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abril 22, 2018
Queima total por Jan Theophilo, Jornal do Brasil
Queima total
Nota de Jan Theophilo originalmente publicada no Jornal do Brasil em 14 de abril de 2018.
Museu de Arte Moderna do Rio, pelo visto, entrou em liquidação. Depois de anunciar a venda do único quadro de Jackson Pollock na América Latina, o óleo “Nº 16”, por US$ 25 milhões de dólares que serão revertidos para despesas de custeio, a diretoria prepara uma nova venda. O alvo dessa vez é a escultura “Bicho Relógio de Sol”, de Lygia Clark, avaliada em cerca de R$ 2 milhões. A operação, que estava sendo mantida em sigilo mas já foi aprovada pela curadoria, é um pouco mais complexa que a venda do Pollock. O primeiro passo é uma permuta. A Coleção Gilberto Chateaubriand cederá ao MAM uma outra escultura de Lygia Clark também da série “Os Bichos” _ é esta série que a consagrou como a melhor escultora brasileira, em 1961. Em troca, o MAM cede à coleção o “Relógio de Sol” que será vendido. A história vem se desenrolando há pelo menos seis meses, quando a direção do MAM pediu à galeria Pinakotheke Cultural que fizesse a certificação e avaliação da peça. Quem conhece o mercado de arte sabe como é complicada qualquer operação que envolva trabalhos de Lygia Clark. É que a artista não assinava suas obras, mas mantinha anotado em cadernos de tudo o que produzia, o que permitiu aos herdeiros controle sobre o acervo. Continua valendo uma pergunta que diz muito sobre como funciona a cabeça da elite brasileira. Pelo mundo afora famílias ricas se orgulham de fazer doações a museus. Porque os Chateaubriand, que armazenam sete mil peças de sua coleção no MAM, não vendem seus quadros em vez de se desfazer de um patrimônio que é de todos os cariocas?
abril 13, 2018
SP-Arte começa em meio a embate do setor com aeroportos por Nelson Gobbi e Paula Autran, O Globo
SP-Arte começa em meio a embate do setor com aeroportos
Matéria de Nelson Gobbi e Paula Autran originalmente publicada no jornal O Globo em 10 de abril de 2018.
Interpretação de norma da Anac faz com que taxa de armazenamento de obras seja cobrada pelo valor de mercado e não pelo peso
A 14ª edição da SP-Arte será inaugurada nesta quarta-feira, no Pavilhão da Bienal, ainda sob o impacto da mudança na interpretação em uma norma da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) na cobrança da taxa de armazenagem de obras de arte trazidas temporariamente ao Brasil, por parte de concessionárias como as que gerem os aeroportos internacionais de Guarulhos (SP), Galeão-Tom Jobim (RJ) e Viracopos (Campinas-SP).
Até setembro do ano passado, obras de arte enviadas para eventos como a SP-Arte eram taxadas por seu peso bruto, dentro de uma tabela para “cargas em regime especial de admissão temporária destinadas a eventos comprovadamente científicos, esportivos, filantrópicos ou cívico-culturais”, de acordo com o Contrato de Concessão Nº 002/ANAC/2012. Com a reinterpretação da norma, a feira deixaria de ser analisada dentro dos parâmetros “cívico-culturais” e passaria a ser cobrada por outra tabela, não mais pelo peso, mas por uma porcentagem de seu valor de mercado. Assim, os valores de armazenagem, que inicialmente eram de R$ 0,15 por quilo de cada obra, podem atingir cifras milhares de vezes mais altas.
COMO ERA
O Contrato de Concessão
Nº 002/ANAC/2012 prevê, em sua Tabela nº 9, a cobrança de armazenagem por quilo (R$ 0,15 por quilo, pelo período de quatro dias úteis para a retirada) para cargas em regime especial de admissão temporária destinadas a eventos comprovadamente científicos, esportivos, filantrópicos ou cívico-culturais. Este era o entendimento até mês passado para eventos como a SP-Arte, feira de arte realizada anualmente em São Paulo, que na sua 14ª edição reúne mais de 130 galerias, sendo 34 internacionais.
COMO FICOU
Algumas concessionárias de aeroportos internacionais, como os de Guarulhos (SP), Galeão-Tom Jobim (RJ) e Viracopos (Campinas-SP), mudaram o entendimento sobre o caráter "cívico-cultural" de eventos desta natureza, e passaram a cobrar a armazenagem das obras de arte fora da tabela nº 9, incluindo na taxação o valor de mercado de cada item, o que aumentaria exponencialmente o total a ser pago. Segundo Fernanda Feitosa, diretora da SP-Arte, o valor em alguns casos chegaria a um aumento de 10 mil por cento.
Diretora da SP-Arte, Fernanda Feitosa entrou com mandado de segurança para evitar a mudança de critério. Após a decisão judicial favorável em Campinas, o Aeroporto de Viracopos informou que voltou a cobrar a armazenagem das obras por peso; o Galeão o informou que vai ouvir os importadores e avaliar caso a caso antes de estabelecer de que forma irá taxá-los. No Aeroporto Internacional de Guarulhos, segundo a SP-Arte, alguns galeristas pagaram pela tabela especial (7) e outros pela mais alta (9), por conta de uma liminar conseguida por uma transportadora. Em nota, a administração de Guarulhos informa que faz a “a aplicação de tabelas tarifárias conforme o perfil da carga e a destinação dos produtos”, os quais não enquadrariam a SP-Arte na tabela especial, e que o evento “movimenta milhares de reais em vendas” (leia a nota na íntegra ao final da reportagem).
— Este tipo de cobrança é algo que não existe em nenhum aeroporto do mundo, os valores cobrados internacionalmente ficam entre quatro e 22 centavos de dólar ou euro por quilo de cada obra de arte — exemplifica Fernanda Feitosa. — Não cabe a um agente de cargas, cuja função é conferir se o que está entrando no país é o mesmo que está declarado, analisar se determinada obra ou evento tem caráter cultural ou não. O MinC e a Secretaria de Cultura de São Paulo já oficiaram a Anac sobre a importância cultural da SP-Arte, isso não seria o suficiente?
Fernanda ressalta que a mudança da interpretação da norma se vale de uma terminologia de décadas atrás, na qual "cívico" passou a ser interpretado como "patriótico":
— Se o texto passar a ser interpretado desta forma, será uma ameaça não só para as artes visuais como para a realização de qualquer tipo de evento cultural no Brasil. Como comprovar o caráter "patriótico" de uma exposição de um artista estrangeiro ou de uma ópera de Wagner? Essa decisão impactou galerias de vários países, e isso já começa a ser comentado no exterior. É o momento de pensarmos a política cultural no Brasil, se queremos estar alinhados com as diretrizes que valem para o mundo todo ou se vamos nos isolar.
Diretora da ArtRio, Brenda Valansi aguarda o desenrolar da questão durante a SP-Arte para planejar os próximos passos para o evento carioca, que será realizado entre 26 a 30 de setembro, na Marina da Glória:
— Se este entendimento for mantido, vamos perder muito em termos de presença internacional em feiras e exposições. O Brasil já é conhecido mundo afora pelos impostos altíssimos para as artes visuais e a burocracia no setor. Uma mudança na regra de importação aumentaria ainda mais esta visão negativa.
Para o gestor cultural e blogueiro do GLOBO Afonso Borques, que escreveu escreveu um artigo sobre o tema em 5 de abril, a mudança na interpretação parte de uma questão vernacular para mudar a taxação.
— Isso gera uma insegurança enorme no mercado. Como um galerista internacional ou um produtor de exposição vai mandar obras de arte para o Brasil sem ter a certeza de como será cobrado? A única solução seria uma alteração no texto do contrato de concessão da Anac, para que não haja brechas como essa para reinterpretações.
Nesta segunda-feira o ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, se reuniu com o presidente da Anac, José Ricardo Botelho, discutir medidas para rever o critério de cobrança de tarifa de armazenagem de obras de arte nos aeroportos, conforme adiantou Marina Caruso em sua coluna no Globo.
— Houve uma mudança no entendimento do termo “cívico-cultural”, que consta nos contratos de concessão, por parte das concessionárias. Agora é preciso defini-lo e determinar a que tipo de evento ele se aplica, para que não haja dúvida. Esta definição deve ser feito pela Anac, numa resolução específica — explicou o ministro, ressaltando que, mesmo nos casos em que há comercialização das obras, o caráter cultural do evento deve ser preponderante.
Em nota, a Anac informou que “não houve qualquer alteração recente em nenhum desses dispositivos normativos e existem diversas tabelas a serem usadas para enquadramento das tarifas-teto”. A agência também ressaltou que “não cabe à Anac acompanhar cada transação comercial entre o aeroporto e os seus usuários, mas a Agência detém a prerrogativa de atuar em caso de denúncia formalizada”.
Leia a nota da Anac na íntegra:
"A regulação da cobrança de tarifas de cargas aplicável aos aeroportos concedidos encontra-se disposta no Anexo 4 do respectivo contrato de concessão, bem como na Portaria nº 219/GC-5, de 27 de março de 2001, baseada no modelo de preços-teto. Não houve qualquer alteração recente em nenhum desses dispositivos normativos e existem diversas tabelas a serem usadas para enquadramento das tarifas-teto.
No âmbito da negociação com os transportadores de cargas, os aeroportos devem seguir os comandos dos referidos dispositivos normativos, devendo respeitar os tetos estipulados pela Agência. Não cabe à Anac acompanhar cada transação comercial entre o aeroporto e os seus usuários, mas a Agência detém a prerrogativa de atuar em caso de denúncia formalizada.
Em reunião realizada na tarde de hoje (9/4) com o Ministério da Cultura, a Anac informou que eventuais definições sobre o tema devem ser objeto de política pública a ser discutida em âmbito ministerial".
Leia a nota do Aeroporto de Guarulhos na Íntegra:
"O GRU Airport informa que segue todas as regras previstas no Contrato de Concessão Nº 002/ANAC/2012. Entre elas, a aplicação de tabelas tarifárias conforme o perfil da carga e a destinação dos produtos. Após análise do tema, a Concessionária concluiu que as cargas destinadas à exposição SP Arte não se enquadram na Tabela 9 do Contrato, aplicável exclusivamente a cargas em regime especial de admissão temporária destinadas a eventos comprovadamente científicos, esportivos, filantrópicos ou cívico-culturais. Ressalta, ainda, que o evento SP Arte, além de não atender às características acima, movimenta milhares de reais em vendas. As tarifas apresentadas estão em conformidade com a Decisão nº 109, de 7 de julho de 2017, da Anac".
Galerias de arte contestam novas tarifas de aeroportos sobre obras por Marcos Augusto Gonçalves, Folha de S. Paulo
Galerias de arte contestam novas tarifas de aeroportos sobre obras
Matéria de Marcos Augusto Gonçalves originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 4 de abril de 2018.
Em anos anteriores, taxa cobrada dependia do tamanho dos trabalhos; hoje reflete no valor delas
Galerias estrangeiras e brasileiras que trouxeram obras do exterior para participar da SP-Arte, que acontece na próxima semana, do dia 11 ao dia 15, no Pavilhão da Bienal, viram-se obrigadas a arcar com um custo extra, cobrado pelos aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Galeão.
Em anos anteriores, as obras que entravam temporariamente no país para o evento estavam submetidas a tarifas de armazenagem calculadas sobre seu peso bruto.
Agora, as concessionárias que administram os aeroportos passaram a enquadrá-las em outra tabela, com taxas cobradas sobre o valor das mercadorias.
A diferença, em se tratando de obras de arte, é brutal. A galeria Nara Roesler, por exemplo, que trouxe de fora do país obras do argentino León Ferrari (1920-2013), pagaria R$ 200 pela armazenagem das obras em Guarulhos, mas, com a mudança, desembolsou R$ 17.000.
“Tive que arcar com esse custo porque tenho um compromisso com o instituto León Ferrari da Argentina”, diz.
A armazenagem refere-se ao período em que as obras ficam estacionadas nos aeroportos à espera de liberação por parte da Receita Federal.
O tempo para que a entrada das obras —ou outras mercadorias— seja autorizada depende da disponibilidade do órgão federal, cujos auditores estão em greve e trabalham em regime de operação padrão desde novembro de 2017.
“É uma situação absurda”, diz Fernanda Feitosa, diretora da feira, que impetrou um mandado de segurança na tentativa de evitar a mudança de critério.
Ela obteve uma decisão liminar que a seguir perdeu efeito prático, pois a Justiça decidiu que em caso de contestação as galerias deveriam depositar em juízo os valores cobrados pelos aeroportos.
As concessionárias alteraram o critério com base numa reinterpretação de um termo usado nas normas da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), que prevê valores menores para cargas em casos especiais, como participação em “eventos de natureza científica, esportiva, filantrópica ou cívico-cultural”.
Para o departamento de assuntos jurídicos do Aeroporto Internacional de São Paulo, evento “cívico-cultural” precisaria ser “patriótico”, o que não seria a SP-Arte.
Em nota para a Folha, a concessionária diz que “segue todas as regras previstas no Contrato de Concessão” e que após análise do tema concluiu que as cargas destinadas à feira não se enquadram no requisito “cívico-cultural”.
Feitosa e seus advogados contestam tal interpretação. “Essa expressão hoje em dia não encontra respaldo em nenhum texto legal, e civismo não se restringe a patriotismo. O acesso à cultura é um direito do cidadão e que portanto eventos culturais são por natureza cívicos”, diz.
Para ela, “não cabe ao aeroporto definir o que é ou não é cívico-cultural” —expressão que, aliás, data de regulamentos passados, como uma portaria de 2001, sobre o tema, assinada pelo Ministério da Aeronáutica.
O pleito da SP-Arte recebeu apoio tanto do Ministério da Cultura (MinC) quanto da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo.
O MinC enviou ofício à Anac considerando que “o termo cívico-cultural admite variações, mas, em todas, refere-se à convivência social”.
Para a galerista Luciana Brito, presidente da Abact (Associação Brasileira de Arte Contemporânea) “mudanças nos processos poderiam ser feitas através de uma análise mais detalhada do impacto em cada setor e, sobretudo, com diálogo e negociação entre as partes afetadas”.
Márcia Fortes, sócia da galeria Fortes D´Aloia & Gabriel diz que “o que já era extremamente difícil vai ficar pior — expor e vender obras de arte importadas no Brasil, mesmo que de autoria de artistas brasileiros. É impressionante a disposição de grande parte de nossos agentes públicos para retirar o Brasil do mercado competitivo”.
abril 1, 2018
Vender obra de arte para pagar dívidas, como quer o MAM, é um descalabro por Jorge Coli, Folha de S. Paulo
Vender obra de arte para pagar dívidas, como quer o MAM, é um descalabro
Artigo de Jorge Coli originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo em 1 de abril de 2018.
Todo o acervo de um museu é importante e precisa ser protegido das flutuações de tendências
O Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro decidiu vender um Pollock, doado por Nelson Rockefeller em 1954, para pagar dívidas. O Instituto Brasileiro de Museus, vinculado ao Ministério da Cultura, protestou. O ministério, ao contrário, foi favorável à venda.
Alienar obras pertencentes a museus é uma prática que existe nos Estados Unidos. Ela é controlada pela regra de aprimorar acervos: só se podem vender obras para comprar outras, significativas. O Metropolitan Museum of Art, de Nova York, por exemplo, considerou que tinha muitos Renoir de uma mesma época e semelhantes entre si. Vendeu alguns para adquirir um quadro, "Os Natchez", de Delacroix, cujo tema tem vínculo com a história norte-americana.
Não é o caso do Pollock carioca. Se o negócio for feito, será para resolver questões financeiras, consequência de más gestões. O Ministério da Cultura, no entanto, declarou: "A instituição [MAM Rio] demonstra estar olhando para o futuro, alinhando-se com as tendências internacionais de excelência em gestão de museus".
É falso. Vender quadros, mesmo para o aprimoramento do acervo, não é uma tendência internacional. Ela é bastante criticada, dentro e fora dos Estados Unidos. Obras que pertencem a um museu fazem parte de sua história. Assinalam interesses, tendências, gostos de momentos diferentes. Isso é o que faz um museu vivo.
Todo seu acervo é importante e precisa ser protegido. Abrigado, entre outras coisas, das flutuações do gosto, das modas e das tendências. Aquilo que parece uma boa troca hoje pode não o ser amanhã. Renunciar a uma obra para pagar dívidas, então, parece-me um descalabro. Sem contar que, no Brasil, existe quase sempre nos grandes negócios (não me refiro aqui ao MAM) "a parte dos anjos", bem conhecida pelos amantes de uísque e conhaque: aquele tanto que evapora dos barris e ninguém sabe para onde vai.
Há mais alguns pressupostos. A venda do Pollock será feita, provavelmente, no mercado internacional, e a obra sairá do Brasil. Exportamos obras de arte bem facilmente. Assim, foi embora para o Texas a coleção do construtivismo brasileiro reunida por Adolpho Leirner; o magnífico André Lhote que pertenceu a Mário de Andrade —e que a casa Sotheby's definiu em seu catálogo como "talvez a obra-prima da carreira do artista"— foi vendido em Nova York em 2011 por US$ 2,5 milhões; e coleções de banqueiros quebrados no Brasil dispersaram-se no mercado internacional. Nada ilegal. Apenas imoral.
O paradoxo é que, ao contrário, importar obras de arte é complicado e desencadeia taxas altíssimas. Arte é tratada na alfândega como objeto de consumo, e não como patrimônio —situação que desestimula colecionadores e incita o contrabando. Ou seja, não apenas o que está no Brasil fica vulnerável, sujeito à exportação, como o engrandecimento de nosso acervo cultural é dificultado.
Outro ponto: nunca vi o quadro de Pollock exposto no MAM Rio. Por uma boa razão: os acervos permanentes dos museus não são mostrados permanentemente. É preciso a coincidência de uma exposição para que se possa descobrir tal ou qual obra.
Eis uma concepção que minimiza a importância do acervo. Ela vem dos anos 1960. Tenho para mim que seu marco inaugural foi o edifício do Museu Guggenheim, em Nova York, concebido por Frank Lloyd Wright e aberto em 1959.
Sua originalidade arquitetônica o tornou célebre de imediato e trouxe também uma noção específica de museu: uma espetacular hipertrofia da sala de exposições temporárias, em espiral, hoje enxertada num anexo de 1992 que se destina ao acervo permanente. É que museu, nos anos da modernidade triunfante, virara sinônimo de coisa morta e empoeirada. Era preciso "animá-lo".
No Brasil, a cultura é mais frágil nesse campo. Essa ideia virou moda, se alastrou e permaneceu. A tal ponto que museu passou a ser, entre nós, definido como prédio, e não como coleção. Seria fácil dar exemplos de "museus" que foram construídos por aqui sem nenhum acervo. E outros que tinham coleções importantíssimas e passaram a escondê-las para dar lugar a atividades efêmeras.
Nos grandes centros culturais, essa visão está hoje ultrapassada. Museus relevantes pensam com cuidado em como expor suas obras para deixá-las estáveis por décadas. Sabem que sequestrar seus tesouros maiores em suas reservas é uma indignidade. Salvo exceções louváveis, isso ainda não é regra no Brasil. Quer dizer, por aqui, os acervos tornaram-se secundários. Que importa, então, desfazer-se de uma obra?
Jorge Coli
É professor titular de história da arte na Unicamp e autor de 'O Corpo da Liberdade' (Cosac Naify).