e buscar novas formas de comunicá-la e veiculá-la. Esse trabalho não poderia ser feito por uma só pessoa, mesmo que fosse possível dar conta dessa quantidade de obras - estão participando 40 artistas, pois era necessária uma interlocução na sua feitura. Ocorreu-me ter como par um jornalista que vivenciaria a experiência complementar a minha, a de jornalista-artista, quebrando também com o padrão de atuação do próprio nessa experiência de artista-etc. Pensei na Juliana Monachesi, jornalista da Folha de São Paulo, crítica e curadora com foco nas novas mídias, mais jovem do que eu e de uma outra cidade para ser esse par ideal.
Estamos no dia da abertura da exposição hiPer, ainda embriagadas pelas tantas possibilidades que temos pela frente, ao mesmo tempo em que também estamos lidando com as limitações que a realidade do processo de produção de uma grande exposição impõe a todos. O que virá a seguir é pura experimentação.
Daniela Bousso, curadora de hiPer, dando entrevista para a jornalista Luciana da TV RBS de Porto Alegre.
finalmente uma boa idéia para tirar a mídia de seu marasmo "auto-deletante". como nos ensinou um artista de hiPer: algumas pessoas (físicas e/ou jurídicas) deveriam se auto-deletar. exemplo: jornalista que faz matéria sobre arte por telefone: deletar; leitor que fica indignado com o que lê mas não se manifesta: deletar; artista, curador, espectador etc. que tem como ideal oxigenar este circuito brasileiro de arte mas não faz nada nem enxerga que HÁ MÍDIA para colocar as idéias no mundo, deletar; e assim por diante.
Posted by: Julia Leme at maio 31, 2004 5:02 PMadorei
Posted by: italo at maio 31, 2004 7:50 PM"auto-deletante", "artista-etc" ...
Adorei a iniciativa !!
Quebremos nós então, todos os padrões, sejam eles físicos, visuais, virtuais ... artificias ... e outros tais!
Deletar, gosto da palavra, deletar limpa o espaço, e hoje o espaço está muito sujo,falso,muita imagem,imagem,imagem nada,prefiro o nada,prefiro delete.
Lu
Posted by: Maria de Lourdes Gomes at junho 5, 2004 6:34 PMEm se falando de arte o DELEITE é bem melhor do que o "delete"
Posted by: sndra schechtman at junho 14, 2004 6:38 PM