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maio 28, 2014
Nuno Ramos: Suspeito que estamos..., Folha de S. Paulo
Nuno Ramos: Suspeito que estamos...
Tendências/Debates de Nuno Ramos originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo em 28 de maio de 2014.
Há tempos venho tentando responder ao convite para escrever nesta página três. O jornal me propôs vários temas, mas nunca me senti preparado para dar conta de nenhum. Então resolvi escrever sobre o que não sei, mas suspeito.
Suspeito que o tema primordial e decisivo da sociedade brasileira sempre tenha sido, e seja ainda, a violência. A vida no Brasil nunca valeu muito. Hoje vale ainda menos. Giramos em torno disso como um animal preso ao poste. Suspeito que o sentimento de agoridade que nos caracteriza faça fronteira com essa violência. Suspeito que precisaríamos, como contraponto, de maior lentidão e inércia.
Perto da violência, suspeito que tudo saia do lugar. Noções como alto e baixo, direito e esquerdo, bem e mal, certo e errado se confundem. Por estar em toda parte, suspeito que esse tema aproxime-se, entre nós, do impensável, e que traga em seu DNA, como esses vírus de mutações constantes e velozes, alguma coisa metamórfica que sempre se transfigura e escapa.
Suspeito no entanto que haja um vínculo estreito entre violência e burrice urbana. Além de morar em São Paulo, andei recentemente por Salvador, São Luís, Manaus, Natal –suspeito que sejam, todas elas, cidades apodrecendo sob o sol. Quarteirões tombados tombando, de um lado; prédios totalmente desconectados da cidade (além de feios), sem cota nem propósito urbano, de outro. Suspeito que entre o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e a especulação imobiliária uma curiosa aliança esteja aos poucos se fazendo –ruínas orgulhosas copulando com despautérios azulejados de 30 andares.
Suspeito que cada detalhe desses grandes centros urbanos esteja em situação igualmente trágica. Suspeito, por exemplo, que quase todas as praias em cidades desse porte tenham ficado estreitas, comprimidas contra um muro de arrimo. Como não podemos mais transportar o paredão dos egoístas (a expressão é de Le Corbusier) cem ou 200 metros no sentido da montanha, suspeito que será preciso aterrar o mar para termos novamente praias em escala decente. Suspeito que muitas vezes as piadas que fazemos com os portugueses se apliquem a nós.
Suspeito que a indústria cultural brasileira seja também ela violenta. Assisti a Luciano Huck "modernizando" a ximbica de um espectador. Vi esse espectador chorar, depois mover os braços como se quisesse abraçar os joelhos do apresentador. Suspeito que isso seja cruel. Suspeito que isso seja cretino.
Suspeito que o tropicalismo tenha naturalizado nossa indústria cultural até um ponto sem retorno, e que o ciclo de conquistas democráticas provenientes dessa operação tenha já se encerrado há décadas. Suspeito que perceber o tiquinho de crueldade que haveria em atirar bacalhau nas pessoas não faça mal nenhum ao país; surpreender um ríspido sargento no modo como Ivete Sangalo dança e canta também não. Suspeito que acessar algo de ridículo no "Jornal Nacional" –a falsa intimidade da dupla, seu balé de rostos virando para a câmera, a ruga na sobrancelha de William Bonner, como um aluno estudioso se preparando para começar uma prova, a gostosíssima Patrícia Poeta descrevendo, e ainda mais com esse nome, a chegada de um tsunami ou terremoto de nove graus na escala Richter– seja uma conquista nacional relevante. Suspeito, no entanto, que nessa área caminhemos para uma verdadeira hagiografia, unilateral e coletiva (daí o esforço, essencialmente religioso, de controlar biografias).
Suspeito que a falência do caríssimo estado brasileiro esteja maquiada por uma espécie de chantagem inconsciente –com uma distribuição de renda como a nossa, sem ele seria ainda pior. Suspeito que esse raciocínio seja imobilista e refém de si mesmo, e que tenhamos perdido completamente qualquer medida de eficiência que permita cobrar o Estado como um prestador de serviços (com a morte galopante da Política, suspeito que seja nisso que ele venha se transformando).
Suspeito que a enorme migração do imaginário político para o econômico nos países desenvolvidos tenha ocorrido após uma razoável distribuição de renda via imposto e conquistas sindicais. A tirania da vida econômica sobre a política, entre nós, se deu num quadro social ainda trágico, que solicitaria muito da política. Suspeito que nossa falta de agudeza e imaginação políticas sejam, por isso, eticamente imperdoáveis. Suspeito que imaginação política no Brasil seria a capacidade de transformar o aumento de renda, a partir do Deus-PIB, em aumento de direitos, a partir do Deus-cidadania.
Tenho 54 anos e suspeito que os únicos projetos nacionais com Pê razoavelmente grande que acompanhei sejam o Plano Real e o Bolsa Família. Suspeito que não estejam tão distantes do imaginário desenvolvimentista, árido e autoritário, dos anos 70 e que afinal isso seja pouco para toda uma geração –e se suspeito que estou sendo injusto com um grupo enorme de pequenos projetos que poderia chamar de redemocratização, que me permitem inclusive escrever isto aqui num grande jornal, suspeito também que isso não passe de obrigação cívica.
Por sinal, suspeito que tenhamos perdido completamente a medida dessa obrigação, e que toda a cultura brasileira venha enfrentando fortes problemas de escala. O que é o máximo? O que é o mínimo? De onde o horror não passa? Dessa vez chega? Qual o limite? Mesmo em casos extremos (conectar um pescoço humano a um poste com uma trava de bicicleta, por exemplo), suspeito que nossa medida continue vaga, elástica.
Suspeito que o termo dívida interna, de memória econômica, descreva bem o país –devemos aos deserdados, aos desocupados, aos desmantelados, aos desabitados, aos destrambelhados e aos desmemoriados. Devemos renda, saúde, educação, claro, mas também avencas, bueiros, ruas, parques, chicletes, remédios tarja preta; devemos água potável, brinquedos, lanternas, poços artesianos; devemos livros, trufas, CDs, lentes de contato, filmes de arte, óculos escuros, museus, proteína, alface. Devemos aos pobres, aos índios, aos pretos e aos pardos, mas também aos albinos, aos esquizofrênicos, aos insones, aos priápicos, aos tiozinhos de padaria, aos mitômanos e aos sexualmente indecisos. Devemos demais aos cães atropelados, prensados contra o "guard-rail". Devemos aos palhaços de bufê infantil e aos papais noéis de shopping. Suspeito que nossa dívida interna seja impossível de descrever.
Suspeito que deus não exista –ou não tenha paciência para nenhum dos assuntos de que lembrei aqui.
Suspeito que a risada, o pôr do sol, o hino à alegria e o acorde maior estejam sendo de alguma forma privatizados. Suspeito que Paulo Coelho, o padre Marcelo Rossi e o bispo Edir Macedo sejam três faces de uma mesma e última privatização –a do infinito. Suspeito que estatizar essas coisas seja ainda pior.
Suspeito que a Portuguesa vai falir, acabar. Suspeito que Galvão Bueno não vai se aposentar nesta Copa, nem na próxima.
Suspeito que estamos fodidos.
NUNO RAMOS, 54, é artista plástico e escritor
maio 26, 2014
O fim da panelinha no prêmio de novos artistas por Cleo Guimarães, O Globo
O fim da panelinha no prêmio de novos artistas
Matéria de Cleo Guimarães originalmente publicada na coluna Gente Boa do jornal O Globo em 3 de abril de 2014.
O Prêmio CNI Sesi Senai Marcantonio Vilaça, dia 29 de maio, terá mudança radical na seleção da premiação, voltada para artistas emergentes. Proposta pela equipe de curadores coordenada por Marcus Lontra, 15 críticos de arte de todo o país (antes eram só quatro) escolherão os 30 finalistas. Isso evitaria o que aconteceu na edição passada, quando 23 dos 30 artistas eram de São Paulo. Ao final do processo, cinco serão premiados.
Duas grandes exposições farão parte do prêmio. Uma delas é “Inventário da Paixão”, que reúne obras de artistas lançados por Vilaça: Adriana Varejão, Ernesto Neto, Beatriz Milhazes, Jac Leirner, Rosangela Rennó, Efrain Almeida, Vik Muniz, e por aí vai.
A outra é uma homenagem a Abraham Palatnik. Será no Projeto Arte e Indústria, que acontece pela primeira vez no prêmio e homenageará um artista cuja história e obra tenham relações com a industrialização brasileira. Pioneiro no uso da tecnologia, Palatnik, mestre da arte cinética, criou linha de móveis e objetos de acrílico nos anos 60 e fabricou várias de suas ferramentas.
maio 25, 2014
Burocracia sem fim por Teixeira Coelho, Folha de S. Paulo
Estatuto de Museus deverá melhorar o acesso à arte? NÃO
Burocracia sem fim
Tendências/Debates de Teixeira Coelho originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo em 10 de maio de 2014.
Várias legislações nacionais restringem a livre circulação da arte pelo mundo. Não há novidade nas recentes normas sobre a decretação de interesse público para certas obras e, com ela, a imposição de restrições à sua disponibilidade. Chama a atenção é o grau de incerteza e flutuação do sentido nos novos textos legais, ao lado do desejo do legislador de legislar sobre o que não é legislável.
Um dos pontos discutíveis do novo ordenamento é a ideia de obra "musealizável", ou obra passível de figurar na coleção de um museu e que, por essa condição, é em princípio limitada em sua circulação. Mas o quê ou quem diz que uma obra é ou será passível de musealização --e quando e, sobretudo, até quando? Há pouco, um leilão da Sotheby's ofereceu à venda uma obra de Monet "desadquirida" pelo Metropolitan de Nova York, obra que o museu entendeu não mais ser indispensável. O que hoje parece "musealizável" pode assim não parecer no futuro. A arte não é, ela sempre é por enquanto. Enquanto isso, os direitos imediatos do artista e do proprietário da obra podem ser seriamente afetados por uma burocracia que, neste país, não tem limites nem se dá prazos.
O poder público parece preocupado em não deixar que alguma arte saia facilmente do país. Perfeito. Mas que tal se tratasse (também) de facilitar a entrada de arte no país? Uma obra doada a um museu passa hoje por um labirinto de martírios para obter a isenção dos impostos correspondentes. O museu que a recebe não tem como pagá-los e o doador não quer pagá-los (já fez sua parte): ver num museu brasileiro uma obra doada proveniente do exterior? Só depois de uma odisseia burocrática que inclui fatores extralegais ("por que uma doação para esse museu? Por que não para este outro?")
Está implícita nessa questão uma dúvida: obra de arte tem a mesma natureza de um carro, um computador ou um quilo de macarrão e deve ser tratada do mesmo modo quando "importada"? Se sim, não há motivo para um interesse público pela obra a ponto de restringir sua circulação: que se paguem os impostos e pronto. Se, pelo contrário, arte for alguma coisa diferente, se tiver um valor agregado, por que tratá-la como produto igual aos demais? Ah, sim: porque arte também pode ser negócio. De fato: o mercado é indissociável da arte. Mas se o interesse é público, por que cobrar impostos sobre a arte que entra? Ou será que quando o poder público decretar uma obra como de interesse público seu proprietário será ressarcido dos impostos talvez pagos?
Mais importante: atende o interesse público que uma obra definida "de interesse público" fique eternamente guardada na privacidade de uma coleção particular, longe do olhar público? Ou será seu proprietário obrigado a depositá-la num museu público para que seja vista publicamente? Ou emprestá-la compulsoriamente para x museus e espaços públicos por x tempo? Mas e se nenhum museu quiser recebê-la por não a considerar "musealizável"? Algum museu será obrigado? Questões pouco práticas, dirão, que não cabem. Filosofias. O problema é que essas são questões inerentes à arte e que a alcançam em seu cerne.
Movido sempre por um patrimonialismo que constitui o leito profundo e inóspito da cultura brasileira, o poder público age antes para restringir do que para propiciar. Declarar de interesse público uma obra de arte não contribui para seu conhecimento e circulação. Interessa mais é ver o país dotado dos meios que de fato coloquem a arte ao alcance dos que a ela queiram acesso. Para usar uma expressão de moda, do poder público se espera que seja pelo menos proativo e não, como neste caso, "proativo negativo."
A situação do mercado da arte não preocupa, ele saberá encontrar seus caminhos. Preocupa a circulação das obras, que dá à arte seu sentido pleno. Antes que questões deste tipo, e outras, fiquem claras para o poder público e para o público, não há razão para mais uma lei. A situação da arte não tem, nesse aspecto, nenhuma urgência que justifique outro imbróglio jurídico.
TEIXEIRA COELHO, 69, é curador do Masp (Museu de Arte de São Paulo)
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br - www.folha.com/tendencias
Uma oportunidade para nossos museus por José Olympio Pereira, Folha de S. Paulo
Estatuto de Museus deverá melhorar o acesso à arte? SIM
Uma oportunidade para nossos museus
Tendências/Debates de José Olympio Pereira originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo em 10 de maio de 2014.
Desde que foi publicado em outubro, o decreto nº 8.124, que regulamentou as leis que criaram o Estatuto de Museus e o Ibram (Instituto Brasileiro de Museus), vem causando comoção no mercado das artes.
A medida cria a possibilidade de que obras de arte sejam declaradas de interesse público e que, uma vez assim, o Estado acompanhe sua conservação e tenha direito de preferência na aquisição da obra, no caso de seu proprietário vendê-la.
Muitas são as críticas e grande é a insegurança que ele gerou entre galeristas, colecionadores e artistas. O decreto faz sentido ou estamos inventando uma nova jabuticaba? A resposta é sim, o decreto faz sentido e vários países com inquestionável legado artístico como França, Itália, Inglaterra e Espanha têm dispositivos semelhantes para resguardar seu patrimônio, alguns até bem mais severos.
Os museus brasileiros têm acervos muito menores em tamanho e importância do que seus pares nos Estados Unidos e Europa. Grande parte de nosso patrimônio artístico está em mãos privadas, o que reforça o interesse da sociedade de possibilitar a nossos museus a compra de obras relevantes para a cultura.
O primeiro questionamento em torno da mudança tem a ver com a declaração do interesse público. O decreto determina um processo bem estruturado: inicia-se com a solicitação, que pode ser feita por qualquer um, passa pela avaliação de um comitê técnico, depois por revisão pelo Conselho Consultivo do Ibram e, finalmente, pela homologação do ministro da Cultura.
O segundo ponto trata do direito de preferência, que tem sido erroneamente interpretado como expropriação. Ele estabelece que, se o proprietário de uma obra declarada de interesse público quiser vendê-la, deverá informar ao Ibram da proposta que recebeu e conceder ao museu que o instituto indicar o direito de comprá-la nas mesmas condições (valor, moeda e forma de pagamento) da proposta recebida. Assim, não há nenhuma previsão de expropriação ou desapropriação. O decreto detalha esse procedimento de forma adequada na venda via leilão, mas é vago no caso de uma venda privada. Está sendo elaborada uma instrução normativa para esclarecer esse aspecto.
Finalmente, pode a obra de arte declarada de interesse público ser vendida para o exterior? A resposta é sim, desde que seja respeitado o direito de preferência.
Uma outra preocupação diz respeito a abusos que o Estado poderia realizar no âmbito das leis/decreto. É importante lembrar que o decreto-lei nº 25/1937 já prevê o tombamento de obras de arte e contém mecanismos muito semelhantes tanto na obrigação de informação sobre o estado de conservação quanto no direito de preferência. Nos últimos 77 anos, não se verificaram problemas relevantes. Assim, não vejo por que o governo passaria a usar a nova legislação para objetivos espúrios visto que poderia ter usado o decreto-lei de tombamento para tanto.
O decreto abre caminho para os museus brasileiros enriquecerem seus acervos, mas não garante isso. Sem o apoio da sociedade e do Estado em prover recursos aos nossos museus para adquirir obras sobre as quais eles terão direito de preferência, nada muda.
A sociedade brasileira deve se inspirar no exemplo do MoMA, Metropolitan ou da Tate Modern para ver o que é possível fazer quando a comunidade se une num projeto comum. Em países que valorizam seus patrimônios culturais, colecionismo público e privado caminham de braços dados na construção de grandes museus. Esse é o meu desejo para o Brasil.
JOSÉ OLYMPIO PEREIRA, 51, é colecionador e presidente do Conselho da Pinacoteca do Estado de São Paulo. Participa do Conselho Consultivo do Ibram (Instituto Brasileiro de Museus) e dos Conselhos Internacionais do MoMA (Museu de Arte Moderna de Nova York) e Tate Modern, de Londres. É presidente do banco Credit Suisse no Brasil
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br - www.folha.com/tendencias
Silêncio no mercado contribui para falsificação de pinturas por Patricia Cohen, Folha de S. Paulo
Silêncio no mercado contribui para falsificação de pinturas
Matéria de Patricia Cohen, do New York Times, originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 20 de maio de 2014.
A prisão de dois irmãos espanhóis acusados de vender pinturas falsificadas como se fossem originais dos maiores mestres modernistas americanos voltou a apontar os refletores para um esquema fraudulento que existe há 15 anos, já acumulou US$ 80 milhões (R$ 177,1 milhões) e ajudou a desmoralizar a galeria mais antiga de Nova York, a Knoedler & Company, fundada em 1848.
Documentos judiciais referentes ao caso revelam que falcatruas ambiciosas como esta no mundo das artes dependem não só de uma operação conjunta engenhosa ou de um imitador talentoso.
Também é essencial haver pessoas, às vezes manipuladas sem seu conhecimento, que dem credibilidade a essas falsificações.
Alguns especialistas em arte que autenticaram fraudes de obras de Jackson Pollock, Mark Rothko e Robert Motherwell tiveram seus honorários de consultoria pagos pela Knoedler.
Outros estudiosos identificaram várias obras como falsas, mas foram instruídos por advogados a ficarem calados para evitar processos judiciais.
A pouca transparência no comércio de arte impede que se estabeleça um padrão -mesmo após algumas falsificações.
Esses problemas permeiam o mundo das artes visuais há décadas, disse Stephen Urice, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Miami.
E citou um despacho judicial de 1978: "Na terra da fantasia do marketing nas belas artes", nomes prestigiosos "desabam de uma hora para outra", e grandes quantias são transferidas rapidamente, escreveu o juiz J. Shorter, da Suprema Corte de Nova York.
No caso Knoedler, a única pessoa condenada até agora é Glafira Rosales, uma marchand de Long Island que se declarou culpada de fraude no fim de 2013.
Promotores dizem que, dentre os comparsas dela, estavam os irmãos José Carlos e Jesús Ángel Bergantiños Díaz, e Pei-Shen Qian, o imitador.
Os irmãos foram soltos sob fiança na Espanha e Qian está na China. Os negociantes que venderam dezenas dessas obras —Ann Freedman, ex-presidente da Knoedler, e Julian Weissman— continuam afirmando que tinham certeza de que elas eram genuínas.
Jack Flam, um dos primeiros a desconfiar da autenticidade das pinturas vendidas por Rosales, disse: "Dentre os fatores por trás do êxito desse esquema, o primeiro é que todos temem ser processados. As pessoas dão credibilidade a obras inadvertidamente mantendo o silêncio".
Flam é o presidente da Fundação Dedalus, grupo criado por Motherwell. Ele e seus colegas inicialmente ficaram impressionados com os supostos Motherwells, mas em 2007, quando o número de obras atribuído ao artista aumentou demais, eles desconfiaram.
Flam logo descobriu que o espólio de Richard Diebenkorn, a Fundação Willem de Kooning e a Fundação Barnett Newman também suspeitavam de obras postas à venda pela Knoedler.
"Todas essas fundações sabiam que havia algo errado, mas não estavam a par de que outras instituições tambêm tinham problemas", comentou Flam.
Em 2005, Eugene Victor Thaw, especialista em Jackson Pollock, disse que duvidava da autenticidade de dois quadros. Embora tenha comentado privadamente sobre suas suspeitas, Thaw foi impedido de dar opiniões formais devido a vários processos.
Em junho de 2008, meses após a Dedalus começar a fazer questionamentos, três especialistas da Barnett Newman confirmaram que uma suposta obra de Newman, de posse da Knoedler e exposta na Fundação Beyeler na Suíça, era falsificada.
No entanto, Yves-Alain Bois, um dos especialistas, escreveu em um e-mail para a Beyeler, que ele e seus colegas foram "orientados a não dar declarações públicas" por um advogado da Fundação Barnett Newman, o qual temia um processo.
Manter o silêncio é a norma. Museus, que antes davam opiniões sobre arte, deixaram de fazer avaliações.
A tradição de silêncio no comércio das artes pode mascarar sinais de advertência. Rosales não levantou suspeitas quando insistiu que o dono de supostas obras-primas —ao qual ela se referiu como X— pediu o anonimato.
E o uso da expressão "coleção privada" fez com que ninguém, além dos negociantes, soubesse que essas obras eram fornecidas por uma única fonte. "Manter segredo é algo que ocorre com enorme frequência nesse negócio", explicou Weissman.
Alguns donos de pinturas vendidas por Rosales talvez ainda não saibam que compraram falsificações, pois a Knoedler e a Weissman às vezes vendiam obras por meio de outras galerias.
maio 23, 2014
Lygia Clark, Museum of Modern Art, New York – review by Ariella Budick, The Financial Times
Lygia Clark, Museum of Modern Art, New York
Crítica de Ariella Budick originalmente publicada no jornal The Financial Times em 13 de maio de 2014.
The Brazilian artist progressed from primly modernist abstraction to messily hippie improvisation
I entered the Museum of Modern Art’s Lygia Clark retrospective at the wrong end, which shouldn’t have mattered, because the Brazilian artist’s epiphany came when she learnt to love the infinite loop. The first piece I encountered was “Caminhando” (Walking), from 1963, in which she invited viewers to construct their own Möbius strip out of paper and glue, then keep cutting along its length until the band narrowed to nothing. This arts-and-crafts project seemed like a reasonable starting point for a life in art, but I soon realised I had begun at the climax of Clark’s career: the moment when she handed off the work of creation to the viewers themselves. A few years later she finally abandoned art-making for a kind of anarchic therapy. She settled in Rio, treating patients through a process she called “structuring of the self”, until her death in 1988.
MoMA’s show is a curiously hermetic affair, following the interior progress of an artist who is practically unknown in the US. A little context might have alleviated the sensation of wandering into an advanced seminar on a rarefied and not terribly interesting topic. Clark’s various phases, discoveries, and retreats resolve themselves not into a Möbius-like loop but a more or less linear trajectory, from prim modernism to wacked-out, body-based improvisation. An alternative story remains untold: Clark’s native country went through spasms of cultural and political turmoil during her career, but for curators Luis Pérez-Oramas and Connie Butler she might as well be a lone visionary on a deserted planet.
Lygia Pimentel Lins was born in 1920 in Belo Horizonte, Brazil. Married at 18 to a civil engineer named Aluízio Clark Ribeiro, in 1950 she took off for Paris to study painting, with three children in tow. By the mid-1950s she was producing standard modernist abstractions. “Composition” (c.1952) echoes Klee in its delicate colours and gridlike structure. “Discovery of the Organic Line” (1954) stars a floating red square straight out of El Lissitzky. Shades of Mondrian haunted her through the mid-1950s, forcing her shapes into strict geometries.
At that time, North American artists, disgusted by the carnage of the second world war and the bankruptcy of all ideologies, turned inward, pioneering a kind of free-form abstraction derived from surrealism. Clark reached further back, to leftist visions dreamt up in prewar Russia and Germany. She briefly found hope in the strict rationalism of mathematics and in the broken promise of modernism.
By the late 1950s though, Clark was no longer satisfied with airless geometries. She began to open up her abstractions by inserting linear breathing spaces between panels. Two floating black squares are separated by what she calls an “organic line”, an inviting white fissure in an otherwise forbiddingly pristine plane. Similar incisions appear in other works from this period, too. Some planes are divided into puzzle-like pieces that fit snugly together, leaving only the slenderest cracks. Other paintings extend into frames that are flush with the painted surface. Clark simultaneously draws our attention to the image’s edge and its boundlessness.
She kept trying different tactics to yank in the viewer. She cut and pasted papers into optical experiments, where black and white areas alternately recede and jut forward. The collages depend on the viewer’s willingness to wrestle with their shifting architecture. They’re fun, but shallow. If Clark’s career had ended in the 1950s, I doubt we’d be hearing much about her now. It was only after she enlisted the audience’s active participation that her work leapt into another dimension. She began to unfold the layers of her paintings into sculptures called “Bichos” (Critters), seriously playful objects that pried viewers from their passivity, obliging them to interact with artworks as if they were living, breathing organisms.
Clark translated the vital lines that had erupted through her paintings into hinges, while two-dimensional planes became steel and aluminum sheets that participants could manipulate and recombine, like metallic origami. MoMA has appealingly recreated a number of these for us to play with, while Clark’s originals wistfully look on from their sacred plinths. She may have wanted people to manhandle her work, but it’s far too valuable these days for such destructive high jinks.
This period culminated in “Caminhando”, which marks the beginning of the end of her involvement with art – and also of MoMA’s exhibition. “From here on I attribute an absolute importance to the immanent act carried out by the participant,” she announced at the time. “‘Caminhando’ has all the possibilities connected to action itself. It allows choice, the unpredictable, and the transformation of a virtual into a concrete event.” That “choice” presents itself as a series of limited decisions: to cut down the centre, or at the side, or gradually guide the scissors left to right? There are echoes of the way Fluxus artists toyed with the public too: Yoko Ono commanded audiences to “Light canvas or any finished painting with a cigarette at any time for any length of time”, and Ken Friedman mischievously ordered viewers of his 1963 “Fruit Sonata” to “Play baseball with a fruit.”
Clark lacked that wry humour, though. Her antics married the rhetoric of self-help to hippie spirituality. She concentrated on making “sensorial objects” such as cloth masks with distorting eye holes and snouts stuffed with herbs, or glasses equipped with adjustable mirrors – things that would, she hoped, boost awareness of our own bodies. At MoMA, a team of “facilitators” helped me navigate a table stocked with replicas of Clark’s contraptions. One demonstrated how to float a rock on a plastic bag filled with air. Another tied her hand to mine with a kind of twisted elastic bandage, extending the Möbius strip into the realm of human relationships.
Videos around the room broadcast some of the sessions Clark led among her students. In “Baba antropofágica” (Anthropophagic slobber), participants slowly disgorge saliva-laden filaments that they lay across a prone colleague, covering him in a moist, wispy web. They then proceed to massage him. “It is the first act in a ritual of phantasmatic exorcism for the emancipation of the body,” Clark explained, unhelpfully. The encounter group meets the neo-primitive ritual, giving birth, as it were, to a groovy mysticism. That shaggy ethos has not aged well and, like almost everything else in this arid show, seems almost brutally dated.
maio 15, 2014
Dossiê: A venda da Coleção Adolpho Leirner para o museu de Houston
Publicações no Canal Contemporâneo - matérias, editoriais, comentários e posicionamentos de Adolpho Leirner e instituições brasileiras - sobre a venda da Coleção Adolpho Leirner para o Museum of Fine Arts, de Houston.
EUA compram coleção construtivista brasileira por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo - 18/03/2007
- Comentários de Ana Holck, Betty Leirner, Daniel Steegmann, Glória Ferreira, Jac Leirner, Ligia Canongia, Luiz Camillo Osorio, Renata Lucas, Vanda Klabin, entre outros
MFAH Adquire a Coleção Leirner de Arte Concreta, artdaily.org - 19/03/2007
Houston, we have a problem... / Houston, nós temos um problema..., por Patricia Canetti - 19/03/2007
Colecionar é uma busca, por Adolpho Leirner - 20/03/2007
Venda da coleção de Leirner gera protesto por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo - 21/03/2007
- Comentários de Patricia Canetti e Ricardo Resende
Simplesmente não se interessaram por Suzana Velasco, O Globo - 21/03/2007
Sururu nas artes plásticas por Marcos Augusto Gonçalves, Folha de S. Paulo - 22/03/2007
- Comentários de Cristina Pape, Patricia Canetti e Renata Lucas
Onde está a burguesia paulista ? em Houston II, por Paulo Henrique Amorim, Portal IG - 23/03/2007
Fui ver e realmente não gostei, por Ricardo Resende - 26/03/2007
Manutenção de acervos: a participação da sociedade brasileira? - 27/03/2007
Respostas das instituições culturais sobre a compra da Coleção Adolpho Leirner - 28/03/2007
"Arte em fuga" por Phydia de Athayde, Carta Capital - 03/04/2007
Correntes que prendem a arte por Suzana Velasco, O Globo - 10/04/2007
Houston, Texas, Brasil por Tereza Novaes, Folha de São Paulo - 25/05/2007
Colecionador ataca políticas públicas, entrevista de João Sattamini a Fabio Cypriano, Folha de São Paulo - 23/08/2007
Simpósio Internacional Concretismo e Neoconcretismo: Cinqüenta anos depois no Museum of Fine Arts Houston, EUA - 05/09/2007
Entrevista com Milú Villela - MAM 60 anos: Nosso papel é ser agente de mudanças sociais, Folha de São Paulo - 16/07/2008
Por um equilíbrio de forças por Luisa Duarte, O Globo - 21/09/2011
Febre por neoconcretos provoca hipervalorização em cascata por Silas Martí, Folha de S. Paulo - 07/11/2011
Obras modernistas estão no exterior ou em coleções privadas por Márcia Abos, Yahoo notícias - 09/02/2012
O Estado da arte por Antonio Gonçalves Filho e Jotabê Medeiros, Estado de S. Paulo - 03/11/2013
maio 14, 2014
Tamar Guimarães e Yuri Firmeza estarão na Bienal de São Paulo por Camila Molina, Estado de S. Paulo
Tamar Guimarães e Yuri Firmeza estarão na Bienal de São Paulo
Matéria de Camila Molina originalmente publicada no jornal Estado de S. Paulo em 6 de maio de 2014.
Enquanto a primeira propõe nova visão do espiritismo, o segundo explora uma cidade beckettiana no Maranhão
Mais dois artistas brasileiros acabam de ser confirmados para a 31.ª Bienal de São Paulo, que será aberta em setembro. De um lado, a mineira Tamar Guimarães prepara uma nova instalação da obra A Família do Capitão Gervásio, projeção de película em 16 mm exibida no ano passado na 55.ª Bienal de Veneza e criada com base nos registros em uma comunidade espírita do interior de Goiás. Já Yuri Firmeza, que vive em Fortaleza, vem fazendo um novo trabalho com as paisagens de ruínas da cidade de Alcântara, no Maranhão.
Sob curadoria de uma equipe formada pelo escocês Charles Esche, os espanhóis Nuria Enguita Mayo e Pablo Lafuente, os israelenses Galit Eilat e Oren Sagiv, e pelos curadores associados Luiza Proença e Benjamin Seroussi, a mostra, marcada para ocorrer entre 6 setembro e 9 de dezembro no Pavilhão Ciccillo Matarazzo, no Ibirapuera, será mais do que uma edição política - será uma "bienal social".
É como Esche já definiu o projeto da exposição, intitulada Como Falar de Coisas Que Não Existem? -, mas o verbo da sentença é flexível. Centrada na situação de conflito que se vive em todo o mundo, trazendo questões como "o colapso do modo de representar a democracia, sonhos e aspirações" (em referência às manifestações populares), a coletividade, e ideias relacionadas a transformações - neste campo, tendo os motes transgressão, transcendência, transexualidade, entre outros; a concepção da mostra tem sido ainda tratada como "uma jornada".
"Talvez precisemos sair da política como tema-adjetivo e pensar a Bienal como ação-verbo", afirma Yuri Firmeza em entrevista ao Estado. "Bienais são políticas e a noção do que é política há de ser entendida num sentido amplo. Não são necessariamente reivindicações explícitas e protestos, mas formas capazes de alterar nossa forma de pensar, de sentir, de agir. Afinal, qual seria a opção contrária? Bienais que operassem simplesmente como antessalas do mercado de arte e mais nada?", opina Tamar Guimarães, que vive na Dinamarca.
Apostando em criadores de áreas diversas e não apenas nos das artes visuais; em participantes de um eixo para além de São Paulo e Rio - e em termos geográficos, há um olhar específico para o Oriente Médio -, os curadores anunciaram, em março, 32 projetos/nomes que estarão no evento, realizado com R$ 24 milhões. Do Brasil, Tamar Guimarães e Yuri Firmeza vêm se juntar aos artistas Tunga, Virginia de Medeiros, Ana Lira, Armando Queiroz, Graziela Kunsch, Romy Pocztaruk, a coreógrafa Lia Rodrigues, o coletivo paulistano Contrafilé e a historiadora Lilian L’Abbate Kelian, da USP. E outros ainda virão, já que a lista de integrantes nacionais e estrangeiros da edição ainda não estaria fechada.
Habituada a conceder entrevistas apenas por e-mail, a artista mineira Tamar Guimarães que vive desde 2002 em Copenhague, na Dinamarca, fala sobre a 31ª Bienal de São Paulo e sua obra, realizada com seu parceiro, Kasper Akhøj. A seguir, trechos de suas falas.
Sua participação se dará com a exibição de A Família do Capitão Gervásio, exibida na última Bienal de Veneza? A peça terá algum desdobramento especial para o evento brasileiro, já que tem como raiz A Man Called Love, seu trabalho sobre o espiritismo e Chico Xavier iniciado em 2006?
Mostraremos A Família do Capitão Gervásio, uma película em 16 mm produzida em 2013, que gira em torno de uma comunidade espírita no interior de Goiás. Segundo essa comunidade, os espíritos intervêm no mundo material, nos ensinam e nos transformam. Há nisso a noção do espiritismo como prática social. O subtexto do filme é também um indicativo de como essas práticas entraram em conflito com os movimentos oficiais de higiene mental e os códigos de sanidade e loucura infligidos pela modernidade. Estamos trabalhando em uma nova instalação para a Bienal de São Paulo e o projeto terá outros desdobramentos. Em 2015, vou produzir um filme mais extenso e também um pequeno livro.
Qual sua ideia sobre estar em uma "bienal social", como já declarou o curador Charles Esche?
A proposta da bienal como jornada é muito pertinente. Interessa-me mais ainda a noção de "falar de", de "viver com", e de coisas que não existem, visto que essas tais coisas articulam fatos sociais para os quais não há um lugar definido dentro da linguagem vigente.
Você considera que foi escolhida para a 31ª Bienal pela via que faz a conjunção da política e do misticismo? Desde a 55ª Bienal de Veneza, como vê o misticismo refletido nestas duas últimas importantes mostras de arte?
Quando (a curadora) Luiza Proença me escreveu, ela contou que a 31ª Bienal está se construindo em torno de um processo de pesquisa e procura chamar atenção para coisas que o mundo moderno ignorou, muitas delas com propriedades mágicas, místicas, alquimísticas e espirituais. Animismo é o que teve que ser expelido para que a modernidade pudesse ser modernidade. É o seu lado de fora. Isso faz com que seja um motivo para investigação sociológica, filosófica e antropológica pós-moderna. Já faz alguns anos que é um tema importante nas artes plásticas. Por exemplo, a exposição Animismo, organizada por Anselm Franke, foi importante nesse sentido, argumentando que o animismo é o fantasma que ronda os limites bem mapeados e cientificamente organizados da modernidade. Não por acaso, esses limites se alinham com fronteiras geopolíticas e, também não por acaso, ecoam situações de subordinação frente a um eurocentrismo branco, masculino, colonizador.
Seu trabalho artístico traz muitas vezes documentos, numa forma de colocar o passado na criação de obras mistas entre a ficção e a realidade. Por outro lado, a 31ª Bienal propõe uma ruptura com o passado - com o modernismo especificamente, já afirmou Esche. Qual sua opinião sobre esta ideia?
Ao que parece, a 31ª Bienal não lida com o modernismo diretamente. Ele não seria nem um tema, nem um objeto de combate. A modernidade talvez sim, em certos aspectos. Parece-me que através da ideia das "coisas que não existem", pode-se considerar as muitas formas de entender o mundo que a modernidade ignorou ou com as quais não soube lidar. Nesse sentido, acho que A Família do Capitão Gervásio tenciona a existência de outras formas de pensar e viver dentro da cidade e da vida moderna. Não me parece que a proposta curatorial busca um rompimento com o passado. Falam de bienais como plantas que florescem a cada dois anos, cuja floração surge de uma continuidade em latência, e não de um vácuo.
Como se sente vivendo há tanto tempo fora do Brasil?
Interrogar a aparência de naturalidade da própria cultura e penteá-la a contrapelo é parte do trabalho que faço. Olhar com outros olhos o que se conhece bem por dentro e por fora é, afinal, a tarefa do artista.
Entre uma e outra viagem, Yuri Firmeza, que nasceu em São Paulo, em 1982, conta na entrevista a seguir que levará a questão da "multitemporalidade" à 31.ª Bienal com um trabalho inédito e a exibição da obra A Fortaleza, de 2010.
Como é seu trabalho novo para a 31ª Bienal?
O projeto em desenvolvimento, comissionado pela Bienal com apoio do Centro Cultural do Banco do Nordeste do Brasil, ocorre em uma cidade do interior do Maranhão, Alcântara. Esta cidade tem parte de sua paisagem marcada por ruínas. E, segundo uma de suas histórias, algumas dessas ruínas são decorrentes dos grandes palacetes construídos na expectativa de hospedarem o então imperador D. Pedro II. Porém, a suposta visita nunca aconteceu. A cidade foi geograficamente e economicamente muito importante no Brasil Colônia devido a suas ligações fluviais e a produção e exportação de arroz, açúcar, algodão. Sempre penso que Alcântara é uma cidade, por um lado, beckettiana, à espera de Godot-D.Pedro II. Como disse uma senhora alcantarense, neta de escravos, em Alcântara nada é – tudo foi ou será. Há, ainda, em Alcântara, uma festa tradicional de origem açoriana. Há também um grande número de comunidades remanescentes quilombolas com as quais eu pretendo desenvolver um projeto a longo prazo. É também lá que se localiza o Centro de Lançamento de Alcântara, um dos mais importantes locais de lançamento de satélites da América Latina.
E como seria a obra?
Pretendo que seja um filme não localizável no tempo e espacialmente não situável. Um lugar insólito, fugidio. Lugar do curto-circuito dos tempos verbais, foi no futuro, será no passado. Filme não exatamente sobre a cidade de Alcântara, mas a partir desse emaranhado temporal não linear, não cronológico, não determinista.
E poderia comentar a obra A Fortaleza?
A Fortaleza consiste em duas fotografias feitas no mesmo lugar, mas com o intervalo temporal de uma década entre ambas. Em uma das fotos apareço, quando criança, fazendo força nos bíceps e tendo a paisagem de fundo uma vista de Fortaleza. Na segunda foto, apareço já adulto replicando a mesma pose da foto anterior no mesmo lugar que foi registrada a primeira foto. No entanto, na paisagem percebemos a verticalização da cidade de Fortaleza onde, diferentemente da primeira foto, já não temos horizonte, mas um bloco maciço de prédios.
Na sua opinião, as bienais devem ser políticas?
O entendimento de política já não é mais o limitado campo das representações dos partidos, agremiações, sindicatos. Assumir a Bienal como "jornada" já me parece um gesto político no modo de pensar o papel da Bienal hoje. Talvez precisemos sair da política como tema adjetivo e pensá-la como ação-verbo e, quem sabe, o esgotamento, diferentemente do cansaço, seja esta potência ativa do que hoje entendo por política. / C.M.
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Lygia Clark, o encontro em meio ao abandono por Tonica Chagas, Estado de S. Paulo
Lygia Clark, o encontro em meio ao abandono
Matéria de Tonica Chagas originalmente publicada no jornal Estado de S. Paulo em 4 de maio de 2014.
Museu de Arte Moderna de Nova York dedica mostra à artista brasileira
Mais de meio século depois que a primeira série de Bichos foi premiada pelo júri internacional da 6.ª Bienal de São Paulo, em 1961, como melhor escultura de um artista brasileiro, aquelas mesmas estruturas de múltiplas configurações e os trabalhos anteriores e posteriores a elas produzidos por Lygia Clark (1920- 1988) começam a ser vistos, nos Estados Unidos, como um marco na arte contemporânea ocidental. Lygia Clark: The Abandonment of Art, 1948-1988, que o Museum of Modern Art (MoMA) de Nova York abre ao público no dia 10, apresenta a obra de Lygia como a de uma pesquisadora consistente que delimita uma fronteira entre contemplação e imersão, entre arte e terapia, entre a arte e a não-arte.
"O incrível legado de Lygia Clark é o de ela ter quebrado mitos e reposicionado a arte como uma relação de experiências e não o objetivo máximo do processo artístico", diz o venezuelano Luis Pérez-Oramas, chefe do Departamento de Arte Latino-americana do MoMA. Curador da 30.ª Bienal de São Paulo, em 2012, Oramas organizou a retrospectiva em parceria com a americana Connie Butler, curadora-chefe do Hammer Museum, de Los Angeles, que até o ano passado era curadora-chefe do setor de desenhos do MoMA.
Primeira retrospectiva da artista brasileira nos EUA, a exposição traz ao museu nova-iorquino cerca de 300 trabalhos de Lygia e mais uma série extensa de programas educativos e eventos paralelos que prosseguem até seu encerramento, em 24 de agosto. Com uma espinha cronológica, as obras foram agrupadas pela curadoria em três temas pontuais - abstracionismo, neoconcretismo e o abandono da arte, fase que dá título à exposição e se refere ao período que Lygia dedicou a aplicar suas experiências como preparação de pacientes para psicanálise.
Esses três capítulos, no entanto, se justapõem no espaço quase totalmente aberto entre as galerias onde a exposição está instalada, passando a sensação de fluidez e continuidade que os curadores encontraram ao longo de toda a carreira de Lygia. "O 'abandono' apresentado na última parte já pode ser notado desde as primeiras pinturas dela", aponta Connie.
Linha orgânica. Casada e mãe de três filhos, a mineira Lygia Clark vai para o Rio de Janeiro em 1947 e começa a estudar arte com o paisagista Burle Marx. Por duas vezes ela muda para Paris: a primeira entre 1950 e 1952, quando estuda com Fernand Léger, e a segunda entre 1970 e 1976, quando leciona na Sorbonne e faz análise com o freudiano Pierre Fédida. É na França que ela se inclina para as possibilidades terapêuticas da arte sensorial.
Entre esses dois intervalos, ela desenvolve no Brasil uma obra inovadora, como integrante do Grupo Frente e também uma das fundadoras do Grupo Neoconcreto. Com uma geração de artistas empurrando a ideia de pintura para novas direções, a arte brasileira entra num ritmo de grande produtividade e a de Lygia se singulariza com a descoberta do que ela chama de linha orgânica.
"Vendo a linha não como uma realidade gráfica mas como separação", conforme analisa Oramas, ela começa a estruturar as pinturas como multipartes, não com linhas desenhadas, mas pelo encontro entre superfícies diferentes que se modulam. O curador lembra que, para Lygia, a fim de modular uma superfície inteira, "o artista também pode investigar linhas que funcionem como portas, como conexões entre materiais". Na galeria de quadros do período final dos anos 40 até obras do fim dos 50, há cópias de maquetes para demonstrar que é por meio da arquitetura que Lygia pensa a sua pintura.
'Caminhando'. Das pinturas passa-se para a fase neoconcreta, dominada pelos Bichos e os Trepantes de Lygia. Durante os cinco anos dedicados à produção da retrospectiva, os curadores entenderam que o público deveria manipular as obras a fim de percebe-las na intenção para a qual foram criadas. "O tempo todo pedimos aos frequentadores de museus que não toquem nas obras de arte e agora fazemos o contrário", comenta Connie Butler.
Nas últimas semanas, foram treinados grupos de pessoas para oferecer e facilitar ao público o manuseio e uso de réplicas de várias criações da artista brasileira. Tesouras e papel, por exemplo, são o material básico para repetir a experiência de Caminhando, trabalho de 1963 feito a partir de uma Faixa de Moebius. Essa figura, que parece o número oito na horizontal, é obtida pela junção das duas extremidades de uma fita, dando-se meia volta em uma delas.
"Ao cortar a faixa seguindo seu traçado da direita para a esquerda, da esquerda para a direita até o pedaço de papel ficar tão fino que não dá mais para cortar, Lygia conclui que a obra é o ato e o autor é o espectador, neste caso aquele que corta o papel", diz Oramas, salientando ser este um momento tão importante na obra dela quanto o da linha orgânica. E é daí que parte o trabalho relacional desenvolvido por Lygia, que deixa de se considerar artista para ajudar pacientes com problemas psiquiátricos.
Terapia. As "proposições", como as chamava sua autora, demandam a imersão do espectador. Mas isso impõe ao museu, com frequência diária em torno de 11 mil pessoas, o desafio de permitir a noção de terapia. "Queremos respeitar Lygia e não dar um aspecto de espetáculo para esses trabalhos", sublinha Connie Butler. Por isso, a reprodução das experiências sensoriais, como a de Baba Antropofágica, será realizada apenas algumas vezes por semana. Por ser de imersão total em seu interior, a instalação A Casa é o Corpo, produzida para a Bienal de Veneza de 1968 e que deve funcionar como rememorização do processo de nascimento, ocupa um espaço exclusivo dois andares abaixo do corpo principal da retrospectiva.
Todas as fases da exposição, desde a pré-montagem à abertura ao público, estão sendo registradas em vídeo para a produção de um documentário. Com direção de Daniela Thomas, o filme terá em torno de 30 minutos e deve estrear, ainda este ano, no Brasil e na Inglaterra.
maio 9, 2014
Who Are the Top 10 Most Expensive Living Women Artists? by Rozalia Jovanovic, artnet.news
Who Are the Top 10 Most Expensive Living Women Artists?
Matéria de Rozalia Jovanovic originalmente publicada no artnet.news em 6 de maio de 2014.
Women artists can earn their keep.
Among the crop of the most expensive living women artists, which we have gathered here by a search of artists’ auction records by individual lot via artnet Analytics, some are abstract painters, some figurative, others use photography or blend mediums or have seen an astonishing resurgence in popularity at auction after decades-long periods of relative obscurity. At least one has been on our radar of late for her masterful transition from platforms of visual art to those of social media, and she’s not even a Millennial. At least one has previously appeared on another of our Most Expensive Artists lists. Here then, without further ado, is our list of the Top 10 Most Expensive Living Women Artists.
1. Cady Noland
When Cady Noland’s Oozewald (1989) sold at Sotheby’s New York in 2011 for $6.6 million (exceeding by threefold its low estimate of $2 million and eclipsing her earlier record of $1.8 million), it broke the record for the highest price ever paid at auction for a work by a living female artist and puts her first on this list. It also garnered the artist a spot on our tally of the Top 10 Most Expensive Living American Artists. Oozewald, of silkscreen ink on aluminum plate, depicts a black-and-white image of Kennedy assassin Lee Harvey Oswald as he’s being shot; he’s gagged with an American flag and his body riddled with white spots that evoke gun shot wounds. The piece captures the spirit of Noland’s work, which frequently traffics in the broken illusion of the American dream. That illusion is also conveyed in Noland’s Gibbet (1993–94), which sold for $1,762,500 at Sotheby’s New York in 2010. Noland, who was born in 1956 and is the daughter of Color Field painter Kenneth Noland, made other news at that same 2011 groundbreaking Sotheby’s sale when she disavowed Cowboys Milking (1990), a silkscreen print on an aluminum sheet, due to damage, and had the auction house withdraw it.
2. Marlene Dumas
Had this been 2005, Dumas would have been at the top of this list. It was in that year, that Dumas made headlines as the most expensive living artist when her painting The Teacher (sub a) (1987)—a forbidding portrait taken from a class picture from her childhood in South Africa—sold for $3.3 million. In 2008, the year of artist Marlene Dumas’s first US survey (which opened at the Los Angeles MOCA and then moved to New York’s MoMA), the artist’s auction record reached a new high with the sale at Sotheby’s London of The Visitor (1995), an oil painting of a group of strippers standing expectantly by an open door. Dumas’ paintings often have moribund subject matter, frequently featuring drowned and hanged people or babies with bloodied hands, and seem to drip with a nightmarish subtext that one imagines must have been informed by the politics of her early surroundings (the 60-year-old artist was raised during Apartheid). Grim as they are, though, her work caught the attention of mega-dealer David Zwirner, who in 2008, after years of courting her, finally signed the artist.
3. Yayoi Kusama
Japanese artist Yayoi Kusama may now be, thanks to social media, best known for the sensation she created this past November with her celestial installation at David Zwirner gallery, “Infinity Mirrored Room.” Visitors lined up for hours to get 45 seconds in the darkened room outfitted with tiny flickering LED lights and mirrored walls that evinced the sensation of free-floating through an endless cosmos. But it is perhaps Kusama’s Infinity Nets, or paintings in which the entire canvas is filled with a hypnotic “net” of monochromatic brushstrokes, that are the 85-year-old artist’s trademark. And with the sale in 2008 of “No. 2” (1959), an early white-on-white iteration of one of her Infinity Nets, Kusama’s auction record (which was already well-established with 3463 lots at auction) hit an all-time high. Selling for $5.8 million, more than doubling its presale low estimate, the painting, which had been owned at one time by Donald Judd, brought in the highest price ever paid at auction for a work by a living female artist.
4. Bridget Riley
Around 1960, while working part-time as an illustrator at an advertising firm, British artist Bridget Riley began to develop the Op Art style that would become her signature. While initially, she worked in black-and-white, in 1967, she would begin using color and created her first stripe painting. One year later she would represent Great Britain at the Venice Biennale where she scooped up the international prize for painting, and was the first woman and the first contemporary British painter to win the prize. Chant 2 (1967), a painting of alternating vertical blue and white stripes, which was part of three works that went to the Biennale, was purchased by an American collector in 2008 at Sotheby’s London for $5.1 million, outpacing her own record, set only a few months earlier, by a couple of million. (If looking at British Pound Sterling, this record was broken by the February 2014 sale of the same painting at Christie’s London, though when converted to US dollars, the 2008 sale remains the record for Riley.) Perhaps the market high was encouraged by her retrospective that year at the Musée d’Art moderne de la Ville de Paris. But in 2006 Riley’s work was already attracting renewed collector interest, as indicated by the sale to Jeffrey Deitch of Untitled (Diagonal Curve) (1966) for $2.2 million, roughly four times its low estimate.
5. Julie Mehretu
Amongst the youngest in the group is Julie Mehretu (born in Ethiopia in 1970), whose abstract painting Retopistics: A Renegade Excavation (2001) broke the artist’s record when it sold for $4.6 million at Christie’s New York in 2013. Mehretu’s abstract paintings, which are created with layers of acrylic on canvas followed by marks in pencil, ink and more layers of paint, were already fetching six figures in 2006. But it wasn’t until 2010, at the sale of works from the Neuberger Berman and Lehman Brothers corporate art collections at Sotheby’s New York in 2010, that one of her abstract paintings first garnered $1 million. That same year, Mehretu’s work was the subject of a novel high profile legal dispute brought by contemporary art collector Jean-Pierre Lehmann against Mehretu’s gallery at the time, the Project Gallery for failure to uphold a contract that granted him access to Mehretu’s work: in exchange for a $75,000 loan, the gallery was to provide the collector the right of first refusal for work by any artist represented by the gallery, at a 30 percent discount. The case, which Lehmann ultimately won, showed not only that the young artist was in high demand, but that money alone can’t secure the privilege of buying art.
6. Cindy Sherman
When American artist Cindy Sherman’s Untitled #96, a 1981 print of Sherman in a pumpkin-colored sweater as a lovesick woman lying on the kitchen floor, sold for $3.9 million at Christie’s New York in May 2011, more than doubling the low estimate of $1.5 million, it became, at the time, the most expensive photograph ever sold at auction. By that point, Sherman’s market had already been on the rise for several years. While the 60-year-old artist is one of the best-known and most critically acclaimed artists working today, at auction she has trailed behind other artists of her generation, including Julian Schnabel and Richard Prince (who made our list of Top 10 Most Expensive American Artists). Though something of an auction darling (Sherman’s work has been offered 1738 times (according to the artnet Price Database), her staged conceptual photographs of herself in costume only broke the $1 million mark in 2007 with the sale of Untitled film still no. 48 (1979), a black-and-white image of herself as a hitchhiker on a desolate highway.
7. Jenny Saville
Jenny Saville‘s unsettling massive female nudes brought her much attention during the 1990s, as she came of age among the Young British Artists. Born in 1970, Saville is best known for these large-scale paintings of nude women, some obese, with their bodies marked up as they would be before having liposuction. Plan (1993), a prime example from this body of work, is also the painting that holds her record at auction. Though Saville has been on the scene for years, she only had her first solo show in Britain in 2012. And interest in her work appears to be on the rise. In February of this year, Plan sold for $3.5 million at Christie’s London, more than doubling its low estimate of $1.3 million.
8. Vija Celmins
Latvian-American artist Vija Celmins is known for her laborious paintings and drawings of images taken from the natural world such as the surface of the moon, the night sky, and the interiors of shells. Her images, which border the photorealistic and the abstract, tend to be her most popular at auction, including Night Sky #14 (1996–97), an oil on linen painting for which her record was set at Christie’s New York in 2013 when it sold for $2.4 million. For Celmins, a 75-year-old artist who has over 40 global exhibitions under her belt since she first started showing in 1965, and whose work is in the collections of the Art Institute of Chicago, the Metropolitan Museum of Art, and the National Gallery of Art in Washington DC, among many others, Night Sky #14 was only the third work to sell for more than $1 million and may indicate that her auction record is finally catching up to her institutional acclaim.
9. Beatriz Milhazes
Interest in Brazilian born artist Beatriz Milhazes’s vivid kaleidoscopic paintings has been steadily growing since she was invited to participate in the 1995 Carnegie International in Pittsburgh. But it wasn’t until the Contemporary Art Day auction at Sotheby’s New York in May 2008, at which her work O Mágico (2001) sold for $1.1 million (more than quadrupling the low estimate of $250,000), that that interest seemed to take on more serious proportions. It was the first time the artist’s work would bring in $1 million at auction. But since then, it has surpassed that mark six more times, the most expensive of which was Meu Limão (2000) a work that sold at Sotheby’s New York in November 2012 for $2.1 million (tripling its low estimate of $700,000). Though her work has only been at auction some 80 times, more than three dozen of them have sold in the six figures. Fomenting interest and solidifying her global reputation over the past 10 years, Milhazes, who was born in 1960, represented Brazil at the Venice Biennale in 2003; had a 2009 show at the Fondation Cartier in Paris; and has been granted several prominent public art commissions in the UK, including a massive installation along the archways of a London Underground station. While interest is gathering steam, supply is, as always, limited. Milhazes has a meticulous process whereby she applies paint on plastic sheets and later transfers the pigment to canvas to achieve a smooth, brushless surface that shows no sign of the artist’s hand.
10. Lee Bontecou
2003 was a good year for Lee Bontecou. On two consecutive days, the 83-year old artist astonished auction goers by breaking her own record twice. First, on November 11, at Christie’s New York, her welded steel work Untitled (1960) sold for $298,700 roughly six times its low estimate of $50,000. The very next day at Sotheby’s, another welded steel work Untitled (1959-1960), blasted past its presale low estimate, which was also $50,000, tenfold realizing $456,000. Perhaps aided in part by her retrospective that year co-organized by the Hammer Museum and the Art Institute of Chicago, the artist who had been living in relative obscurity in Pennsylvania, was yanked back into the spotlight. Her ominous welded steel sculptures (covered with recycled canvas) from 1959 to 1960, which seem to conjure, with all their insectoid armor-like carapaces, gnarly visions of the future, are among her most recognizable works and continue to command high prices at auction. Her record is held by the sale Untitled (1962), which sold at Christie’s New York for $1.9 million in 2010. And with all the talk of the 50th anniversary of the World’s Fair, her sculpture in the David H. Koch theater at Lincoln Center, which was commissioned when the buildings were constructed for the 1964 World’s Fair, are decidedly timely and a good way to check out her work whether or not you’ve got millions to spare at auction.
maio 4, 2014
Mostra celebra o universo sombrio de Iberê Camargo por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Mostra celebra o universo sombrio de Iberê Camargo
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 3 de maio de 2014.
Iberê Camargo foi uma espécie de arquiteto da solidão.
Na mostra que celebra seu centenário, aberta hoje no Centro Cultural Banco do Brasil, fica claro como o artista, morto aos 79, há 20 anos, construiu um universo singular, quase todo azul e cheio de figuras à beira da morte.
Do subsolo, onde estão seus estudos e um amplo recorte de sua obra gráfica, ao terceiro piso, que concentra as enormes telas de sua chamada fase trágica, estão expostos desde os alicerces mais tímidos de sua pintura até seu auge expressionista.
Ocupando todo o antigo banco no centro paulistano, as 150 obras não respeitam uma cronologia, embora o fim de sua vida, a produção dos anos 1990, esteja em peso maior no terceiro andar e o segundo piso tenha as pinturas dos anos 1960 e 1970.
Mas Camargo não se divide em capítulos. Nada é estanque nessa obra contínua de exploração da matéria.
Sua pintura parece obcecada em afirmar a própria presença, o peso físico de estar aqui e agora mais do que qualquer noção de devaneio.
Nesse ponto, suas telas dos anos 1950, abarrotadas de carretéis, uma lembrança de infância que se tornou o símbolo máximo de sua obra, são composições espessas que parecem transbordar do quadro.
FASE DE TRANSIÇÃO
Mas entre os carretéis e a abstração plena dos anos 1960 e 1970, está uma de suas fases mais poderosas. São telas negras, de uma escuridão aterradora só rompida por vultos de carretéis esbranquiçados, quebrando o silêncio.
Essa série, que venceu o prêmio de pintura da Bienal de São Paulo em 1961, é um dos pontos altos da mostra, sinalizando uma transição na obra de Iberê Camargo.
Foi depois dessa espécie de expurgo da cor que apareceu sua fase mais gestual e abstrata, com tons coloridos.
Camargo parecia se entregar ali a um expressionismo histérico, em que mais do que a forma final dos quadros importavam seus gestos, a violência do pincel sobre a tela.
Ele parecia construir a antessala de sua fase trágica, mais silenciosa e toda azul. É difícil reduzir a obra do artista a um só momento, mas o terceiro andar da exposição é sem dúvida o ponto máximo de sua trajetória plástica.
Estão lá suas "idiotas", as figuras quase amorfas, de rostos cadavéricos e olhos ausentes, que aguardam solenes e patéticas o próprio fim.
Há algo de beckettiano nessa espera. Suas figuras desgarradas do plano terreno e em plena ascensão rumo a um firmamento acachapante afirmam a beleza do fim.
Em crise, Masp aprova reforma de seu estatuto por Camila Molina, Estado de S. Paulo
Em crise, Masp aprova reforma de seu estatuto
Matéria de Camila Molina originalmente publicada no jornal Estado de S. Paulo em 29 de abril de 2014.
Processo começou por conta de dificuldades financeiras que podem chegar a R$ 54 milhões
O primeiro passo oficial de mudança de governância do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (Masp) ocorreu no fim da tarde desta terça-feira, 29, quando foi aprovada a reforma do estatuto da entidade em assembleia realizada no pequeno auditório da instituição. Com 73% de aprovação, ou seja, com a presença de 40 dos 53 conselheiros e associados do Masp, todas as propostas de uma nova gestão que terá o consultor e empresário Heitor Martins à frente da presidência do museu serão incorporadas nos autos da entidade.
O processo foi alavancado por causa das "dificuldades financeiras" pelas quais passa o museu - oficialmente, as dívidas seriam de R$ 10 milhões, mas extra-oficialmente o rombo seria de montante em torno de R$ 54 milhões, incluindo os gastos com o prédio Masp-Vivo. Entre as mudanças propostas, está a criação de comitês de gestão para acompanhar as atividades de gestão do museu e para o processo de construção do edifício Masp-Vivo, atualmente, com obras paralisadas.
"Estamos em um momento de grandes transformações no Masp", disse a atual presidente executiva da instituição, Beatriz Pimenta Camargo. Possivelmente, ela vai presidir o conselho da instituição para dar lugar a Heitor Martins, sócio-diretor da empresa de consultoria McKinsey & Company e ex-presidente da Fundação Bienal de São Paulo, na presidência do museu. O nome do empresário foi levado pelo Banco Itaú e pelo "grupo de empresas" que assumirão a dívida do Masp, afirmou Beatriz. A colecionadora contou que há mais de uma década não ocorriam mudanças no estatuto da instituição.
Uma nova assembleia será convocada em até 60 dias para que seja oficialmente efetivada a eleição de Heitor Martins como presidente do Masp e para que novos conselheiros entrem na entidade, chegando a um total de 80 membros. Além de Martins, a nova diretoria-executiva da instituição será formada por Alberto Fernandes (vice-presidente executivo do Banco Itaú BBA), Alexandre Bertoldi, advogado, Flavia Velloso, Nilo Cecco e pelo cientista-social e colecionador Miguel Chaia.
Segundo Beatriz Pimenta Camargo, ainda não foi cogitada a troca do curador do Masp, Teixeira Coelho, neste processo de mudança de gestão do museu. "Nós não somos eternos aqui", afirmou o arquiteto Julio Neves, ex-presidente do Masp. Outra mudança apresentada no novo estatuto é a criação de lugares natos para o poder público, ou seja, para os secretários de cultura do município e do Estado de São Paulo e para o presidente do Ibram (Instituto Brasileiro de Museus), órgão do Ministério da Cultura.
Mostra inicia as celebrações do centenário de Iberê Camargo por Camila Molina, Estado de S. Paulo
Mostra inicia as celebrações do centenário de Iberê Camargo
Matéria de Camila Molina originalmente publicada no jornal Estado de S. Paulo em 2 de maio de 2014.
Exposição em São Paulo apresenta 48 pinturas e cerca de 80 desenhos, gravuras e matrizes do 'homem-pintor'
"Pinto porque a vida dói." Parece não haver maneira de fugir desta afirmativa que o artista Iberê Camargo (1914-1994) usou para falar de sua obra.
Na sala do terceiro andar do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) de São Paulo, seis grandes óleos sobre tela realizados pelo pintor no fim de sua vida concentram naquele espaço a expressão mais trágica de sua arte. Nas pinturas da série Tudo Te É Falso e Inútil (1992), As Idiotas (1991) e Crepúsculo da Boca do Monte (1991), figuras cujas formas e rostos não as definem como velhas ou mais novas parecem apenas esperar pela morte, já sem suas vestes. A atmosfera azul, lilás, roxa daquelas obras faz remeter, como identifica o curador Luiz Camillo Osório, à capela Rothko em Houston.
Monumentais (com mais de dois metros de comprimento cada uma), as telas são o auge da exposição Um Trágico nos Trópicos, a retrospectiva do artista gaúcho Iberê Camargo a ser inaugurada no CCBB. A mostra, que abre o calendário de comemorações do centenário de nascimento do pintor (exatamente, em 18 de novembro de 1914, em Restinga Seca), apresenta 48 pinturas e cerca de 80 desenhos, gravuras e matrizes do "homem-pintor", expressão de seu conto Hiroshima, já publicado em livro.
Iberê Camargo também soube usar as palavras para expressar o drama, a melancolia, o lado trágico de sua criação. Além de escrever, sempre definiu com clareza, em suas falas, suas motivações. Mas a pintura – de densa matéria (muita tinta), em que os elementos nunca se soltam por ser tão coesa, afirma Luiz Camillo Osório, curador da exposição –, é a essência de sua produção artística. "Teve um sacerdócio de Iberê com a pintura, com o ofício plástico, uma fala sempre muito de dentro do fazer e que desdobra o conhecimento técnico para as questões metafísicas que perpassam sua obra", afirma o crítico. "Da mão", Osório completa, sai toda a "respiração espiritual" que o trabalho do artista carrega.
Sombrio. Não se trata de uma retrospectiva didática, porque já de princípio a exposição não tem nem mesmo um percurso cronológico. Diz o curador, baseado em citações filosóficas, que a cultura brasileira "rasura, nega" a dimensão trágica da vida – Iberê Camargo, o gravador Oswaldo Goeldi e, na face contemporânea, o artista Nuno Ramos formariam o tripé de "exceção", ou seja, seriam criadores que trazem o sombrio existencial para a obra plástica (e o escritor Graciliano Ramos, opina o curador, no campo da literatura nacional). A "afirmação do trágico" é, assim, o mote que Osório tomou para conceber a exposição que, por ora, só será exibida em São Paulo. "Anoiteceu dentro de mim", disse o artista em uma entrevista inédita concedida ao pintor Jorge Guinle e reproduzida no catálogo (que, aliás, traz também falas de Iberê à escritora Clarice Lispector e outros).
Em pequena sala do quarto andar do CCBB, está uma espécie de "microuniverso de Iberê". É uma visada geral e concisa pela trajetória do pintor, começando por duas pequenas pinturas de paisagem, Jaguari (1941) e Dentro do Mato (1941-42) – raridades pelo protagonismo do verde. Passa-se, ainda, pela obra Natureza-Morta com Garrafas (1957) – sombria, com formas negras ao fundo, já em diálogo com a série dos carretéis, das mais emblemáticas de sua carreira, realizada no fim da década de 1950 e início dos anos 60, e representada por um trabalho. Há também uma grande tela de 1965, que indica o período abstrato de Iberê, e peças apresentando sua volta, aos poucos, à figuração – até chegar às imagens dos ciclistas e dos homens e mulheres solitários, fantasmagóricos.
"A ideia é justamente pegar esse elemento mais pictórico para mostrar, seja indo para a abstração, seja para figuração, como a articulação da tinta, cor, gesto e matéria se mantém ao longo do trabalho dele", afirma Camillo Osório. Só nesta sala acontece uma exibição explícita de passagem ou percurso na obra de Iberê Camargo. Nos outros segmentos, as obras reúnem-se por conjuntos expressivos de sua carreira.
Por uma opção curatorial, a série dos carretéis, "ponto de partida da sua fase considerada abstrata", afirmou o pintor em carta de 1979 a Pierre Courthion e na qual ele traz para sua obra a forma do objeto que era um brinquedo em sua infância, "foi sacrificada". Falta de espaço para exibir tudo o que se tinha vontade a partir de uma produção tão ampla (calcula-se que Iberê tenha criado mais de 7 mil trabalhos).
Além da já citada apresentação de conjunto denso de pinturas do fim da trajetória do gaúcho, estão em outra sala, no segundo andar, criações dos anos 60, 70 e 80, dando destaque para a abstração no trabalho do pintor. O escurecimento da pintura chega ao auge com as Fiadas de Carretéis e depois a cor vai explodindo (com destaque para o vermelho) em telas diversas. Para o curador, há uma "vibração" na pintura do artista que a torna, até mesmo, "sensorialmente otimista".
"Eu não abandonei a figura, apenas a transformei", afirmou Iberê a Clarice Lispector, em 1971. Há quem considere que ele tenha voltado a ser figurativo depois do trágico episódio do assassinato de um homem em 1980, no Rio de Janeiro, durante uma briga de rua (o pintor foi absolvido por legítima defesa). Mas isso não importa. O fato é que mais outras celebrações de sua obra virão, culminando com a homenagem maior em Porto Alegre, com a abertura, em novembro, de mostra na casa do artista, a Fundação Iberê Camargo.