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outubro 29, 2014
Pinacoteca do Estado de São Paulo comunica mudança de diretoria
Comunicado à imprensa
São Paulo, 28 de Outubro de 2014
A Associação Pinacoteca Arte e Cultura – APAC, Organização Social responsável pela gestão da Pinacoteca do Estado de São Paulo e Memorial da Resistência, vem a público comunicar mudanças em sua diretoria.
Após 12 anos trabalhando com a Pinacoteca, o Diretor Técnico, Ivo Mesquita, pediu seu afastamento para dedicar-se a projetos pessoais. No entanto, conforme a prática na passagem deste tipo de cargo e função em museus, ele deverá permanecer à frente desta Diretoria por um período de transição até fevereiro de 2015.
Sob a gestão técnica de Mesquita a Pinacoteca realizou exposições memoráveis, tais como as panorâmicas de Alberto Giacometti (2012), Waltercio Caldas (2013), Willian Kentridge (2013), Mira Schendel (2014) e Ron Mueck que abrirá ao público no próximo dia 20 de novembro. Mesquita ainda contribuiu para a ampliação e o aperfeiçoamento de diversas áreas técnicas do Museu, como os Núcleos de Pesquisa, Educativo e Produção, além de estabelecer forte diálogo com a cena cultural de fora do país, inserindo a Pinacoteca no restrito circuito internacional dos grandes museus.
“Em nome do Conselho de Administração, gostaria de agradecer especialmente a Ivo Mesquita por todo sua contribuição à Pinacoteca nos últimos 12 anos. Sua marca ficará registrada na história deste Museu”, afirma José Olympio Pereira, Presidente do Conselho de Administração da APAC.
Para assumir como Diretor Superintendente, cargo que também contempla as atividades técnicas do Museu, a APAC convidou o professor Tadeu Chiarelli. Chiarelli é doutor em Artes pela Universidade de São Paulo, USP, foi curador-chefe do Museu de Arte Moderna de São Paulo e Diretor do Museu de Arte Contemporânea da USP, além de atual presidente do Conselho de Orientação Artística da Pinacoteca, órgão consultivo da Secretaria de Cultura do Estado.
Para compor a equipe de Chiarelli, foi convidado a assumir a Diretoria Administrativa Financeira, o administrador Marcelo Dantas, braço direito de Miguel Gutierrez, que há um mês deixou a Pinacoteca e responde pela mesma diretoria no MASP. Dantas é colaborador da Pinacoteca desde 1998 e dará continuidade com transparência, eficiência e responsabilidade à gestão financeira de um dos principais museus do país.
Paulo Vicelli, diretor de Relações Institucionais desde 2012, continua como responsável pela Comunicação, pelo Marketing e pela Captação de recursos da Pinacoteca.
"Tive o prazer de trabalhar com o Tadeu Chiarelli entre 1997 e 2000, quando fiz parte da diretoria do MAM SP e fico muito feliz em poder contar com a sua contribuição agora também na Pinacoteca" diz José Olympio Pereira, e conclui "Gostaria de saudar os novos membros da diretoria e expressar a confiança do Conselho na continuidade do excelente trabalho realizado por seus antecessores”.
Associação Pinacoteca Arte e Cultura - APAC
Curador Tadeu Chiarelli será novo diretor artístico da Pinacoteca por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Curador Tadeu Chiarelli será novo diretor artístico da Pinacoteca
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 27 de outubro de 2014.
Em reunião do conselho na noite desta segunda (27), a Pinacoteca do Estado de São Paulo escolheu Tadeu Chiarelli como novo diretor artístico do museu.
Chiarelli, ex-diretor do Museu de Arte Contemporânea da USP, tomará posse no ano que vem. Ele sucederá Ivo Mesquita. Segundo a Folha apurou, Mesquita foi demitido por uma decisão do conselho administrativo da Pinacoteca, presidido pelo colecionador José Olympio Pereira.
Mesquita permanece no cargo até a chegada de Chiarelli e confirmou sua saída. De acordo com funcionários e conselheiros do museu, havia um desgaste entre Mesquita e diretores das áreas financeira e de relações institucionais, já que a direção do museu é dividida entre esses três departamentos, cada um com poder igualitário.
Esse conflito interno, segundo funcionários e conselheiros ouvidos pela Folha, vem se arrastando há pelo menos seis meses e se agravou nas últimas semanas. Mas a gota d'água para a saída de Mesquita, segundo conselheiros, foi a intransigência em diminuir o orçamento do ano que vem, que poderia levar à quebra do museu.
No cargo há dois anos, Mesquita assumiu a posição com a saída de Marcelo Mattos Araújo, atual secretário estadual da Cultura, que antes exercia sozinho as funções de três profissionais.
Antes da saída de Mesquita, Miguel Gutierrez, da área financeira, deixou o museu, há um mês, para assumir esse departamento no Masp, o que sinaliza um desmantelamento da atual direção técnica e financeira da Pinacoteca.
Curador respeitado no circuito brasileiro e internacional, Mesquita era o braço direito na direção da Pinacoteca quando o museu estava sob o comando de Marcelo Araújo, tendo começado como coordenador da área de pesquisa em história e crítica de arte, há sete anos.
Ao lado de Ana Paula Cohen, ele foi curador da Bienal de São Paulo de 2008, conhecida como a Bienal do Vazio, polêmica edição que deixou um andar inteiro do pavilhão sem obras e foi alvo de ataques de pichadores.
Mesquita também já foi diretor artístico do Museu de Arte Moderna de São Paulo, de 2000 a 2002, e da Fundação Bienal, onde trabalhou nos anos 1990.
outubro 24, 2014
Papel do Estado na cultura diferencia as candidaturas de Aécio e Dilma, Folha de S. Paulo
Papel do Estado na cultura diferencia as candidaturas de Aécio e Dilma
Matéria originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 20 de outubro de 2014.
Ausente dos debates, área deve ter peso maior em futura gestão petista, enquanto tucanos planejam minimizar participação do Estado no setor.
Ex-ministro da Cultura e coordenador da campanha na área cultural, Juca Ferreira pede o contrário do apresentado pelos tucanos, que que querem diminuir o peso estatal em vários setores, inclusive o cultural.
Suas propostas, no entanto, como a defesa de um orçamento maior para o Ministério da Cultura, ficam no plano das intenções.
Já o programa de Aécio Neves estabelece 23 diretrizes. Nenhuma delas, porém, passa de um conceito, sem apontar propostas concretas.
O texto fala em "apoio a programas de formação de público para eventos culturais", por exemplo, sem determinar como fará para tirar essa proposta do papel.
Veja o que propõe cada candidato:
PSDB defende fomento à cultura com uso maior de verbas do setor privado por Karla Monteiro, Folha de S. Paulo
PSDB defende fomento à cultura com uso maior de verbas do setor privado
Matéria de Karla Monteiro originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 20 de outubro de 2014.
O programa de governo do candidato Aécio Neves (PSDB) estabelece 23 diretrizes para a cultura.
Nenhuma delas, porém, passa de um conceito, sem apontar propostas concretas para o setor.
O texto fala em "apoio a programas de formação de público para eventos culturais", por exemplo, sem determinar como fará para tirar essa proposta do papel.
É o caso da diretriz "criação de fontes complementares de financiamento para atender ao amplo espectro das demandas culturais".
A parte cultural do programa tucano foi elaborada por um homem só, o escritor mineiro Affonso Romano Sant'Anna, 77, a partir de um "novo conceito de cultura".
Sant'Anna defende menos Estado e mais setor privado no rateio. Para isso, propõe mudanças dos fundos de investimento para a cultura, que nunca saíram do papel mas podem gerar renda a empresas via projetos lucrativos.
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Por falar em dinheiro, ele já fala num aumento de recursos para o setor, caso o tucano seja eleito presidente.
"O Aécio vai diminuir o número de ministérios e já falou em quadruplicar o atual orçamento do MinC, que é de R$ 2 bilhões mais R$ 670 milhões de emendas parlamentares", comenta. "Haverá um período de transição. Aí se conhecerá a realidade objetiva." Segundo Sant'Anna, o aumento sairia da economia oriunda do enxugamento da máquina pública.
O escritor defende ainda uma reforma da Lei Rouanet, principal mecanismo de incentivo à cultura do país, que injetou R$ 1,3 bilhão em 3.459 projetos via renúncia fiscal.
Tramita hoje no Congresso uma proposta de mudança dessa lei, visando aumentar a participação do setor privado no rateio. Em 2013, a cada R$ 10 investidos, R$ 9,50 saíram dos cofres públicos.
Confrontado pela Folha sobre a falta de propostas concretas, o escritor, que nega ser cotado para um futuro ministério, reage indignado.
"Tudo começa com a redefinição da palavra cultura. O conceito de cultura é elitista. Cultura tem que estar em todos os ministérios. Na medida que um presidente entende isto -e o Aécio entende, as coisas começam a mudar. Dar dinheiro é fácil."
O programa não deixa clara a posição do tucano sobre outros pontos importantes para o meio cultural. Entre eles estão a reforma da Lei dos Direitos Autorais (em curso no Executivo), os reajustes salariais pleiteados por funcionários do Ministério da Cultura, o uso do Vale-Cultura (benefício de R$ 50 mensais para trabalhadores que recebem até cinco salários mínimos) ou a distribuição de recursos da Ancine.
Campanha de Dilma quer 'mais e melhor Estado' no setor cultural por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Campanha de Dilma quer 'mais e melhor Estado' no setor cultural
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 20 de outubro de 2014.
À frente das propostas para a cultura na campanha à reeleição da presidente Dilma Rousseff, do PT, Juca Ferreira defende o que chama de "mais e melhor Estado". "Foi esse o recado que o povo nas ruas nos deu em junho."
Nesse ponto, Juca pede o contrário da campanha de oposição, que quer diminuir o peso estatal em vários setores, incluindo o cultural. Suas propostas, no entanto, como a defesa de um orçamento maior para o Ministério da Cultura, não se ancoram em medidas concretas, ficando no plano das intenções.
Escalado por Dilma para coordenar essa área da campanha depois que a atual ministra da Cultura, Marta Suplicy, foi vista como aliada do movimento no PT pela volta de Lula, Juca lista metas genéricas, como aumento do orçamento da pasta, reformas nos direitos autorais e na Lei Rouanet e aproximação entre a Cultura e a pasta da Educação.
Sem explicar como essa aliança aconteceria, ele acredita que ela poderia sanar crises como a enfrentada agora pela Biblioteca Nacional.
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Embora o orçamento do MinC tenha caído no ano passado, Juca diz que os recursos da área seriam incrementados por verbas provenientes do Fundo Setorial do Pré-Sal e com a aprovação da PEC-150, que estabelece gasto mínimo em cultura pelas três esferas de governo.
Mas essa medida encontra forte resistência entre prefeitos, e verbas da exploração do pré-sal só terão efeito real no médio ou longo prazo, com impacto mínimo para os próximos quatro anos.
Em resumo, Juca defende pouco além de uma continuidade da gestão Marta, que priorizou setores como o audiovisual, com a lei que prevê cota de exibição de produções nacionais na TV paga, e ações afirmativas, como o edital para produtores culturais afrodescendentes.
"Políticas de cotas são essenciais para fortalecer a democracia. Ela só tem a avançar com essa política, que trata diferenças com diferença."
No ponto em que mais diverge com a oposição, Juca afirma que o próximo governo deve se comprometer com a reforma dos direitos autorais iniciada em sua gestão e que voltou à pauta do Ministério da Cultura após a saída da ministra Ana de Hollanda, que era contrária a essa agenda.
"Queremos desenvolver uma inventiva política cultural para o século 21, uma política do autor incorporando autores não reconhecidos na atual lei", diz. "Elaboramos uma lei avançada, mas fomos combatidos de forma vil."
Na reforma da Lei Rouanet, que ainda tramita no Congresso, o ex-ministro defende o fim da renúncia fiscal de 100%, algo que "o próximo ministro, em diálogo com a sociedade, terá de definir".
outubro 19, 2014
Bienal elege curador do país em Veneza após quebrar tradição por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Bienal elege curador do país em Veneza após quebrar tradição
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 15 de outubro de 2014.
Rompendo com a tradição, a Bienal de São Paulo indicou um nome diferente dos curadores de sua atual edição para dirigir a representação brasileira na Bienal de Veneza, em maio do ano que vem.
Luiz Camillo Osorio, crítico de arte e curador do Museu de Arte Moderna do Rio, estará à frente do pavilhão do país na mostra italiana em vez do britânico Charles Esche, responsável pela Bienal de São Paulo agora em cartaz.
Era esperado, como em anos anteriores, que Esche assumisse o pavilhão brasileiro, mas a Fundação Bienal, responsável pela indicação à representação do país em Veneza, decidiu mudar de ideia.
"Isso já era um processo em amadurecimento", diz Luis Terepins, presidente da fundação. "Procuramos um curador brasileiro, e que fosse identificado com o trabalho daqui. A ideia é sempre experimentar coisas novas."
No ano passado, o pavilhão brasileiro em Veneza foi organizado pelo venezuelano Luis Pérez-Oramas, que também havia sido curador da Bienal de São Paulo em 2012. Sua seleção foi criticada pelo excesso de obras, fator agravado ainda pelo atraso na chegada das peças à cidade italiana.
Também houve críticas à escolha de nomes —Hélio Fervenza e Odires Mlászho— então desconhecidos no meio.
Em entrevista à Folha, Camillo Osorio, que trabalhará ao lado do curador Cauê Alves, adiantou que pretende levar um nome mais consagrado e outro ainda em ascensão a Veneza. "Quero que sejam artistas que já tenham uma presença na cena."
De certa forma, a Fundação Bienal parece ceder a pressões para escalar curadores brasileiros, já que suas últimas duas edições foram lideradas por nomes estrangeiros.
"Não existe uma preocupação de que o curador tenha de ser brasileiro. Existe uma discussão sobre o quanto esses curadores [estrangeiros] conhecem daqui", diz Terepins. "Tem também a coisa de ser uma representação nacional em Veneza, então faz sentido ser alguém daqui."
Essa troca também reflete o desgaste da relação dos diretores da Fundação Bienal com os curadores, que apoiaram o manifesto de artistas a favor da devolução do patrocínio de Israel à mostra, um debate que estourou na abertura da mostra, em setembro.
Artistas árabes e palestinos ameaçavam deixar a Bienal caso a fundação não devolvesse recursos israelenses, o que acabou não ocorrendo.
Sobre o fato de não ter sido escalado para a representação em Veneza, Charles Esche disse à Folha que "essa foi uma decisão da diretoria". "Nossas emoções não têm nada a ver com o ocorrido."
Terepins negou qualquer problema de relacionamento. "Não foi o episódio de Israel", disse. "Nosso relacionamento com os curadores é tranquilo e respeitoso."
outubro 15, 2014
Masp vai ressuscitar os cavaletes de vidro por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Masp vai ressuscitar os cavaletes de vidro
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 9 de outubro de 2014.
Num momento que define como "divisor de águas" na história do Masp, o novo diretor artístico do museu, Adriano Pedrosa, quer olhar para o passado, anunciando que vai devolver os famosos cavaletes de vidro de Lina Bo Bardi à galeria de pinturas.
Essas estruturas de vidro com uma base de concreto, aposentadas nos anos 1990, davam a sensação de que os quadros flutuavam no maior espaço do museu. Foi a grande marca do projeto de Bo Bardi na área interna do Masp, com a ideia de confronto cara a cara entre obra e público.
"Voltar com os cavaletes é um gesto genuíno por achar que isso tem uma radicalidade, uma subversão", diz Pedrosa, em entrevista à Folha . "Muitos de nós não conviveram com eles, e há um desejo que voltem. Não é um gesto de marketing, mas vai ser nossa grande ação agora."
Pedrosa também anunciou uma reestruturação arquitetônica do segundo andar, removendo as paredes instaladas ali pela antiga diretoria.
Será uma espécie de expurgo da velha gestão do Masp, substituída em setembro com a eleição para a presidência do empresário Heitor Martins, rompendo um ciclo de 20 anos em que o museu esteve sob o comando do arquiteto Júlio Neves e de seus aliados.
Desde que aceitou o cargo de curador do museu, substituindo Teixeira Coelho, Pedrosa vem frisando que o Masp deve olhar para o passado na hora em que está tentando redefinir seu futuro.
"Não quero chegar e começar algo do zero sem entender a história do museu", diz Pedrosa. "Esse é o momento de olhar para o acervo e retomar exposições históricas."
Nesse sentido, o curador adiantou que suas primeiras mostras no Masp vão revisitar ideias por trás de exposições do museu nos anos 1960 e 1970, como "A Mão do Povo Brasileiro" e "GSP/76".
Enquanto sua maior proposta se volta para o passado, Pedrosa está escalando uma equipe de curadores-adjuntos para trabalhar com o resto do acervo da casa.
TANGAS E REMOS
Na coleção, seu foco inicial será incrementar os acervos de moda e de arte indígena, com novas aquisições.
"Não vou sair por aí comprando tangas e remos", diz. "Quero dialogar com outras instituições e ver o que pode vir para o Masp. É importante olhar para matrizes que não são europeias, algo que tem a ver com ser brasileiro."
Também está em curso uma negociação com a prefeitura para reaver o controle do vão livre —a feira de antiguidades que acontece ali aos domingos seria deslocada para que o espaço abrigue eventos e exposições. "Queremos retomar e potencializar o grande vão do museu", diz Pedrosa. "Esse é um momento em que o Masp se abre para a cidade."
E também para o mundo. Pedrosa quer uma revisão da política de empréstimos, que considerou "conservadora" na gestão passada. A ideia é usar a troca de obras para criar relações com instituições de peso no mundo.
Uma obra de Cézanne será emprestada em novembro para o Metropolitan, em Nova York, e desenhos de Bo Bardi irão para Munique.
outubro 14, 2014
Crítica: Retrospectiva do Rumos vale pela importância de edital na cultura por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo
Retrospectiva do Rumos vale pela importância de edital na cultura
Crítica de Fabio Cypriano originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 13 de outubro de 2014.
Entre os centros culturais vinculados a instituições financeiras, o Itaú Cultural desponta como um dos locais com maior coerência em sua programação. Isso ocorre graças a uma política cultural consistente que não só foge do mero evento como tampouco terceiriza a outros produtores suas exposições.
Nos últimos 16 anos, o programa Rumos Artes Visuais é uma ação exemplar muito além da organização de algumas mostras. Ele mobilizou curadores de todo país a estimularem a produção local por meio de debates e visitas.
Essa iniciativa ímpar, mais próxima do que deveria ser uma ação do governo, inspirou a curadora Lisette Lagnado, em 2005, a usar o Acre como um dos eixos da Bienal que organizou, em 2006, após participar do programa.
REFORMULAÇÃO
Sem se ater a uma receita que se revelou de sucesso, o Itaú reformulou o Rumos no ano passado. Agora, a seleção de projetos não se dá mais por área específica de expressão, o que é totalmente coerente com o que de melhor vem sendo feito. Grupos como o Teatro da Vertigem transitam entre teatro, performance e artes visuais.
Para marcar a mudança, o Itaú encomendou a três curadores – Aracy Amaral, Paulo Miyada e Regina Silveira – a seleção de artistas representativos da trajetória do edital, que resultou na mostra "Singularidades/Anotações", que compreende o período entre 1998 e 2013.
Em primeiro lugar, a constatação da dificuldade de ocupação da sede da instituição é incontornável. Mesmo após diversas reformas, as salas expositivas seguem com pé direito baixo demais e com uma divisão que não ajuda mostras que se desenvolvem nos três andares.
Outra dificuldade em uma exposição que revê dezenas de artistas em um período tão abrangente é a sua própria seleção. Ela tem o risco de se tornar óbvia em excesso, com os nomes de sempre, que se tornaram quase obrigatórios em exposições sobre a recente produção nacional, como Thiago Martins de Melo, Rodrigo Braga, Cinthia Marcelle e Marcius Galan.
A questão aí, e nisso os curadores não podiam se eximir, é que se trata de uma exposição sobre o Rumos e, afinal, não se podiam tirar justamente os nomes que despontaram no programa.
Assim, é notável a inclusão de artistas que trabalham em uma chave já um tanto desgastada como o binômio arte-tecnologia, em que se destacam Gilbertto Prado, Katia Maciel e Lucas Bambozzi. Tratando-se de uma mostra retrospectiva, faz sentido.
Vista apenas como uma exposição, "Singularidades/Anotações" é um panorama um tanto óbvio e desconexo da produção atual.
Contudo, dentro do contexto do programa Rumos, a exposição aponta que o evento só faz sentido dentro de uma política cultural que fortaleça o meio artístico.
outubro 8, 2014
Who funds the arts and why we should care por Rachel Spence, Finantial Times
Who funds the arts and why we should care
Matéria de Rachel Spence originalmente publicada no jornal Finantial Times em 19 de setembro de 2014.
As the arts increasingly depend on private and corporate funding, questions arise about how closely artists and institutions should examine the sources of finance
Anyone passing through Tate Modern’s Turbine Hall one recent Saturday might have witnessed an unscheduled performance by a group of people writhing beneath a huge square of black cloth. Taking its motif from the Malevich exhibition at Tate, the event – entitled “Hidden Figures” – was designed to flag up the museum’s refusal to reveal details of its financial relationship with BP. It was the latest in a series of protests about the sponsorship of institutions – among them the British Museum and the National Portrait Gallery – by the energy giant responsible for the Deepwater Horizon disaster of 2010.
The protesters have been undeterred by the fact that the institutions have acted perfectly within the law, or that BP has been a generous and longstanding sponsor of the arts. Rather, such events are the tip of an iceberg of anger currently focused on a wide range of sponsorship, which in recent years has become an essential part of the infrastructure of the art world. In the past few weeks alone, the São Paulo Biennial dropped the logo of the Israeli Embassy after artists and curators complained. A week earlier, the Gwangju Bienniale’s president resigned and various artists withdrew after its financial backer, the city’s government, censored a work.
Both Manifesta in Russia and the Sydney Biennale have been hit by boycotts. Frieze Art Fair in New York ran into trouble for using non-unionised labour, and the organisation has now agreed to employ only unionised workers next year. Meanwhile, the labour conditions on Abu Dhabi’s Saadiyat Island, which provoked an artists’ threatened boycott of museums being built there, including the Guggenheim and the Louvre, are still unresolved.
Governments, too, are stepping into the debate. Last month, Art Basel heard that a change in Swiss law might mean that it loses its sponsorship from cigar manufacturer Davidoff. (In the UK, tobacco companies are allowed to sponsor cultural and sporting events only if they use their company name rather than a brand of cigarettes.)
Art and patronage are ancient bedfellows and bursts of outrage are nothing new. But the sheer weight of discontent suggests we are reaching a tipping point. When the curators of the São Paulo Biennial wrote to the organisers in support of the artists’ objections, they declared that the Brazilian situation “should also be a trigger to think about funding sources of major cultural events”. In their opinion, “the sources of cultural funding have an increasingly dramatic impact on the supposedly ‘independent’ curatorial and artistic narrative of an event”.
The thrust of this argument is that art is compromised if the finance is unethical. “In the 31st biennial, much of the work seeks to show that struggles for justice in Brazil, Latin America and elsewhere in the world are connected,” the São Paulo curators continue. In other words, work will lose its integrity if it depends on support from those seen to be perpetuating problems.
The tensions extend beyond geopolitics. “Creativity has become . . .instrumentalised both by capitalism and the nation state,” says São Paulo curator Charles Esche. In some countries, once-generous state subsidies have been swept away. In others, they never existed. Whatever the history, art’s paymasters will always have their own agenda. “During the cold war, institutions were representing that conflict in their programming,” says Esche of a period when state funding was far more beneficent in northern Europe.
Now, the growing dependence on private funding is igniting new concerns. “The corporate ethos has permeated deeply into museum culture,” says Professor Julian Stallabrass of the Courtauld Institute of Art, who has written extensively on the pact between commerce and culture. “The brand permeates everything, from the products in the shop to the designer uniform of the staff.”
Like the São Paulo curators, Stallabrass points out that the tension between content and context creates a paradox. “Much avant-garde and contemporary art is actively hostile towards capitalism. If an artist who is critiquing corporate power is presented as part of this branded apparatus, the work is being betrayed quite fundamentally.” Equally, when an institution or an event is being sustained through, say, exploitative labour practices, certain artists are going to question the ethics of their own participation there.
Curators are questioning whether dependence on private benefactors exacts too high a price. Emily Pethick, of the Showroom, a London-based, not-for-profit space that specialises in emerging and experimental artists, says: “Previously, when I was working in the Netherlands where we had a much higher subsidy, we could speculate and take more risks.”
The Showroom, in partnership with two other non-profit spaces, Studio Voltaire and Chisenhale Gallery, was recently the beneficiary of a £210,000 grant from Arts Council England that is only awarded on the basis that the recipient can match these funds with private donations. She finds, however, that it is a struggle to persuade private givers, in particular corporate investors, trusts and foundations, to buy into ideas that are still at the speculative stage. “That’s what happens with the attrition of public funds,” says Pethick.
Elsewhere, the shift in mood is equally tangible. Julia Friedrich, a curator at the Ludwig Museum in Cologne, says there is now far more pressure to find private sponsorship for shows than there was even 10 years ago. She believes that a loss of independence is inevitable when private money is involved. “Sponsors want exhibits that are popular. I am not saying that popular artists are bad artists but the choice is not as independent as it is when the money is there already. Most sponsors think very carefully about what they want to connect their names and logos to.”
The institutions say they have no choice but to buy into the slick new world. “It’s a very competitive market for all art institutions,” says Jennifer Suggitt, head of corporate relations at the British Museum, which for 2013-14 received a government grant of £43.9m (£1.5m less than the previous year) and raised more than double that sum from a mix of donations, legacies, and commercial and charitable activities.
“We have to be pragmatic about the fact that the only way we can put on temporary exhibitions of the world-class standard we aspire to is if we have external funding. And the levels of funding that we look for are possible only through the corporate world.”
Some of the most active cultural sponsors are investment banks. The British Museum, for example, lists Morgan Stanley, Goldman Sachs and Bank of America Merrill Lynch among its corporate partners. Asked whether or not there was a contradiction in a public cultural institution taking money from companies that are simultaneously under fire for damaging the fabric of society, Suggitt replied: “It’s not for the British Museum to judge how organisations operate.” She is fearful that “so much criticism [of those] supporting the arts could really affect how much arts organisations are funded in future”.
Yet if an institution’s financial relationships are irreproachable, why is there so little transparency? I could find no one at Art Basel prepared to answer a question about why it felt it acceptable to take tobacco sponsorship. Instead, Art Basel issued a statement that simply applauded Davidoff as a “dedicated supporter of art”. Both Tate Modern and the British Museum declined to give me any financial details about their collaborations with BP, stating that the link was in line with their ethics policies.
The refusal to be more communicative can put public institutions on shaky ground. In April this year, the UK Information Commissioner ruled that Tate should remove redactions from committee minutes that discussed details of the BP sponsorship. Tate has appealed against that ruling and is awaiting a judgment.
If the art world finds itself with more moral watchdogs snapping at its heels than ever before, it is partly as a result of its unprecedented growth. Every year, we see more biennials, new museums, the expansion of older museums and glossier shows, all of which must be funded. Simultaneously, more artists are making works with a political and social resonance. “Culture is much more politicised,” says Esche. “The changes in funding are going in hand in hand with changes in the kind of role that artists are demanding.”
A new commitment to openness will not neutralise the situation but it may defuse it a little. “Transparency is essential,” observes Esche. “So far it’s happening as a struggle rather than a protocol. It needs to become a protocol.”
Em centenário, Lina Bo Bardi é celebrada como estrela por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Em centenário, Lina Bo Bardi é celebrada como estrela
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 7 de outubro de 2014.
Uma mulher que dizia escolher a liberdade em vez da beleza e que achava estar jogando pérolas aos porcos com sua arquitetura "bruta e feia" nunca esteve tão na moda.
Lina Bo Bardi, morta aos 77 em 1992, faria cem anos em dezembro deste ano. Seu centenário agora turbina uma onda de exposições e lançamentos de livros que tentam explicar como a arquiteta do Masp e do Sesc Pompeia deixou de ser uma "diletante" excêntrica para entrar no círculo dos maiores mestres do modernismo no mundo.
Em vida, Bo Bardi não era aceita pelo establishment. Arquitetos em voga no auge do modernismo brasileiro não entendiam suas ideias de abandonar cada vez mais a austeridade racionalista do estilo internacional e abraçar a simplicidade da arquitetura popular como a base de uma nova modernidade.
Mais de 20 anos depois de sua morte, teses sobre seu legado proliferam nas universidades. Artistas plásticos fazem releituras –boas e péssimas– de suas ideias, enquanto exposições estão prestes a celebrar Bo Bardi como uma "estrela póstuma".
Nas palavras de Carlos Eduardo Comas, um dos curadores de uma aguardada mostra de arquitetura latino-americana marcada para março do ano que vem no MoMA, em Nova York, a arquiteta está sendo "descoberta pela intelligentsia" global.
Tal descoberta é tão grande que Bo Bardi será um dos nomes centrais da mostra do museu norte-americano, que ampliou seu escopo para incluir o desenho do Sesc Pompeia, uma das últimas –e melhores– obras da arquiteta.
"Ela era colocada um pouco de escanteio, mas o peso de sua obra é incontornável", diz Comas. "Esse reconhecimento atual tem a ver com um interesse renovado pelo modernismo e a descoberta do Brasil em termos geopolíticos."
De certa forma, Bo Bardi está em ascensão no plano mundial desde que a Bienal de Arquitetura de Veneza dedicou uma sala a ela, há quatro anos.
Essa edição da mostra italiana organizada pela japonesa Kazuyo Sejima, famosa por seus projetos de poucas e claríssimas linhas, jogou luz sobre como Bo Bardi já fazia uma apologia à simplicidade.
DELÍRIOS HIPPIES
Marcelo Ferraz, que trabalhou com a arquiteta e organiza, ao lado de André Vainer, uma mostra sobre Bo Bardi agora no Sesc Pompeia, entende sua obra como uma alternativa ao que chama de "arquitetura-show", que entrou em crise nos últimos anos.
"Hoje a arquitetura vai muito para um caminho de moda e estilo, o que é um retrocesso", diz Ferraz. "Sem dúvida, a Lina é melhor compreendida, mas há um fetiche em torno dela. Ficam delirando que ela era uma hippie, o que é muito ruim, porque tudo que ela fez acaba virando receita."
No caso, arquitetos criticam o fato de que Bo Bardi vem sendo copiada não pela essência da obra, que buscava um enraizamento singular com o entorno, e mais por traços formalistas –a superfície de seus projetos que acaba levando a uma multiplicação vazia de vãos livres e paredes de vidro.
Ou seja, a natureza iconoclasta de suas ideias, como os cavaletes de vidro que davam a impressão que as pinturas flutuavam no Masp, foi domada para virar tendência.
Uma mostra em cartaz no Museu da Casa Brasileira, aliás, chama a atenção para as soluções de Bo Bardi para espaços expositivos, mostrando que mesmo sua arquitetura mais efêmera vinha carregada de uma ideologia de confronto entre público e obra.
Talvez por essa pegada radical, sua galeria no Masp foi desmantelada. "Não é que ela estava à frente de seu tempo", diz o curador Giancarlo Latorraca. "Ela via as possibilidades reais de transformação."
Outra mostra, que abre neste mês na Casa de Vidro, onde Bo Bardi viveu, vai destacar o mobiliário da arquiteta, dando a entender como suas cadeiras e poltronas de lona e couro soltos sobre estruturas de metal ou madeira se inspiraram nas redes dos índios.
"Hoje, a Lina é quase uma porta de saída à arquitetura fashion, de tecnologia sofisticada", diz Olivia Oliveira, que acaba de lançar um livro sobre a obra construída da arquiteta. "Ela é contrária ao espetáculo, sempre tirou partido das restrições."
EXPOSIÇÕES
A arquiteta é tema de quatro exposições neste mês em São Paulo. Uma já está em cartaz no Museu da Casa Brasileira (av. Brig. Faria Lima, 2.705). Duas outras abrem nesta terça (7) no Sesc Pompeia (r. Clélia, 93). Uma quarta exposição abre em 18/10 na Casa de Vidro (r. Gal. Almério de Moura, 200)
LIVRO
Acaba de sair pela ed. Gustavo Gili "Lina Bo Bardi - Obra Construída" (R$ 140), de Olivia Oliveira
Próxima Documenta busca inspiração em Lina Bo Bardi por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Próxima Documenta busca inspiração em Lina Bo Bardi
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 3 de outubro de 2014.
No parque Ibirapuera, sob o sol do meio-dia, o curador polonês Adam Szymczyk fuma um cigarro depois de dar uma palestra. Sua franja loira quase cobre os olhos, servindo de óculos escuros. Szymczyk –que se pronuncia como um espirro– tem a aparência e a fama de "cool".
Diretor do Kunsthalle Basel, na Suíça, ele já era visto como uma espécie de "rock star" entre curadores pela cara de mau e o jeito blasé, mas sua fama só aumentou depois que foi apontado para liderar a próxima Documenta, uma das mais importantes mostras de arte do mundo, que acontece em Kassel, na Alemanha, a cada cinco anos.
No mês passado, Szymczyk participou de um seminário organizado pela revista "Brasileiros", em São Paulo, e rodou a cidade em busca de ideias para a 14ª edição da Documenta, daqui a três anos.
Mais um a ser arrebatado pelo revival em torno das ideias da arquiteta Lina Bo Bardi, que faria cem anos em dezembro deste ano, Szymczyk adiantou em entrevista à Folha que a "arquitetura de proposições e manifestos" da ítalo-brasileira será um dos nortes de sua exposição.
"Ela é interessante porque foi uma pensadora, ativista e arquiteta que fez muito para moldar a realidade social a partir da construção de museus", diz Szymczyk. "O que ela fez no Masp é um gesto corajoso de defesa do espaço público. Se há um papel para os museus aqui é que eles sejam espaços de acolhimento."
Szymczyk também foi buscar nas ideias da arquiteta uma percepção dinâmica dos espaços expositivos, exaltando os extintos cavaletes de vidro que ocupavam a maior galeria do museu como estratégia para evitar que a história se cristalize em "monumentos para a contemplação".
"Ela criou com esses suportes imateriais um confronto cara a cara entre cidadão e obra de arte", observa. "Não tinha o caráter linear dos museus. É um campo aberto, e o fato de todos nos lembramos disso significa que esses conceitos não são anacrônicos."
'URGÊNCIA PALPÁVEL'
Noutra ponte com o passado, Szymczyk quer devolver à Documenta a "urgência" que tinha entre 1955, quando começou como uma tentativa de reerguer a cultura europeia na ressaca do pós-Guerra, até a queda do Muro de Berlim, há 25 anos.
Kassel, ele frisa, ficava na fronteira entre as duas metades de uma Alemanha dividida e agora precisa retomar o contato com outras áreas geográficas em que esse sentido de urgência está cada vez mais "palpável e tangível".
Daí seu foco em lugares como a América Latina, o Oriente Médio e o sudeste da Ásia.
"Não é só um recorte geográfico. Tem a ver com olhar para os lugares onde está surgindo uma arte que desafia as regiões hegemônicas", diz o curador. "A Europa é unida até certo ponto, e muito se fala sobre como ela vem se isolando. É preciso refletir sobre a condição europeia a partir de áreas mais problemáticas."
Seu desafio, nesse sentido, será criar uma mostra capaz de traduzir as tensões do presente –qualquer semelhança com a atual Bienal de São Paulo não é coincidência– ao mesmo tempo em que reforça as raízes da Documenta como motor de reflexão em Kassel.
"Não quero as coisas flutuando, perdidas, como numa sopa", compara Szymczyk. "Quero acentuar algumas notas e criar pontos focais bem articulados na mostra."
Traduzindo, Szymczyk avisa que não vai fazer mistério em torno dos nomes que levará à Documenta e que primeiro vai discutir o esquema geral da mostra com os cidadãos de Kassel para depois ir anunciando, a partir do ano que vem, artistas que vão criar obras para a exposição alemã.
"Não deve haver um vazio entre uma mostra e outra", diz o curador. "Sou cético em relação ao suspense em torno disso. Todo valor de choque está superado nesse campo."
outubro 6, 2014
Falta de parceria entre colecionadores e instituições faz com que obras se distanciem do público por Luisa Duarte, O Globo
Falta de parceria entre colecionadores e instituições faz com que obras se distanciem do público
Artigo de Luisa Duarte originalmente publicada no jornal O Globo em 15 de setembro de 2014.
Museu de Arte do Rio (MAR) inovou, no entanto, ao pedir doações para obter telas na ArtRio
RIO — A obra de Rosangela Rennó, “Menos-Valia (Leilão)”, de 2010, exibia uma coleção de 73 objetos fotográficos adquiridos em feiras de segunda mão. A artista levava para um circuito legitimado — a 29ª Bienal de SP — aquilo que antes era destinado à invisibilidade e, ao realizar um leilão das peças durante a mostra, colocava à luz o fetiche da mercadoria vinculado à arte. “Se a arte pode fazer do lixo poesia, está sujeita a fazer da invenção uma mera cifra” — estas palavras de Moacir dos Anjos sobre “Menos-Valia (Leilão)” nos recorda uma obviedade tantas vezes esquecida: antes de ser uma mercadoria, uma obra de arte é uma invenção endereçada ao mundo.
Há três anos escrevi neste mesmo espaço um artigo sobre a repercussão da primeira edição da feira ArtRio. O texto questionava a euforia causada pelo evento e chamava atenção para as disfunções de um circuito de arte local desequilibrado, no qual o mercado se organizou muito bem enquanto outras esferas, como as instituições públicas, a crítica, as escolas, tinham um peso cada vez menor, deixando que o comércio se tornasse o parâmetro maior de legitimação do trabalho de um artista.
FRAGILIDADE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS
Passado este tempo vale colocar em pauta um outro debate. Uma reportagem publicada na capa do Segundo Caderno da última quarta-feira mostrava números reveladores: atualmente 76% da venda de obras de arte no Brasil têm como destino colecionadores, e somente 4% instituições. Esses dados levam a algumas considerações. Primeiramente reiteram a fragilidade de nossas políticas públicas de aquisição de acervo, bem como são sintomas de um grau ainda diminuto de parceria entre colecionadores e instituições. Em boa parte do mundo pessoas físicas são a origem de parcela considerável do orçamento de museus para novas aquisições. Em segundo lugar, a estatística sinaliza a existência de uma quantidade esmagadora de trabalhos que fica restrita ao circuito ateliê-galeria-casa do colecionador. Se vivemos em uma época na qual a ética do consumo está demasiadamente aplicada à arte, é importante lembrarmos que a arte é, antes de tudo, um bem comum, no sentido de que sua realização ultrapassa em muito os fins comerciais. Torna-se pertinente começarmos a desenhar dispositivos que levem essas obras para mais perto da esfera pública fazendo com que colecionadores — agentes que possibilitam que os artistas continuem a criar vivendo somente de sua obra e que ativam todo um circuito — possam atuar de maneira mais forte no que toca o papel da arte na formação de nosso país.
A arte contemporânea possui uma natureza capaz de destiná-la a um apartamento do mundo — diferentemente de livros, músicas, filmes; tal situação revela-se uma contradição cruel, pois ali estão sendo muitas vezes cultivadas reflexões ricas sobre o tempo em que vivemos.
Deixemos de lado os nomes considerados históricos e tomemos um volume considerável de artistas jovens ou em meio de carreira que certamente formam a maior parcela dentre os 76% adquiridos por colecionadores, até porque nesse nicho encontra-se um preço menos exorbitante. Esse manancial, o contemporâneo de hoje que será o histórico de amanhã, deveria ser o foco de um projeto que torne viável a circulação de trabalhos destinados a viver entre quatro paredes vistos por pouquíssimas pessoas. Ou seja, não trata-se de competir com museus e instituições públicas obviamente, mas sim de inventarmos novas maneiras de fazer com que essas obras hoje em casas e apartamentos, muitas vezes guardadas e não vistas pelos próprios donos, cheguem, mesmo que temporariamente, mais perto de todos e sejam pensadas, articuladas em público.
Nesse circuito ainda somente imaginado, haveria a tentativa de instaurar um espaço não só de obras expostas, mas de pensamento sobre a arte num sentido expandido. As obras seriam o ponto de partida, mas devido ao seu caráter não formatado, não institucionalizado, poderia haver ali um cruzamento de processos, aproximando diferentes atores da sociedade. Em “Para não dizer que não falei de arte 2”, coluna publicada no dia 12 de agosto neste caderno, Marcus Faustini afirmou: “A distribuição pela malha urbana de espaços de criação e recepção de experiências artísticas pode ser um dos termômetros considerados para medir o direito a essa mobilidade.” No texto, o autor buscava justamente imaginar formas ainda não existentes de circulação da arte na cidade, propondo “um espaço poroso e participativo, pois espaços de arte não guardam apenas repertórios para expor. São lugares de ação.”
As ideias de Faustini vão ao encontro do que tentamos esboçar — a necessidade de criarmos mecanismos que levem alguns desses trabalhos hoje abrigados em coleções para mais perto do público, fazendo com que a obra “viva”. Se o que está dito aqui parece tateante é porque não trata-se de um pensamento fechado, mas que surge com a vontade de abrir espaço para um debate permeado por mais perguntas do que certezas, mas convicto de sua pertinência.
Nesta edição da ArtRio, entretanto, uma iniciativa diferente chamava atenção: algumas obras expostas em diversas galerias traziam sinalização de que seriam do interesse do curador do Museu de Arte do Rio (MAR), Paulo Herkenhoff, para o acervo da instituição. Com isso, público e pessoas jurídicas podiam se oferecer para doar valores para as aquisições, em uma espécie de crowdfunding presencial. Vejamos com o balanço final, ainda a ser revelado, qual o impacto da ação.
Adriano Pedrosa será curador do Masp por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Adriano Pedrosa será curador do Masp
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 1 de outubro de 2014
Um dos nomes mais respeitados do cenário artístico do país, Adriano Pedrosa será o novo curador do Masp.
A decisão de mudar a curadoria havia sido anunciada pelo novo presidente do museu, o empresário Heitor Martins, como uma das prioridades de sua gestão, que começou no fim de setembro depois de longas negociações com a antiga cúpula à frente do Masp.
Pedrosa vai liderar uma equipe de três curadores associados, substituindo o atual titular da área, Teixeira Coelho, que ocupou o cargo pelos últimos sete anos.
Num esforço para redefinir a "vocação" do Masp e tornar mais "aberta" sua relação com a sociedade, Martins enxerga na mudança da curadoria um passo fundamental para devolver a credibilidade que o museu vem perdendo.
Com dívidas de R$ 12 milhões e pendências com o Ministério da Cultura, o museu vive um momento de crise que a nova gestão tentará sanar, e por isso, de acordo com membros da nova diretoria, a programação do ano que vem será mais enxuta.
Na semana que vem, Pedrosa deve apresentar ao conselho do Masp seu plano inicial para a área responsável por definir a programação do museu e seu eixo conceitual.
À diretoria, ele propôs realizar 12 exposições no ano que vem, sendo oito delas com obras do acervo do museu —conjunto de 8.000 peças avaliado em US$ 2 bilhões— e quatro delas mostras temporárias, que deverão ser elaboradas por ele e sua equipe.
Pedrosa despontou no cenário artístico do país nos anos 1990, quando integrou a equipe do curador Paulo Herkenhoff na 24ª Bienal de São Paulo, dedicada a uma reflexão sobre o movimento antropofágico e responsável por alavancar a mostra a um novo patamar internacional.
Ele é responsável por quatro mostras em cartaz no país, todas bem avaliadas pela crítica –as retrospectivas de Leonilson e Rivane Neuenschwander e as coletivas "Artevida" e "Histórias Mestiças".
Também integrou a curadoria da 27ª Bienal de São Paulo, em 2006, e foi um dos curadores-chefes da Bienal de Istambul, em 2011.
Adriano Pedrosa já figurou na lista dos nomes mais poderosos e influentes na cena artística global elaborada a cada ano pela revista britânica "ArtReview", que funciona como espécie de termômetro mundial de tendências.
Sua escolha para chefiar o maior museu da América Latina está em sintonia com os planos da nova direção de devolver o peso institucional perdido pelo Masp. E também sinaliza maior abertura ao resto do mundo, já que a equipe de Pedrosa deverá incluir alguns nomes estrangeiros.