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Como atiçar a brasa

 


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março 30, 2012

Brasil tem exposição mais visitada do mundo, e críticos explicam fenômeno, Portal VNews

Brasil tem exposição mais visitada do mundo, e críticos explicam fenômeno

Matéria originalmente publicada na seção de variedades do Portal VNews em 29 de março de 2012.

Mostra 'O mundo mágico de Escher', no CCBB-RJ, ficou no topo do ranking. Curadores falam ao G1 e analisam atual apetite brasileiro pelas artes.

Deu na "The Art Newspaper", publicação norte-americana especializada em artes que faz um levantamento anual, desde 1996, das exposições mais vistas do planeta: a mostra "O mundo mágico de Escher", em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro entre os meses de janeiro e março do ano passado, ficou no topo do ranking relativo a 2011, tendo recebido uma média de 9.677 visitantes ao dia.

Além da exibição de gravuras originais, desenhos e instalações do holandês M.C. Escher (1898-1972), outras duas exposições realizadas na unidade carioca do CCBB também aparecem no top 10 divulgado: "Oneness", da artista japonesa Mariko Mori, com 6.991 visitantes diários (7º lugar); e "Eu em Tu", da americana Laurie Anderson, que atraiu média de 6.934 pessoas por dia (9º lugar) — todas gratuitas.

Mas o que pode ter despertado o "incrível apetite por arte contemporânea" nos brasileiros, como descreve a revista americana? Especialistas ouvidos pelo G1 creditam o fenômeno a vários fatores. Para o carioca Fernando Cocchiarale, crítico e professor de Filosofia da Arte do Departamento de Filosofia da PUC-RJ, o sucesso das exposições do CCBB está diretamente relacionado ao trabalho de divulgação das instituições culturais junto à mídia.

"As instituições vêm batalhando arduamente atrair público. Para isso utilizam-se de serviços de divulgação, assesoria de imprensa e de comunicação. Isso cria uma situação favorável, que torna natural a busca de informações por arte contemporânea. Mas acho que a grande maioria das pessoas que visita uma exposição como a do Escher sente-se atraída pelo espetáculo, pela publicidade. Não necessariamente está sendo formado um público cativo e aficionado pelo assunto. Ainda assim, acho tudo muito positivo", diz Cocchiarale, que também é professor da Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio.

Quantidade e qualidade
Investimentos em arte-educação, a boa situação econômica do país (que torna livros, obras, discos e filmes mais acessíveis) e a gratuidade das exposições também criam condições para o incremento de público, segundo Pieter Tjabbes, curador da mostra que liderou o ranking da "The Art Newspaper".

"Além desses fatores, também temos investido bastante num novo conceito de exposição. Utilizamos recursos para que as pessoas se sintam conectadas e envolvidas mais facilmente com o que está sendo exibido. Fizemos assim com as mostras de Escher e da Índia. Com seções lúdicas e interativas, que se comunicam mais com os visitantes, é que estamos atingindo novos públicos", explica Tjabbes, elogiando a quantidade e qualidade de exposições que o Brasil têm recebido ultimamente.

"A qualidade média das exposições têm subido muito. Hoje o Brasil não deve nada ao exterior. As mostras aqui são de altíssima qualidade. Além disso, a oferta de exposições, principalmente no Rio e em São Paulo, é fantástica. Eu mesmo, que sou do ramo, não dou conta de ver tudo", destaca.

Rio e São Paulo
Analisando o ranking mais de perto, um outro dado relativo ao Brasil também chama a atenção. Enquanto a unidade carioca do CCBB aparece três vezes entre as dez exposições mais visitadas, o centro cultural paulistano surge apenas em 23º lugar, também com a mostra do ilustrador holandês. Nada fora do comum, de acordo com o curador independente, jornalista e crítico de arte Marcus Lontra.

"Historicamente, a classe média carioca sempre foi uma grande consumidora de cultura, diferentemente de outras que se estruturaram posteriormente no Brasil, como a paulistana ou a mineira. Porque, no Rio, não é preciso ser rico para isso. Os cariocas têm essa peculiaridade e sempre participaram de atividades artística e culturais", ressalta Lontra, curador das exposições “Niemeyer: arquiteto, brasileiro, cidadão" e "Onde está você, Geração 80?", relembrando outras mostras de sucesso no país.

"Isso acabou se refletindo em diversos momentos, como nas exposições de Monet e Rodin, no Museu Nacional de Belas Artes do Rio, nos anos 90. O número de visitações na cidade eram sempre superiores ao de São Paulo, apesar da capital paulista ser uma cidade mais populosa", analisa o jornalista, que inaugura no dia 2 de junho, no Centro de Artes Hélio Oiticica, no Centro do Rio, a mostra "Espelho refletido", reunindo obras de 38 artistas contemporâneos brasileiros.

Continuidade
Quem também opina sobre a diferença de público da exposição "O mundo mágico de Escher" nas duas cidades é o gerente de programação do Centro Cultural Banco do Brasil no Rio, Francisco Ribeiro. Ele considera as características entre as duas unidades como um possível motivo.

"São características geográficas diferentes. Talvez no Rio o acesso ao CCBB seja mais fácil. E, por ser maior, a gente pode abrigar mais pessoas diariamente. Acredito que isso possa se refletir neste número. Porque, apesar da imponência do nosso prédio carioca, queremos mostrar que essa pode ser uma casa de todos", diz Ribeiro.

Apesar da atual notoriedade brasileira no campo das artes e da festa em torno do levantamento divulgado pela revista "The Art Newspaper", ainda é cedo para comemorar, como observa Fernando Cocchiarale. O crítico adverte: "Não acho que estes números sejam resultados consolidados. Este trabalho de divulgação e publicidade da arte tem que continuar. Aí, sim, o público cativo também vai aumentar".

Posted by Guilherme Nicolau at 2:34 PM

Narcélio Grud em constante mutação por Dalviane Pires, Diário do Nordeste

Narcélio Grud em constante mutação

Matéria de Dalviane Pires originalmente publicada no Caderno 3 do Diário do Nordeste

Em Etério, que abre, hoje, no Sobrado Dr. José Lourenço, o artista inquieta com obras feitas a partir da areia

Areia que vira barro que vira tijolo que vira arte. Areia misturada, aquecida, resfriada, moldada em vidro para também se transformar em arte. O artista Narcélio Grud, que abre, hoje, às 19h, a exposição Etério, no Sobrado Dr. José Lourenço, não está muito preocupado em conceituar sua obra. Grud está mais interessado em experimentações que sirvam para que ele se reconheça - ou não - em determinadas linhas de criação artística. "Não quero explicar muito. Quero que as pessoas vejam e sintam as obras", diz o artista sobre a primeira mostra individual da carreira.

A mesma liberdade que Grud defende para os olhares diante de sua arte exercita ele próprio durante a criação. Coloca a mão na massa, faz testes com o que planejou, recusa originais. Ora acerta, ora erra, mas não se limita a achar que tudo funciona em uma exposição. Cita exemplos de peças pensadas para Etério que ao serem executadas não ficaram boas. "É um processo muito intuitivo. Vou percebendo o que é do design, o que é da cenografia e o que é, de fato, uma obra de arte. É necessário um crivo, um equilíbrio", diz Grud.

O personagem risonho "sem nome, sem sexo, sem boca" que acompanha outras obras de Grud também está presente em peças de vidro, sempre deixando para o visitante a interpretação final. Em uma das salas, casulos, espelhos e a sensação de encontrar o final do arco-íris. Chama a atenção uma moldura grossa, de madeira, que cerca delicados desenhos pintados em tampinhas de refrigerante. A moldura, que foi encontrada por Grud na rua, guarda um pouco da sensibilidade do artista. Em Etério, Grud teve sua primeira experiência com barro queimado. Os tijolos longos, curtos, cortados que compõem uma "parede viva" foram feitos pelo artista em uma olaria distante aproximadamente 80 quilômetros de Fortaleza.

Com jeitinho, conseguiu autorização para usar o local para produzir os tijolos personalizados, muitas vezes diante dos olhares curiosos e apressados dos trabalhadores do lugar.

O olhar

A rua está sempre presente em seu trabalho. O spray permanece essencial para o artista que ficou conhecido pelos grafites e intervenções urbanas. Ele conta que inicialmente os tijolos ficaram cinzas, "prateados", e que não combinavam com o pensamento inicial da obra. Usou um spray para deixá-los com uma cor padrão, alaranjados. Antes da montagem, Grud foi ao Sobrado Dr. José Lourenço fazer uma espécie de "reconhecimento do espaço". Tirou várias fotos, mas de tão inquieto e de acelerado pensamento, não chegou a ver tais fotos e estudar o que ficaria melhor em cada local. Apostou no olhar panorâmico do artista e disse que durante a montagem saberia o que poderia ou não mudar de lugar.

Narcélio Grud reconhece a importância do trabalho de Dodora Guimarães para a realização de Etério. Conta que os diálogos com a curadora foram fundamentais para aprimorar o próprio trabalho. A aproximação de Dodora e Grud começou antes mesmo dele saber. "Soube do Grud pelos "cabeções" (uma intervenção urbana onde o artista, inicialmente anônimo, pintou as caixas de telefonia com rostos coloridos). Fiquei acompanhando, plugada no artista, vendo o que ele teria a dizer a partir dali", recorda Dodora.

Como parte desse acompanhamento, Dodora viu o trabalho de Grud também no Centro Dragão do Mar. Por lá, esculturas sonoras colocadas em um espaço conhecido como Arena Dragão do Mar atraíam visitantes, sinalizando mais uma importante invenção do artista.

No ano passado, Grud foi convidado para levar uma dessas esculturas sonoras para fazer parte de uma "exposição relâmpago" do Sobrado chamada "Com o Ceará no Coração". Mais tarde participou de um seminário que discutia arte e mercado, onde apresentou um portfólio a Dodora. "Aí vi a obra dele de forma mais completa. Só me interesso por "artista inventor" e o trabalho do artista é correr risco, experimentando o caminho próprio", diz a curadora, que percebe na arte de Grud provocação e inquietação.

Projetos futuros

Etério fica em cartaz até dia 20 de maio, mas, em abril, em homenagem ao aniversário de Fortaleza, Grud vai colocar em diferentes pontos da cidade o que chama de "escultura sonora pública". O projeto será possível por meio do edital da Secretaria da Cultura de Fortaleza (Secultfor).

Ainda neste semestre Grud apresenta mostra de esculturas sonoras também no Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBNB).

Do futuro, Nárcelio Grud, que ganha a vida como cenógrafo e designer, quer viver da arte. "Quero passar meu tempo, da hora que acordo a hora que vou dormir, pensando na minha criação e não no mercado", finaliza.

Sobrado ganha também uma exposição de quadrinistas

Em paralelo a exposição Etério, o Sobrado Dr. José Lourenço abre também, hoje, às 19h, a mostra Desenhomatic LTDA, de dois nomes do underground gráfico brasileiro: Jaca e Fabio Zimbres. Os quadrinistas e ilustradores apostam na convergência de seus trabalhos, por meio do desenho, pensado como força automática, autônoma, nesta primeira mostra conjunta que promete a quebra do silêncio das paredes do espaço.

A exposição reúne a produção recente dos dois artistas, apresentadas, em 2011, nas cidades de São Paulo e Porto Alegre. No Sobrado Dr. José Lourenço o visitante poderá ver também obras resultantes de suas residências no local.

Amanhã, às 15h, o Sobrado promove uma oficina de desenhos de Fabio Zimbres. Exercícios com colagens e transparências, com destaque para o modo de produção manual. A entrada é franca tanto para exposição quanto para a oficina.

Mais informações:

Abertura de Etério, de Narcélio Grud, hoje, às 19h, no Sobrado Dr. José Lourenço (Rua Major Facundo, 154, Centro). Na ocasião, show de Paula Tesser e Edmundo Júnior. Visitas de terça a sexta, das 9h às 19h. Aos sábados, das 10h às 19h e, aos domingos, das 10h às 14h. Em cartaz até 20 de maio. Entrada franca. Contato: (85) 3101.8827.

Posted by Guilherme Nicolau at 1:05 PM

Forrest Bess em dose dupla por Juliana Moachesi, Revista Select

Forrest Bess em dose dupla

Matéria de Juliana Moachesi originalmente publicada na Revista Select em 26 de março de 2012.

Curadoria de Robert Gober lança luz sobre a obra do artista

Roberta Smith começa seu texto no New York Times de sexta-feira, 23, com um alerta: "A arte de Forrest Bess (1911-1977), como a de Vincent van Gogh, pode estar em perigo de ser acometida pela sua história de vida. Especialmente agora, quando a obra deste excêntrico pintor visionário - que passou a maior parte de sua maturidade como um pescador no Golfo do México, vivendo em uma restinga de praia no Texas - está tendo um momento especialmente intenso em Nova York".

É que o pintor texano conhecido pelo vocabulário muito particular de formas que lhe vinham em sonhos e visões está tendo duas mostras paralelas em importantes instituições de NY no momento: uma sala especial na Bienal do Whitney 2012 com curadoria de Robert Gober e uma exposição de 40 pinturas na casa de leilões Christie's que resulta da venda de uma coleção particular. A mostra A Tribute to Forrest Bess, na Christie's, perfaz "uma visão bastante inquieta de uma casa de leilões agindo como galeria comercial manejando o equivalente ao espólio de um artista", segundo Smith.

As pequenas pinturas de Bess são preenchidas com símbolos pessoais e elementos básicos de significado igualmente subjetivo. Para o artista, as pinturas que ele executava reproduzindo com fidelidade suas próprias visões representavam uma linguagem pictórica com significado universal. Junto com as teorias médicas e psicológicas derivadas de sua erudição auto-didata, ele acreditava que sua imagética compreendia o esboço de um estado humano ideal, com o potencial de aliviar a humanidade do sofrimento e da morte.
A crítica do NYT concede que os fatos da vida de Bess não são nada menos que sensacionais: "Eles incluem isolamento, pobreza, visões recorrentes e até mesmo auto-mutilação. Na década de 1950, convencido de que a união das lados masculino e feminino de sua personalidade garantiria a imortalidade, Bess tentou se transformar em o que chamou de 'pseudo-hermafrodita' por meio de dois atos de dolorosa autocirurgia que resultaram em uma pequena abertura na base de seu pênis".

Porém, assim como Van Gogh, prossegue Roberta Smith, as pequenas quase-abstrações intensamente pessoais de Bess parecem "projetadas para resistir ao ataque da biografia. As melhores delas, feitas entre 1946 e 1970, são inicialmente modestas, contudo podem reviram os olhos com as suas superfícies agitadas, cores saturadas e combinações de símbolos estranhos ou evocações destiladas do mundo natural", afirma.

"Igualmente importante é a forma como os trabalhos de Bess reconfiguram a história da arte. Como Myron Stout, Steve Wheeler e Alice Trumbull Mason, que também favoreceram os pequenos formatos e as formas ressonantes, Bess amplia nossa compreensão da ascendência da pintura americana das décadas de 1940 e 50 para muito além das telas imensas dos habituais expressionistas abstratos suspeitos", escreve a crítica do NYT, contribuindo, também ela, com sua escrita magistral, para reconfigurar a história da arte.

Segundo Smith, a exposição na Christie's inclui um vídeo com vários depoimentos sobre a vida e a obra de Bess, do qual destaca as falas do escritor budista Robert Thurman e do crítico de arte John Yau. O primeiro aventa a tese de que, de uma perspectiva budista, Bess era "talvez alguém que tenha sido um iogue em uma vida anterior. Ele observa que o papel de um iogue é submeter seu corpo e seu ser à sua visão da vida", chamando o corpo de Bess de sua "obra de arte suprema".

Já o senhor Yau sugere, "com plausibilidade possivelmente maior para os não-budistas, que a busca fervorosa de Bess, bem como sua autocirurgia - a idéia veio do estudo de ritos realizados por aborígenes australianos - refletem uma incapacidade para aceitar a sua homossexualidade e, de maneira mais geral, sua reação a uma cultura com pouca tolerância à diferença. O sr. Yau compara as superfícies cicatrizadas de pinturas de Bess às cicatrizes físicas e psíquicas que ele sofreu", reporta Smith.

Considerando que o momento é tudo, a mostra da Christie's se sobrepor à Bienal é dificilmente um acidente, alfineta ainda a crítica. "A exposição é acompanhada de um catálogo luxuoso com ensaios esclarecedores de Robert Storr, o escritor, curador e reitor da Yale School of Art, e do crítico cultural Wayne Koestenbaum. O sr. Koestenbaum fornece uma leitura muito minuciosa das superfícies de Bess, especialmente sobre o uso da espátula e do ritmo visual criado por seus desempenos bastante cuidadosos."

Posted by Guilherme Nicolau at 11:41 AM

Nobuo Mitsunashi nos 30 anos da Galeria Deco por Mariel Zasso, Revista Select

Nobuo Mitsunashi nos 30 anos da Galeria Deco

Matéria de Mariel Zasso originalmente publicada na Revista Select em 29 de março de 2012.

Comemoração inclui uma exposição paralela de artistas contemporâneos brasileiros

A Galeria Deco inaugurou hoje duas exposições comemorativas ao seu trigésimo aniversário. Desde 1981, a galeria representa artistas plásticos japoneses e nikkeis na pacata Rua dos Franceses no Bairro Bela Vista, em São Paulo.

Para marcar a data especial, convidou o proeminente artista japonês Nobuo Mitsunashi para um exposição na qual suas obras dialogam com as de Tomie Ohtake, e ainda montou, paralelamente, a coletiva "Olhares Oblíquos" com artistas contemporâneos brasileiros e japoneses.

Mitsunashi é presença constante em terras tupiniquins, e foi inclusive curador da exposição Círculos Traçados, centrada no diálogo entre Brasil e Japão, na mesma galeria, no final do ano passado. Em 2004, também na Deco, causou frisson com Chocolate, Framboesa e Chantilly. No jantar-performance, 24 convidados - artistas, críticos de arte e jornalistas, todos vestidos de preto, sentados em uma longa mesa branca em cadeiras para as quais eram apontadas pistolas antigas penduradas no teto - foram recebidos com um banquete exótico de pratos doces, como um pedaço de carne vermelha coberto de chocolate. O memorável jantar terminou com uma taça de cristal enfeitada com pingos de chocolate - que tiveram que ser lambidos pelos convidados.

A performance teve sua estreia no Brasil, entre outros motivos, pelo baixo custo da matéria-prima - foram utilizados 80 quilos de açúcar de confeiteiro! Na exposição que se seguiu, obras de chocolate. Graduado na Universidade de Arte de Musashino, em Tóquio, Mitsunashi também expôs na 21ª Bienal de Artes de São Paulo, em 1991, na Pinacoteca do Estado, no Instituto Tomie Ohtake, e em diversas exposições na Deco, onde expõe regularmente desde 2002.

Aleḿ das obras inéditas de Ohtake e Mitsunashi, a comemoração da Deco inclui uma exposição paralela de artistas contemporâneos brasileiros. Olhares Oblíquos reúne pinturas, esculturas, gravuras e objetos e propõe ao visitante conhecer um pouco mais sobre a arte contemporânea japonesa e suas influências no trabalho de artistas nipo-brasileiros. Entre os artistas, Sandra Cinto, Albano Afonso, Felipe Barbosa, Rosana Ricalde, Futoshi Yoshizawa e Lia Chaia

As exposições “Encontros: Tomie Ohtake e Nobuo Mitsunashi” e “Olhares Oblíquos” ocorrem simultaneamente entre 28 de março e 29 de abril de 2012.

Serviço:
"Encontros: Tomie Ohtake e Nobuo Mitsunashi" e “Olhares Oblíquos”
Abertura: 28 de março, 19h
de 29 de março a 29 de abril de 2012

Galeria Deco
Rua dos Franceses 153, Bela Vista.
11-3289-7067. Diariamente, 10h-19h.

Posted by Guilherme Nicolau at 11:33 AM

A arte documentada por Ivan Claudio, Istoé

A arte documentada

Matéria de Ivan Claudio originalmente publicada na seção de Artes Visuais da Istoé em 23 de março de 2012.

O documentário "Shoot Yourself" reúne o trabalho de artistas brasileiros e estrangeiros que se dedicam ao ato efêmero da performance

Diante da plateia atenta do museu Jeu de Paume, em Paris, a artista cubana Tania Bruguera fala sobre a ineficácia da arte. Ela é radical. Faz uma pausa, pega um revólver, carrega-o com uma bala de verdade e encosta-a na cabeça. Agora, além de atento, o público está tenso e atônito. A roleta russa pontua toda a sua explanação. Tania chega ao fim. Viva. Intitulada “Self Sabotage”, essa performance não foi concebida para ser documentada. Um espectador, no entanto, gravou o ato e o postou no YouTube: é o único registro conhecido de uma obra feita para durar não mais que um momento. São imagens de impacto que abrem o documentário “Shoot Yourself”, da editora da revista “SeLecT”, Paula Alzugaray e do cineasta Ricardo van Steen, que estreia no Festival É Tudo Verdade (Rio de Janeiro e São Paulo, até 5/4). “A metáfora da câmera como arma nos deu também o título do filme”, diz Paula, que entrevistou Tania durante uma residência artística no Centre International D’Acueill et D’Echanges des Récollets.

Além da performer cubana, o filme reúne oito artistas entre brasileiros e estrangeiros – nomes como do americano Gary Hill, da iraniana Ghazel e do pichador paulista Cripta Djan, que invadiu a Bienal de São Paulo. O que une o trabalho de todos eles é o uso do corpo como instrumento do fazer artístico; o que os distancia é a forma como documentam. Alguns preferem não registrá-lo, outros usam a gravação como objeto do ato criativo. “Buscamos fazer um mapeamento da importância da câmera para a performance. O subtexto é esse: em que medida a ação deve ser mantida para a posteridade ou ir embora com o público”, diz Paula, que optou por uma seleção heterogênea de nomes da arte contemporânea.

Ao se afastar de um grupo coeso, orientado pelas mesmas práticas estéticas, o documentário promove confrontos e cria choques, segundo a diretora, que procurou desde o início misturar gerações, contextos, procedências e línguas. Essa escolha se reflete nas filmagens, variando de artista para artista. “A tônica foi romper a fronteira e dialogar com a obra do entrevistado”, diz Van Steen, que assume, assim, o lado performático do próprio documentarista.

Posted by Guilherme Nicolau at 11:23 AM

março 28, 2012

A crise da cultura: ocaso e fulanização por Saul Leblon, Carta Maior

A crise da cultura: ocaso e fulanização

Artigo de Saul Leblon originalmente publicado no Blog das Frases em Carta Maior em 27 de março de 2012.

Há uma crise aberta no Ministério da Cultura do governo Dilma, guarnecida com todos os ingredientes típicos desse cardápio. Há guerra de declarações na mídia, há descontentamento nos bastidores, há manifestos e ressentimentos; há fogos e contrafogos.

Há, sobretudo, um perigo: o de simplificar a natureza de um impasse pouco discutido e menos ainda compreendido fora do círculo dos iniciados. Em qualquer crise, o rebaixamento das causas fulaniza as consequências gerando uma compreensão epidérmica do principal. O conjunto dificulta o passo seguinte da história.

Um dos nomes da crise no MinC pode ser Ana de Hollanda, titular da pasta criada em 1985, no governo Sarney.

Faltaria ao ministério, atestam seus críticos, o desassombro e/ou a convicção para reposicionar o país em sintonia com as novas possibilidades, agendas e desafios da produção cultural no século XXI.

Inclui-se aí maior ousadia em relação à política de direitos autorais, bem como o empenho necessário à revisão da lei de patrocínio, que engessaria a política cultural brasileira no coador dos interesses privados.

Ana de Hollanda pode ser um dos nomes da crise, mas não é o nome completo de todos esses impasses, que tampouco nasceram neste governo e, menos ainda, derivam exclusivamente das idiossincrasias deste ou daquele personagem.

O jornalismo afivelado à ditadura, nos anos 80, costumava seguir uma receita ilustrativa do papel desdenhoso, tradicionalmente reservado à cultura na sociedade brasileira. Compunha-se a 'sábia' prescrição de um ilustrativo tripé feito de conservadorismo extremo na área da economia; liberalismo aguado na cobertura política e um desvaçlorizado vale-tudo na cultura.

O menosprezo pelo papel da cultura na vida e no desenvolvimento de um povo não é exclusividade brasileira, tampouco se circunscreve a períodos ditatoriais. Sua incidência, infelizmente, persiste no amplo espectro político dos nosso dias.

Ao reconquistar o governo da Espanha este ano, o Partido Popular, por exemplo, herdeiro do franquismo - de cujas entranhas brotou o lema 'quando ouço a palavra cultura saco o revólver - extinguiu o ministério da Cultura, rebaixando-o à condição de secretaria menor.

Collor de Mello fez o mesmo no Brasil, em abril de 1990, devolvendo o então recém-criado ministério da Cultura a uma prateleira subalterna na burocracia de Estado.

Amesquinhar tevês educativas é outro traço da mesma cepa.

Aconteceu com a BBC, na Inglaterra de Cameron; está acontecendo na Espanha, de Rajoy, e na São Paulo tucana, cuja TV pública vive mais um capítulo de um ocaso financeiro e conceitual (leia "TV Cultura, uma nova privataria em curso").

Pior ainda, no Brasil, a alérgica relação entre cultura e conservadorismo foi mitigada no auge do ciclo neoliberal pela assimilação do MinC ao espírito da época.

O engessamento herdado desse período ainda não foi totalmente rompido.

Coube ao segundo governo FHC cunhar o dístico do renitente matrimônio, quando o ministério da Cultura tucano adotou como lema o brado auto-explicativo: “cultura é um bom negócio”.

O ovo de Colombo seria a adaptação do regime medieval do mecenato à terceirização da política cultural, sustentada pela renúncia fiscal dos fundos públicos.

Se as telecomunicações, as estradas e os minérios estavam sendo depurados da intrínseca ineficiência estatal pela panaceia privatizante, por que não juntar a esfera cultural no mesmo saco?

O regime de patrocínio cultural que combina renúncia pública e dividendos privados foi instituído no governo Collor. A exemplo de outras práticas 'desregulatórias', porém, seu fastígio ocorreria no governo dos intelectuais e professores tucanos, que submeteram a área da Cultura a um tenaz arrocho orçamentário.

Em média, nos anos 90, coube ao MinC miseráveis R$ 230 milhões por ano.
O torniquete revelou-se funcional ao jogar compulsoriamente a sobrevivência das artes ao arbítrio das fundações de prestígio e fachada, que passariam a deter prerrogativa de selecionar o que deveria ou não chegar aos olhos, ouvidos, corações e mentes do imaginário nacional.

Os mesmos que assim agiam, e agem, gostam de criticar o 'dirigismo cultural' do Estado Novo getulista; odeiam a Voz do Brasil; tem brotoejas diante das emissões da TV Brasil.

No governo Lula, o orçamento do Ministério da Cultura multiplicou-se por dez, girando hoje um valor torno de R$ 2 bi.

O salto relativo é indiscutível. Mas o valor absoluto está longe de ser suficiente para abolir a senzala da terceirização que determina a cultura do país.

Hoje, o orçamento federal para bancar um ano de atividade do MinC equivale ao gasto público de três dias com o pagamento dos juros da dívida interna (cujo serviço total custou R$ 236 bi no ano passado, segundo o BC).

Há nessa assimetria uma demolidora e silenciosa crise da cultura que as erupções atuais pouco abordam.

Os oito anos de governo Lula, de qualquer forma, acumularam avanços incontestáveis na área que a tibiez atual do MinC colocaria em risco. As linhas de passagem erguidas entre o mecenato neoliberal e a construção de uma política verdadeiramente democrática de financiamento cultural, perdem sustentação progressiva, acusam os críticos da ministra Ana de Hollanda. A mobilização anterior para modificar a Lei Rouanet, por exemplo, seria alvo de uma restauração conservadora dentro e fora do próprio ministério.

Mas o pano de fundo verdadeiramente incontestável é que o impasse orçamentário persiste, não é retórico e atinge até mesmo o experimento mais avançado de ruptura com a lógica do mercantilismo cultural.

O programa dos pontos de cultura, criado no governo Lula, oferece à juventude pobre meios de expressão para libertar suas inquietações e talentos na forma de intervenções e circuitos culturais. Hoje existem 3.500 pontos de cultura no país. Seu orçamento em 2004 era de R$ 4 milhões; chegou a R$ 216 milhões em 2010, último ano de governo Lula.

Em 2011, primeiro ano de Dilma, o programa recebeu apenas R$ 80 milhões. O mero funcionamento dos quase 3.500 Pontos de Cultura já existentes exigiria pelo menos R$ 200 milhões.

São essas cifras e variáveis que sugerem a existência de uma deriva mais profunda na política cultural brasileira. A simples troca do titular da pasta, por si só, não será suficiente para revertê-la.

Posted by Patricia Canetti at 8:51 PM

Neumanne, autor de livro anti-Lula, defende Ana de Hollanda no Estadão por Renato Rovai

Neumanne, autor de livro anti-Lula, defende Ana de Hollanda no Estadão

Artigo de Renato Rovai originalmente publicado no Blog do Rovai em 28 de março de 2012.

“Diga-me com quem andas e te direi quem és.” Este velho ditado é mais do que o suficiente para revelar o que é o atual MinC.

Ana de Hollanda é a rainha do Ecad, a CBF da cultura. Órgão que multa até quermesse de igreja por “desrespeito” ao direito autoral e está envolto em todos os tipos de acusações e suspeitas de corrupção. Atualmente vive uma CPI no Senado e é investigado pelo Ministério da Justiça.

Ana de Hollanda não é só a rainha do Ecad. É Ecad na veia.

Se você acha que estou exagerando, veja o comentário que a ministra enviou ao blog de Antonio Grassi no dia 18 de janeiro de 2008. Não se apegue ao fato de a ministra da Cultura ter escrito softers ao invés de software. Preste mais atenção a como ela se refere à CBF da cultura.

Oi Grassi,
Essa questão de direitos autorais tem provocado discussões calorosas pelo fato de mexer com altas cifras e propriedade privada, já que a criação artística é um bem inalienável, além de sustento profissional de um contingente enorme de artistas de todas as áreas. Com o surgimento da internet, celulares, com seus provedores, softers, empresas de telefonias e grandes grupos que englobam tudo acima, a criação é o elo mais fraco e fácil de se neutralizar com o irônico discurso de “democratização do acesso”. O mundo inteiro está discutindo como se ajustar à novas tecnologias e o Brasil não está fora disso. As diversas associações de músicos e compositores e seu escritório central, o ECAD, participam de congressos internacionais em busca de soluções que permitam o acesso sem deixar de remunerar os criadores.
Lembro que seu conterrâneo, Fernando Brant, além de um dos nossos maiores compositores é uma pessoa esclarecida e, com anos dedicados à luta, poderia ser entrevistado sobre o assunto.
beijos, Ana

Ana também é a rainha do secretário do comércio dos EUA, Gary Locke, que fez questão de visitá-la logo que assumiu o ministério para discutir a questão da propriedade intelectual e o interesse do states nessas questões no Brasil. O que é bom para os EUA é bom para o Brasil, certo? Pois então…

Mas agora Ana se superou. Seus assessores estão há uns quinze dias articulando uma reação ao povo de má-fé (palavras da ministra em audiência na Câmara dos deputados) que a atacam principalmente pela internet. E estão estimulando uma série de pessoas a escrever artigos em defesa da ministra utilizando a tática do bem contra o mal.

Ana de Hollanda é a moça do bem. E o povo de má-fé é a companheirada de olho no butim do MinC. Nada mais primário, mas essa é a estratégia da turma.

Muitas pessoas que os articuladores do “fica Ana” foram procurar se negaram a cumprir tal script. Este blogue recebeu telefonemas de dois desses interlocutores. Um deles me disse, “só faltaram dizer que iriam colocar meu nome de pessoas não gratas no MinC se não me posicionasse”. Mas há quem aceite, certo? E não estou dizendo aqui que é o caso de José Neumanne Pinto, jornalista de fama e que no auge de sua carreira foi assessor do banqueiro José Eduardo de Andrade (ex-dono do falido Bamerindus).

Neumanne não faria isso, principalmente na página 2 de O Estado de S. Paulo. Mas de qualquer forma escreveu um artigo hoje com essa linha de argumentos.

E há alguns dias fez comentário no Direto ao Assunto da Rádio Jovem Pan no mesmo tom, onde acusa o ator Sérgio Mambertti de querer derrubar a ministra, Fernanda Torres de ser “empresária que está lutando por seus interesses” e onde ainda chega ao ponte de dizer que Marilena Chaui, que teria plagiado José Guilherme Merquior, só quer o dinheiro do MinC sendo administrado por seus indicados.

Além de jornalista, Neumanne também é homem das letras, um verdadeiro literato. Sua obra-prima é o livro: “O que sei de Lula”.

Com todo o respeito ao autor faltou-me tempo nesta vida atribulada para ler a obra. Mas movido por curiosidade jornalística, assisti a uma entrevista dele sobre o dito cujo no Youtube. E dali saquei as seguintes frases de Neumanne sobre Lula.

O Lula é o retrato do cidadão brasileiro: oportunista, vagabundo inimigo da leitura e da educação…

O Lula instalou a aceitação da corrupção como uma coisa legítima, quase como um programa popular

Lula conseguiu colocar no lugar dele quem ele quis, um poste, (Dilma), que ele pode manipular da maneira dele.

Lula é um dos piores presidentes que o Brasil já teve.

Lula foi o primeiro presidente a não ter oposição nenhuma. O Lula é filho de um canalha, bêbado, autoritário e mulherengo com uma santa. Ele representa a maior parte dos brasileiros que são filhos sem pais.

Como se pode notar pelo palavrório, o livro é de elevado nível. O nível do artigo de hoje no Estadão é semelhante ao do livro contra Lula.

Mas para não ficar só no discurso “anti-companheirada”, Neumanne recorre a outro texto do cineasta Cacá Diegues, que usa números tortos produzidos pela assessoria do ministério, para dar um certo lustro ao seu. Como o artigo de Diegues para o jornal O Globo já está sendo respondido ponto por ponto pela professora e diretora da Escola de Comunicação da UFRJ, Ivana Bentes, na hora certa, tratarei do tema aqui.

A questão que explode deste artigo de Neumanne é de que o atual MinC não está apenas desorientado. Ele é a quinta-coluna do governo Dilma. Suas articulações são todas com aqueles que sempre combateram o PT, Lula, Dilma e a esquerda. É a partir de uma articulação com esses setores mais reacionários da cultura e da sociedade que essa turma da ministra tem tentado mantê-la a qualquer preço no cargo.

Mesmo sabendo que se trata de uma ministra fraca e comprometida com aqueles que não lutam pela cultura como patrimônio nacional, mas como um quintal de poucos.

E mesmo sabendo que Ana se move apenas no sentido de destruir o belo trabalho, que reverberou internacionalmente, conduzido por Gilberto Gil.

Freud explica o que Ana sente por Gil.

O problema é que esse sentimento está tornando o governo Dilma uma catástrofe na área cultural. E está trocando apoios relevantes por apoios como o de Neumanne Pinto.

Se tiver ânimo e quiser assistir ao vídeo onde Neumanne a propósito de falar do seu novo livro, desanca Lula, segue o link.

Posted by Patricia Canetti at 8:30 PM

A velha luta entre o talento e a tutela por José Nêumanne, O Estado de S. Paulo

A velha luta entre o talento e a tutela

Artigo de José Nêumanne originalmente publicado na seção Opinião do jornal O Estado de S. Paulo em 28 de março de 2012.

No fundo, a mobilização grosseira e atrevida de segmentos do Partido dos Trabalhadores (PT) e de grupos com interesses na indústria cultural pela derrubada da ministra da Cultura, Ana de Hollanda, é mais um efeito colateral do loteamento de cargos públicos de primeiro escalão por partidos em troca de apoio ao governo no Congresso. De fato, uma coisa nada tem que ver com a outra, mas essas pessoas que redigem manifestos e procuram algum jornalista amigo para lhes dar repercussão pública devem pensar algo como: "Puxa, vida, se o PMDB, o PR, o PRB ou qualquer outra siglazinha ancorada no lago do Palácio do Planalto nomeia e derruba ministros, por que nós não o faríamos?" Por mais absurda que essa conexão possa parecer à primeira vista, ela nunca será mais grotesca do que a cruzada em si.

A primeira motivação para o ataque sistemático, desproporcional e absolutamente inócuo (pelo menos tem sido até agora) atende a uma questão: "Por que ela e não eu?" É claro que deve haver no Brasil milhões de cidadãos e cidadãs que se sentem mais preparados do que a economista Dilma Rousseff para exercer a Presidência da República. Só que a eleita foi ela e a ela cabe nomear, se não todos, porque tem realmente de aceitar indicações das bases para sobreviver politicamente, a maioria dos ministros que a ajudam a governar. Haverá também milhões de brasileiros decentes e bem-intencionados à espera de um convite do Planalto para ocupar uma pasta - da Fazenda à da Pesca. Pode ser que alguns façam como aqueles comunistas de antanho que ficavam no aguardo da prisão de mala e cuia prontas, com escova de dentes, dentifrício e sabonete entre os pijamas, naquele tempo em que nossas prisões ainda permitiam esses luxos. No entanto, quase todos, coitados, esperarão em vão. Pois muitos são candidatos e poucos serão escolhidos, lei darwiniana inventada pelo profeta galileu. Para estes a resposta apenas inverte a questão: "Por que eu e não ela?"

Pois o diabo é que a ministra da Cultura tem, digamos, pedigree para o posto: é filha do professor (da USP) Sérgio Buarque de Hollanda, autor de Raízes do Brasil, obra clássica que ilumina o entendimento histórico e sociológico de nosso país, e de Maria Amélia, Memélia, que virou uma espécie de padroeira do PT de Lula em suas primeiras derrotas para a Presidência. E, convenhamos, a moça é irmã do maior ícone vivo da cultura brasileira, Chico Buarque de Hollanda. Isso basta para justificar a nomeação? Mas é claro que sou o primeiro a responder que não. Só que, ainda assim, quem for capaz de enxergar além do próprio nariz deveria respeitá-la ao menos por esta razão. As cenas de grosseria explícita registradas nessa guerra sem quartel contra a ministra são, para começo de conversa, demonstrações de uma cafajestice na qual o mundo é pródigo e o Brasil, principalmente a patrulha cultural do PT, recordista mundial.

Sou do tempo em que derrotado cumprimentava vencedor pela simples e boa razão de que a civilidade é uma das condições para a permanência do jogo democrático. Juca Ferreira, segundo ministro de Lula e antecessor de Ana, entrou no governo pela porta da cozinha de Gilberto Gil. Sob os auspícios do sonho espanhol de recolonizar o mundo, e não mais apenas a América não imperialista, o artista e seu "maçaneta" espalharam o passa-moleque, conveniente para os grupos que os cortejam e as produtoras multinacionais de conteúdo, de que cultura é um bem coletivo e um meio de aumentar o acesso do membro da comunidade pobre da periferia do Ó é reduzir-lhe o custo com o abatimento do direito do autor. Sob seu patrocínio no MinC, venderam-se o furto fácil da internet aberta (Creative Commons) e a falácia de que produto cultural bom não é o de qualidade, mas o mais barato. E o autor que se "exploda".

Ana assumiu o ministério enfrentando sem estardalhaço, com seu estilo doce e firme, esse esbulho "politicamente correto". O direito do autor e o mercado são conquistas da civilização que estabelecem o único critério pelo qual uma produção artística ou cultural deve ser avaliada: o mérito do talento. O melhor é melhor e vive do que faz. Gil e Juca tentaram inverter essa constatação feita pelos iluministas franceses, propondo substituir a qualidade pela quantidade. E defenderam, ao longo de oito anos, a redução do direito autoral e a submissão do mercado à tirania do lumpesinato. Que Chico Buarque, que nada! O povão quer o funkeiro da Rocinha.

O caso é que há lugar para todos no mercado - o xote pé de serra e o forró de plástico. O povo ouve o que quer e paga pelo que prefere ouvir. Casas lotadas por Chico Buarque no HSBC Brasil não tiram fãs dos shows de Criolo. O mercado garante o moço bonito que virou unanimidade nacional e o poeta de vielas das favelas. Ao Ministério e às Secretarias Estaduais de Cultura não cabe tutelar o lumpemproletariado, mas incentivar orquestras sinfônicas e produções de vanguarda. Além de pegar R$ 1,64 bilhão para bater recorde sem precedentes em investimentos na pasta (furto o valor de artigo do cineasta Cacá Diegues em O Globo de sábado).

Não me lembro de ter lido estes números na entrevista de Juca Ferreira à Folha de S.Paulo em que ele inaugurou no Brasil o choro dos substituídos com um show de grossura e ressentimento explícitos, desconhecendo evidências como o fato de o investimento em Centros de Cultura ter passado de R$ 50 milhões no último ano de Juca/Lula para R$ 62 milhões no primeiro sob Ana/Dilma, com previsão de R$ 114 milhões para 2012.

Como uma forma de desqualificar a ministra, seus solertes detratores, de olho no butim, dizem que ela só não caiu porque Dilma não quer dar o braço a torcer. Quem acredita no mérito e desconfia do uso do lumpesinato reza todo dia para que o braço da presidente prossiga duro de torcer. Esta guerra não é fácil, mas não pode ser comparada com a crise da base aliada.

José Nêumanne é jornalista e escritor, é editorialista do Jornal da Tarde

Posted by Patricia Canetti at 8:11 PM

O que se tece por trás da rede de intrigas contra Ana de Hollanda? por Ana Terra

O que se tece por trás da rede de intrigas contra Ana de Hollanda?

Artigo de Ana Terra originalmente publicado no blog da compositora em 25 de março de 2012.

O artigo do cineasta Cacá Diegues, publicado no jornal “O Globo” em 24 de março de 2012, chega como água clara e cristalina para limpar a lama que estão tentando jogar em cima da Ministra Ana de Hollanda desde a sua posse. Desde que ela tirou a licença da ONG norte americana “Creative Commons” do site do MinC, num ato de soberania e altivez que devemos esperar dos dirigentes brasileiros, tentam associá-la a uma suposta quadrilha que dirige o ECAD. Mas o que está mesmo por trás da rede de intrigas é o que se tece por trás da rede da internet:

Com a popularização do uso de redes de comunicação bilhões de pessoas passaram a transitar pelo chamado “território livre da internet”. Liberdade que cobra um altíssimo preço para sua existência, pago pelo cidadão usuário que contrata um serviço, ou como acontece em muitos países, pago por órgãos governamentais que disponibilizam gratuitamente esse serviço para a população. Em ambos os casos, empresas privadas recebem uma concessão pública como qualquer meio de comunicação, para explorar economicamente este negócio que possui um número gigantesco de clientes.

Além do pagamento pelas assinaturas, a grande receita das empresas se dá pela publicidade na internet e pela negociação de bancos de dados formados a partir de informações fornecidas graciosamente pelo usuário em suas redes sociais.

O que move o sistema capitalista é obviamente o lucro, e não as boas intenções. E com péssimas intenções, o poder econômico induz ao público a ideologia da democratização da cultura e da arte, colocando na boca dos cidadãos o discurso aparentemente legítimo do “direito universal” de acesso ao conhecimento.

Nesta ação, o que está embutido, é a maximação dos lucros das empresas de telefonia e os sites provedores de conteúdo, através do não pagamento dos direitos autorais das obras artísticas e culturais, que são a razão de ser da internet. O mais preocupante é assistir setores governamentais, acadêmicos e políticos, apoiarem essa prática atual de estelionato como a tentativa de alterações significativas da Lei 9.610 que rege os Direitos Autorais no Brasil.

E muito mais preocupante é que se utilizam de mentiras contra a gestão da Ministra que o artigo do Cacá Diegues tão bem elucidou. Se tantos querem o lugar dela, aprendam a ter educação e serenidade.

Violência e má-fé não são boas credenciais para um Ministro da Cultura.

Posted by Patricia Canetti at 8:04 PM | Comentários (2)

A cultura é a alma de um povo por Cacá Diegues, O Globo

A cultura é a alma de um povo

Artigo de Cacá Diegues originalmente publicado no jornal O Globo em 24 de março de 2012.

Vira e mexe, a ministra Ana de Hollanda é atacada pelos jornais, através de artigos e manifestos, como uma Geni da cultura. Esta semana, texto subscrito por professores universitários, no jornal "O Estado de S. Paulo", e entrevista do ex-ministro Juca Ferreira, na "Folha de S.Paulo", pareciam petardos sincronizados, como numa campanha bélica bem tramada.

Não sou especialista em administração pública. Mas conhecendo a ministra e acompanhando de longe sua ação à frente do ministério, me estarreço com a violência praticada contra ela. Chego a pensar que não estamos acostumados à política exercida com discrição e serenidade, gostamos da tradição dos berros e dos murros na mesa, confundimos delicadeza com fragilidade.

São tão tortuosos e pouco sólidos os rumos desses desaforos, tão clara sua voracidade política, que seria mais simples se os agressores declarassem logo: "É que não vamos com a cara dela."

Juca Ferreira, o ministro do projeto autoritário da Ancinav, não esconde contra o que se bate: "Num estado com pouco controle social como o Brasil, você diz e faz o que quiser", declara em tom de lamentação, sobre algo que devia nos orgulhar. Antes dele, os professores liderados por Marilena Chauí listam várias expressões acadêmicas que gostariam de ouvir vindas do MinC e exigem dele uma participação criativa que não lhe cabe ousar ter. O velho e místico sebastianismo brasileiro ainda pensa que é o estado que produz e deve produzir cultura.

Ora, para os que já se esqueceram dele, lembro trechinho do belo discurso de posse da presidente Dilma Rousseff: "A cultura é a alma de um povo, essência de sua identidade. Vamos investir em cultura, ampliando a produção e o consumo em todas as regiões de nossos bens culturais." E então fui me informar do que anda fazendo o MinC de Ana de Hollanda para atender a esse programa anunciado pela presidente. Aqui transmito algumas respostas ouvidas por mim.

Em 2011, o MinC não só conseguiu dar conta de um enorme passivo de compromissos que ficaram a descoberto em 2010, como alcançou uma execução recorde de 98,98% dos limites autorizados para empenho. Isso significou R$1,069 bilhão em investimentos diretos, o maior número já alcançado pelo Ministério no que se refere ao efetivamente investido.

Ao contrário do que se tem dito, o orçamento do MinC, na gestão da presidente Dilma, é maior e mais realista do que o de gestões anteriores. O total de investimentos é de R$1,24 bilhão. Somando-se a isso os R$400 milhões a serem incorporados através do Fundo Setorial do Audiovisual, chega-se a R$1,64 bilhão, um recorde sem precedentes na pasta. E não se computa aqui o investimento indireto através das leis de incentivo, como a Rouanet.

E para onde têm ido esses recursos?

Os Pontos de Cultura encontravam-se sem pagamento desde o mês de março de 2010. Na atual gestão, o MinC já pagou cerca de R$100 milhões. O crescimento do orçamento do Programa Cultura Viva tem permitido a criação de novos Pontos de Cultura, o revolucionário projeto inaugurado por Gilberto Gil. Em 2010 o investimento nos Pontos de Cultura era de R$50 milhões. Em 2011, o primeiro ano da gestão atual, foram empenhados R$62 milhões e em 2012 esse valor saltou para R$114 milhões.

Em fevereiro deste ano, a ministra aprovou, junto à presidência, uma lista de programas prioritários que já estão em execução: o Brasil Criativo, que visa a ampliar as possibilidades de emprego e renda, a partir do potencial criativo; o Mais Cultura & Mais Educação, em parceria com o Ministério da Educação, para investir em cultura nas escolas; o PAC das Cidades Históricas, atuando em 125 cidades que possuem sítios históricos ou bens tombados; o de Praças dos Esportes e da Cultura, na periferia de 345 cidades, para construção de parques esportivos, bibliotecas, salas de espetáculo, cineclubes.

O ministério está investindo no processo de implantação do Sistema Nacional de Cultura, que pulou de 337 municípios e um estado integrados até 2010, para 782 municípios e 17 estados hoje. Na área do audiovisual, a aprovação recente da lei 12.485 vai permitir a presença do produto nacional independente nas televisões por assinatura e o crescimento dos recursos do Fundo Setorial. Um instrumento de remissão do cinema brasileiro.

Além disso, o MinC, com o apoio da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Cultura, se empenha na aprovação, pelo Congresso, de leis como as do Vale Cultura, do Procultura e sobretudo da revisão dos Direitos Autorais. Sou internauta e sei que não é mais possível nem desejável recolher esses direitos como se fazia no passado. Mas também não estou disposto a entregar o que sai de minha cabeça ao Creative Commons, um projeto de marketing de empresa esperta.

Foi isso o que me contaram e eu ouvi do MinC. Se alguém não concorda, que apure e se manifeste. Não precisa trucidar quem está do outro lado.

Chico Anysio foi e será sempre o Rei da Comédia, como Pelé é do futebol e Roberto Carlos da canção popular. Aqui, o clichê é exato e irresistível: o mundo vai ficar mais triste sem ele.

Cacá Diegues é cineasta.

Posted by Patricia Canetti at 7:51 PM | Comentários (1)

No Recife, exposição 'sem título' propõe diálogo entre três artistas, Portal G1 PE

No Recife, exposição 'sem título' propõe diálogo entre três artistas

Matéria originalmente publicada no portal G1 PE em 26 de março de 2012.

A Galeria Amparo 60 abre o calendário de exposições deste ano nesta terça-feira (27), às 20h, com a mostra “Sem título algum”, que reúne, pela primeira vez, obras dos artistas Lula Wanderley, Paulo Bruscky e Adolfo Montejo Navas. Sob coordenação de Joana D’Arc, a proposta foi abolir a tradicional curadoria e deixar a amizade entre os três criar conexões entre seus trabalhos, expondo os que apresentam ressonâncias e afinidades. Evento segue até 27 de abril.

No lugar da curadoria, aparece uma espécie de agenciamento. “Nesse formato, o diálogo para a escolha das obras se potencializa. Eu entrei no pedaço para fazer a interlocução dessa rede. É o que chamamos de agenciamento. Por causa da proximidade entre eles, acaba que seus trabalhos se conversam o tempo todo, mesmo que estejam geograficamente distantes. Então, eu apareço como uma rendeira, aquela figura que tece os fios”, explicou Joana D’Arc.

O pernambucano Paulo Bruscky, que vive e trabalha no Recife, será o anfitrião. Ele vai acolher o também pernambucano Lula Wanderley, que deixou a cidade na década de 1970 para enveredar-se pelo Rio de Janeiro. O encontro se completa com a presença do espanhol Adolfo Montejo Navas, que mora no Brasil há 18 anos. Atualmente, Navas vive em Foz do Iguaçu e é mais reconhecido como poeta, tradutor, crítico e curador independente.

“O trabalho deles se toca no uso de materiais, poéticas e temáticas semelhantes, mesmo que eles estejam vivendo em contextos diferentes. Um tema presente na obra dos três, por exemplo, é o futebol, que cada um escolhe uma maneira de trabalhá-lo. Eles também usam materiais inusitados. Pegam coisas corriqueiras e trazem para o campo da arte, sacralizam o que é profano", diz Joana D’Arc.

O título (ou anti-título) já ressalta que nessa exibição as divisões entre os gêneros e suportes estão misturadas para destacar características comuns a esses artistas, que apresentam ao público diversas linguagens expressivas - textos, vídeos, fotografias, objetos, entre outros. “Ao mesmo tempo que abolimos a curadoria, também acabamos com o título, a etiqueta que aponta qual obra é de quem e, assim, nenhum artista ou linguagem domina a mostra. Não ter título significa também dessacralizar o modo com o as exposições atuais têm sido feitas. Quebramos esse modelo definido”, comenta a coordenadora.

As obras selecionadas vão ocupar todos os espaços da galeria, do jardim ao banheiro, passando pela vitrine. Em uma única parede, será possível encontrar um mapa que localizará e identificará as peças e seus autores, criando um tipo de obra coletiva pautada na conversa estética. O evento contará, ainda, com um projeto educativo que vai promover visitas escolares e encontro com professores.

Sem título algum

Curadoria de Joana D’Arc

27 de março, terça-feira, 20h

Amparo 60 Galeria de Arte
Av. Domingos Ferreira 92A, Boa Viagem, Recife – PE
81-3033-6060 ou galeria@amparo60.com.br
www.amparo60.com.br
Segunda a sexta, 10-13h; 14-19h; sábado, 10-14h
Exposição até 27 de abril de 2012

Posted by Guilherme Nicolau at 2:26 PM

‘New York Times’ destaca o Sesc como ‘grupo cultural único’, O Globo

‘New York Times’ destaca o Sesc como ‘grupo cultural único’

Matéria originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Globo em 27 de março de 2012.

Jornal americano faz perfil da organização sem fins lucrativos, que cresce 10% ao ano

RIO - O jornal americano “New York Times” destaca, em sua edição desta terça-feira, o trabalho do Sesc como um “grupo cultural único”, com um orçamento crescente para a promoção da cultura no Brasil e, agora, também fora do país. O artigo, assinado pelo jornalista Larry Rother, diz que, enquanto organizações do mundo todo estão apertando seus orçamentos e reduzindo produções, Danilo Santos de Miranda, diretor-geral do Sesc, enfrenta um desafio diferente: o de encontrar bons projetos para investir seu orçamento, que chega a US$ 600 milhões por ano e que cresce anualmente cerca de 10% ou mais.

“Nosso princípio-guia fundamental é usar a cultura como ferramenta para a educação e a transformação, para melhorar a vida das pessoas. Graças a Deus, estamos numa posição em que podemos cumprir essa missão. Na última década, nosso orçamento tem dobrado a cada seis anos, não é incrível?”, declarou Miranda ao jornal.
Segundo o “NYT”, o Serviço Social de Comércio tem um modelo de financiamento considerado “único no mundo”: uma entidade privada, sem fins lucrativos, endossada pela Constituição nacional, cujo orçamento é proveniente de uma taxa de 1,5% sobre a folha de pagamento de empresas brasileiras. “Como a força de trabalho no país de quase 200 milhões de habitantes tem se expandido, o mesmo acontece com o orçamento da organização”, destaca. “Atualmente, praticamente não existe uma área das artes no Brasil em que o Sesc não atue. A organização tem sua própria editora, assim como um selo musical e um canal de TV por assinatura, e ainda admnistra galerias de arte, teatro, cinemas e salas de espetáculo, frequentamente parte de complexos maiores que incluem restaurantes e aparelhos esportivos”.

Para a publicação, o investimento do Sesc em cultura é um reflexo do desenvolvimento econômico brasileiro nos últimos anos, que colocou o país como a sexta maior economia mundial. Agora, a organização está fazendo um esforço para expandir suas atividades e aumentar o reconhecimento cultural do Brasil internacionalmente, reforçando seus laços com artistas de fora do país. O Sesc “patrocina um festival de jazz em conjunto com a gravadora de Nova York Nublu; assinou uma ‘parceria institucional’ com a companhia de língua espanhola TeatroStageFest; e apresentou trabalhos de artistas como o músico David Byrne, o percussionista Bobby Sanabria e o diretor teatral Robert Wilson”.

“O modelo do Sesc é um exemplo maravilhoso que deveríamos ter por todo o mundo”, disse ao “NYT” Nan van Houte, diretora do Netherlands Theater Institute e ex-presidente do International Network for Contemporary Performing Arts. “Integrar tudo, ter teatros, piscina, livraria, restaurante, oficinas e museus, tudo junto, é tão engenhoso. Isso faz a cultura ser parte do dia-a-dia, não algo à parte”.

Posted by Guilherme Nicolau at 2:22 PM

Obras de dez criadores são apresentadas em exposição, livro e documentários por Camila Molina, O Estado de S. Paulo

Obras de dez criadores são apresentadas em exposição, livro e documentários

Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal o Estado de S. Paulo em 27 de março de 2012.

'Teimosia da Imaginação - Dez Artistas Brasileiros' reúne peças de criadores autodidatas

O artista José Bezerra, nascido em Buíque, Pernambuco, teve um sonho ou uma visão num dia de domingo para segunda-feira, como conta. Dormindo em uma rede, fora de casa, viu um grande véu branco em formato de um grande homem que lhe disse: "Ô, Zé Bezerra, você é um artista e vai viver das matas". Desde então, começou a esculpir em madeira ou fazer nascer de pedaços de troncos brutos, formas de animais, quase abstratos, únicos.

"Arte ou artesanato? Interessa é o criar uma linguagem própria, independentemente de se ter uma formação", diz a artista Germana Monte-Mór, que assina a curadoria da mostra Teimosia da Imaginação - Dez Artistas Brasileiros, a ser inaugurada nesta terça-feira, 28, no Instituto Tomie Ohtake. Assim como obras de Bezerra, há ainda na exposição criações - esculturas, cerâmicas, pinturas e desenhos - de Izabel Mendes, Véio (Cícero Alves dos Santos), Antonio de Dedé, Manoel Galdino, Aurelino, Francisco Graciano, Nilson Pimenta, Getúlio Damado e Jadir João Egídio. São peças de criadores que tiveram um ensejo natural de ser artista, mas por serem autodidatas e produzirem uma obra a partir de seus lugares de origem, ficam classificados no gênero da arte popular ou arte do povo brasileiro.

São, enfim, terminologias. Mas que podem ser repensadas. "Nos Estados Unidos, ao menos nas artes visuais, ‘pop’ (uma abreviação do termo popular) significa praticamente o oposto daquilo que, em geral, a mesma palavra designa entre nós. Nas telas de Andy Warhol, sua melhor tradução, ‘pop’ diz respeito a uma realidade que rompeu totalmente os nexos que poderia manter com a experiência", escreve o crítico Rodrigo Naves, cocurador de Teimosia da Imaginação, no prefácio do livro, editado pela WMF Martins Fontes e Instituto do Imaginário do Povo Brasileiro, que acompanha a exposição.

Falas. Mostra e publicação, assim, fazem parte de um projeto amplo. Na verdade, toda a empreitada nasceu da ideia de se fazer documentários sobre 10 artistas da arte popular. A produtora Polo de Imagem, em parceria com a TV Cultura, definiu com o Instituto do Imaginário do Povo Brasileiro, criado em 2006, os criadores que seriam retratados nos filmes. Malu Viana Batista, diretora da produtora, a colecionadora Vilma Eid e Germana Monte-Mór, respectivamente, presidente e consultora do Instituto do Povo Brasileiro, fizeram uma seleção que privilegiasse criadores vivos, para que os documentários tivessem suas falas.

"Só o Galdino não é vivo, mas o diretor Claudio Assis tinha horas de gravações com ele", conta Germana. Além do cineasta Assis, premiado autor de filmes como Amarelo Manga e Baixio das Bestas, os episódios, com 26 minutos de duração e que serão exibidos na TV Cultura, também são assinados por Hilton Lacerda, Cecília Araújo, Rodrigo Campos e Adelina Pontual.

Os cineastas foram a campo - ao Nordeste, onde vivem Antonio de Dedé, Aurelino, Véio, Graciano e Bezerra; a Minas, para gravar Damado, dona Izabel e Egídio, e a Mato Grosso, para retratar Nilson Pimenta. O livro Teimosia da Imaginação, assim, representa cada um dos criadores dando maior voz aos depoimentos de cada um - como o do sonho de Bezerra, citado -, editados pela antropóloga Maria Lucia Montes. "Há uns mais articulados, como o Véio. Já Aurelino é esquizofrênico", conta Germana, que fez fotografias dos artistas e seus locais de trabalho.

A exposição, agora, é mais uma forma de dar o devido espaço para as criações subjetivas, imaginadas, desses artistas (leia mais ao lado), de um gênero que, também, vem adquirindo ascensão, nos últimos cinco anos, no mercado de arte.

Com obras de diversas instituições, a mostra dedica áreas como salas com conjuntos de cerca de 10 peças de cada um, datadas de diversos períodos. "Cidade e campo, ensinamento e experiência, loucura e relação serena com o meio, procedimentos modernos e técnicas tradicionais deixam de se pautar por parâmetros claros e excludentes. No mais das vezes eles se encavalam de maneira mais ou menos violenta, dando origem a trabalhos de arte que guardam a lembrança dessas relações complicadas e imperfeitas", tão bem define Naves.


TEIMOSIA DA IMAGINAÇÃO

29 de março a 13 de maio de 2012

Instituto Tomie Ohtake
Av. Faria Lima 201, Pinheiros, São Paulo - SP
11-2245-1900 ou instituto@institutotomieohtake.org.br
www.institutotomieohtake.org.br
Terça a domingo, 11-20h

Posted by Guilherme Nicolau at 2:13 PM

Principal museu francês de arte contemporânea mira no Brasil, O Globo

Principal museu francês de arte contemporânea mira no Brasil

Matéria originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Globo em 28 de março de 2012

Pompidou investe na aquisição de arte brasileira e se articula para trazer ao país exposições

RIO - Os olhos do Centro Pompidou estão fixados no Brasil. O principal museu de arte contemporânea da França vem trabalhando silenciosamente em território nacional para encontrar parceiros locais e trazer ao país exposições temporárias que levem sua marca. Enquanto isso, em Paris, a prestigiada instituição adota uma "política ativa" de aquisição de obras brasileiras. Quer tornar mais robusta a presença do Brasil em seu acervo.

Em entrevista ao GLOBO, o recém-reeleito presidente do Pompidou, Alain Seban, enaltece a cena de arte contemporânea brasileira e a classifica como "uma das mais apaixonantes do mundo". Revela ainda qual é a estratégia do museu para estreitar relações com o país: o investimento em novas aquisições e a exibição de parte de seu acervo por aqui.

— Recentemente, com apoio de um grupo de colecionadores franceses e latino-americanos, compramos trabalhos de Ernesto Neto, José Damasceno, José Bechara e Rivane Neuschwander — diz Seban.

Além disso, o Pompidou vem tentando enriquecer sua coleção com obras da arte moderna brasileira. Recebeu em doação do mecenas americano Daniel Brodsky, por exemplo, "Caranguejo" (1960), um dos "bichos" de Lygia Clark. Atualmente, o museu conta com aproximadamente 600 obras de cerca de 60 artistas brasileiros. E ainda quer mais.
Não está nos planos do Pompidou, no entanto, abrir um braço permanente no Brasil — ou em qualquer outro país. A instituição, que em 2010 deu o primeiro passo em direção à descentralização (com a inauguração do Pompidou-Metz, em Lorraine, na França), quer que seu acervo, de 70 mil obras, circule mais.

— O Brasil tem todas as ferramentas para desenvolver suas próprias instituições, como os Estados Unidos têm o MoMA, ou a Inglaterra, a Tate. Não creio na implantação de um Pompidou permanente no exterior. Por outro lado, acredito que podemos levar nosso apoio e expertise para projetos de duração temporária.

Um museu global e virtual

O pensamento de Seban sobre a arte nacional está totalmente alinhado com o da curadora-chefe da instituição, Christine Macel. Sem economizar, ela diz que "a história da arte no século XX não pode ser escrita sem mencionar artistas como os neoconcretos Lygia Clark, Hélio Oiticica e Lygia Pape":

— Ando especialmente fascinada por Lygia Clark, que viveu parte de sua vida em Paris, mas ainda é pouco conhecida do grande público francês. Ela inventou uma arte baseada na ação e na interação, em que o espectador se torna o verdadeiro ator.

Christine assina a curadoria de "Danser sa vie", em cartaz atualmente junto com a exposição principal da casa, de Henri Matisse. Na mostra, ela encontrou espaço para incluir parangolés e um vídeo de Kátia Maciel em que o poeta Waly Salomão veste uma das peças criadas por Hélio Oiticica. A exposição sobre dança, que termina na próxima segunda-feira, tem média diária de quatro mil visitantes. 

Com relação à arte contemporânea brasileira, Christine também se mostra animada. Lembra que o Pompidou já exibiu, por exemplo, vídeos de Janaina Tschäpe e que efetivamente vem aumentando seu acervo.

Segundo o presidente do museu, existem muitos projetos em discussão para que o Brasil acolha mostras de duração limitada do Pompidou. Seban, porém, evita detalhar as negociações.

O interesse no país é reflexo não só do alardeado boom da arte do Brasil, mas também da presença maciça de brasileiros pelos corredores do museu. De acordo com as últimas pesquisas da casa, o Brasil está entre os dez países que mais levam visitantes ao Pompidou anualmente — ganha de chineses e japoneses, e é o segundo no ranking dos não europeus, perdendo apenas para os Estados Unidos.

Para Seban, a América Latina é o "centro criativo mais ativo e dinâmico do mundo", e ocupa "evidentemente um lugar prioritário" no cenário cultural. O interesse é tanto que, há dois anos, o museu conta com a consultoria de um grupo de especialistas e colecionadores de arte latino-americana (o Centro Pompidou América Latina), que o direciona nas aquisições de obras de arte por aqui.

O presidente explica que o movimento em direção ao Brasil também é parte de uma estratégia maior, de "mundialização" da marca Pompidou.

— Para um museu de arte contemporânea no século XXI, o que está em jogo é justamente isso. A arte se tornou global. Nossa coleção se pretende universal e, então, deve refletir essa nova geografia da criação, abrindo-se às cenas emergentes. Para isso, precisamos reorganizar profundamente o museu e encontrar novos meios de aumentar a coleção.

Dentro do pacote da "mundialização", há ainda a proposta de criar um Pompidou virtual. Previsto para estrear em setembro, o projeto não é apenas um museu digital, mas, segundo Seban, abrirá na web todo o acervo e as exposições desenhadas pela casa. Para tanto, o museu vem investindo no desenvolvimento de uma plataforma tecnológica com "arquitetura de interface simples e intuitiva". 

Mostras ‘blockbusters’

O plano de "mundialização" tem, é claro, inegável viés econômico. Num continente imerso em crise, em que a visitação de museus está em queda, expandir-se na direção de mercados em ascensão é um bom caminho para obter mais recursos.

— Nosso orçamento já era frágil e, no ano passado, a verba do Estado caiu mais 5% (o equivalente a 3,5 milhões) — afirma Seban. — O Pompidou, no entanto, soube reagir aumentando suas receitas próprias, de 20 milhões para 30 milhões nos últimos cinco anos, graças, entre outras coisas, ao mecenato, à locação de espaços e ao desenvolvimento de exposições fora da França. Já fizemos parcerias com Benin, Líbano e África do Sul.

Seban é o décimo presidente do Pompidou e, após cinco anos, foi reeleito. Assim como oito de seus antecessores, não tem formação em arte. Ocupa o posto como um administrador do governo francês. Orgulha-se de, na primeira gestão, ter elevado o número de visitantes do museu em 40% (no ano passado, foram 3,6 milhões de pessoas) e de ter aumentado as receitas próprias do Pompidou em 50%.

Há, do ponto de vista curatorial, empenho em criar mostras que resultem em público. O próprio Seban comandou exposições de Kandinsky, Calder e Munch. A programação para 2012 reforça a busca por blockbusters. Estão agendadas retrospectivas do alemão Gerhard Richter (o pintor vivo mais bem cotado em leilões) e do surrealista Salvador Dalí.

Posted by Guilherme Nicolau at 2:00 PM

março 27, 2012

Ana não gosta da internet, mas seus companheiros gostam por Tatiana de Mello Dias, O Estado de São Paulo

Ana não gosta da internet, mas seus companheiros gostam

Matéria de Tatiana de Mello Dias originalmente publicada no caderno Link do jornal O Estado de S. Paulo em 25 de março de 2012.

Governo avisou que a ministra continua

Ana de Hollanda não se interessa pela internet, mas virou Trending Topic no Twitter. Ela foi o assunto mais falado do País ao soltar, durante uma audiência pública na Câmara dos Deputados, que “a pirataria feita através da internet” vai “matar a produção cultural brasileira se não tomarmos cuidado”.

Ana de Hollanda provavelmente não sabe que a maior causa de pirataria em países emergentes como o Brasil não é a internet, mas os preços altos praticados pela indústria cujo discurso ela replica.

Ela também provavelmente não sabe o que é crowdfunding, que viabiliza projetos culturais através de doações na internet, nem plataformas como o Soundcloud, em que artistas ganham público sem depender de gravadoras. E também não deve conhecer o sucesso do Spotify lá fora, além de outros negócios milionários e acessíveis, que não operam no Brasil porque aqui vinga um modelo baseado no que a indústria quer e não no que os usuários podem pagar.

Como dizem, Ana é analógica e anacrônica. Não parece preocupada em entender a internet. Muito menos em pensar políticas culturais que conversem com o ambiente digital. Prefere investir, por exemplo, em restaurações. É seu projeto de governo – e endossado por Dilma Rousseff. A porta-voz da presidência disse que ela fica no cargo.

A reforma da lei de direitos autorais, prioridade do MinC até 2010, hoje é segundo plano. O ministério freou o processo de aprovação da lei para incluir no texto tópicos desejados pela indústria cultural (como a instituição do mecanismo de notificação e retirada de conteúdo infrator sem ordem judicial). A lei agora está no executivo – e sabe-se lá quando o texto irá para o Congresso.

Nada como um tempo após um contratempo, Ana. A ministra não está interessada na reforma, mas outros setores estão. O deputado Nazareno Fonteles (PT-PI) percebeu que, dentro do Congresso, predominava uma visão mais progressista em relação aos direitos autorais. Depois do recuo de Ana, ele pegou o texto anterior do MinC, mais flexível, e apresentou uma nova versão na Câmara. Há chance dessa lei ser aprovada antes da versão oficial do MinC? Ele me disse que não. Mas está otimista: sua ideia é reunir os dois projetos para que os parlamentares consigam aprovar uma legislação que, enfim, adeque a lei brasileira de 1998 à internet. Ele diz que a onda anti-Ecad “fortalece o projeto”.

O dia em que Ana foi o assunto mais falado do Twitter foi um marco. Só que a hashtag #AnadeBelém (em referência ao perfil oficial do MinC que twittava uma viagem dela pela capital paranaense) não derruba ninguém – muito menos aprova uma política cultural mais condizente com a internet. Ana não gosta da internet, mas seus companheiros gostam. O deputado aposta na mobilização online do “pessoal da cultura” para chegar a um texto progressista e flexível. Resta saber se a pressão da internet será tão forte quanto a da indústria. No MinC, quem manda é o modelo antigo.

Posted by Guilherme Nicolau at 2:20 PM

março 26, 2012

Coletivo multimídia Chelpa Ferro lança disco, O Globo

Coletivo multimídia Chelpa Ferro lança disco

Matéria originalmente publicada no caderno de Cultura do O Globo em 26 de março de 2012.

Trio formado por artistas plásticos e editor de vídeo fará performances na Europa

RIO - Eles misturam sons inusitados com materiais e apetrechos diversos para criar instalações potentes em vários decibéis. O coletivo multimídia Chelpa Ferro, formado pelos artistas plásticos Barrão e Luiz Zerbini e pelo editor de vídeo Sérgio Mekler, o Serginho, vem fazendo barulho há mais de uma década somando apresentações e exposições mundo afora. Em 2012, o trio prepara o terceiro disco — na verdade, um LP — e faz as malas para performances em Portugal e na Polônia.

Para "Chelpa Ferro 3", que será lançado no mês que vem, o grupo convidou sete músicos para tocar e interagir com cinco instalações sonoras do repertório do Chelpa: o baterista francês radicado no Brasil Stephane San Juan se uniu à obra "Acusma" (2008); Jaques Morelenbaum, ao trabalho "Microfônico" (2009); Arto Lindsay e Pedro Sá, à instalação "Máquina de samba" (2008); Kassin e Berna Ceppas, ao "Jungle jam" (2006); e o produtor musical Chico Neves — antigo integrante do coletivo — se juntou ao trabalho "On off poltergeist" (2007).

O vinil-objeto terá apenas 250 cópias, e cada capa será feita à mão, uma a uma, por Barrão, Zerbini e Serginho. Ele deverá ser vendido apenas na galeria Múl.ti.plo, no Leblon. O lançamento vai acontecer no dia 24 de abril, com show de Stephane San Juan no Espaço Tom Jobim, no Jardim Botânico.

Depois disso, em junho, o trio faz seu primeiro show no Circo Voador (ainda sem data definida) e logo ruma para Lisboa, onde estão agendadas uma apresentação e uma exposição no espaço Carpe Diem, idealizado pelo curador brasileiro Paulo Reis, morto no ano passado. Em terras lusitanas, o Chelpa vai exibir uma nova instalação, chamada "Craca", que ainda está em fase de criação, mas que vai contar com 18 alto-falantes e alguns blocos de isopor.

— O legal de viajar com a proposta de fazer uma nova obra no lugar é que não precisamos carregar toda aquela tralha na mala, despachar etc. Mas, por outro lado, existe uma certa tensão em pensar que temos que fazer o negócio acontecer — diz Barrão.

Em setembro, o grupo viaja para se apresentar na Bienal de Poznam, na Polônia. De lá, seguem para a cidade de Gdansk, onde vão expor na Gdansk Citty Gallery.

Reunidos pela primeira vez em 1995, por conta de um convite feito pelo poeta Chacal para criarem algo juntos o CEP 20.000 — tradicional evento de poesia carioca —, os três gostaram do que surgiu e resolveram dar continuidade à proposta, que ganhou forma em 2000.

— Acho que o que faz a gente continuar é essa possibilidade de trabalhar entre amigos. Eu só estou no Chelpa porque assim consigo tocar com eles, que são parceiros de longa data. Assim consigo fazer coisas que, sozinho, não são viáveis — conta Zerbini.

Posted by Guilherme Nicolau at 1:04 PM

Arte para o corpo por Nina Gazire, Istoé

Arte para o corpo

Matéria de Nina Gazire originalmente publicada na seção de Cultura da Istoé em 23 de março de 2012.

A dupla Rejane Cantoni e Leonardo Crescenti vem trabalhando a interferência do público em obras cinéticas desde 2008. Mas até aqui nenhuma delas era tão dependente do corpo humano como as recentes esculturas vestíveis, “Molas”, expostas na Baró Galeria. “Em todos os nossos trabalhos a mola é um objeto recorrente, é fundamental para a ideia de movimento. Por isso começamos a pesquisar as possibilidades táteis do objeto”, explica Crescenti, que além de artista é arquiteto de formação.

O trabalho “Molas” (foto) é composto por três peças, que devem ser acopladas ao corpo do visitante: duas usadas no braço e no antebraço e a terceira no pescoço. Quando as peças são vestidas, o movimento provocado pelos aros gera diferentes sons. Esse dado torna essa obra uma escultura, além de cinética, sonora. Outra função interessante que os artistas atribuem aos objetos vestíveis é a de “joias conceituais”. Grande parte da inspiração para o projeto veio de referências da joalheria imperial chinesa e dos adereços usados por xamãs em rituais religiosos. Mas é inevitável traçar aqui uma correspondência com a história da arte contemporânea brasileira. As “Molas” parecem descender de maneira direta dos “Objetos Sensoriais” – óculos e máscaras com diferentes filtros táteis e visuais – de Lygia Clark e outras de suas experiências de arte-terapia na década de 1960. Ao vestir as esculturas, o visitante tem uma experiência não apenas tátil-visual, mas também lúdica.

Posted by Guilherme Nicolau at 12:50 PM

Máquina de ficção por Paula Alzugaray, Istoé

Máquina de ficção

Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na seção de Artes Visuais da Istoé em 23 de março de 2012

Em retrospectiva no MoMA, obra de Cindy Sherman é um prato cheio para refletir sobre o que é ser mulher no século XXI

A identidade é um artifício que tem a fotografia como principal cúmplice. Estamos no mundo de Cindy Sherman, uma das artistas mais influentes de seu tempo. E, por isso mesmo, um dos poucos nomes que já tiveram a honra de ganhar, ainda em vida, uma retrospectiva na meca da arte moderna: o MoMA de Nova York. A exposição cobre a carreira da artista desde os clássicos “Untitled Film Stills”, dos anos 1970, até as obras fotográficas em formato de mural a que ela tem se dedicado desde 2010 – e que expõe pela primeira vez nos EUA nesta mostra. São 171 obras-chave para compreender sua produção.

Nestes 35 anos de carreira, Cindy Sherman flertou com o cinema, as revistas femininas, a moda, a publicidade, a psicanálise e a história da arte, mas sua maior contribuição foi protagonizar, junto de nomes como Richard Prince, Sherrie Levine e Louise Lawler, a conquista de um espaço nobre para a fotografia no cânone da arte contemporânea. Antes desse grupo de artistas que se estabeleceu nos anos 1980, a fotografia era considerada uma arte menor. Hoje, se um jovem artista trabalhando com o suporte fotográfico ganha reconhecimento e tem suas obras absorvidas pelo conservador mercado de arte, é em grande parte graças a Cindy Sherman e seus colegas da Pictures Generation (Geração Fotografia) – termo cunhado pelo crítico Douglas Crimp, em 1977.

É interessante confrontar os “Untitled Film Stills” (1977-1980), em que a artista encenava cenas de suspense ou romance cinematográfico em fotos preto e branco de dimensões modestas e efeito reticulado, com os portraits de socialites de 2008, em que senhoras de alto poder aquisitivo – o que se depreende de suas roupas sofisticadas e dos ambientes luxuosos em que são retratadas – posam para fotos de grandes dimensões que revelam em detalhe suas rugas e cirurgias estéticas. Ambas as séries são protagonizadas pela própria artista (Sherman é famosa por trabalhar sem modelo nem assistentes) e nenhuma é menos construída do que a outra. A obra da artista, aliás, é um manifesto sobre como toda fotografia é sempre fabricada. Mas o campo da ficção que cada série referencia difere radicalmente. A foto de cinema tem como motor a construção hollywoodiana da imagem feminina, ou seja, o estereótipo de mulher criado pelos filmes, a publicidade e as revistas eróticas. Já os retratos de 2008 se fundamentam na fabricação particular de uma identidade artificial pelas mulheres mais velhas, aquelas que já abandonaram a indústria dos tipos femininos para consumo.

É perturbador observar como as fotografias de socialites escancaram a busca inglória pela eterna juventude e pelo glamour algo decadente de uma realidade social igualmente efêmera. São retratos patéticos e, por isso mesmo, mais humanos, quase reais. Ao longo de sua trajetória, a artista teve sua obra cooptada por todas as teorias correntes, do pós-modernismo ao pós-estruturalismo, passando pelos discursos feministas e psicanalíticos. A psicanálise tem novamente nestas obras recentes um prato cheio para refletir sobre o que é ser uma mulher no século XXI.

Posted by Guilherme Nicolau at 12:17 PM

Retrato de Cindy Sherman deve bater recorde em leilão por Chris Michaud, Reuters Brasil

Retrato de Cindy Sherman deve bater recorde em leilão

Matéria de Chris Michaud originalmente publicada na Reuters Brasil em 23 de março de 2012

LONDRES, 23 Mar (Reuters) - Um dos mais famosos retratos da fotógrafa norte-americana Cindy Sherman, pertencente ao Museu de Arte de Akron, em Ohio, será leiloado em maio e pode alcançar um valor inédito para obras da artista, disse a casa Christie's na quinta-feira.

O museu há muito tempo aposta em Sherman, cujo trabalho está atualmente atraindo multidões para uma exposição no Museu de Arte Moderna de Nova York.

"Sem Título Nº 96", da série Centerfolds, feita por Sherman no começo da década de 1980, irá a leilão em 8 de maio em Nova York. A Christie's deve anunciar a autorização para a venda na sexta-feira.

Andrew Massad, especialista em arte contemporânea internacional da Christie's, disse que a obra representa "a apoteose do que Rosalind Krauss (crítica e teórica da arte) chamou de a capacidade de Sherman de destilar uma 'cópia sem original', significando assim arquétipos pictóricos ideais que definem nossa cultura".

O grande retrato colorido é considerado um dos mais importantes da seminal série Centerfolds. O Museu de Arte de Akron decidiu vendê-los para poder adquirir outras obras para o seu acervo de arte contemporânea.

No ano passado, a Christie's vendeu por 3,89 milhões de dólares um outro retrato de Sherman em tamanho quase natural, na qual ela aparece vestida com o colegial. Na época, esse foi o preço recorde para uma obra fotográfica, mas o valor já foi superado desde então.

Posted by Guilherme Nicolau at 12:03 PM

março 23, 2012

Fragmentos de arte e pensamento, Diário do Nordeste

Fragmentos de arte e pensamento

Matéria originalmente publicada no caderno 3 do Diário do Nordeste wm 23 de março de 2012

A revista coletiva "Avoante" e o livro "Os Mágicos Mascarados" serão lançados no Dança no Andar de Cima

A sobreposição de propostas, linguagens e suportes que saltam aos olhos da singela caixa em que é reunido o conteúdo do número único da revista "Avoante" chegam a dar vertigem em um primeiro contato - caótico, difuso e momentaneamente incompreensível. Duas baforadas profundas, ritmadas e a humilde opção por começar a leitura pelo editorial da revista. Eis o embarque em um belo e representativo mosaico da produção e discussão atual da arte produzida em Fortaleza.

A publicação será lançada, amanhã, a partir das 18 horas, no Dança no Andar de Cima, em "Evento de Lançamento" com exibição e apresentação de vídeos e demais trabalhos dos participantes, em uma ocupação artística do espaço. Além da revista, será lançado o livro "Os Mágicos Mascarados", de Eduardo Escarpinelli. No evento, haverá ainda apresentações artísticas do músico e performan Davi da Paz e da banda microleãodourado.

A revista quebra o ordenamento tradicional, impressa em um caderno de páginas destacáveis, somadas a adesivos, DVD, cartazes, cartões e até um santinho do Sagrado Coração de Jesus, assinados por 40 colaboradores, entre escritores, artistas visuais e cineastas. Nas palavras da editora e idealizadora do projeto, Mariana Smith, é "uma espécie de memória pontual do tempo presente, de modo a deixar vestígios das passagens, do cotidiano e do pensamento poético e político desenvolvido em Fortaleza nos últimos anos".

Os artistas

Entre os participantes estão os cineastas Ivo Lopes, Alexandre Veras, Marcelo Ikeda, Ricardo Pretti e Luiz Pretti (que assina uma seleção de vídeos publicados em DVD); os escritores Eduardo Rocha, Érica Zíngano, Eduardo Escarpinelli e Natércia Pontes; o músico Fernando Catatau; os artistas visuais Yuri Firmeza e Enrico Rocha; Solon Ribeiro, Euzébio Zloccowich; coletivos de intervenções urbanas como o Grupo Acidum e Coletivo Curto Circuito; além da própria Mariana e Zzui Ferreira, que assina o projeto Gráfico e a editoração.

"Eu chamo de revista, mas não tem um caráter de atualidade e sim de memória. É um memorial, um inventário de artistas", situa a Mariana. Ela explica que a ideia nasceu da necessidade de registrar o momento da produção artística que estava emergindo em 2010, com muitos trabalhos experimentais ganhando corpo e uma gama de artistas de diferentes linguagens interagindo, criando e lançando seus trabalhos.

"Era um clima de muita empolgação. Um momento que a produtora Alumbramento estava com sede no Centro, eu estava trabalhando lá, vários projetos paralelos acontecendo. Eu tinha um desejo de marcar essa época. Queria criar um link para unir essas pessoas e fazer com que essa produção circulasse um pouco. Que ela voasse", reforça.

Os textos incluem reflexões sobre o papel da arte, política cultural - como a importância de espaços independentes para a arte, no texto "Autonomia é preciso", de Mariana Smith; o papel dos recursos públicos e da arte que lança mão do mesmo (como é o caso da revista) em "Algumas questões imprecisas, nenhuma resposta necessária", de Enrico Rocha; e as singularidades da recente leva de produções independentes do cinema cearense, em carta de Marcelo Ikeda endereçada à editora.

A eles, somam-se nas páginas, cartões e folhas soltas, contos, crônicas, poesia, desenhos e outros registros que carregam um pouco de cada artista. "Pedi a cada um pedacinho do trabalho dele. Algo que fosse ele, que tivesse indício da presença de cada pessoa. Trabalhamos mais de cinco tipos de papel, formatos, tudo isso tentando adequar-nos à produção deles", conta.

Sobre a reunião dos trabalhos, mais um processo peculiar: a editora produziu a "Festa da Entrega", conseguindo reunir boa parte dos colaboradores. "A gente montou escritoriozinho. Ficava rolando a festa e as pessoas iam sendo chamadas. De uma por uma, a gente foi pensando as páginas", lembra.

A cidade

Fortaleza acaba por ser uma constante, uma liga entre os textos, vídeos, fotografias. Crônicas como a divertida "Raparigueiro", de Eduardo Rocha, narrando a saga de uma noite de sexta-feira, perambulando por espaços "alternativos", como a lanchonete "Disneylanches", na Avenida Duque de Caxias, no Centro, a noite vazia das ruas e praças do bairro, seus motéis e cinemas pornôs.

De São Paulo, a escritora Natércia Pontes carrega nos erres de sua nordestinidade em crônica sem nome, de 2009. A revista traz ainda registros escritos de experiências como o Livro Livre, de Alexandre Veras; a intervenção "TEMPORADA", de Marina de Botas, Simone Barreto e Waléria Américo; poemas, como os Jogos de Amar de Érica Zíngano. "O primeiro lampejo de desejo de fazer foi quando estava morando fora. Voltei para cá nesse desejo de guardar um pouco. De ter um retrato da produção artística, de como a gente vive a cidade, como a gente é ativista dela", encerra.

Livro

Também no "Evento de Lançamento" deste sábado, Eduardo Escarpinelli lança o livro "Os Mágicos Mascarados", assinado com o pseudônimo Eduardo Cardoso. Contemplada em 2010 no Prêmio Eduardo Campos, para obras de dramaturgia, do "Prêmio Literário para autor cearense", da Secretaria da Cultura do Ceará, a obra traz uma reflexão sobre a linguagem em forma de texto teatral.

Mais informações:
Lançamento da revista "Avoante" e do livro "Os Mágicos Mascarados", amanhã, 18h, no Dança no Andar de Cima (Rua Desembargador Leite Albuquerque, 1523 A, Aldeota). Contato: (85) 3032.8081

Posted by Guilherme Nicolau at 2:38 PM

Relações nebulosas por Beatriz Mendes, Carta Capital

Relações nebulosas

Matéria de Beatriz Mendes originalmente publicada na seção de Cultura da revista Carta Capital

Desde que assumiu o Ministério da Cultura, em janeiro de 2011, Ana de Hollanda é a principal ex-ministra em atividade da Esplanada – ao menos pelo tom do noticiário. Rumores de que seria substituída no cargo surgiram e desapareceram ao longo de um ano e três meses de gestã0, por motivos ligados principalmente ao descontentamento da comunidade intelectual quanto à postura em relação aos direitos autorais e pela sucessiva aproximação da pasta ao Escritório Central de Arrecadação.

Para entender a crise é preciso primeiro compreender como funciona o Ecad. O escritório é uma sociedade civil, de natureza privada, administrada por nove associações de música. É o órgão responsável por arrecadar e distribuir os rendimentos provenientes de execuções públicas de composições nacionais e estrangeiras. Tem também o poder de estabelecer suas regras de cobrança por meio de uma lei federal de 1973 e mantido pela atual Lei de Direitos Autorais brasileira, instaurada em 1998. Quando criado, o órgão era fiscalizado pelo Conselho Nacional de Direitos Autorais (CNDA). Como a entidade foi desintegrada em 1990, ano em que o Ministério da Cultura foi extinto durante o governo Collor, passou a ter uma total liberdade administrativa.

Arbitrariedades

“Essa falta de fiscalização fez com que o Ecad passasse a tomar medidas completamente arbitrárias”, afirma o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), presidente da CPI formada contra o órgão em julho de 2011. A investigação foi iniciada depois que a Secretaria de Direito Econômico (SDE) fez denúncias de exacerbação de competência legal e de estabelecimento de cartéis para a fixação de preços.

Rodrigues lembra o caso do cantor Frank Aguiar, cobrado por executar seu próprio repertório. “Ele estava fazendo uma festa de aniversário e tocava suas músicas para os amigos. Pouco tempo depois recebeu uma notificação do Ecad, com cobranças por ter executado sua própria música”. Na ocasião, o músico afirmou se sentir órfão do Escritório de Arrecadação.

No dia 5 de março, outra decisão do órgão gerou polêmica na internet. Foi anunciado que a postagens de vídeos em sites e blogs passariam a ser cobradas com o valor de 352,59 reais, não importando o fato de o Youtube e o Vimeo já terem pago pelas execuções. Depois de receber duras críticas, inclusive do próprio Google, o Ecad suspendeu a ordem.

À CartaCapital o senador disse acreditar que os dirigentes do Ecad notaram que ninguém tinha poder sobre eles e passaram a agir em sociedades. Algumas das associações ligadas ao órgão, como a Socinpro, são presididas pela mesma pessoa há aproximadamente 25 anos. “A CPI constatou que não existem rodízios de administração, um pequeno grupo de sócios é responsável por todo o Ecad. Isso gerou um ciclo vicioso de manutenção de poder”, relata.

Relações com o Ministério

O curioso é que o atual Ministério da Cultura costuma se posicionar favoravelmente ao Ecad. Justamente num momento em que o setor cultural esperava mudanças no sistema. Na época em que a CPI foi instaurada, Ana de Hollanda defendeu a instituição, dizendo que ela tem o direito de liberdade de decisão, já que não se trata de “um simples guichê, mas um centro de poder sobre as atividades de cobrança e repartição dos direitos autorais”.


A CPI do Ecad acredita que é de extrema importância uma reforma da Lei dos Direitos Autorais do Brasil, vigente desde 1998 Foto: Pedro Taques
A aproximação entre ministério e Ecad, entretanto, não se limita a essa ocasião. Logo que foi nomeada ministra, Ana de Hollanda retirou o selo de Creative Commons da página do Minc, ação totalmente oposta a que foi adotada por Gilberto Gil e Juca Ferreira durante o governo Lula. Em seguida, nomeou Márcia Regina Barbosa como diretora de Direitos Intelectuais, indicada ao cargo por Hildebrando Pontes, advogado do Ecad. Tibério Gaspar, ex-fiscal do órgão, foi designado assessor especial da ministra no Rio de Janeiro. “A prática de indicar nomes do Ecad ao ministério foi iniciada com Ana de Hollanda, nunca havia ocorrido isso antes”, garantiu Rodrigues.

Recentemente, o jornalista Jotabê Medeiros publicou uma reportagem no site Farofafá e gerou ainda mais polêmicas sobre a ministra. De acordo com a matéria, um suposto favorecimento foi descoberto depois da análise de documentos emitidos pelas duas instituições. O Ecad confeccionou uma peça de defesa que circulou por Brasília em novembro do ano passado e o Minc a endossou, através de um parecer técnico enviado ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

Ambos defendem a ideia de que o Ecad é o órgão oficial de arrecadação e distribuição de direitos autorais no País e que não é permitido que existam instituições concorrentes. Os argumentos são uma espécie de consentimento para que haja um monopólio legal impedindo a entrada de novas associações na fiscalização da execução das músicas. “Essas denúncias mostram que o relacionamento entre Ana de Hollanda e o Ecad são, no mínimo, nebulosas”, interpreta o senador.

O documento emitido pelo Minc é completamente antagônico ao parecer produzido a pedido do Ministério Público Federal durante o governo Lula. Aos olhos de Juca Ferreira, o monopólio do Ecad não abarcaria a fixação de valores unificados. O ex-ministro também defendia a existência de um mercado concorrencial com a negociação direta dos usuários com as associações. O atual ministério, contudo, incorpora o argumento do Ecad de que foi o antigo Conselho Nacional de Direitos Autorais o autor dos mecanismos em funcionamento hoje em dia.

Retrocesso

Na quarta-feira 21, Juca Ferreira afirmou que avalia a gestão de sua sucessora no Minc como sendo “‘desastrosa”. Em entrevista ao Farofafá, o ex-ministro afirmou que é explícita a ruptura com a política anteriormente adotada.


O ex-ministro da Cultura Juca Ferreira acredita que a gestão de Ana de Hollanda representa um retrocesso em relação à política antes adotada Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr
Para Ferreira, se os avanços de Dilma no setor econômico e na redução da desigualdade social são reflexos de um programa de continuidade em relação ao governo Lula, a área cultural foi deixada de lado.

Prova disso, disse, foi o fato de Ana de Hollanda ter afirmado que a pirataria vai “matar a produção cultural brasileira”. Ao contrário do que diz a ministra, Ferreira acredita que a internet é um meio de facilitar o acesso à informação e que as políticas a ser adotadas deveriam partir do pressuposto de que a rede veio para ficar e que não se pode colocar o direito do autor em contradição com o de acesso à cultura.

Outras irregularidades

O senador Randolfe Rodrigues diz que apesar de as investigações da CPI só serem finalizadas em maio, algumas evidências já podem ser apontadas. Para ele, o Ecad está se apropriando de parte da quantia gerada com os direitos autorais. “Em 2010 eles arrecadaram 430 milhões de reais e apenas 70% desse valor foi distribuído para os artistas. O resto ficou para o que eles chamam de ‘atividade-meio’, dinheiro a para manutenção do órgão”, conta.

Outra questão abordada pelo senador é o fato de que a Lei do Direito Autoral deixa claro que o Ecad é uma entidade que não tem finalidade de obtenção de lucro. Entretanto, costuma embolsar o dinheiro de arrecadação de direitos autorais cujos donos são desconhecidos. “Por exemplo, se o Ecad arrecadar 10 mil reais de um compositor e ele nunca aparecer para resgatar esse dinheiro, isso vai para a conta deles”. Em tese, o dinheiro deveria ficar numa conta separada à espera da manifestação dos respectivos artistas.

Conclusões da CPI

Rodrigues afirma que a principal conclusão a que chegou a CPI foi a necessidade de reforma da lei do direito autoral. “A lei 9610 é de 1998, naquela época ainda não existia a internet. Essa legislação está anacrônica”, argumenta. O senador também deixa claro que a liberdade do Ecad deve ser reduzida. “É preciso que se crie uma instituição pública responsável por fiscalizar toda essa arrecadação e que assuma o controle desses acessos”.

Por fim, completa que a CPI pedirá o indiciamento de pelo menos quatro dos diretores do Ecad por formação de quadrilha, cartelização e apropriação indébita.

Ana de Hollanda poderia ser indiciada por “advocacia administrativa”, quando funcionário público patrocina, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário.

As denúncias geraram manifestos de intelectuais em favor da saída da ministra. Atores como Fernanda Montenegro e Dan Stulbach apoiam a nomeação de Danilo Miranda, diretor do Sesc São Paulo, para o cargo. Marilena Chauí, professora do Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo, afirma que o “despreparo do Minc é dolorosamente evidente”.

Diante das acusações, a Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado aprovou na terça-feira 13 um convite à ministra para que ela fale a respeito do assunto. O próprio senador solicitou o requerimento, mas Ana de Hollanda ainda não anunciou se aceitará o convite.

Posted by Guilherme Nicolau at 2:07 PM

Marcelo Silveira expõe em São Paulo, Diário de Pernambuco

Marcelo Silveira expõe em São Paulo

Matéria originalmente publicada no Diário de Pernambuco em 23 de março de 2012

Marcelo Silveira, artista plástico pernambucano, inaugurou ontem a exposição Chronos, na Galeria Nara Roesler, em São Paulo. Ele apresenta quatro obras em sua quinta indivual na galeria. Caleidoscópio é instalação composta por algumas dezenas de espessas molduras retangulares, que abrigam um número grande de placas coloridas de acrílico translúcido e de idêntico tamanho, agrupadas em camadas até formar bloco espesso o bastante para bloquear quase toda a luz que sobre elas caia. Vazadas, criam figuras abstratas, geométricas e corriqueiras, como brinquedos, veículos e pessoas.

O segundo trabalho, Cuco (Livro da semana) é uma publicação com tiragem única, produzida em estêncil, técnica que o artista considera "um esquema facilitador do processo de desenhar, encontrado facilmente em lojas de material escolar". Desafiando os limites entre desenho e pintura, Criação do Mundo traz enormes caixas de cedro presas à parede, nas quais se instalam papéis brancos inteiramente preenchidos por sinuosos traços abstratos feitos com caneta esferográfica azul. Por fim, Sinuca traz sete caixas triangulares produzidas a partir da reprodução de uma peça encontrada em um brechó do Recife, onde o artista reside.

"Repleta de construções que se movimentam fisicamente, sua obra se caracteriza, sobretudo, por promover deslocamentos constantes de sentidos. Nos trabalhos reunidos nesta exposição, uma vez mais os meios usados e os nexos sugeridos se confundem, oferecendo ao visitante a experiência de tecer relações novas a partir do encontro com a criação do artista", explica Moacir dos Anjos, curador da última Bienal Internacional de São Paulo, que assina o texto crítico da exposição.

Posted by Guilherme Nicolau at 11:30 AM

Mostra de Giorgio de Chirico em cartaz no Masp, O Estado de São Paulo

Mostra de Giorgio de Chirico em cartaz no Masp

Matéria originalmente publicada no caderno de cultura do jornal O Estado de São Paulo em 22 de março de 2012

A tragédia da serenidade. A expressão, num dos escritos de Giorgio de Chirico (1888-1978), se refere a seus pensamentos sobre a estética metafísica, movimento pelo qual o pintor se inscreveu na história da arte do século 20. "Na construção da cidade, na forma arquitetural das casas, das praças, dos jardins e das paisagens, dos portos, das estações ferroviárias, etc., estão os primeiros fundamentos de uma grande estética metafísica. Os gregos tiveram certo escrúpulo nessas construções, guiados pelo senso estético-filosófico: os pórticos, os passeios sombreados, os terraços erguidos como plateias diante dos grandes espetáculos da natureza", definiu o artista em 1919.

Na década de 1910, o greco-italiano De Chirico começou a pintar suas paisagens urbanas enigmáticas, cidades melancólicas formadas por construções da arquitetura antiga e clássica, das quais emergem sombras e figuras humanas, estátuas ou manequins isolados sempre com o chão quase ocre, a luminosidade do céu em camadas verdes e amarelas. Um criador referencial, o artista tem agora apresentada no Brasil a primeira antologia de sua obra, a mostra De Chirico: O Sentimento da Arquitetura, com 45 pinturas, 11 esculturas e 66 litografias pertencentes à coleção da Fondazione Giorgio e Isa de Chirico, sediada em Roma, na casa onde ele viveu a partir de 1944.

A exposição, primeiramente, foi apresentada na Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre. Com curadoria da arquiteta e crítica italiana Maddalena d?Alfonso, a mostra será, depois, exibida na Casa Fiat, em Belo Horizonte (entre 29 de maio e 29 de julho). Mesmo que reúna obras que o artista executou, especialmente, nas décadas de 60 e 70, a antologia representa, na verdade, todo o seu pensamento artístico - como afirmou a curadora à reportagem por ocasião da exposição em Porto Alegre, De Chirico promoveu uma espécie de "antropofagia" de suas questões durante toda a sua carreira. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo

Posted by Guilherme Nicolau at 11:25 AM

Retrato do artista quando (muito) jovem Sofia Borges, Felipe Bittencourt, Rafael Carneiro, Flávia Junqueira e André Feliciano dizem a que vieram por Juliana Monachesi, Revista Select

Retrato do artista quando (muito) jovem Sofia Borges, Felipe Bittencourt, Rafael Carneiro, Flávia Junqueira e André Feliciano dizem a que vieram

Matéria de Juliana Monachesi originalmente publicada na Revista Select em 20 de março de 2012

Nascidos entre 1984 e 1987, cinco artistas relatam seus caminhos para as artes visuais e refletem sobre o atual contexto, em que “jovem artista” virou commodity

Eles têm obras de gente grande, mas ingressaram muito cedo no circuito da arte e construíram uma trajetória artística com apenas vinte e poucos anos. Sofia Borges, 27, Felipe Bittencourt, 24, Rafael Carneiro, 26, Flávia Junqueira, 26, e André Feliciano, 27, são jovens precoces que estão inscrevendo seu pensamento e sua atitude na conversa da arte contemporânea brasileira.

André Feliciano, o mais precoce entre os precoces, que formulou seu primeiro (de muitos) manifesto sobre arte ainda no colegial, atende hoje pelo nome Jardineiro de Arte. Ele já teve outros codinomes ao longo de uma breve e acintosamente frutífera carreira de artista: foi moderno (2000-2001), foi Pós-moderno (2002-2005), Contemporâneo (2005-2006) e, por fim, encontrou a verdadeira vocação, que não é, segundo ele, ser artista, mas “cultivar a natureza da arte”, como Jardineiro.

“A arte surgiu na minha infância como uma dúvida: eu tinha uma memória muito forte de brincar em um galinheiro, em um sítio que visitava sempre nas férias, em Minas Gerais, mas não sabia se essa memória provinha de uma experiência ou de uma fotografia. Passei muitos anos com essa dúvida que, de certa forma, nutriu minha vontade de querer entender mais sobre a natureza da fotografia”, conta o Jardineiro André.

Uma dificuldade de mobilidade aos 17 anos levou-o a começar a fotografar. “Por algum motivo misterioso tornei-me uma fotografia: não tinha ação própria, não conseguia me comunicar e vivia em um espaço plano”, explica. Ele elaborou, em 2001, um manifesto sobre o que seria a arte do futuro, intitulado Neo-pós-pós, passou a criar e costurar as próprias roupas e conseguiu “sair do mundo estático e fotográfico” em que havia se metido.

Em 2002, Feliciano ingressou na Fundação Armando Álvares Penteado (Faap) e, por que deixou “de ser espontâneo”, adotou o codinome Pós-Moderno. “No ambiente intenso de criação em que me encontrava no final do colegial, eu não conhecia outra possibilidade a não ser cursar uma faculdade de artes. Perdi um pouco a noção de realidade durante o curso e me aprofundei nas questões sobre a natureza da fotografia”, conta.

No percurso de formação, o artista introjetou de tal maneira o pensamento sobre a fotografia e as experimentações intensas com o meio (técnica e simbolicamente) que voltou a se sentir, no último ano do curso, estático e com dificuldade de se comunicar. “Tornei-me o próprio contemporâneo. Só consegui sair do buraco com ajuda do meu orientador, que me ensinou a ler e escrever textos de modo claro e estruturado para, enfim, conseguir me comunicar.”

Orientado por Felipe Chaimovich em seu trabalho de conclusão de curso, em 2006, o que o Jardineiro André Feliciano fez foi ousar reescrever a história da arte moderna a partir de uma perspectiva fotográfica e decretar o fim do contemporâneo e o surgimento de um novo ciclo histórico: o Florescimento.

Florescentista há cinco anos, o Jardineiro vem se dedicando a cultivar a natureza da arte em lugar de superpovoar o mundo com mais obras de arte. Escritos florescentistas, festas florescentistas e conversas florescentistas perfazem sua obra hoje. Nas festas, por exemplo, o anfitrião serve apenas comidinhas em forma de câmera, que simbolicamente fotografam os convivas.“

A minha entrada no circuito das artes começou de fato com a exposição Ecológica no MAM-SP. Depois dessa iniciativa, as pessoas dizem que entenderam mais o que eu tento falar há muitos anos. Entretanto, meu trabalho é um longo cultivo, mas a poética do meu trabalho não está pronta”, avalia. Em 2011, Jardineiro fez duas exposições em Nova York, na Bonni Benrubi Gallery e em um prêmio internacional de jovens artistas no Brooklyn, e tem prevista para março sua primeira individual na Galeria Zipper, em São Paulo.

O que significa ser "jovem artista"

A artista e professora de artes visuais da Faap Dora Longo Bahia faz uma diferenciação entre “artista jovem” – “uma denominação retroativa que pressupõe a existência de uma obra feita por alguém que faz arte (o artista)”, como subentendido no título do romance de James Joyce – e “jovem artista”, designação que prescinde da obra. “O jovem artista é uma categoria que existe antes da arte; é uma promessa do mercado, é uma aposta que pode dar certo (valorizar) ou não”, defende. As escolas de arte, hoje, ainda segundo Bahia, ensinam os alunos a ser “jovens artistas”, a se inserir no mercado e até a usar dispositivos de “subversão”.

Uma marca dos jovens artistas no contexto atual é a diversidade de meios que escolhem para se comunicar. Apesar de certo predomínio da pintura figurativa (basta visitar a exposição Os Primeiros 10 Anos, em cartaz no Instituto Tomie Ohtake até 26 de fevereiro, para perceber que esse suporte é o cavalo de batalha da nova geração), os artistas também fazem farto uso do vídeo, da fotografia e do tridimensional.

Mesmo na pintura há visadas marcadamente distintas, como no caso da obra de Rafael Carneiro. Ele se vale de um olhar mediado ou maquínico, capturado por câmeras de segurança ou stills de filmes de Alfred Hitchcock, como base para uma pintura que faz questão de figurar a própria artificialidade. “Tento resolver o mal-estar cultural em meu trabalho. Para mim, a obra de arte não tem nada a ver com sublimação, acho que o que existe é a tentativa de solucionar o jogo de necessidades psicológicas em um objeto”, afirma.

O problema é, na opinião do artista, que no mercado de arte aquecido existe pouco espaço para a subjetividade. “Não posso negar que a pintura hoje é algo vendável. Mas uma pintura minha leva um mês para ser feita, cinco horas por dia. Ter uma galeria me obrigou a ter a responsabilidade de trabalhar, mas a investigação crítica nunca deixou de ser parte integrante do trabalho”, defende um desencantado Carneiro, sugerindo que nem todo mundo que está pintando consegue conciliar demanda e consistência de pesquisa.

Transparência e opacidade

De família tradicional, Flávia Junqueira cursou direito e filosofia antes de estudar artes também na Faap. “A decisão pela faculdade de artes plásticas não foi fácil. Cresci em ambiente familiar que sempre me deu liberdade de escolha, porém, por estar imersa em um contexto de valores mais tradicionais, me sentia pressionada a escolher profissões que proporcionassem maiores garantias no mercado de trabalho”, conta.

Quando se formou, em 2009, a artista já tinha uma boa inserção institucional com participações em salões e editais, e também no mercado. “Esse caminho me possibilitou começar a apresentar meu trabalho fora da faculdade, o que despertou o interesse de galerias. A maior dificuldade que encontrei foi entrar no mercado muito jovem. Tive de aprender a dividir o tempo entre dar continuidade ao processo criativo e administrar tarefas além da produção. Isso é muito difícil, pois estou em um processo inicial de construção do trabalho. Percebo que muitos jovens artistas também acabam tendo essa dificuldade, da pouca experiência aliada à demanda comercial, o que pode comprometer a produção e a concentração”, desabafa.

Um universo solitário de referências infantis marca a produção de Junqueira. A artista realiza performances fotografadas, simulando o ambiente multicolorido de festas infantis (pilhas de presentes, balões, casa de bonecas, flores), nos quais se insere vestida de menininha e com expressão melancólica.

Flávia Junqueira e Sofia Borges trabalham em limites diametralmente opostos do espectro da investigação fotográfica: a primeira se vale da transparência e a segunda, da opacidade. A melancolia do set infantil de uma tem, entretanto, um paralelo com as indecifráveis encenações da outra, que modifica pouco o ambiente de forma direta. As transformações desse set solitário e desolado são produzidas no interior do processo fotográfico, da iluminação ao processamento na ampliação.

“Eu sempre soube que trabalharia em alguma área ligada à criação. Durante o colegial cheguei a resolver que seria escritora. Mas, quando, morando em São Paulo havia dois meses (aos 19 anos), visitei uma exposição de arte contemporânea, me dei conta de que havia uma área do conhecimento na qual eu poderia exercer aquele tipo de prática. Ao me dar conta disso, decidi cursar artes plásticas”, lembra Borges, que já saiu da USP, em 2008, com galeria (Virgilio, em São Paulo).

A entrada no mercado de arte é menos cristalina no caso de alguém trabalhando com performance. Felipe Bittencourt conta que sua inserção foi “bem torta”: carioca vivendo em São Paulo, participou da primeira mostra coletiva no Rio de Janeiro. “Meu trabalho foi extremamente desrespeitado, assim como o de muitos outros: um edital enganoso e um espaço precário que não atenderam a nenhuma exigência dos artistas. Decepcionado, não produzi por um tempo”, lembra. De uma série de decepções pessoais surgiu o projeto de realizar performances de limite físico, que foram os trabalhos que lhe deram projeção e renderam convites para expor pelo Brasil em espaços institucionais e festivais internacionais. Um exemplo é a ação de apontar vários lápis durante três horas, até sangrarem os dedos. “Testo o limite do objeto e o objeto testa o meu limite”, explica o artista.

Bittencourt trabalhou na exposição Objeto Transitório para Uso Humano (2008), de Marina Abramovic, na então Galeria Brito Cimino, na qual as pessoas podiam interagir com os objetos e propostas da artista. “Minha função era performar ações durante 12 horas, todos os dias, por um mês, como exemplo vivo e constante na exposição. Foi um contato muito forte e uma grande influência em minha produção”, conta ele. “A constante crítica de que minha produção não renderia dinheiro foi outro fator importante no meu processo como artista, porque resolvi produzir somente pela arte e não pelos seus fins financeiros”, observa.

Um exemplo disso é o belíssimo projeto de performance diária que Bittencourt iniciou em 8 de dezembro de 2010. “Minha proposta foi fazer uma ideia de performance por dia durante o período de um ano, lançando, assim, um desafio e tomando a ação de desenhar diariamente como performance. Nenhuma foi desenhada com o intuito de acontecer de fato. Não havia limitações financeiras, lógicas ou de segurança nas ideias desenhadas.”

Hegemonia de um padrão de gosto

“A arte está cada vez mais colada na moda, operando segundo uma mesma lógica: assim como as marcas lançam coleções sazonais, também as faculdades e instituições lançam artistas sazonalmente”, analisa Dora Longo Bahia. “Hoje, o jovem artista tornou-se uma mercadoria, é uma commodity como as ações do mercado de futuros, pois a arte reproduz o sistema econômico”, continua. “A descontextualização da experiência do artista em seu ateliê em relação à obra formatada para estar nos museus e galerias é muito perversa.”

Com base em uma pesquisa de Tiago Mesquita para o livro Pintura Brasileira Século 21, que a editora Cobogó lança em fevereiro, a exposição no Instituto Tomie Ohtake promove relações entre a onipresente produção de pintura de nomes que despontaram no cenário da arte na última década com obras em outros suportes de colegas de geração. Mesquita, que é cocurador da exposição, atribui a profissionalização dos jovens artistas a fenômenos novos como a continuidade do processo democrático e, de seis a oito anos para cá, à estabilidade econômica do Brasil.

“Esse contexto permite uma continuidade na trajetória dos artistas; não há muitos sobressaltos. Além disso, há muita organização do meio de arte nos dias de hoje”, afirma Mesquita. A facilidade do acesso a informações – seja pela quantidade de livros circulando na internet, seja pela facilidade de se fazer uma viagem de formação – também contribui para a continuidade de uma investigação artística, na opinião do curador. “Parte da produção brasileira atual é muito marcada pela hegemonia do mercado internacional de arte, pela hegemonia de um padrão de gosto, e isso é um problema”, diz.

*Publicado originalmente na edição impressa #4.


Posted by Guilherme Nicolau at 11:07 AM

Obra de arte em São Paulo? Sujeita a guincho por Jotabê Medeiros, O Estado de São Paulo

Obra de arte em São Paulo? Sujeita a guincho

Matéria de Jotabê Medeiros originalmente publicada no caderno Cultura do jornal O Estado de São Paulo em 22 de março de 2012

Prefeitura exige o pagamento de R$ 12 mil para devolver obra ao coletivo artístico Bijari

Há cerca de duas horas, a Prefeitura de São Paulo, por meio da Subprefeitura de Pinheiros, guinchou uma obra de arte do coletivo artístico Bijari, que já foi exposta na Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo e na exposição austríaca Rotor, em 2009, e já ocupou espaços de eventos como a Matilha Cultural e o SWU.

Trata-se de uma carcaça de automóvel coberta com plantas, uma intervenção urbana da série Carro Verde, um comentário crítico sobre a metrópole automatizada. Para liberar a obra de arte, autuada como "carro abandonado em via pública, a Prefeitura de São Paulo exige o pagamento de R$ 12 mil. O Grupo Bijari não tem o dinheiro e reclama que a Prefeitura não cumpriu o rito legal de informar a suposta infração e dar 5 dias para a sua legalização.

O Grupo Bijari, desde 2007, desenvolve um projeto batizado de Natureza Urbana, montado em diversos suportes. "Constitui-se na apropriação de equipamentos e estruturas urbanas símbolos e agentes de um modelo nocivo de ocupação, mas que, ao mesmo tempo, possuem um caráter de identificação coletiva dentro do ambiente das cidades: o carro , o ônibus, o outdoor, a caçamba de lixo", diz seu manifesto.

O automóvel coberto de plantas é uma velha Quantum sem motor, que estava em exposição na frente da Galeria Choque Cultural, na Rua João Moura, na Vila Madalena. O grupo utiliza os veículos para reapresentá-los à vida urbana, cobertos de samambaias, bromélias, arbustos, unhas de gato e palmeiras para "dar uma nova vida às carcaças estéreis criando um organismo único e sincrético".

"Para quem a cidade é feita: para as pessoas ou para os carros? A resposta não é clara. Para emplacar um carro é fácil, mas para expor uma obra de arte questionando isso é difícil", diz Rodrigo Araújo, um dos 13 artistas do Coletivo Bijari. São Paulo possui cerca de 7 milhões de automóveis nas ruas.

Posted by Guilherme Nicolau at 10:16 AM

março 22, 2012

MAM propõe diálogo entre novas aquisições e acervo por Audrey Fortunato, O Globo

MAM propõe diálogo entre novas aquisições e acervo

Matéria de Audrey Furlaneto originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Globo em 22 de março de 2012

Mostra alinha 83 obras recém-adquiridas com a exposição permanente do museu

RIO - A exposição das novas aquisições da coleção Gilberto Chateaubriand já é regular no calendário do Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio — e, por isso mesmo, um desafio para a curadoria de Luiz Camillo Osorio e Marta Mestre. Nesta edição, que o MAM abre nesta quinta-feira ao público, a dupla propõe que as obras adquiridas entre 2010 e 2012 dialoguem com a exposição permanente do museu.
Os 83 novos trabalhos (a maioria pintura e fotografia) expostos estão divididos em quatro núcleos, os mesmos da mostra permanente, no segundo andar do MAM.

Para o diálogo nos núcleos — geometria, cidade, identidade e corpo —, obras que já pertenciam à coleção entram no chamado Espaço Monumental do museu, agora ocupado pelas novas aquisições. Um Weissmann de 1986 e um Volpi de 1960 guiam, assim, o núcleo "geometria". Os dois são apresentados ao lado de novas aquisições como um múltiplo da artista Claudia Melli.

No núcleo "cidade", um bólide de Hélio Oiticica fica próximo ao porta-fotos "Eu amo camelô" (2009-2010), do Opavivará!, ou a fotos de Gustavo Speridião — ele é o nome mais presente nas novas aquisições.
Em "identidade", "Lindoneia — a Gioconda do subúrbio" (1966), de Rubens Gerchman, divide a parede com Alexandre Mury, que cobre o rosto com fatias de bacon em "Francis Bacon" (2011). Já em "corpo", os artistas são guiados por "Vênus" (1977), de Tunga. Lá, estão os bordados "Me cobre" (2010), de Elisa Castro, e "Veste nu" (2010), de Daniel Toledo, com a foto de um corpo nu impressa numa capa de tecido.

Na mostra, a ideia é expor ao menos uma peça dos 24 artistas que, agora, passam a integrar a coleção Chateaubriand. Há obras de artistas de 24 a 84 anos. Embora a exposição apresente 83 trabalhos, o colecionador comprou quase 190 obras nos últimos dois anos.

Posted by Guilherme Nicolau at 4:10 PM

Cidade perfurada, Jornal de Hoje

Cidade perfurada

Matéria originalmente publicada no caderno Arte & Vida do Jornal de Hoje em 21 de março de 2012

Começam amanhã as atividades abertas ao público do projeto Perpendicular - em sua versão Fortaleza.

Obra processo, o projeto apresenta as etapas da construção do pensamento artístico

Não que seja cômodo ser expectador – em dependendo da obra, a experiência é reveladora. Mas é possível subverter essa proposta e a experiência artística – fazendo um outro convite ao público. É isso que o mineiro Wagner Rossi Campos e outros cinco artistas propõem a partir de amanhã. Os seis expõem os processos de construção do pensamento artístico no projeto Perpendicular Fortaleza. A mostra das atividades começa amanhã no Centro Cultural Banco do Nordeste e em outros pontos da cidade, seguindo até domingo.

A provocação inicial é apresentar o processo de construção da obra: “A gente não quer produzir uma coisa já resolvida. O que a gente está fazendo é mostrar para as pessoas o processo, para as pessoas acompanharem, participarem mais do que acontece na concepção da obra que chega à galeria. O trabalho é o mais aberto possível”, detalha Wagner. Na versão Fortaleza, o Perpendicular envolve os artistas Fernando Ancil e Raquel Versieux, ambos mineiros (além de Wagner), e Yuri Firmeza, Uirá dos Reis e Sabyne Cavalcanti, do Ceará.

Por isso, os seis iniciam os trabalhos com ideias que podem se modelar até domingo, assumindo o risco de um trabalho intenso concentrado em menos de uma semana. Fernando, por exemplo, tem se apropriado da fotografia para falar do apagamento das cidades. Esquecimento. “Estou procurando cartões postais e fotos antigas da cidade”. Raquel, em sua fase mais escultora, pretende explorar a matéria – e espera com expectativa pela visita à comunidade Moita Redonda, no município de Cascavel (distante 60km da capital).

Yuri, por outro lado, ainda está por dar esse primeiro passo. “Tinha pensado algo que fosse coletivo. Penso que algo pode vir da cidade a ser apresentada através do olhar do estrangeiro, alguma Fortaleza que me escapa”. Esse é o primeiro exercício (que aconteceu ontem e hoje): que Fortaleza Raquel, Fernando e Wagner apreenderam? Já Wagner parte das possibilidades do corpo e dele inserido no espaço da cidade. “Os artistas de Fortaleza têm uma relação habitual com a cidade e os de fora, não. Acaba que uma coisa vai contaminar outra”.

O projeto já tem três anos, e começou em Belo Horizonte. No já distante 2009, Wagner ficou particularmente instigado pelo lançamento de uma exposição na Galeria da Copasa (uma empresa de água mineral), da qual é “vizinho perpendicular”, como definiu. E resolveu, ele também, montar um evento: “Que foi dentro da minha casa. Queríamos propor uma perfuração num evento institucional a partir de um evento feito pela vontade do artista. Foi super forte”, descreveu, em conversa ao telefone. Ações na rua e dentro da casa jogavam com o público e o privado. Do lado de lá da galeria, “nem deram bola”.

História

Wagner, artista, pesquisador e performer ele próprio, fez uma segunda edição do Perpendicular, também na capital mineira, do lado de fora do Museu Inimá de Paula. Em 2010, ele decidiu estruturar a proposta para um edital, conseguindo financiamento para outras edições. “O Perpendicular é uma forma de encontro, saindo um pouco desse universo de ‘eu comigo mesmo’, ampliar isso com o outro. O projeto é sempre esse de encontros, com artistas, com lugares”, explicou Wagner.

Aconteceu, pois, o cenário # ambiente de 2010 e Perpendicular Casa e Rua, em 2011. O encontro de Fortaleza é fruto do prêmio do Programa Rede Nacional Funarte Artes Visuais - 8ª edição. Vão ser lançados os livros elaborados a partir das outras experiências. No Brasil, o projeto já aconteceu no Rio de Janeiro, no Museu da República, em Maceió na praia, e em Berlim (Alemanha) e Bilbao (Espanha). Em Bilbao, os artistas saíram pela rua com uma muda amarrada ao corpo. “Foi um trabalho único. Tentamos entrar no Guggenheim. A gente entrou no hall, mas não pôde entrar nas salas expositivas: eles disseram que não podia entrar nada vivo no museu”.

Outras info.: http://www.perpen-dicular-fortaleza.blogspot.com.br/

Posted by Guilherme Nicolau at 11:55 AM

"Gestão de Ana de Hollanda é desastre", afirma ex-ministro da Cultura por Matheus Magenta, Folha de São Paulo

"Gestão de Ana de Hollanda é desastre", afirma ex-ministro da Cultura

Entrevista de Matheus Magenta originalmente publicada no caderno Ilustrada da Folha de São Paulo em 22 de março de 2012.

"Acho que é um desastre." Foi assim que o ex-ministro da Cultura Juca Ferreira (2008-2010) definiu, em entrevista à Folha, a gestão da sucessora Ana de Hollanda.

Ferreira se manifesta no momento em que circulam na internet dois manifestos com críticas à pasta sob Ana de Hollanda, assinados pela atriz Fernanda Montenegro e pela filósofa Marilena Chauí, entre outros. "Se me chamassem, eu assinaria", disse.

Procurada na terça-feira (20) à noite, a assessoria da ministra disse que não poderia responder às críticas a tempo.

O ex-ministro diz ter "elegância acima da média e silêncio obsequioso com todas as diferenças programáticas" entre a sua gestão e a atual.

Isso não impediu que, ao longo de uma hora de conversa, Ferreira afirmasse haver críticas "em quantidade e qualidade" suficientes para constatar "retrocesso" e "ruptura" na passagem de bastão.

Ferreira foi, entre 2003 e 2008, secretário do então ministro Gilberto Gil. Com a saída do músico, assumiu o Ministério da Cultura (MinC).

Em oito anos, se viu às voltas com polêmicas na Lei Rouanet e na Ancinav, agência do audiovisual considerada autoritária.

Desapegar do cargo não foi fácil. Queria ter ficado na pasta? "Não dá para negar isso."

Até comprar briga com o PV ele comprou. Em 2010, após 23 anos de militância, se desligou da sigla --que requeria mais espaço no MinC.

No dia 2 de fevereiro, na festa para Iemanjá, filiou-se ao PT da Bahia. Na ocasião, circulava a brincadeira da "melancia": verde por fora, vermelha por dentro.

Hoje, mora na Espanha com a família, onde trabalha na Secretaria Geral Ibero-Americana, órgão da Cúpula Ibero-Americana de chefes de Estado e de governo, que reúne 22 países, Brasil incluso.

Juca veio a São Paulo para o 1ª Fórum Internacional de Gestão Cultural, um ciclo de debates na Livraria Cultura que começou nesta quarta-feira (21) e vai até sexta-feira (23).

Confira abaixo a íntegra da entrevista concedida pelo ex-ministro à Folha nesta terça-feira (20).

*
Folha - O sr. mora na Espanha atualmente. Tem algum planejamento para uma volta?
Juca Ferreira - Não.

Por que a troca do PV para o PT e por que agora?
Eu já vinha em rota de colisão com o PV há muito tempo, há uns três ou quatro anos. O PV se distanciando do programa inicial e eu perdi o vínculo. Tivemos muitas divergências em relação ao ministério. No ano retrasado, eu apoiei a Dilma [nas eleições presidenciais de 2010], e o PV construiu uma outra candidatura [da ex-senadora Marina Silva], eu já estava praticamente fora.

E como surgiu a aproximação com o PT?
Na Bahia nós sempre andamos juntos. Éramos oposição à corrente do Antonio Carlos Magalhães [senador morto em 2007] e sempre trabalhamos juntos, sempre tivemos algumas afinidades importantes. Eu acho que o PT cumpriu um papel importante. Primeiro na redemocratização, organizando os movimentos sociais.

Desde o movimento sindical ao movimento de mulheres, de homossexuais, culturais, ambientais, o PT teve muita presença na organização disso. O Brasil contemporâneo precisava de uma democracia civilizada para poder mudar a estrutura do país.

O senhor disse que o PV entrou em conflito com alguns pontos do ministério durante a gestão do senhor. Quais eram os pontos divergentes?
O PV não tinha uma proposta diferente da nossa. Eles achavam pouco a minha presença, a presença de Gil e queriam ocupar espaço.

Queriam cargos?
É. Eu tenho muito cuidado com isso porque eu acho que o Estado não é botim de guerra, quem ganha a eleição. O Estado é um instrumento público e essa relação tem que ser muito cuidadosa.

Na sua gestão, houve muita resistência à Lei Rouanet nos moldes atuais, e daí surgiu a proposta de reforma da lei que é o ProCultura, que tramita no Congresso.
Não é resistência. Nós tivemos condições de constatar que a Lei Rouanet não gerou nenhum dos produtos que pretendeu gerar. Não criou um mecenato. Na verdade, é 100% de dinheiro público. E 100% de dinheiro público passando pelo crivo das empresas. O que, a rigor, é inconstitucional. O dinheiro público tem que ser usado a partir de critérios públicos.

Segundo não criou mecenato, ou seja, não atraiu recursos da área privada. Pelo contrário, passou a financiar a construção de intervenções privadas na área da cultura e concentrou excessivamente em dois Estados com as mesmas pessoas. Porque nesses Estados não houve distribuição porque não tinha critério. Então, quem passou a definir a política pública eram os departamentos de marketing. Era 80% do dinheiro que o ministério tinha era da Lei Rouanet.

Inclusive foram publicados anúncios durante a sua gestão criticando a concentração de recursos no Rio e em São Paulo.
Não é Rio e São Paulo. São os mesmos. Gil foi falar isso, ele ainda era ministro, num encontro no Rio de Janeiro, no teatro Leblon. Eu me lembro como se fosse hoje. Eu disse: "Olha, aqui eu estou vendo muitos artistas conhecidos, importantes, mas eu queria dizer que eu vou distribuir o dinheiro do ministério para o Brasil inteiro porque não se justifica que a cultura brasileira, tão diversa e rica, não tenha acesso a recursos públicos. E está muito concentrado em Rio e São Paulo".

Aí uma pessoa lá atrás levantou o braço, pediu a palavra e disse: "Não diga que é concentrado em Rio e São Paulo porque eu dirijo o maior centro cultural da Baixada Fluminense e nunca vi um tostão desse dinheiro --porque esse dinheiro é concentrado nos mesmos". O que é verdade. Era um processo de perda da razão do dinheiro público.

E aí o ProCultura viria para substituir esse modelo?
Tudo o que a gente fez foi precedido de muita discussão pública. Passamos dois, três, quatro, seis anos discutindo cada projeto de lei. E a Lei Rouanet exigiu muita discussão. Porque no processo de discussão você vai consolidando um esclarecimento e uma transparência, uma adesão, uma retificação do projeto inicial. É preciso discutir com artistas, criadores, produtores, empresários, gestores públicos e privados. E nós fomos muito coerentes com isso.

Então, demoramos, deixamos não só a Lei Rouanet, mas outros projetos de lei tramitando no Congresso. Teve um que foi aprovado recentemente, a Lei da TV a cabo, que não é da nossa autoria, mas teve nossa participação decisiva através da Ancine [Agência Nacional do Cinema], do ministro, no caso eu, apoiando, articulando. E é uma lei que vem dar uma grande contribuição nacional e na presença das telinhas.

O sr. acompanha a tramitação no Congresso da reforma da Lei Rouanet? Dizem que ela foi desvirtuada.
Porque recuperaram a proposta dos 100% [de isenção fiscal para financiadores privados, que não teriam de investir verba própria]. Isso já desvirtua [a reforma]. Mantém uma excrecência.

Produtores culturais alegam que a proposta da sua gestão, de obrigar empresas a investirem recursos próprios, afastaria os financiadores.
Se afastasse, não teria perda nenhuma, já que é 100% de dinheiro público. Estudei no colégio primário que zero menos zero é igual a zero. Mas não haveria isso, os maiores financiadores nos apoiaram.

Se é o proponente que necessita realmente do dinheiro e essas empresas de fato recuassem, não seria ele o prejudicado? Por que esse dinheiro não seria remanejado automaticamente para ele.
Eu quero lembrar que nós tínhamos um orçamento de R$ 217 milhões quando nós chegamos e saímos com um orçamento de R$ 2,3 bilhões. Ou seja, a gente estava fazendo a retificação. Não era só trabalhar a Lei Rouanet, a gente estava afirmando um projeto. Nós construímos um processo no Ministério da Cultura a partir de critérios públicos. Então, esse argumento é pobre.

No início da nossa gestão até poderiam dizer isso. "Esses caras vão acabar com uma coisa e não vão construir outra". Mas a gente fez o milagre dos peixes, a gente entrou com R$ 217 milhões, que era a média e o máximo até nós entrarmos, e deixamos R$ 2 bilhões. A Cultura nunca foi tão forte que nem no governo Lula.

O que mudou da sua gestão para a de Ana de Hollanda?
Não sou a melhor pessoa para avaliar. Estou longe. O Atlântico é mais do que uma poça d'água. Mas sei que se perdeu muita coisa. Vejo um nível [alto] de reclamação dos Pontos de Cultura. Parece que está bambo das pernas. Não por divergência, me parece que por dificuldade de implementar.

É falta de articulação política?
Eu não sou a melhor pessoa para dizer isso. Eu como ministro, digo ex-ministro, evito fazer comentários sobre o atual governo. Eu acho que não faltam críticos nem compreensão do que há de retrocesso. Eu sei que seria bom ouvir da minha boca, mas eu acho que sou a pessoa menos indicada para fazer essa observação.

Recentemente, o sr. falou a um blog que estaria mentindo se dissesse que estava contente com a atual gestão do MinC.
Eu acho que é um desastre. Isso é o que eu posso dizer porque já comentei num artigo de Idelber [Avelar, blogueiro e professor da Universidade Tulane, nos EUA].

Por que é um desastre?
É fácil constatar isso. É óbvio que há um retrocesso, um desinvestimento, a desestruturação de uma frente de trabalho importante. Não vi argumento sustentável que justifique o retrocesso do programa Pontos de Cultura.

A gestão atual do MinC apontou irregularidades nos editais desse programa lançados durante as gestões anteriores.
Não é verdade. Há gente contestando isso na Justiça. Quando não há boa vontade, e num Estado com pouco controle social como o Brasil, você faz e diz o que quiser.

O nome de Danilo Miranda, diretor do Sesc-SP, foi aventado em uma eventual substituição da ministra Ana de Hollanda. Já disseram que o problema dele é que não é mulher. O senhor acha que esse fator pesou na saída do sr. do MinC?
Não acredito. O que eu li foi o manifesto da Marilena Chauí [publicado na segunda-feira (19) no jornal "O Estado de S. Paulo"] e tem outro que eu não li. Se me chamassem, eu assinaria. Isso aí eu estou dizendo pela primeira vez.

*Por que há insatisfação com a gestão atual?
Porque, apesar de ser um governo de continuidade, houve uma ruptura inexplicável na área cultural. Há uma perda do que foi investido, das conquistas realizadas. Fui andar na rua em Salvador e vi pessoas pedindo: "Salve os pontos de cultura".

Qual é a ruptura mais gritante?
O projeto como um todo.

O sr. critica a falta de regulação do Ecad (que arrecada e distribui direitos autorais). Por que não mudou isso?
Porque não se recria [um sistema] facilmente. Vê a guerra que está agora. A transparência e a fiscalização do Ecad por um órgão são necessárias para garantir direitos dos artistas.

É preciso um órgão fiscalizador?
Sim, um órgão e um sistema de transparência para o próprio artista saber se está sendo lesado ou não.

O Ecad hoje está fora de controle?
Desde o governo Collor [1990-92].

O Ecad deveria ser regulado pelo governo?
Claro. Deveria ter obrigações de transparência em nome de quem eles cobram esse dinheiro.

O que foi feito durante a gestão do senhor para mudar esse quadro?
A Lei do Direito Autoral [na verdade, o texto ainda é um projeto de lei que está no Executivo após Ana de Hollanda reavaliar o texto elaborado durante as gestões Gil/Juca]. Ela foi modificada totalmente. Dizem aí nos blogs que há cópia de documentos do Ecad transformando em documento oficial. Não sei dizer porque não li os dois para comparar, mas vi que há uma suspeição.

Inclusive a ministra foi convidada para dar explicações no Senado. O senhor acha que a base governista não trabalhou para impedir isso?
Eu não sei o que houve. Mas de qualquer jeito eu fico triste porque foram 14 horas por dia de trabalho durante oito anos, de muita dedicação, uma escuta intensa de todo o Brasil, nós trouxemos para a política cultural os povos indígenas, os grupos culturais de favela, de periferia. Demos atendimento aos artistas de todo o Brasil, distribuímos recursos. E de repente, num processo de perda desse patrimônio acumulado.

O Brasil não vai se tornar uma grande nação realizando o crescimento da economia e colocando um pouco mais de dinheiro no bolso das pessoas. Isso é pouco. É fundamental, mas é pouco. É preciso garantir educação de qualidade para todos e garantir acesso pleno à cultura. Os números vocês devem conhecer porque eu repetia exaustivamente e não me esqueci. Pouco mais de 5% dos brasileiros entraram mais de uma vez em um museu, só 13% dos brasileiros vão ao cinema, só 17% compram livros, a média de leitura de livros é 1,7 per capita. Tão mudando aí o critério para ver se aumenta o número, mas isso não é bom fazer. Faziam na época da ditadura essas mágicas estatísticas.

Como é que o Brasil quer ser uma grande nação assim? Então, esse seminário [Fórum Internacional de Gestão Cultural: Para Além do Mercado, que será realizado em São Paulo entre hoje e sexta-feira], é fundamental, é uma discussão estratégica. Está todo mundo olhando para o Brasil. Às vezes eu acho que aqui de dentro não se tem noção da importância do país hoje no mundo. O Brasil hoje é um líder mundial, tem uma presença significativa e há uma expectativa, o mundo quer conhecer o Brasil. As artes plásticas brasileiras são consideradas de primeira linha no mundo. Os artistas são mais conhecidos lá fora do que aqui. Muitos. E a Bienal está ameaçada.

O que o sr. acha do MAM assumir o controle da Bienal?
Não sei. Mas seria um escândalo se deixássemos acabar a Bienal. É um patrimônio brasileiro. É o único evento globalizado a partir do Brasil. E coloca o país na ponta. As duas principais bienais do mundo são a de São Paulo e a de Veneza.

Essas dificuldades estão relacionadas à fiscalização de órgãos de controle. O ex-presidente Lula já reclamou bastante desses órgãos que, segundo ele, atrapalhavam o desenvolvimento do país. Há excessos na fiscalização?
Não existe excesso de fiscalização. Se existir, existe falta. O conflito entre o gestor e quem fiscaliza é normal. Às vezes quem fiscaliza não localiza exatamente onde estão os problemas e dificulta a execução de projetos importantes. No caso da Bienal, houve uma caracterização por parte do Ministério Público de que tinha havido uso indevido de recursos públicos sem a prestação de contas.

Mas a própria Bienal elegeu uma diretoria de oposição aos diretores anteriores. Eu fui ao Ministério Público e disse que seria um escândalo se a Bienal acabasse. Então faz um TAC [Termo de Ajustamento de Conduta] com a nova diretoria, a instituição está se propondo a resolver os problemas da gestão passada e garante a realização da Bienal. Eles fizeram uma ótima Bienal. Eu não acompanhei se eles cumpriram as exigências do Ministério Público ou não.

O senhor falou em continuidade. Existe uma continuidade de governo entre o ex-presidente Lula e a presidente Dilma e o senhor enxerga uma ruptura entre a gestão Gil/Juca e a de Ana de Hollanda...
Eu não. Mais de metade da torcida do Corinthians e acho que a torcida do Flamengo inteira.

Até que ponto a gestão da Ana de Hollanda não segue uma orientação do próprio governo Dilma? É uma gestão só da ministra e não do governo da presidente Dilma?
Acho que é cedo para dizer isso. Depende da maneira que a presidenta conduzir a questão.

O que a gente pode falar até agora?
Podemos falar que há uma dissintonia.

Hoje a presidente Dilma disse a jornalistas que a Ana de Hollanda fica no ministério.
Então pronto, ela fica. Eu não a ouvi dizendo isso, mas ela tem direito. Ela foi eleita, ela que se submeteu ao processo de gestão, ela que sabe se ela tem condições de fazer, com essas mesmas pessoas, uma reversão dessa política.

Em última instância, o governo é da presidente Dilma.
Não pode se estar trocando ministro a toda hora. Eu não sei o que passa na cabeça da presidenta, mas acho que é um direito dela.

O fato de manter a ministra sinaliza que a presidente concorda com a gestão?
Não. Talvez não. Não sei, estou muito longe para saber.

Você buscou se distanciar propositalmente?
Acho que um ministro não deve dar opinião sobre a gestão de outro. Acho deselegante. A política brasileira às vezes carece de elegância, de regra de civilidade.

Acha que a discussão acaba se tornando pessoal, e não política?
Já tem críticos em quantidade e qualidade suficiente, não me sinto motivado a participar desse processo.

Desde a passagem de bastão, o senhor já conversou com a Ana em algum momento?
Não, conversei antes. Depois que a presidenta Dilma ganhou a eleição, eu reiterei a orientação e tive uma reunião com ela, em dezembro [de 2010] já. Levei minha caderneta pessoal e li para ela 18 preocupações. Falei: preste atenção às leis que estão tramitando no Congresso, se vier alguma lei que tiver que ser modificada por discordância, faça isso publicamente, pois essas leis tiveram envolvimento muito grande mesmo. Preste atenção à Bienal. Precisamos apoiá-la para sair da crise. Falei dos Pontos de Cultura, da importância. Falei de João Gilberto. Precisamos apoiar João Gilberto na demanda de recuperar o controle do "Chega de Saudade", que é um patrimônio da cultura brasileira, e a empresa está fazendo mau uso dele. Era um caderno de anotações pessoais sobre pontos importantes do ano de 2011 para frente do MinC.

E quantos [dos 18] pontos você acha que foram correspondidos?
Não sei porque não estou acompanhando. Saí logo depois. Fui na Europa entre janeiro e maio três vezes, e maio eu comecei a trabalhar na Segib [Secretaria Geral Ibero-Americana, órgão da Cúpula Ibero-Americana de chefes de Estado e de governo, que reúne 22 países, Brasil incluso]. E foi bom ir longe. Não cabia mim, eu não exerço o papel de algoz, não é minha vocação.

A programação do fórum fala da gestão cultural para além do mercado. O que de concreto vai ser discutido nesses dias?
O papel do poder público, do Estado, na garantia do desenvolvimento cultural. O mercado só permite acesso a quem tem possibilidade de poder aquisitivo para comprar o CD, comprar o livro. Inclusive, li ontem, na imprensa espanhola, a seguinte frase: "Em todo o mundo ocidental, o desenvolvimento cultural tem no Estado a principal garantia de acesso". Houve uma época, década de 90, quando houve demonização do Estado, se acreditava que o Estado deveria manter distância, mercado era mais eficiente. Na verdade isso é uma falácia. Brasil precisa que Estado assuma sua responsabilidade. É preciso garantir através dos museus, dos centros culturais, dos financiamentos da produção.

E Vale-Cultura [projeto em tramitação no Congresso que prevê o repasse do valor mensal de R$ 50 a trabalhadores com rendimento de até cinco salários mínimos] seria um dos grandes pontos de acesso?
É, o Vale-Cultura seria.

Por que é que o projeto parou no Congresso?
Os projetos de origem do Executivo, para tramitar, precisam de acompanhamento da base política. Se não houver incentivo do ministério, dificilmente anda.

A defesa da ministra Ana de Hollanda contra a fiscalização do Ecad, como órgão privado, isso é uma visão de governo ou pessoal?
Como é que vou saber se não passei pelas reuniões de governo?

A então ministra Dilma tinha essa visão de Estado mais fraco em relação a órgãos privados?
Eu não acredito. Acho que o mundo contemporâneo, as relações privadas têm algum nível de regulação pública. Por exemplo: quando eu era menino, eu ouvia com muita frequência: briga de marido e mulher, ninguém mete a colher. Hoje, vá o marido bater na mulher pra ver que processo ele tem que... Ou seja, a opressão do macho sobre a mulher no ambiente doméstico evidentemente que são relações privadas, mas a sociedade coíbe esse tipo de prática. Não existe lugar nenhum do mundo que aconteça o que acontece no Brasil depois do governo Collor.

Desafio alguém a encontrar um lugar no mundo onde se arrecade dinheiro em nome de terceiros sem obrigações de transparências para esses terceiros, no caso de artistas e criadores, e não tenho um acompanhamento que se arrecade um volume que excede e muito a R$ 300 milhões por ano. E não ter nenhum mecanismo público.

Você falou que desde o Collor acontece. Mas por que o Brasil tem há tanto tempo esse ambiente que não floresceu em nenhum lugar do mundo?
Olha, você sabe que aconteceram coisas do arco da velha no governo Collor. Foi o auge da ideia de que o Estado é um ambiente caduco, que não se justificava mais, que o mercado se autorregularia. Foi um momento de deslumbramento com essas teses. E eles vieram para cima da gente com agressividade enorme, mas é verdade.

Que agressividade?
Verbal. Pegue os jornais da época que você vê a coragem que a gente teve de comprar todas as brigas. Qualquer que seja o sistema de regulação, o artista tem de ser pago. Pessoa de qualquer outra atividade é paga pelo seu trabalho. E direito autoral é a forma de reconhecimento do trabalho criativo e o retorno do artista. Isso é inquestionável, e nós não seríamos doidos, nem malucos, nem Gil esquizofrênico de negar esse direito básico.

Há um dualismo no debate que coloca a gestão da Ana como pró-Ecad e as gestões Gil/Juca como frouxas na defesa dos direitos autorais.
A internet veio para ficar. Não se pode colocar o direito do autor em contradição com o de acesso à cultura. Tem que buscar harmonização.

Você acha que o retorno do anteprojeto dos direitos autorais ao Executivo vai retardar ainda mais a discussão?
Não sou bom analista porque estou longe, desinformado, conscientemente distante. E acho que já tem crítica suficiente. Não sinto que está passando incólume a destruição do que nós fizemos. Pelo contrário. Aquele manifesto assinado por pessoas proeminentes da cultura, o Viveiros de Castro. É um documento, uma peça histórica. Se me chamassem, eu assinaria com a maior tranquilidade.

Há uma tropa de choque muito forte que milita em seu nome...
No meu nome, duvido. Você sabe que parte da área cultural queria que eu continuasse. Mas não é tropa de choque, não tem um nível de organização, pelo contrário. Fiquei um ano completamente isolado, sem partido, nem nada. Me filiei agora mais para me reinserir. Não quis fazer antes de sair para não sinalizar que era algo tático para me cacifar. Tive dúvidas se voltaria a me filiar a partido, qual partido. PSB, PT... Optei por me filiar ao PT.

Você se filiou ao PT pensando no futuro.
Evidente. A língua portuguesa separa o ser e estar. Algumas línguas não fazem essa separação. Eu fico imaginando como é que se viram para ter uma precisão ao se expressar, por exemplo, nesse caso. Estou lá, mas sou daqui. Passei quase oito anos entre Chile e Europa, fui exilado.

Pensando em 2012 e 2014?
Sei lá quando. Tenho filho de um ano, isso me ajudou a ficar um pouco em casa.

Você gostaria de ter continuado no ministério?
Na época, disse que sim. Não dá para negar isso.

Em um texto publicado na Folha em maio do ano passado, a colunista Eliane Cantanhêde afirmou que o senhor teria ciúme do governo atual.
Ela tem poder paranormais de saber o que eu penso? Isso é uma irresponsabilidade dela. Ela não tem nenhum elemento para dizer isso. Uma profissional não deveria trabalhar com esse nível de subjetividade. Apoiei Dilma publicamente, comprei uma briga no partido em que militei por 23 anos, divergi da candidatura de uma pessoa pela qual tenho maior respeito, que é Marina. Não sei de onde ela tirou isso, pelo contrário.

Tenho tido elegância acima da média, silêncio obsequioso com todas as diferenças que possa ter, e são diferenças programáticas com o atual governo. Uma profissional não tem direito de ser tão irresponsável quanto ao dizer isso. O que é ciúme? É um sentimento que você tem quando se sente ameaçado. Você só se sente ameaçado por quem você avalia que tem condições de superar o que você é, seja na relação afetiva ou não. Não me parece que seja um sentimento possível de eu ter.

O sr. fala que, até por uma questão de elegância do cargo, não emite opinião. Mas, ao longo dessa entrevista de 59 minutos, o sr. acha que não emitiu nenhuma opinião?
Não, não é isso. Eu não sou avalista, não julgo, não tenho capacidade porque estou longe, não tenho informações suficientes. Vocês, ao fazerem as perguntas, me revelam coisas que eu não sei, como está o projeto de lei, que foi incluído tal coisa, que cortou tal ponto. Nada disso eu sei. O que eu posso dizer é que está havendo um retrocesso, que houve um abandono de um projeto que foi construído durante o governo do presidente Lula em muitos pontos fundamentais.

Então, sobre isso eu tenho opinião. Isso é um desastre. Num governo de continuidade você fazer um desmonte de uma política bem-sucedida, sem uma justificativa? Agora, a partir daí eu não posso ir. Porque não tenho vontade, porque não conheço, porque estou distante conscientemente do dia a dia do ministério. Entendeu a diferença? Não é que eu não tenha opinião, eu tenho limites para emiti-la. Então, tentar extrair isso de mim, fazer de mim um crítico é uma forçação de barra. Eu sinto que a imprensa às vezes faz isso, mas não é elegante.

Posted by Guilherme Nicolau at 11:41 AM

Secretaria de Cultura do Rio revê critério de edital por Roberta Pennafort, O Estado de São Paulo

Secretaria de Cultura do Rio revê critério de edital

Matéria de Roberta Pennafort originalmente publicada no caderno Cultura do Estado de São Paulo em 21 de março de 2012

Depois de confusão na fila, ordem de chegada não valerá mais

Rio de Janeiro - Diante da confusa seleção de projetos culturais mediante ordem de chegada, a Secretaria de Cultura da cidade do Rio decidiu rever o esquema de seu edital 2012. Os documentos referentes a todos os projetos serão recebidos, independentemente de quando forem entregues. O novo prazo: da segunda à quarta-feira da semana que vem.

Dessa forma, os produtores culturais não vão mais precisar dormir na fila, como fizeram no último fim de semana. Eles já têm patrocínios acertados para seus projetos, mas as empresas patrocinadoras liberam o dinheiro apenas mediante o o.k. da Prefeitura, pós-análise de documentos.

Amanhã, saem publicados no Diário Oficial os novos procedimentos de entrega dos Termos de Compromisso e Adesão, necessários à participação no edital da Lei Municipal de Incentivo à Cultura. A principal demanda dos produtores ainda está sob estudo: o aumento do teto da renúncia do Imposto Sobre Serviços (ISS), atualmente em R$ 14,8 milhões.

Posted by Guilherme Nicolau at 11:31 AM

março 20, 2012

Ministra nega saída de Ana de Hollanda da Cultura por Tânia Monteiro, O Estado de São Paulo

Ministra nega saída de Ana de Hollanda da Cultura

Matéria de Tânia Monteiro originalmente publicada no caderno Política do Estado de São Paulo em 20 de março de 2012.

Titular do MinC enfrenta críticas de artistas, intelectuais e militantes, que pedem publicamente sua saída da pasta; queixas vão de despreparo à envolvimento com instituição suspeita de fraude

BRASÍLIA - O forte abraço dado nesta terça-feira, 20, pela presidente Dilma Rousseff na ministra da Cultura, Ana de Hollanda, no encerramento da cerimônia de lançamento do Programa Nacional de Educação no Campo (Pronacampo), acabou provocando uma rápida intervenção preventiva de outra ministra, a de Comunicação Social da Presidência da República, Helena Chagas. Imediatamente após o abraço, Helena fez questão de declarar para a imprensa que Ana de Hollanda "não está saindo do governo", antecipando-se a quaisquer novas especulações que o abraço poderia suscitar sobre a saída da titular da Cultura.

A mais recente baixa no primeiro escalão do governo Dilma foi a de Afonso Florence, que deixou o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) este mês sob críticas a respeito do ritmo que imprimiu à reforma agrária, para ser substituído por Pepe Vargas. Ambos são petistas. Ana de Hollanda também já enfrentou - e enfrenta - rumores de que estaria prestes a ser substituída por Dilma Rousseff.

Desde o final da semana passada, manifestos de artistas e intelectuais começaram a circular pedindo abertamente sua substituição à presidência Dilma Rousseff. Os signatários são críticos da gestão de Ana e argumentam que a ministra é despreparada para ocupar o cargo.

A ministra acumula momentos de mal-estar desde o primeiro ano de governo e o mais recente envolve denúncias de que o ministério teria agido em favor do Escritório de Arrecadação e Distribuição de Direitos (Ecad) em um processo no qual a instituição é acusada de cartelização e gestão fraudulenta. O Ecad é alvo de CPI no Senado, que deverá propor o indiciamento de quatro dos seus diretores por formação de quadrilha, cartel e apropriação indébita.

Posted by Guilherme Nicolau at 3:23 PM | Comentários (1)

Diretor do Reina Sofía inaugura nova fase no museu por Fabio Cypriano, Folha de São Paulo

Diretor do Reina Sofía inaugura nova fase no museu

Entrevista de Fabio Cypriano originalmente publicada no caderno Ilustrada da Folha de São Paulo em 20 de março de 2012.

Um dos museus mais importantes da Europa, o Reina Sofía, em Madri, que tem entre suas obras-primas nada menos que o "Guernica", de Pablo Picasso (1881-1973), vem passando por uma revolução.

Desde 2008, quando Manuel Borja-Villel assumiu sua direção, o Reina ganhou uma nova e arrojada disposição para seu acervo. Pinturas valiosas de Mark Rothko (1903-1970) são exibidas ao lado de produtos da indústria cultural, no caso o filme "Janela Indiscreta" (1954), de Alfred Hitchcock (1899-1980). "Ambos são sobre visualidade", disse o diretor à Folha, numa pausa na montagem da mostra "Lygia Pape - Espaço Imantado", na Estação Pinacoteca.

A íntegra do texto está disponível para assinantes do jornal e do UOL, empresa controlada pelo Grupo Folha, que edita a Folha.

Villel, vem imprimindo à instituição uma série de transformações. Contrário à postura "colonial" dos museus do século 18 e 19, ou "pós-colonial" do atual mundo globalizado, ele está criando uma nova identidade ao museu espanhol, que inclusive se baseia no diálogo com a produção brasileira.

Leia a seguir, a íntegra da entrevista na qual Villel esclarece suas propostas, concedida à Folha na última sexta (16), na Estação Pinacoteca, onde conferia a montagem da mostra "Lygia Pape. Espaço Imantado", na qual é um dos curadores.

Folha - Quando esteve à frente da Fundação Tàpies, entre 1990 e 1998, você criou grandes vínculos com a arte brasileira, certo?
Manuel Borja-Villel
- Sim, lá organizamos a primeira grande mostra internacional de Hélio Oiticica, em 1992, e depois de Lygia Clark, em 1996.

E o que o levou a observar a arte brasileira, e latino-americana, em geral?
Parte, como tudo, de uma história pessoal e também de uma ideia acadêmica. A história pessoal era trabalhar em museu monográfico. Em Barcelona, como na Espanha, não havia museus de arte moderna. E artistas como Miró, Tàpies e Picasso, quiseram dar algo à cidade, ou seja, havia um sentido positivo. Mas havia um problema que um museu monográfico, de certo modo, sempre possui e é referência ao nome próprio, ao autor, mesmo que a Fundação Tàpies fosse muito, muito aberta. Mas, mesmo assim, era algo que me incomodava. A partir daí fiz uma exposição que se chamava "Os limites do Museu", que era um questionamento da própria instituição.

E esse questionamento continuou e é daí que surge o desenvolvimento intelectual: da ideia de que os museus são estruturas do século 18 e 19, que tinha uma posição colonial e que era, basicamente, o museu que acumulava tesouros, como peças egípcias. Essa posição colonial, nas últimas décadas, se transformou num neocolonialismo, que tem a ver com os efeitos da globalização e com a transformação da cultura em um elemento de consumo, com a troca da experiência estética por uma experiência meramente de consumo.

E esse é um questionamento que sigo até agora, refletindo sobre as bases da instituição: no questionamento de como se coleciona, por exemplo. Uma das coisas que questiono muito é que museus estão baseados na ideia de propriedade, na acumulação. Mas, especialmente hoje em dia, creio que os museus deveriam estar baseados no relato, em compartilhar, em perceber que, no mundo atual, quem recebe também dá.

A partir dai, isso também implica em refletir como se criam os relatos. Nesse questionamento, se dá conta de que os relatos que temos da modernidade são eurocêntricos. Por isso, é necessário questionar a modernidade e a interpelação tem que ser externa. Na época dos romanos, a escravidão era algo normal. Então só de fora que se percebe que algo considerado normal, não é, em verdade, tão normal. Foi a partir daí que passei a me interessar pela condição latino-americana em sua excentricidade, em estar fora, como um elemento de interpelação, de questionamento, não apenas pela arte latino-americana, mas para entender a própria arte europeia.

E qual o papel de Hélio Oiticica nessa história?
A mostra dele, em 1992, foi um momento de inflexão. Ele usava termos como "Crelazer" e vários outros, porque ele mesmo dizia, claramente, que conceitos ocidentais como minimalismo ou pop não eram adequados e necessitava de um vocabulário próprio. Quando Lygia Clark fazia terapia, isso não era possível num museus tradicional, era preciso um espaço distinto. Então, a partir de uma série de mostras com Oiticica, Clark e ainda Marcel Broodthaers, que foi o primeiro, culminando com "Os Limites do Museu", desenvolvemos todo um questionamento sobre os museus, que sigo fazendo até hoje. Esse questionamento gira em torno de certos temas: como narrar, como arquivar, qual é o espaço de mediação nos edifícios e como se atende ao público.

Em 1992, Oiticica era um desconhecido na Europa...
Eu quase fui demitido... Recebi críticas de todo tipo. E isso é curioso porque, agora, não se pode fazer uma exposição "in" se não há Lygia Clark ou Hélio Oiticica. Mas, em 1992, as críticas foram muito duras! Diziam que ele era um artista menor...

E como você chegou a ele?
Foi ao dar-se conta de que há outras realidades. De que no Brasil, Venezuela, Argentina, isso é, na América Latina, a história é cheia de derivas, desvios, viagens, portanto muito distinta daquela que nós, europeus, construímos como linear, sem fissuras. (Jesús Rafael) Soto trabalha na Venezuela e Paris, assim como Clark. Essa complexidade tem a ver com a viagem, com a deriva, a mutação, a antropofagia, e a não diferenciação entre erudito e popular, que é uma separação, falsa, construída no mundo ocidental. Então, ai se dá conta que a modernidade democrática, a modernidade não hegemônica é a modernidade do sul.

Mas, é preciso tomar cuidado para não cair na própria armadilha do norte e não transformar Lygia Clark em santa, ou criar o santo Hélio Oiticica, porque ai estaremos criando outro cânone. Por isso é preciso questionar essa moda de exposições com Clark e Oiticica, porque é impressionante a capacidade do sistema em absorver todo é ilimitada. É preciso dar-se conta, e por isso é importante a mostra de Lygia Pape, em criar novos termos, novas palavras, novas formulas para entender a obra de arte, senão vamos cair em outro cânone.

Mas as famílias desses artistas tem contribuído muito para colocar esses artistas...
Em um pedestal! Porque o pedestal, e isso não é uma teoria nova, o pedestal significa a aura, que significa o fetiche, o fetiche representa a mercadoria e a mercadoria é o dinheiro! É lógico e coerente, mas totalmente contrário à proposta desses artistas.

Então, como expor esses artistas?
Como fazer? Isso é o que estamos realizando a partir da coleção do Reina Sofia. E estamos fazendo em vários níveis, o que é uma revolução, porque é uma grande ruptura. Primeiro, o relato. E o relato não é por disciplinas, porque esse é um conceito moderno, mas está cheio de transversalidades, onde, por exemplo, há um Rothko e, ao lado, "Janela Indiscreta", de (Alfred) Hitchcock, afinal ambos são sobre visualidade. James Stewart nunca toca nada, na verdade apenas uma vez em Grace Kelly, mas é sobre a espionagem, a Guerra Fria, então, há várias camadas.

Outra forma é criar microrrelatos, ao contrário de uma história universal. Antes das obras que acabo de citar, há um trabalho de Jorge de Oteiza (1908 - 2003), que, quando vem ao Brasil (1957), há uma deriva da modernidade. Isso implica também em outras cartografias, cartografias de caminhos que não levam a nenhum lugar, com caminhos que vão de Madri a São Paulo, sem passar por Nova York ou Paris. Ou de São Paulo a Valparaiso.

E há elementos de oralidade, porque ao usar todos esses microrrelatos, nos quais não há um elemento único, mas uma multiplicidade de elementos, há uma característica oral, que é muito distinta dessa coisa platônica, das coisas fixas e isso tem a ver com a ideia de narrador do Walter Benjamin. Isso é, você conta as histórias, mas os espectadores precisam memorizá-las e quando o fazem, elas a reconstroem e as estão recriando.

Bom, isso é um aspecto. Outro aspecto ligado a esse é entender o museu não como um templo clássico do século 19 e nem tampouco um edifício de marca, como um Frank Gehry ou um Richard Meyer, mas como uma cidade. Em uma cidade não se tem uma experiência linear, é possível perder-se, há derivas , descobertas, e isso ocorre no Reina. É um grande museu, como uma cidade, uma espécie de caos entre aspas.

Mas é a sua gestão que o tornou assim, o edifício poderia ter um percurso linear...
Sim, mas não me interessa um percurso linear porque a história não é assim. Outro aspecto que estamos desenvolvendo é que haja a experiência estética do "flaneur, uma experiência que seja contemplativa, outra discursiva, de debates, e outra mesmo terapêutica, se houver abertura.

Finalmente, estamos trabalhando ainda sobre a ideia de um museu que não seja colonial, que não se baseie na acumulação de tesouros, que não seja um museu europeu com seu comitê internacional de aquisição de arte latino-americana, comprando obras para acumular tesouros. Estamos entendendo o museu não como proprietário mas como depositário e como uma rede, um lugar que se conecta com outros. E isso estamos fazendo com companheiros latino-americanos. Estamos gerando arquivos na América Latina: no Chile, no Uruguai, na Argentina. Os arquivos crescem ai e criamos uma rede, uma rede onde todos são importantes, não importa o tamanho ou a representação ou a organização institucional. Com isso, todos ganhamos, porque a riqueza é compartida. Não é uma exploração, uma posição colonial, que ainda por cima é limitativa, porque quando se tem algo, também se representa algo. No MoMA, quando se apresenta arte latino-americana é a visão deles, independente da abertura que ela tenha.

Então, o que você está fazendo é o oposto do Museu de Belas Artes de Houston que está comprando não só arte latino-americana, como documentos sobre arte...
Sim porque o que fazemos é uma pluralidade de arquivos, onde não há um sistema de classificação, mas muitos. Onde não há uma voz, mas uma multiplicidade de vozes, com o qual se cria um relato que é realmente plural. Creio que essa é a grande ruptura desse momento.

E isso é o que no site do museu se chama Rede Conceitualismos do Sul?
Sim. Esse é o núcleo da rede.

Mas há outras duas redes apoiadas pelo museu...
Sim. Há uma outra rede chamada Outra Institucionalidade, que tem a ver com a teoria do comum, que tem a ver com a ruptura da ideia tradicional da dialética entre privado e público. Mas isso, que é uma ideia burguesa, por sorte ou azar, não é bem assim. De fato, o privado acaba sendo tudo, absorvendo tudo. O privado tem a ver com a espoliação do trabalho cognitivo. Quando se faz uma pesquisa, essa pesquisa acaba sendo utilizada pela Microsoft, por exemplo. É uma espoliação permanente do trabalho intelectual ou artístico. E, em geral, os que menos recebem são os artistas, ou certos artistas, e os pesquisadores.

Por outro lado, quando há uma estrutura pública, ao final o público acaba gerindo o global de um modo que acaba sendo estatal e não público. Por isso, é preciso uma nova categoria que é a do comum. A ideia é que tudo volte a todos. E, como é algo novo, não há modelos, é algo que se constrói. E essa rede tem a ver com essa nova forma de pensar a institucionalidade e questionar a propriedade privada, a precariedade do trabalho, onde os museus são os primeiros culpados. Quando um curador faz uma pesquisa de um artista que estava totalmente desconhecido e fazemos um seminário sobre ele, sempre vai haver alguém do mercado, que aparece e, em dois dias, ele vai oferecer ao museu a obra daquele artista pelo dobro do que valia antes!

Como um museu público, como o Reina Sofia, consegue ter uma ação tão radical, se o governo espanhol é tão conservador, não surgem problemas?
Até o momento não porque há seis anos, para nossa sorte, foi feito um pacto de Estado. Antes o diretor do museu era um cargo político, mas agora, o Museu do Prado, a Biblioteca Nacional e o Reina Sofia tem autonomia. Eu fui eleito por um grupo independente e tenho um contrato.

Mas quem paga a conta é o Estado?
O que passa é que, com a crise, estamos mudando. E, frente às crises, há duas saídas: a melancolia, que é a mais comum. E é mesmo como o filme de Lars Von Trier, que se chama "Melancolia", e é a espera da morte. Eu me nego à melancolia, ao lamento de uma época da Espanha que se tinha muito dinheiro. E isso se acabou, provavelmente para sempre. E por isso estamos buscando novas fórmulas, uma fórmula mista, privado e publica, e, ao mesmo tempo, criando uma fundação que cubra toda Ibero América. Creio que a crise implica numa mudança de mentalidade, inclusive de identidade. A identidade tradicional de nação perdeu sentido. A identidade tradicional era, como os museus, de representação: a identidade explica quem você é, brasileiro, espanhol, catalão. Isso se acabou. Identidade, agora, é algo em fluxo. E essa ideia em fluxo tem a ver com regiões muito mais amplas, como o mundo ibero-americano, que inclui a península ibérica e toda América Latina.

E temos que ser conscientes que essa realidade existe em nível econômica. Normalmente, sempre pensamos que as ideias artísticas vão a frente da economia, mas, ultimamente, o mundo financeiro vai muito mais rápido. A realidade do sistema econômico é conseguir o máximo de benefício com o mínimo investimento. Então, depende de nós que pensemos numa realidade de acordo com nossos princípios, princípios de intercâmbio, de criar um espaço democrático, um espaço do que é comum.

A força desse sistema econômico, de fato, parece refletir no atual sistema da arte. Enquanto artistas como Lygia Pape, Lygia Clark e Hélio Oiticica tinham uma proposta artista muito radical, há 30 anos atrás, isso não se vê agora...
Por isso me interessa tanto o que se passa na Europa, porque é um dos meus passados, nós todos temos vários passados, não apenas um, todos somos de muito lugares. Mas um elemento que me interessa muito no mundo ibero-americano, em contraposição com a China, por exemplo, é que a China está copiando a parte mais perversa do mundo ocidental que é o mercado. Já na América Latina, por conta das ditaduras, a arte criou seus próprios circuitos, suas próprias formas de relação, de intercâmbio. E como há essa tradição na América Latina, não podemos perder isso de vista, mas agora há uma fascinação, que é lógica, mas que é uma fascinação psicológica, de um certo erotismo pela fama. E as ideias progressistas, especialmente na Europa, estão perdendo seu lugar. Então temos que aprender com essas estruturas do passado.

Posted by Guilherme Nicolau at 1:11 PM

A terceira via das artes por Fabio Cypriano, Folha de São Paulo

A terceira via das artes

Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada no caderno Ilustrada da Folha de São Paulo em 20 de março de 2012.

Diretor do Reina Sofía, Manuel Borja-Villel, inaugura nova fase no museu, com prioridade para o universo ibero-americano

Um dos museus mais importantes da Europa, o Reina Sofía, em Madri, que tem entre suas obras-primas nada menos que o "Guernica", de Pablo Picasso (1881-1973), vem passando por uma revolução.

Desde 2008, quando Manuel Borja-Villel assumiu sua direção, o Reina ganhou uma nova e arrojada disposição para seu acervo. Pinturas valiosas de Mark Rothko (1903-1970) são exibidas ao lado de produtos da indústria cultural, no caso o filme "Janela Indiscreta" (1954), de Alfred Hitchcock (1899-1980). "Ambos são sobre visualidade", disse o diretor à Folha, numa pausa na montagem da mostra "Lygia Pape - Espaço Imantado", na Estação Pinacoteca.

Ele é um dos curadores da exposição -que chega agora ao país, após passar pelo Reina e pela londrina Serpentine no ano passado- que posiciona Pape como uma das principais artistas brasileiras.

Reunir Rothko e Hitchcock faz parte de uma das estratégias do espanhol para repensar a função do museu. No caso, ele chama essas junções de "microrrelatos".

Com isso, busca estimular novas possibilidades de leitura para o visitante. Assim, um dos grandes expoentes da arte abstrata americana do pós-Guerra, Rothko, passa a ser associado à espionagem e à Guerra Fria, temáticas presentes em "Janela Indiscreta". "É uma ruptura", diz ele.

No entanto, é não só na disposição do acervo que o Reina vem sendo transformado mas também na própria condição do colecionar.

Para o diretor, "os museus estão baseados na ideia de propriedade, de acumulação". "No mundo atual, quem recebe também dá, ou seja, o visitante pode recriar a narrativa proposta pelo curador nessas junções", explica.

PARTILHA

Para tanto, o diretor engajou o museu em três redes (organizações não centralizadas de troca de informações com pessoas ou instituições). Uma delas, chamada "Outra Institucionalidade", visa "a ruptura da dialética entre privado e público", diz ele. "Existe uma nova categoria que é a do 'comum', a ideia é que tudo volte a todos. E, como é algo novo, não há modelos."

Outra das redes apoiada pelo Reina é o site "Conceitualismos do Sul". Nele, são armazenados relatos sobre arte nos países latino-americanos. Segundo Villel, organiza-se uma "pluralidade de arquivos, em que não há um só sistema de classificação, mas muitos." Com isso, ao invés de concentrar informações, o museu as descentraliza em regime colaborativo.

A postura é contrária à do Museu de Belas Artes de Houston (EUA), por exemplo, que compra documentos de arte latino-americana.

"Entendemos o museu como depositário, um lugar que se conecta a outros", explica.

BRASILEIROS

A mostra de Lygia Pape (1927-2004), inaugurada no sábado, é apenas uma das muitas mostras de brasileiros com as quais Villel esteve envolvido. "Depois do Guy Brett [crítico e curador inglês], nos anos 1970, ele é a figura mais importante para a divulgação da arte brasileira", diz Marcelo Araújo, diretor da Pinacoteca do Estado.

Villel, quando foi diretor da Fundação Tàpies, em Barcelona, organizou grandes mostras retrospectivas de Hélio Oiticica, em 1992, e Lygia Clark, em 1996.

Foi a partir da obra deles, no entanto, que o espanhol desenvolveu sua postura crítica em relação aos museus.

"Os relatos que temos da modernidade são eurocêntricos. Por isso, para se questionar a modernidade, a interpelação tem que ser não europeia", diz. Ao conhecer as propostas de Oiticica, Clark e Pape, que se recusavam a usar termos como pop arte e minimalismo, Villel teve seu momento eureca: "Passei a me interessar pela visão estrangeira latino-americana."

No próximo ano, o museu receberá uma retrospectiva do artista Cildo Meireles, com curadoria assinada pelo português João Fernandes, que deixou o Museu de Serralves recentemente para trabalhar no Reina.

"O João inaugura uma nova fase no museu, com prioridade para o universo ibero-americano", diz Villel.

Com isso, o diretor busca uma nova vocação para o museu: "Identidade, agora, é um fluxo. E essa ideia em fluxo tem a ver com regiões muito mais amplas do que a Espanha, como o mundo ibero-americano, que inclui a península ibérica e toda a América Latina".

Posted by Guilherme Nicolau at 12:12 PM

O MAM tem a força por Camila Molina, O Diário

O MAM tem a força

Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno D+ do jornal O Diário em 20 de março de 2012.

O Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo foi confirmado ontem como a instituição realizadora da 30ª Bienal de São Paulo, a ser inaugurada em setembro. O Ministério da Cultura (MinC) anunciou em nota a escolha do museu para se tornar o proponente legal do evento.

"Deliberou-se pela maior tradição do Museu de Arte Moderna, pesando inclusive o fato de essa instituição ter sido a realizadora das primeiras edições da Bienal", afirmou o governo federal.

"Vamos atender com todo o empenho à solicitação do Ministério da Cultura para contribuir com a Bienal. O evento é estratégico para o País, e o MAM não poderia deixar de apoiar a fundação e seu presidente, Heitor Martins, que à frente da sua equipe realiza um importante trabalho de recuperação, já evidenciado na última edição da mostra. Havendo reais possibilidades técnicas de execução, o MAM ocupará, com imenso prazer, o papel de correalizador do evento", disse Milú Villela, presidente do museu.

Inicialmente, o Ministério da Cultura havia indicado o MAM, o Instituto Tomie Ohtake e a Pinacoteca do Estado para apresentarem propostas para assumir a 30ª Bienal de São Paulo, uma vez que a Fundação Bienal de São Paulo está com suas contas bloqueadas - 13 convênios firmados pela instituição entre 1999 e 2007 estão sendo questionados judicialmente. A Pinacoteca se retirou do processo no início do mês.

"Tendo em vista que a Fundação Bienal de São Paulo encontra-se impedida de operar os recursos de incentivo fiscal da Lei n.º 8 313/1991 (Rouanet), o MinC buscou uma solução para tornar exequível a 30.ª edição da Bienal de São Paulo, prevista para ocorrer no segundo semestre deste ano. Tal solução não acarretará interrupção dos processos de prestação de contas em apuração", esclarece a nota do MinC.

"Por meio de sua Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura, elaborou a Nota Técnica n.º 0116/2012, em 16 de fevereiro de 2012, propondo a alteração de proponente, para uso dos recursos de incentivo à cultura. A nota foi analisada pela Consultoria Jurídica do MinC, órgão da Advocacia Geral da União, o que resultou no Parecer n.º 133/2012, de 22 de fevereiro de 2012, favorável à troca de proponente, o que deverá ocorrer nos limites da lei."

Os R$ 12 milhões que já haviam sido captados pela Bienal antes de suas contas terem sido bloqueadas, em 2 de janeiro, vão ser transferidos para o novo proponente. A mostra tem orçamento estimado entre R$ 20 milhões e R$ 21 milhões.

"O importante é garantir que o evento ocorra a cada dois anos e realizar esse encontro histórico entre o MAM e a Bienal de São Paulo", afirmou José do Nascimento Junior, presidente do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), instituição vinculada ao Ministério da Cultura. "A possibilidade de ter o MAM-SP como parceiro é um grande estímulo.

O apoio de Milú Villela, uma grande ativista da cultura brasileira, e dos seus colaboradores, será vital para garantirmos a continuidade da Bienal. Com essa parceria, esperamos superar esse grande desafio", afirmou Heitor Martins, presidente da Fundação Bienal de São Paulo.

Posted by Guilherme Nicolau at 11:49 AM

Território ocupado pela arte por Dalviane Pires, Diário do Nordeste

Território ocupado pela arte

Matéria de Dalviane Pires originalmente publicada no Caderno 3 do Jornal Diário do Nordeste em 20 de março de 2012

O projeto Perpendicular reúne vários artistas de Fortaleza e Belo Horizonte no pensar da cidade

O espaço é de experimentação e o ponto de encontro é a própria cidade. Ou "cidades", aquelas - em um sentido amplo - que moram no imaginário/trabalho de cada artista. De hoje até 25 de março, Fortaleza recebe o projeto "Perpendicular Fortaleza", criado pelo artista visual, pesquisador de arte e performer mineiro, Wagner Rossi Campos.

O projeto convida outros cinco artistas, sendo três locais - Yuri Firmeza, Uirá dos Reis e Sabyne Cavalcanti - e mais dois de Belo Horizonte - Fernando Ancil e Raquel Versieux -, para, nos próximos dias, trocarem experiências artísticas por meio de reflexões sobre a cidade.

O projeto, que foi selecionado pelo Programa Rede Nacional Funarte Artes Visuais - 8ª edição, propõe vários diálogos estéticos e éticos entre os espaços, contribuindo para uma reflexão sobre território, espaços de circulação, convívios urbanos e centros difusores de arte e cultura.

Parte da programação que é aberta ao público acontecerá no Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBNB), a partir de amanhã, 21. Outra parte deve acontecer nas ruas mesmo, de acordo com os resultados da residência desses artistas.

Wagner Rossi explica que o projeto parte do desenvolvimento de trabalhos individuais dos artistas convidados e que não existem regras, sendo interessante acompanhar o andamento dos encontros pelo blog http://www.perpendicular-fortaleza.blogspot.com.

"Encontro experimental é processual, não tem definição prévia muito rígida. É uma ocupação de território. É um projeto que cria um encontro inesperado e novo entre esses artistas, o que não poderia acontecer se não fosse ´perpendicular´", diz justificando o nome do projeto.

As cidades de lá

Perpendicular já foi realizado em outras cidades. No exterior, passou por Berlim, na Alemanha, e por Bilbao, na Espanha. No Brasil, Rio de Janeiro, Maceió e Belo Horizonte, nesta última com duas edições: "Perpendicular cenário # ambiente" e "Perpendicular Casa e Rua", que também contou com a participação de artistas do Ceará.

"Wagner havia me convidado para o Perpendicular em BH, juntamente com Solon Ribeiro e Artur Ribeiro, de São Paulo. Construímos uma casa com tijolos feitos de pão. Não cheguei a ir, pois tinha outro compromisso, mas Solon e Artur participaram", conta o artista Yuri Firmeza, que já morou em Belo Horizonte e que foi parceiro de Wagner Rossi na escolha dos artistas locais convidados. Foi o próprio Yuri quem indicou Uirá dos Reis e Sabyne Cavalcanti, por serem artistas com um trabalho voltado para as problemáticas da cidade onde produzem.

"Logo pensei em trabalhos que me instigam. Uirá escreve muitos poemas que transpassam uma relação com Fortaleza. Ele mora em Messejana, então é uma outra Fortaleza. Além da vertente poética, Uirá mescla outras linguagens, produzindo paisagens sonoras e também como realizador em cinema", diz Yuri.

Da obra de Sabyne, Yuri destaca a relação com questões ligadas à natureza sem um teor assistencialista ou panfletário. "Sabyne atua na interseção entre o natural e o artificial, corpo e natureza, cidade e natureza. Ela não pensa essas questões de maneira óbvia". O "Perpendicular Fortaleza" vai esticar até a comunidade de Moita Redonda, em Cascavel, onde Sabyne desenvolve um interessante trabalho envolvendo os moradores e a arte secular do artesanato feito de barro.

As trocas

Apesar de terem em comum uma arte que dialoga com a cidade, os artistas que produzem no Ceará ainda não conheciam os artistas mineiros. Trocaram portfólios, alguns links e e-mails, mas a contaminação pela arte de cada um vai acontecer durante o Perpendicular.

Hoje os artistas vão circular pelas "fortalezas" de cada um. Ao contrário do que se poderia imaginar, os artistas locais não necessariamente apresentarão a cidade aos visitantes. A ideia é que o inverso aconteça.

"Tudo vai depender da Fortaleza que eles desejam encontrar. Desde questões que perpassam o imaginário do que seja Fortaleza, já que alguns sabem da especulação imobiliária, do turismo sexual avassalador, do coronelismo. Eles também irão apresentar Fortaleza pra gente. Em algum momento as lentes vão se misturar", destaca Yuri Firmeza.

A artista mineira Raquel Versieux, que está pela primeira vez no Ceará, conta que a cidade já é uma primeira instância de troca. "Vamos ficar também numa casa no povoado de Moita Redonda, onde se produz muito artesanato com barro e estou bem interessada no deslocamento entre esse lugar e a Capital. O descolamento é pra mim matéria-prima de trabalho e certamente os pontos de origem vão ser considerados, desde minha saída de Belo Horizonte para o Rio de Janeiro, e agora do Rio para Fortaleza, já vou levando um pouco de minério com iodo", diz a artista.

Mais informações:

Perpendicular Fortaleza - de 20 a 25 de março, com atividades abertas ao público, no Centro Cultural Banco do Nordeste (Rua Floriano Peixoto, 491, Centro). O projeto prevê intervenções urbanas pela Capital. Blog: http://www.perpendicular-fortaleza.blogspot.com

Programação

Hoje

Apresentação do projeto Perpendicular Fortaleza, dos artistas, do local de trabalho, o CCBNB.

Passeio por Fortaleza para estabelecer possíveis territórios de ação.

Amanhã

Construção coletiva de uma agenda de apresentações e performances.

Dia 22 - quinta-feira

Performances e ações na cidade de Fortaleza. À tarde, conversas, apresentação de ideias, construção de instalações e processos criativos que dialoguem com o espaço físico disponibilizado. À noite haverá uma apresentação do projeto ao público, lançamento dos livros Perpendicular cenário # ambiente e Perpendicular Casa e Rua, mesa de conversa.

Dia 23 - sexta-feira

Performances, ações e intervenções urbanas em algum espaço aberto da cidade.

Dia 24 - sábado

Visita ao povoado Moita Redonda, em Cascavel. Noite_ Livre

Dia 25 - domingo

Encerramento das atividades junto aos moradores do povoado Moita Redonda.

Posted by Guilherme Nicolau at 11:22 AM

Nova York em pé de guerra por Juliana Monachesi, Revista Select

Nova York em pé de guerra

Matéria de Juliana Monachesi originalmente publicada na Revista Select em 15 de março de 2012.

Várias mostras em Chelsea tematizam conflitos socioeconômicos

Exposições pela cidade demonstram que os ares de Occupy Wall Street ainda assolam Gotham City

Os protestos que tomaram de assalto o bairro de Wall Street, em Nova York, em setembro de 2011, em que um movimento contra a desigualdade econômica e social e contra a influência das grandes corporações financeiras no governo conquistou as ruas, as páginas de jornal no mundo inteiro e as redes sociais digitais, espraiando-se e inspirando atitudes semelhantes globo afora, continua firme e forte no imaginário cultural de NY. Na primeira semana de março, um tour pelas principais exposições em cartaz em museus e galerias da cidade dava a medida do impacto da onda recente de desobediência civil na criação contemporânea.

De downtown ao Upper East Side, da vanguardista trienal do New Museum à tradicional bienal do Whitney, das galerias de Chelsea àquelas participando do Armory Show, obras com cara de "ocupação" definem o zeitgeist. A ponto de, quando um artista foge demais ao clima dos tempos, a crítica descer a lenha, tachando a exposição de retratos de famosos por Eric Fischl de fútil, por exemplo. Bem distantes da futilidade estão as mostras individuais de Norbert Bisky na galeria Leo Koenig Inc., de Maximilian Toth, na galeria Fredericks & Freiser, e do grupo Gran Fury na galeria 80WSE. Até o final do mês, a seLecT posta aqui no site outras reportagens e críticas sobre as exposições visitadas em Nova York.

Intitulada Stampede, a exposição de Bisky é organizada "em torno do fenômeno da histeria em massa exibida quando em uma multidão em pânico pessoas começam a pisotear umas as outras", segundo informação do press release disponível na galeria Leo Koenig Inc. (que também pode ser consultado no site). O título faz referência às idéias gerais de "mentalidade de rebanho" e de dependência (humana e animal) dos impulsos e da liderança. "Bisky vê o tumulto como uma metáfora para o estado atual das coisas", prossegue o resumo da galeria, ressaltando que o tema da exposição, no entanto, foi motivado diretamente pela tumulto recente na maior rave techno da Alemanha, a Love Parade de 2010, em que 21 pessoas morreram e 500 pessoas ficaram feridas.

Sem ter conhecimento do contexto específico de onde partiu a investigação do artista para esta sua terceira individual na galeria nova-iorquina, a impressão que se tem é que o ambiente caótico pontuado por pinturas dramáticas mostrando corpos ensanguentados e rostos desfigurados só pode simbolizar as feridas sociais que o capitalismo tardio está promovendo no mundo. "A instalação de Bisky é uma reflexão sobre as consequências de uma festa que, de repente, e devastadoramente, deu errado. Em meio a pinturas do artista estão espalhados escombros estruturais e outros resíduos, juntamente com uma infinidade de aparelhos e apetrechos de segurança que, depois de serem confrontados com um confuso esmagamento humano, parecem inúteis e inertes", conclui o release. Pensando bem, talvez seja a rave a principal metáfora aqui.

Sobra a exposição de Maximilian Toth, o texto do press release da galeria Fredericks & Freiser informa que as figuras de base do artista "reencenam, mergulhados em uma sufocante orgia, versões contemporâneas de ritos de iniciação há muito abandonadas. Eles entram em guerra para testar a força, estimular a lealdade e desafiar a fé. Eles procuram o perigo para estabelecer a glória. No entanto, dentro desta pesquisa há uma violência inerente que revela uma natureza primordial. Em última análise, a sua ânsia de destruir torna-se seu veículo para desafiar as limitações".

Uma "percepção de que a vitalidade é fugaz e o corpo é frágil" seria ainda outro tema da mostra do artista norte-americano. Uma pesquisa no site de Toth releva logo que os desvios da juventude são um motivo antigo em sua produção. Mas a galeria tomada por pinturas que se espraiam pelas paredes para fora das bordas da tela e de desenhos feitos diretamente na parede é uma cena que conecta imediatamente o espaço na rua 24 com a praça, não muito distante dalí, Zuccotti Park, em Wall Street. Assim como o "tumulto" de Norbert Bisky, esta "revolta" de Toth demonstra como não cabem na moldura da tradição os movimentos contemporâneos de protesto e mobilização.

Em uma galeria no coração da Universidade de Nova York, a 80 Washington Square East, acontece a primeira exposição a documentar de forma abrangente o trabalho do Gran Fury, influente coletivo de arte e ativismo nos anos 1980. Com curadoria do coletivo e do diretor-assistente da 80WSE, Michael Cohen, a exposição é composta por 15 peças, incluindo as mais importantes obras públicas do grupo, Kissing Doesn't Kill, Welcome to America e Women Don't Get AIDS, reproduzidas no formato de grandes murais.

"O trabalho do Gran Fury aumentou a consciência pública sobre a AIDS, fez pressão sobre os políticos e abriu um espectro mais amplo de compreensão sobre as práticas artistico-políticas e coletivas que floresceram no centro de Nova York durante os anos 1980 e 1990. Com um nome emprestado ao modelo de automóvel Plymouth utilizado pela New York City Police Department, o Gran Fury fez projetos públicos que eram simultaneamente mordazes, provocadores, elegantee e, muitas vezes, bastante engraçados. A exposição transmite a voz única do coletivo em uma ampla variedade de meios, incluindo outdoors, cartões-postais, vídeos, cartazes e pinturas que contribuíram para transmitir cedo a urgência da crise da Aids e levaram muitos às ruas para exigir reformas que mudaram a política pública e salvaram vidas", analisa o texto de divulgação.

Posted by Guilherme Nicolau at 10:25 AM

março 19, 2012

O homem das longas figuras por Paula Alzugaray, Istoé

O homem das longas figuras

Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada no caderno de Cultura da Istoé em 16 de março de 2012

Pinacoteca organiza a primeira retrospectiva do suíço Alberto Giacometti na América do Sul

Ativo desde a primeira década do século XX até os anos 1960, Alberto Giacometti é um dos mais importantes artistas modernos. A mostra “Alberto Giacometti: Coleção da Fondation Alberto et Annette Giacometti, Paris”, com cerca de 280 obras e fotografias de todas as fases de sua carreira, é sem dúvida uma introdução à história da arte moderna. Mais especificamente, a representação da figura humana pela arte moderna, já que Giacometti teve o ser humano como tema absoluto e obsessivo de sua obra. A retrospectiva, em cartaz a partir de 26 de março na Pinacoteca de São Paulo, é também a ocasião para o lançamento da primeira monografia consagrada ao artista no Brasil, intitulada “Giacometti” (Cosac&Naify, 368 págs., R$ 120).

Alberto Giacometti encontrou seus primeiros modelos vivos entre os membros de sua família. Seus primeiros retratos reconhecidos são desenhos de sua mãe, realizados em casa, em Borgonovo, Suíça, em 1913. Mas antes de posar para o jovem desenhista a mãe era a modelo oficial do pai de Giacometti, que era pintor. O próprio Alberto posava para seu pai, Giovanni Giacometti, e para seu padrinho, Cuno Amiet, que juntos introduziram o menino no ofício da pintura e do desenho. Nesse ambiente caseiro fértil em atividade artística e criativa, Giacometti efetivamente começou a desenhar muito cedo. Segundo ensaio de Véronique Wiesinger, diretora da Fondation Alberto et Annette Giacometti e curadora da exposição, o menino escolhia os mesmos temas que seu pai e às vezes até os mesmos enquadramentos.

Annette, futura esposa de Giacometti, se tornaria sua modelo quando o jovem artista chega a Paris, na década de 20, para estudar escultura e onde viveria durante toda sua vida. É com ela que o artista chega ao estilo com o qual se consagrou: um desenho longilíneo e dramático, talvez influenciado também pela pintura cubista de Georges Braque. Em 1952, ele escreveria ao pintor cubista: “Como falar da sensação que a vertical ligeiramente fora do eixo do vaso e das flores que se erguem sobre um fundo cinza provocam em mim?” Mas, à revelia da fama longilínea de Giacometti, a curadora Véronique afirma categoricamente no livro: “A verticalidade tão elogiada das obras de Giacometti é um engodo – nenhuma figura, nem mesmo ‘As Grandes Mulheres’, é reta (...). Elas não são, na verdade, nem mais nem menos retas do que árvores.”

Entre os corpos longilíneos – ou tortos – como árvores, a exposição apresentará uma série de esculturas influenciadas pela arte africana e da Oceania, como “O Casal” e a inquietante “Mulher Colher”, que foi esculpida em 1927 e foi a primeira obra exibida publicamente pelo artista, no Salon des Tuilleries, nesse mesmo ano.

No núcleo documental da mostra, destaque para as fotografias do ateliê onde Giacometti trabalhou durante 40 anos, na rue Hippolyte-Maindron 46, em Paris. Espaço que, como aponta a curadora, foi “uma extensão de si mesmo”, uma caixa de 4 x 4 metros que “facilmente poderia ser comparada a uma caixa craniana na qual coexistiam a percepção da realidade e visões mágicas”.

Posted by Guilherme Nicolau at 7:01 PM

Exposição homenageia 20 anos do Museu de Arte Contemporânea do RS por Fábio Prikladnicki, Zero Hora

Exposição homenageia 20 anos do Museu de Arte Contemporânea do RS

Matéria de Fábio Prikladnicki originalmente publicada no Segundo Caderno do jornal Zero Hora em 05 de março de 2012

Cerca de 100 obras de 63 artistas estarão na mostra no Santander Cultural, na Capital

Embora recente, a trajetória da arte contemporânea é de sucesso. Mesmo que ainda sinta certa perplexidade, o público parece disposto a participar desta movimento que aponta, em última análise, para o futuro.

Esta é a constatação que motiva a exposição O Triunfo do Contemporâneo — 20 Anos do Museu de Arte Contemporânea do Rio Grande do Sul, que será inaugurada nesta terça-feira (06) — para convidados – no Santander Cultural, na Capital, e estará aberta para visitação a partir de quarta-feira (07), com entrada franca.

Este ano, o MAC-RS – que funciona na Casa de Cultura Mario Quintana e negocia uma nova sede — completa duas décadas de fundação com a missão de consolidar um acervo de arte recente produzida no Estado e em outras regiões do país. O aniversário também será comemorado a partir de 22 de março com uma mostra documental no Museu de Arte do Rio Grande do Sul (Margs). Uma semana antes, será inaugurada a primeira exposição no próprio MAC-RS este ano.

Com curadoria de Gaudêncio Fidelis, primeiro diretor do MAC e atual diretor do Margs, O Triunfo do Contemporâneo reúne obras de 63 artistas, dos quais 42 são nascidos ou radicados no Estado. São trabalhos do acervo do museu, produzidos desde o final da década de 1980, quase coincidindo com seu ano de fundação (1992). Estão lá nomes de diferentes gerações, como Michael Chapman, Gisela Waetge, Pablo Lobato e Yuri Firmeza.

— Os museus costumam ter medo de colocar em xeque seu prestígio ao fazer escolhas equivocadas na hora de adquirir uma obra. Mas até agora o MAC colecionou o que tinha de colecionar. Não errou. E acho que vai permanecer com essa vocação para o risco — afirma Fidelis.

O curador exemplifica a ousadia citando a obra com diversos materiais sobre madeira criada por Nuno Ramos em 1991 e presente na mostra:

— Naquela época, ele já era um artista de destaque, mas muitos museus evitavam adquirir seus trabalhos por causa dos materiais instáveis.

Um balanço destes 20 anos mostra que o MAC se tornou um "berço, quase uma certidão de nascimento" para muitos artistas, como afirma André Venzon, atual diretor da instituição:

— O MAC-RS tem sido um museu conduzido mais pelos artistas do que por muitos de seus diretores. É a classe artística que faz as doações e se preocupa se os trabalhos estão em bom estado de conservação.

Produzidas em diferentes suportes, da pintura ao vídeo, as cerca de cem obras da mostra estarão dispostas no Santander Cultural nas paredes e em estruturas espalhadas pelo grande hall que remetem ao tradicional cubo branco dos museus. A monumental arquitetura do local vai ampliar simbolicamente o MAC até 22 de abril, quando a exposição será encerrada, e, quem sabe, chamar atenção para a causa da nova sede.

Posted by Guilherme Nicolau at 6:19 PM

O empresário brasileiro que gasta US$ 70 milhões ao ano para ter um jardim de arte por Simon Romero, portal eletrônico Cenário MT

O empresário brasileiro que gasta US$ 70 milhões ao ano para ter um jardim de arte

Matéria de Simon Romero originalmente publicada no caderno de Economia do portal eletrônico CenárioMT em 19 de março de 2012.

O magnata da mineração Bernardo Paz emprega mais de mil pessoas no projeto que mantém no interior de Minas Gerais e que, diz ele, vai durar mil anos

Não é de admirar que Bernardo Paz seja conhecido como o "Imperador do Inhotim". Cerca de mil funcionários, incluindo curadores, botânicos e derramadores de concreto, fervilham em torno de Inhotim, o complexo de arte contemporânea de Paz, situado nas montanhas do sudeste do Brasil, no Estado de Minas Gerais. Peregrinos que viajam por todo o mundo em busca de arte absorvem obras surpreendentes, como "Sonic Pavilion" ("Pavilhão Sônico"), de Doug Aitken, que utiliza microfones de alta sensibilidade colocados em um buraco de 192 metros para captar o murmúrio grave das profundezas do interior da Terra.

Parece que as florestas de eucalipto de Inhotim emanam um cheiro de megalomania. Ali, Paz colocou mais de 500 obras de artistas brasileiros e estrangeiros. Seu jardim botânico contém mais de 1.400 espécies de palmeiras. Ele resplandece ao falar das plantas raras e oníricas de Inhotim, como a titun arum de Sumatra, chamada de "flor-cadáver" devido ao seu horrível mau cheiro.

Paz, um magro magnata da mineração, fumante inveterado de 61 anos, fala em forma de sussurros quase inaudíveis. Ele se casou com sua sexta mulher em outubro. Tem cabelos brancos até os ombros e olhos azuis pálidos, que lhe dão uma aparência que lembra o debochado e esquelético fazendeiro brasileiro interpretado por Klaus Kinski no filme "Cobra Verde", de 1987, assinado pelo diretor Werner Herzog.

"Este é um projeto para durar mil anos", disse Paz sobre Inhotim, numa rara entrevista, com um cigarro Dunhill pendendo nos lábios.

É difícil dizer o que as pessoas poderão pensar de Inhotim daqui a séculos. Algumas obras-primas de momentos importantes da arte no Brasil ainda sobrevivem como testemunho da extravagância do passado, como o célebre teatro de ópera construído no auge do ciclo da borracha no final do século XIX, em Manaus, a maior cidade da Amazônia.

Em outros lugares da América Latina, majestosas coleções particulares de arte contemporânea também foram disponibilizadas ao público, como a Jumex, de Eugenio Lopez, na Cidade do México. E muito mais longe, no arquipélago Seto, no mar interior do Japão, o Benesse Art Site mistura, de modo semelhante, uma arquitetura inovadora com a arte contemporânea.

Mas nenhum desses lugares tem a exuberância do clima quente de Inhotim, situado nas colinas marcadas pelas cicatrizes da mineração, longe dos circuitos de colecionadores do Brasil, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Os historiadores de arte e curadores muitas vezes saem maravilhados com a dimensão e a visão caótica que Paz criou em Inhotim.

"A quantidade de espaço concedido a projetos de artistas individuais é incomparável, como a maneira como os visitantes transitam de um prédio a outro, refrescando os sentidos, estando na natureza", disse Beverly Adams, autoridade em arte latino-americana que é curadora da coleção particular de Diane e Bruce Halley em Scottsdale, Arizona.

Parece que sobrecarregar os sentidos dos conhecedores ainda entusiasma Paz, que abandonou a escola no ensino secundário e teve como primeira experiência de trabalho a operação das bombas de um posto de gasolina de propriedade de seu pai. Ele então trabalhou no mercado de ações em Belo Horizonte, que odiava, conforme contou, antes de entrar na mineração de ferro e forjar rapidamente um império empresarial privado que financia as operações de Inhotim.

Algumas obras de Inhotim parecem questionar, se não de fato insultar, a ideia de lucrar com a mineração dos tesouros da Terra. Por exemplo, uma instalação do artista americano Matthew Barney em um domo geodésico inclui uma cena de um crime ambiental inconfundível: um trator enorme coberto de lama segurando uma árvore e suas raízes. Para visitar essa obra, os visitantes visitam as colinas desmatadas, contendo minerais, da Mata Atlântica, floresta que cobria a região.

Inhotim recebeu cerca de 250 mil visitantes em 2011 e espera bem mais neste ano. Mas Paz, que diz que suas empresas fornecem a Inhotim cerca de US$ 60 a US$ 70 milhões para suas operações a cada ano, não vê necessidade de parar por aí.

A fim de tornar Inhotim autossustentável, ele disse que estava planejando construir nada menos que dez novos hotéis aqui para os visitantes, um anfiteatro para 15 mil pessoas e até mesmo um complexo de "lofts" para aqueles que quiserem viver em meio à coleção. Ele disse que Inhotim, que se espalha por quase 2.020 hectares, tem espaço para pelo menos mais duas mil obras de arte.

O crescimento de Inhotim ao longo da última década tem proporcionado um forte impulso à economia circundante, empregando muitos dos adultos residentes em pequenas cidades próximas como funcionários que atuam no local, tornando-os dependentes da visão de Paz de montar uma "Disneylândia" da arte contemporânea no Estado de Minas Gerais.

"Antes de Inhotim, os nossos homens trabalhavam nas minas ou se mudavam para São Paulo para ganhar dinheiro", disse Porfira de Souza, 74 anos, residente da pequena cidade de Marinhos, cujo filho e neto trabalham em Inhotim. "Deus permitiu que Bernardo Paz viesse do céu até nós, e rezo para que ele não o leve de volta muito em breve."

Ainda assim, Paz insistiu que não é um imperador. Ele se considera uma "pessoa isolada" que não tem muitos amigos de verdade e opta por viver em meio a centenas de obras de arte, incluindo um pavilhão construído por ele para uma de suas ex-esposas, a artista brasileira Adriana Varejão.

Sentado em um dos restaurantes de Inhotim em um dia abafado de fevereiro, ele bebeu rapidamente três coquetéis de vodca, murmurando sobre as maquinações dos banqueiros e a crise financeira global enquanto fumava seus Dunhills.

"Não ligue isso", disse ele, apontando para um gravador digital que estava sobre a mesa.

Um dia depois, em um prédio com ar-condicionado que incorporou "Narcissus Garden" ("Jardim de Narciso"), uma obra do artista japonês Yayoi Kusama, em sua concepção, ele parecia se divertir ao desprezar alguns outros titãs do empreendedorismo brasileiro, chamando-os de "imbecis" e alegando que os visitantes pobres de Inhotim muitas vezes são mais capazes de absorver a importância do complexo. Ele também tinha um desdém especial reservado para o homem mais rico do Brasil, Eike Batista.

"De repente, ele aparece com bilhões e bilhões, dizendo que vai ser o homem mais rico do mundo", disse ele sobre Batista, um empresário mineiro que recebe tratamento em grande parte elogioso na mídia local como um ídolo do crescente rol de milionários do Brasil. "Ele quebrou todas as empresas que teve até fazer 50 anos."

Paz também negou alegações publicadas nos jornais brasileiros de que a expansão de Inhotim se deveu em parte à lavagem de dinheiro, chamando tais acusações de uma "montanha de disparates e mentiras". "Claramente, ninguém é totalmente transparente", reconheceu. Ainda assim, afirmou: "Os jornais nunca provaram nada".

Por enquanto, ele parece mais preocupado em atrair as massas para Inhotim para que vejam obras como "Restore Now" ("Restaure agora"), uma enorme paródia de normas acadêmicas feita pelo artista suíço Thomas Hirschhorn, em que os textos de filósofos franceses, como Jacques Derrida e Gilles Deleuze (sim, os mesmos que muitas pessoas fingiam ler na faculdade) são intercalados com imagens de corpos mutilados.

Quando questionado sobre obras específicas, Paz habilmente muda a conversa para outros temas. Ele sorriu ao falar da nova esposa, Arystela Rosa, de 31 anos, grávida de seu sétimo filho. Outras coisas de Inhotim atraem seu interesse, como as enormes árvores tamboris ou a traíra, um peixe carnívoro das lagoas daqui que tira sangue de visitantes tolos o suficiente para mergulhar os dedos na água.

"Há obras de arte aqui que eu ainda não visitei e que todos me disseram que são espetaculares, mas por que eu deveria ir lá?", questionou Paz. "Eu não me considero apaixonado por arte. Mas de jardins, sim, eu gosto."

Posted by Guilherme Nicolau at 6:09 PM

Renato Valle abre hoje a exposição Cristos e Anticristos por Renato Contente, Jornal do Commercio

Renato Valle abre hoje a exposição Cristos e Anticristos

Matéria de Renato Contente originalmente publicada no caderno de Artes Plásticas do Jornal do Commercio em 12 de março de 2012

Novo trabalho do recifense, cuja abertura acontece hoje na UFPE, traz reflexão sobre a influência da religião na contemporaneidade

Depois de transitar pelo desenho, pintura, gravura e fotografia, o artista plástico Renato Valle decidiu realizar um antigo desejo: ampliar a dimensão de seu trabalho com esculturas e objetos. É com essa vontade materializada que o recifense abre hoje parte da exposição Cristos e anticristos, ao meio-dia, na Galeria Capibaribe, no Centro de Artes e Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco. Pela vastidão do material produzido, outra parte do trabalho será exposta na Galeria Dumaresqe, em Boa Viagem, com abertura na próxima-quarta-feira, às 18h.

O projeto partiu de um objeto em comum em quase toda sua extensão: o crucifixo. Unido à diversos materiais e técnicas artísticas, o símbolo da cruz ganhou um sem-número de conotações, utilizando seus novos significados adquiridos como crítica ao fanatismo religioso e à hipocrisia social. “O crucifixo foi escolhido por uma antiga inquietação minha. Na maioria das suas representações tradicionais, a cruz ainda aparenta ser de madeira polida, bem acabada, como se fosse preparada para o repouso de um rei branco de olhos azuis, e não para punir um bandido”, justifica Renato Valle.

As reflexões e angústias do artista se desdobraram em colmeias, grades e cruzes com Coca-Cola, colocando em xeque a afirmação de que a bondade é inerente ao ser humano, e que a maldade depende de fatores externos à ele. Ser humano pressupõe fazer escolhas que estão além de ser do bem ou do mal, e é a consciência dessa cota de humanidade que Valle tenta suscitar em cada um dos visitantes da exposição.

O anticristo do título não tem nenhuma conotação apocalíptica. Em referência literal ao prefixo, indica um cristo em posição oposta a outro, passando longe de levantar dúvidas quanto a ser o “filho do dêmonio” temido pelos cristãos. A formatação recorrente dos dois cristos polares em conflito indica a dicotomia da natureza humana, dividida entre luz e sombra, amor e ódio, fé e descrença.

Em uma das peças mais emblemáticas, e de feitio dos mais complexos, está o Mealheiro. Feito à base de resina de poliéster e em várias etapas, a obra conduz a uma reflexão entre poder simbólico e econômico, quando a religião se utiliza da fé para explorar fieis em troca da promessa de salvamento material e espiritual. Dentro da cabeça transparente do cristo, moedas e cédulas reforçam a ideia.

A disposição de cristos em grades também faz parte da mostra, constituindo mais um objeto de dualismo: a grade ao mesmo tempo como sinal de proteção e opressão dos meios externos. Um dos destaques é a série de cristos equilibristas e em coreografia para nada sincronizado. A imagem do cristo é rigorosamente a mesma que se vê nas igrejas, mas a situação em que foi posto lhe dá uma configuração completamente diferente. “Me incomodo com a tradição de associar o cristo crucificado à dor e ao sofrimento. Essas peças foram uma tentativa de tirá-lo desse estado. Não houve ironia ou intenção de ferir nenhuma ideia.”, explica o artista, que desejou imprimir vida à figura sacra do cristo, esta simbolizada pela dança e pela alegria.

Posted by Guilherme Nicolau at 3:19 PM

Ministério da Cultura escolhe o Museu de Arte Moderna de São Paulo para viabilizar Bienal por Márcia Abos, O Globo

Ministério da Cultura escolhe o Museu de Arte Moderna de São Paulo para viabilizar Bienal

Matéria de Márcia Abos originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Globo em 19 de março de 2012.

MAM passa a ser o proponente da mostra prevista para setembro

SÃO PAULO - O impasse que ameaçava a realização da 30 edição da Bienal de São Paulo terminou na manhã desta segunda-feira, com a decisão do Ministério da Cultura de transferir os recursos captados via Lei Rouanet e convênios diretos com o governo pela Fundação Bienal para o Museu de Arte Moderna de São Paulo.

Desde 2 de janeiro, quando a Fundação Bienal foi listada como inadimplente pelo MinC, as contas da instituição estão bloqueadas. A mudança de proponente possibilita a liberação dos R$ 12 milhões já captados via Lei Rouanet para a realização da exposição, prevista para ser aberta ao público em 7 de setembro deste ano. Também permite que sejam captados mais recursos incentivados.

Inicialmente o orçamento previsto para a 30 Bienal, com curadoria do venezuelano Luis Pérez-Oramas e com o tema “A iminência das poéticas”, era de R$ 30 milhões. No entanto, com a limitação de tempo imposta pela inadimplência e pelo bloqueio das contas os organizadores já trabalham com valores mais modestos, de R$ 18 milhões a R$ 20 milhões.
A Fundação Bienal foi listada como inadimplente por recomendação da Controladoria Geral da União, que encontrou 13 irregularidades em pretações de contas entre 1999 e 2006, no valor total de R$ 32 milhões. Segundo a nota divulgada pelo MinC, a decisão de tornar o MAM-SP proponente da 30 Bienal “não acarretará interrupção dos processos de prestação de contas em apuração”.

A Bienal e o MAM devem definir nos próximos dias um plano conjunto de trabalho para a realização da exposição.

Em nota assinada em conjunto pelas duas instituições, Milú Villela, presidente do MAM-SP, disse: “Vamos atender com todo o empenho à solicitação do Ministério da Cultura para contribuir com a Bienal. O evento é estratégico para o País, e o MAM-SP não poderia deixar de apoiar a Fundação e seu presidente, Heitor Martins, que à frente da sua equipe realiza um importante trabalho de recuperação, já evidenciado na última edição da mostra. Havendo reais possibilidades técnicas de execução, o MAM ocupará, com imenso prazer, o papel de correalizador do evento”.

No mesmo comunicado, Heitor Martins, presidente da Fundação Bienal, declara: “A possibilidade de ter o MAM-SP como parceiro é um grande estímulo. O apoio de Milú Villela, uma grande ativista da cultura brasileira, e dos seus colaboradores, será vital para garantirmos a continuidade da Bienal. Com essa parceria, esperamos superar esse grande desafio”.

Leia abaixo a íntegra da nota técnica divulgada pelo Ministério da Cultura:

MinC indica o MAM para a proponência da 30ª Bienal de São Paulo

Pautado pelo interesse público, o Ministério da Cultura (MinC) vem se empenhando para viabilizar a continuidade da Bienal de São Paulo, um evento cultural existente desde 1951, notoriamente reconhecido pela sua grande importância no cenário artístico do País, o que repercute também no cenário externo, onde se situa como um dos principais acontecimentos da agenda internacional das artes visuais.

No entanto, a Fundação Bienal de São Paulo (FBSP), tradicional realizadora do evento, encontra-se inadimplente em função de projetos de anos anteriores em situação de Tomada de Contas Especial (TCE), junto à Controladoria Geral da União. Os processos em questão tiveram suas prestações de contas reanalisadas pelo MinC, por determinação da CGU, emitida em julho de 2009, quando este Ministério deu ciência à atual Diretoria da FBSP.

Tendo em vista que a Fundação Bienal de São Paulo (FBSP) encontra-se impedida de operar os recursos de incentivo fiscal da Lei nº 8.313/1991 (Rouanet), o MinC buscou uma solução para tornar exequível a 30ª Edição da Bienal de São Paulo, prevista para ocorrer no segundo semestre deste ano. Tal solução não acarretará interrupção dos processos de prestação de contas em apuração.

Por meio de sua Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura (Sefic), elaborou a Nota Técnica nº 0116/2012, em 16 de fevereiro de 2012, propondo a alteração de proponente, para uso dos recursos de incentivo à cultura. A Nota Técnica foi analisada pela Consultoria Jurídica do MinC, órgão da Advocacia Geral da União, o que resultou no Parecer nº 133/2012, de 22 de fevereiro de 2012, favorável à troca de proponente, o que deverá ocorrer nos limites da lei.

Para essa substituição, foram convidadas três instituições com sede no Estado de São Paulo, detentoras de comprovada capacidade técnica, de experiência na gestão de projetos na área da arte contemporânea, com alcance nacional e internacional, e de experiência na execução de projetos com benefícios da Lei Federal de Incentivo à Cultura: o Instituto Tomie Ohtake, o Museu de Arte Moderna (MAM) e a O.S. Pinacoteca do Estado de São Paulo. Das três instituições, duas responderam positivamente ao convite do MinC. A Pinacoteca declinou tendo em vistas características estatutárias impeditivas.

A fim de dar segurança jurídica ao ato, MinC está preparando um Termo de Ajustamento de Conduta, em conjunto com a Advocacia Geral da União (AGU), que permita a alteração de proponente dos projetos “Projeto Curatorial da 30ª Bienal de São Paulo – PRONAC 10-11262” e ¨30ª Bienal de São Paulo – PRONAC11-9340”.

Para decidir pelo novo proponente, as equipes técnicas do MinC realizaram uma série de encontros com as instituições convidadas e com a FBSP.

Apesar de ter sido constatada a competência de ambas as instituições, deliberou-se pela maior tradição do Museu de Arte Moderna, pesando inclusive o fato dessa instituição ter sido a realizadora das primeiras edições da Bienal.

Leia abaixo a íntegra da nota conjunta divulgada pela Bienal e o MAM- SP:

A Fundação Bienal de São Paulo e o MAM-SP (Museu de Arte Moderna de São Paulo) iniciam nos próximos dias os entendimentos para a realização conjunta da 30ª edição da Bienal de São Paulo. As duas instituições, a pedido do Ministério da Cultura (MINC), estão empenhadas em encontrar soluções para assegurar a realização do evento, fundamental para fortalecer ainda mais o Brasil no cenário internacional das artes.

“Vamos atender com todo o empenho à solicitação do Ministério da Cultura para contribuir com a Bienal. O evento é estratégico para o País, e o MAM-SP não poderia deixar de apoiar a Fundação e seu presidente, Heitor Martins, que à frente da sua equipe realiza um importante trabalho de recuperação, já evidenciado na última edição da mostra. Havendo reais possibilidades técnicas de execução, o MAM ocupará, com imenso prazer, o papel de correalizador do evento”, diz Milú Villela, presidente do Museu de Arte Moderna de São Paulo.

“A possibilidade de ter o MAM-SP como parceiro é um grande estímulo. O apoio de Milú Villela, uma grande ativista da cultura brasileira, e dos seus colaboradores, será vital para garantirmos a continuidade da Bienal. Com essa parceria, esperamos superar esse grande desafio”, diz Heitor Martins, presidente da Fundação Bienal de São Paulo.

A parceria entre o MAM-SP e a Fundação Bienal de São Paulo, que dá agora seus primeiros passos, resulta da mobilização do Ministério da Cultura (MinC), que tem empenhado esforços na busca de alternativas para a realização da 30ª Bienal.

Assim que os entendimentos técnicos estiverem concluídos, o MAM-SP e a Fundação Bienal de São Paulo voltarão a prestar informações sobre as decisões acordadas.

Posted by Guilherme Nicolau at 2:52 PM

O rapto do debate sobre artes visuais por César Oiticica Filho, Folha de São Paulo

O rapto do debate sobre artes visuais

Leia abaixo o texto de César Oiticica Filho originalmente publicado publicado na edição "Ilustríssima" do jornal Folha de São Paulo em 18 de março de 2012, resposta à tréplica de Flávio Moura.

*
Para responder ao texto de Flávio Moura de 4/3, realizei um exercício comparativo: peguei os meus exemplares de "Aspiro ao Grande Labirinto" (1986) e "Museu É o Mundo" (2011) e tentei entender o que difere tanto, para o crítico, nas edições, tornando uma delas o exemplo de como se faz um volume de ensaios do autor e o outro um "amontoado de textos sem referência".

Não há, nos volumes, nada que justifique tal julgamento. Os dois seguem a ordem cronológica dos textos, mantendo a referência original dos documentos. A maior diferença está na quantidade dos textos: "Museu É o Mundo" se estende até 1980, enquanto o último texto de "Aspiro" é de 1969.

Além disso, foram incluídos em "Museu" alguns textos da década de 1960 ausentes no livro anterior. De resto, os critérios são bastante semelhantes.

Então, onde está essa diferença tão gritante de qualidade curatorial entre os volumes? Estaria na cabeça do crítico? Estaria ele julgando a partir de uma visão externa, preconceituosa, sem ter feito o mesmo exercício comparativo? Será que possui um exemplar do "Aspiro" para tanto? A pergunta, que pode parecer capciosa, se explica.

No texto, Flávio diz que "Aspiro ao Grande Labirinto" é organizado apenas por Luciano Figueiredo. Mas, na folha de rosto do volume, está claro: "Seleção de textos: Luciano Figueiredo, Lygia Pape, Waly Salomão".

O crítico não conhecia essa informação, absolutamente básica? Senão, que interesse ele tinha em omitir os nomes dos outros organizadores? Por que privilegiar apenas o organizador vivo?

Começo o texto dizendo isso para explicar o motivo de, novamente, responder ao crítico. Confesso que relutei, temi ser isso exatamente o que ele queria: conquistar espaço de mídia com factoides. Mas é dever de um curador preservar a boa informação sobre a obra e o respeito ao trabalho dos profissionais que a ela se voltaram. A omissão de créditos, como no caso da organização do "Aspiro", é muito grave.

No caso de "Museu É o Mundo", é importante ressaltar o investimento de todos para fazer que esse seja um dos poucos livros de exposição a chegar às livrarias do Brasil com um preço acessível --e o primeiro de Hélio Oiticica. Os demais já nascem como obras raras, inacessíveis ao grande público.

Isso não é pouco, mas não isenta o livro de críticas. O que esperamos é que elas sejam feitas de forma qualificada, por meio da leitura atenta do seu conteúdo.

DISTORÇÃO

Outro fator importante, que motivou a minha resposta, é desfazer uma distorção de sentido, realizada por Flávio Moura, da minha primeira réplica. Ao citar os novos críticos, não busquei chancelar nomes, ao contrário.

Não tenho contato pessoal com vários dos citados, mas acompanho com entusiasmo seus trabalhos, pela qualidade e relevância. Alguns deles inclusive não trabalham diretamente com a obra de Hélio Oiticica.

O que destaquei, e repito, é a necessidade de uma postura crítica séria, o que todos esses nomes e muitos outros da nova geração expressam e que não vejo no trabalho presente de Flávio Moura.

A certo ponto, Flávio Moura fala sobre o fato de eu ser sobrinho de Hélio Oiticica e da necessidade de ganhar "musculatura crítica" para falar do artista. Jamais tive essa ambição crítica.

A minha obrigação, como curador da obra, é cuidar para que as informações sobre a obra de Hélio Oiticica sejam o mais acuradas possível, evitando que erros se perpetuem.

O trabalho é árduo: é preciso acompanhar a reflexão crítica internacional, tornar informações e obras acessíveis ao maior número possível de interessados, independentemente das opiniões que possam vir dessas pessoas.

Há quase dez anos, o projeto HO entrega, para todos os pesquisadores que nos procuram, DVDs com todos os documentos de Hélio Oiticica, que podem ser acessados rapidamente por um programa de busca. Essa é uma atitude que adotamos para facilitar o acesso à informação sobre a obra de Hélio Oiticica e multiplicar as suas leituras críticas. O próprio Flávio Moura usufruiu desse serviço.

O trabalho realizado no livro "Museu É o Mundo", junto com as entrevistas de Hélio Oiticica reunidas no volume da coleção Encontros e o livro "Newyorkaises "" Conglomerados", com os textos de Oiticica realizados em Nova York na década de 1970, a sair ainda neste ano, todos em parceria com a Azougue Editorial, é uma forma de estender ainda mais o acesso à obra de Hélio Oiticica. Esperamos que criem novas leituras, instigantes, públicas e consistentes

O que preocupa, nesse sentido, é o rapto do debate sobre artes visuais, que deixou de ser um diálogo sobre as possibilidades experimentais e de linguagem para se aprisionar num discurso sobre o circuito mercadológico, tratando artistas revolucionários internacionalmente como meras commodities.

Provavelmente isso se deve a certa promiscuidade entre crítica e mercado, que a cada vez mais se intensifica, trazendo textos nos quais o valor das obras muitas vezes se sobrepõe à sua importância estética e cultural.

Posted by Guilherme Nicolau at 2:20 PM | Comentários (1)

Hélio Oiticica e Lygia Clark não precisam de protetores por Flávio Moura, Folha de São Paulo

Hélio Oiticica e Lygia Clark não precisam de protetores

Leia abaixo a tréplica de Flávio Moura originalmente publicada na edição da "Ilustríssima" do jornal Folha de São Paulo em 04 de março de 2012, resposta à réplica de César Oiticica Filho.

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Em resenha publicada na "Ilustríssima" de 29/1, parto da discussão do processo de consagração de Hélio Oiticica (1937-80) e Lygia Clark (1920-88). A julgar pelas reações que suscitou, está claro que esse debate precisa ser feito.

César Oiticica Filho, sobrinho do artista, curador do Projeto Hélio Oiticica e organizador de "Museu É o Mundo" [Azougue, 248 págs., R$ 80], livro de ensaios de Hélio, desqualifica a resenha com base em supostos "erros".

Afirma que não foram mencionados os textos inéditos incluídos no volume, atribuindo a mim a afirmação de que o livro seria mera reprodução da coletânea "Aspiro ao Grande Labirinto", de 1986.

A passagem em questão não fala sobre a ausência de textos inéditos na coletânea, mas sobre o fato de que o livro carece de seleção e organização criteriosa dos textos mais representativos de Hélio, trabalho que não é realizado desde 1986; e não é mesmo.

"Aspiro ao Grande Labirinto", organizado por Luciano Figueiredo, figura até hoje como principal referência para quem procura ensaios de Hélio e virou peça de colecionador. Era de esperar que, tantos anos depois, uma nova coletânea mostrasse a que veio.

E o que temos? Um amontoado de textos sem nenhuma referência. Não sabemos o critério de seleção. Há textos que não trazem a data em que foram escritos. Não há indicação sobre publicações anteriores em livros, catálogos, revistas ou jornais. Sabemos apenas que não devem ser lidos isoladamente, "e sim como parte da obra". Isso exime o organizador da lição de casa? Dotar de transcendência toda e qualquer anotação de Hélio não é uma forma de mitificação?

É como se Hélio fosse apresentado "por inteiro" pela primeira vez. Meticuloso, dificilmente ele aprovaria uma edição assim. Basta cotejar "Museu É o Mundo" com o catálogo da retrospectiva no exterior em 1992, ou com "Body of Colour", na Tate Gallery (2007), em Londres (org. Mari Carmen Ramirez), ambos generosos em referências.

Agora tudo se passa como se esses e outros trabalhos não existissem. Oiticica Filho parece imbuído da missão de veicular apenas uma versão da trajetória do tio: a sua.

CONCRETISMO

O curador aponta um segundo "erro" na resenha: diz ser incorreto afirmar que Hélio passa a escrever como um concretista nos anos 60 porque sua reaproximação com os irmãos Campos só se deu em... 1967! Onde está o equívoco?

O texto "Subterrânia 2" (1969), incluído em "Museu É o Mundo", é um entre os diversos exemplos dessa aproximação nos anos 60. Oiticica Filho afirma que "não há nenhum fundamento na tentativa de traçar um paralelo entre esse diálogo entre Hélio e os poetas concretos e o afastamento do artista com Ferreira Gullar, ocorrido na primeira metade da década de 1960, anos antes". Será?

Por que é tão persistente a polarização entre os "frios" paulistas e os "sensuais" cariocas, mesmo após a ligação dos concretistas de São Paulo com Hélio e com os baianos da Tropicália? Perguntas assim vêm sendo feitas por autores como Gonzalo Aguilar e Michael Asbury, e estão na base dos argumentos da resenha.

Em sua introdução a "Museu É o Mundo", Oiticica Filho afirma que seu objetivo é ir contra os "setores conservadores da arte", que só valorizam o Hélio do fim dos anos 1950 ao início dos anos 1960. Eis aí, na trilha de Aguilar e Asbury, um caminho a explorar nessa cruzada contra os "conservadores". Mas antes é preciso ganhar musculatura como crítico e abandonar a passionalidade de sobrinho.

É legítimo que ele esteja à frente da curadoria do Projeto H.O., a que se deve tributar muito do que foi construído em torno do artista. Mas um debate crítico digno do nome será tanto pior quanto mais tutelado por instituições desse tipo.

CENÁRIO

A reação intempestiva do curador é reflexo de um cenário recente, no qual o que não é aplauso deve ser banido, no qual uma resenha crítica se torna sinônimo de agressão ao artista.

Nota-se a mesma sanha de controle na lista de 13 "jovens críticos" chancelados em sua réplica. A pretexto de sugerir abertura para o novo, desqualifica o interlocutor e o exclui do campo, num índex às avessas, como se o sobrinho tivesse poder de controlar quem está autorizado a falar sobre o tio.

Na mesma edição da "Ilustríssima" foi publicada réplica aos comentários feitos à caixa de DVDs sobre Lygia Clark, organizada pela curadora Suely Rolnik. A resposta do crítico Afonso Luz rende uma discussão que terá de ser adiada --mas merece elogios por propor uma troca de ideias, não um ringue de luta livre.

No processo de consagração dos artistas, em curso desde meados dos anos 90, apagam-se dimensões relevantes de sua trajetória. A resenha não faz mais do que apontar alguns desses pontos.

Isso só faz sentido em face da centralidade que esses artistas adquiriram no debate sobre arte no Brasil --centralidade que se produz por fatores que dizem respeito às obras, mas não apenas a elas, e que devem ser objeto de investigação.

Confundir essa proposta legítima com arrivismo é coisa de quem acredita que Hélio e Lygia precisam de protetores. Felizmente, eles já podem dispensar esse tipo de condescendência.

Posted by Guilherme Nicolau at 2:11 PM

Uma resposta à crítica de "Museu É o Mundo" por César Oiticica Filho, Folha de São Paulo

Uma resposta à crítica de "Museu É o Mundo"

Texto de César Oiticica Filho originalmente publicado na edição "Ilustríssima" do jornal Folha de São Paulo em 26 de fevereiro de 2012, resposta à crítica de Flávio Moura.

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A reflexão crítica de artes visuais vive um momento de renovação no Brasil. Para todos os que trabalham ou acompanham a área, é um feliz acontecimento o aparecimento de nomes de qualidade em diversas regiões do país, com diferentes posicionamentos teóricos e afinidades estéticas.

Demonstração da vitalidade e maturidade que as artes visuais têm conquistado no nosso país. Sem querer ser exaustivo, poderíamos citar Clarissa Diniz e Cristiana Tejo, em Pernambuco, Felipe Scovino, Frederico Coelho, Tânia Rivera, Daniela Labra e Sergio Martins, no Rio de Janeiro, Julia Rebouças, em Minas Gerais, Luiza Duarte, Fernanda Lopes, Guy Amado, Marcelo Campos e Ligia Nobre, em São Paulo, como exemplos de jovens críticos altamente qualificados em atuação no Brasil.

Seria possível nomear vários outros, que vêm para contribuir para o excelente nível que a crítica brasileira tem adquirido nas últimas décadas.

Flávio Moura segue a direção contrária. Mantém um estilo ultrapassado: crítica preguiçosa, baseada na polêmica fácil e na ânsia midiática. Textos que trazem pouco ou nenhum fundamento teórico ou histórico e que se valem da agressão gratuita a importantes nomes da cultura para buscar autopromoção.

Foi o que aconteceu no artigo do último dia 29 de janeiro, na "Ilustríssima", sobre o livro "Museu é o Mundo", de Hélio Oiticica.

ERROS

Flávio Moura escreveu a resenha sem, ao que tudo indica, sequer ter lido o livro. Se o tivesse feito, não incorreria em erros tão básicos, como o de ter dito que este "abriga a íntegra dos textos escolhidos para figurar na exposição homônima que percorreu o Brasil em 2010. Não se trata, por isso, de uma coletânea dos melhores ensaios de Hélio, trabalho que não é feito desde 1986, quando saiu 'Aspiro ao Grande Labirinto' (Rocco, esgotado)."

Pois bem, "Museu É o Mundo" contém não apenas os textos do artista compilados originalmente em "Aspiro ao Grande Labirinto" como uma série de outros textos, alguns inéditos em livros, entre eles "A Trama da Terra que Treme", "Balanço da Cultura Brasileira - 1968", "Experimentar o Experimental", "Brasil Diarreia", "Sobre Penetráveis Magic Square", "Ondas do Corpo", "Mitos Vadios", "O q Faço É Música", "Devolver a Terra a Terra", "Esquenta pro Carnaval".

É certamente a maior antologia de escritos de Hélio Oiticica já publicada. Quando da feitura do livro, a escolha foi exatamente trazer a público os textos do autor, da forma mais qualificada possível e em edição bilíngue.

FLA-FLU

Isso, por si só, já deveria ser motivo de interesse e celebração por todos os interessados em cultura, goste-se ou não da obra de Oiticica. Afinal, cultura não é Fla-Flu.

Com a importância adquirida por Hélio Oiticica no Brasil e no exterior, teria sido bastante fácil fazer um livro com textos de grandes críticos nacionais e internacionais louvando a sua obra.

Em vez disso, preferimos trazer para o público a obra do próprio autor, a sua própria voz, da forma mais isenta possível. Acreditamos que essa é a melhor forma de evitar mitificações ou canonizações. Mas, ao que parece, alguns críticos ainda preferem o obscurantismo e a ignorância...

O texto incorre em uma série de outros erros, biográficos ou cronológicos, como ao dizer que "nos anos 60 Hélio passou a escrever como concretista".

Embora Oiticica já conhecesse os poetas concretos na década de 1950, só retomaria o contato com eles em 1967, num encontro com Haroldo de Campos em Belém, como relata Marcos Augusto Gonçalves em excelente ensaio de 2003.

Assim, o frutífero diálogo entre os irmãos Campos e Hélio surge apenas nos últimos anos da década de 1960 e ganha força realmente na década seguinte, durante a estadia de Hélio em Nova York.

GULLAR

Por isso mesmo, também não há nenhum fundamento na tentativa de traçar um paralelo entre esse diálogo entre Hélio e os poetas concretos e o afastamento do artista com Ferreira Gullar, ocorrido na primeira metade da década de 1960, anos antes.

O afastamento ocorreu, como é sabido por todos que pesquisam a cultura brasileira desse período, quando o poeta rompe com os princípios construtivistas e filia-se ao Centro Popular de Cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes (UNE), adotando uma arte engajada politicamente.

Esses erros, básicos, demonstram o total desconhecimento de Flávio Moura sobre o assunto. Um pouco mais de estudo, nessas horas, cai bem.

Ou seja, nas poucas vezes que Flávio se digna a falar diretamente do objeto da sua resenha, erra. O que sobra é a sua tese, no mínimo controversa, para não dizer mesquinha.

O que ele está propondo, menos Hélio e Lygia? Não seria bom para o Brasil ter mais, com obras e documentos mais acessíveis? Reconhecer isso está além do alcance de um crítico obcecado pela ideia da "canonização" dos artistas.

Como se Oiticica precisasse de procedimentos desse tipo, após décadas de reconhecimento, devido não a estratégias de consagração, mas à inequívoca importância da sua obra. A resenha fala, certa hora, de "narcisismo". Não será mais narcisista ocupar-se das próprias posições preconcebidas em detrimento do objeto da crítica?

Posted by Guilherme Nicolau at 1:58 PM

Como nascem os ícones por Flávio Moura, Folha de São Paulo

Como nascem os ícones

Matéria de Flávio Moura originalmente publicada no caderno Ilustríssima do jornal Folha de São Paulo em 29 de fevereiro de 2012

O processo de transformação de Lygia Clark e Hélio Oiticica nos ícones da arte brasileira contemporânea segue a todo vapor.

Em 2004, foram os únicos brasileiros a figurar no compêndio "Art Since 1900" (Thames and Hudson), súmula do que pensa a crítica de mais prestígio nos EUA e na Europa sobre a arte do século 20.

Em 2007, mais de 150 trabalhos de Oiticica ocuparam a londrina Tate Modern. Em 2011, a galeria Gagosian de Paris realizou pela primeira vez uma mostra com obras dos dois.

Em maio de 2014, os nova-iorquinos deverão ver no MoMA a maior retrospectiva de Lygia já feita. No Brasil, avolumam-se iniciativas nessa direção, como uma coletânea de ensaios de Oiticica e uma caixa com depoimentos sobre Lygia, ambas recém-lançadas.

"Museu É o Mundo" *[Azougue, org. Cesar Oiticica Filho, 288 págs., R$ 80]* reúne textos produzidos por Oiticica entre 1954, quando tinha 17 anos, e 1980, ano de sua morte. A maior parte é composta de entradas de seu diário, escritas entre 1960 e 1962. O restante são ensaios de cunho interpretativo, como o "Esquema Geral da Nova Objetividade", de 1965, e anotações esparsas sobre trabalhos.

O livro abriga a íntegra dos textos escolhidos para figurar na exposição homônima que percorreu o Brasil em 2010. Não se trata, por isso, de uma coletânea dos melhores ensaios de Hélio, trabalho que não é feito desde 1986, quando saiu "Aspiro ao Grande Labirinto" (Rocco, esgotado). Faltam indicações sobre o contexto de produção dos textos e dados básicos sobre eventuais publicações anteriores.

O objetivo, como diz Oiticica Filho na introdução, é ir contra os "setores conservadores da arte", que valorizam só a obra inicial de Hélio Oiticica. Em seu entender, a esses críticos falta coragem para enfatizar a qualidade da produção dos anos 1960 e 70, que "abre as portas da arte contemporânea com proposições e criações que transcendem o objeto artístico".

CONCRETISTA

Por trás da invectiva do curador contra a "crítica conservadora" há pontos relevantes. Como mostram os textos do livro, nos anos 60 Hélio passou a escrever como concretista: criava palavras, enfatizava a sonoridade, interrompia frases e exercitava jogos de linguagem que por vezes soam como caricatura do concretismo, de tanto que exploram cacoetes formais associados à corrente.

O livro evidencia como a trajetória de Oiticica é tão devedora dos irmãos Haroldo e Augusto de Campos quanto de Ferreira Gullar e do neoconcretismo (1959-61). Não parece casual que o próprio Gullar, líder da dissidência, tenha desqualificado a obra de Oiticica de 1964 em diante, como se ali houvesse traição aos princípios do grupo neoconcreto.

Os textos de "Museu É o Mundo" são apresentados como parte do trabalho artístico. Encarados assim, assumem a condição de complemento às obras expostas, não de ensaios críticos. Mesmo porque por vezes as interpretações são frágeis: nos textos mais densos, do início de carreira, Oiticica emula o linguajar filosofante de Gullar.

Mais tarde, em textos como "Balanço da Cultura Brasileira 1968", procura esboçar um retrato de sua geração, mas restringe-se ao elogio narcisista da própria trajetória.

Vistos na ordem cronológica, os textos seguem um caminho que encontra expressão nas obras. O que no início eram ensaios comportados, às voltas com conceitos filosóficos, vai se decompondo em anotações, aforismos, legendas, gravações, experimentos até os "programas in progress" do fim da carreira, em que idiomas se misturam, frases não se completam, referências eruditas e à cultura de massas se avolumam e se anulam em sentidos lacunares e obscuros.

BORBOTÕES

Fruto de parceria entre o Sesc-SP e a Cinemateca Brasileira, *"Arquivo para uma Obra-Acontecimento" [org. Suely Rolnik, 20 DVDs, R$ 240]*, assim como o livro de Oiticica, deriva de uma exposição. A caixa reúne parte dos depoimentos colhidos para uma exposição de 2006 e foi lançada em mostra homônima em São Paulo, em 2011.

O time de convidados -20, no total- é heterogêneo: Caetano Veloso, Ferreira Gullar, Jards Macalé e os críticos Guy Brett e Yve-Alain Bois, entre outros.

Caetano narra a experiência de ter sido paciente da terapeuta Lygia, em quem se inspirou para compor "If You Hold a Stone", canção incluída em seu álbum de 1971. Gullar discorre sobre o "não-objeto", conceito criado a partir de obras da artista, e o papel de Lygia para os neoconcretos. Alain-Bois fala dos gostos cinematográficos e da rotina parisiense da artista.

E tome hagiografia: embora o texto de apresentação insista na necessidade de evitar o fetiche, abundam nos depoimentos afirmações como a do curador Paulo Herkenhoff, para quem a relação entre Lygia e Oiticica "era da mesma natureza da que havia entre Picasso e Braque em 1910".

Há na apresentação a tentativa de justificar a importância do formato "arquivo" (os DVDs vêm dispostos numa caixa que sugere um arquivo de pastas suspensas), mas a opção pelos depoimentos na íntegra é difícil de compreender.

São cerca de 40 horas de entrevistas, o que torna penosa a busca por momentos relevantes. É uma pesquisa respeitável para um futuro documentário, mas o espectador não especializado que se aventure por ali ficará perdido: o crítico Guy Brett, por exemplo, é lacônico a ponto de constranger, e não se compreende por que os silêncios e hesitações foram mantidos.

Como no livro de Oiticica, também esses depoimentos buscam valorizar trabalhos produzidos a partir dos anos 60, quando a experiência sensorial assume a dianteira em relação às preocupações formais. O alvo é igualmente a crítica "conservadora", que duvida da qualidade dessas obras.

Trabalhos como os "Objetos Relacionais", feitos de pedras, sacos e outros materiais sobre o corpo das pessoas, negam o objeto artístico e enfatizam a experiência de quem os vivencia. É essa fase, impossível de ser reproduzida em museu, que o arquivo focaliza.

CONVENCIONAL

Pelo avesso, os depoimentos revelam da parte da própria Lygia uma concepção de arte convencional. A questão a permear as conversas é a fronteira entre arte e terapia.

Até que ponto há valor estético nessa produção tardia? O que autoriza tomá-la como arte, e não como derivação do tratamento psicanalítico?

Parte significativa do esforço de críticos e curadores, dos anos 90 para cá, tem sido encontrar conceitos ampliados de arte para acolher essa produção, não raro com malabarismos retóricos que pedem socorro a Deleuze, Guattari ou ao filósofo da moda mais à mão.

Há registros da artista, contudo, em que a questão aparece em termos mais pedestres: a arte, no início da carreira, era compensação para frustrações. Em 1963, ela anotou no diário: "Eu que fiz uma análise que durou anos só para virar mulher e ser mais gente sempre dizia que se com isto a minha arte desaparecesse eu preferia ser uma pessoa autêntica a ser um artista que compensasse sua frustração através da criação artística. Ficou provado que sou artista mesmo".

O sucesso do tratamento implicaria o abandono da condição de artista. A "pessoa autêntica", integrada ao papel de mulher e mãe, não pode viver com a arte, que aparece como compensação para um estado permanente de frustração. É como se integração social e realização pessoal significassem uma morte simbólica, pois com isso morreria a forma de relação com a arte que cultivou publicamente.

"Ficou provado que sou artista mesmo." Essa concepção de arte é de forte carga romântica. O artista só existe como fruto do desajuste. As faíscas entre essa noção de arte convencional e uma trajetória que tem início no construtivismo -que pressupõe o apagamento da subjetividade e das veleidades do indivíduo- definem a forma como a equação entre "arte" e "vida" aparece na trajetória de Lygia.

TORTUOSO

O caminho que leva Lygia Clark e Hélio Oiticica da condição de jovens herdeiros do construtivismo a figuras exemplares da arte brasileira é tortuoso.

É preciso ter em conta a participação de ambos no grupo neoconcreto. Esse é o ponto de partida para uma aura de vanguarda que recai sobre os dois e dá a senha para as inovações posteriores. O grupo tem os ingredientes necessários -os manifestos, as palavras de ordem, a cobertura crítica e institucional- para constituir um momento de origem de fácil catalogação e que, a partir do material teórico a ele associado, produzido pelos próprios integrantes, entrega as chaves para sua decifração.

Ambos tiveram condições materiais de atuar como "artistas puros", sem necessidade de se empregar no mercado: o mesmo não ocorreu com muitos artistas associados à arte construtiva, sobretudo em São Paulo, que acabaram estigmatizados por unir arte e "indústria".

Some-se a isso o contato com críticos estrangeiros, a vivência nos EUA e Europa, a atuação do Projeto Hélio Oiticica no direcionamento das interpretações sobre a obra do artista, a valorização politicamente correta da arte em países emergentes por parte das universidades americanas e europeias, e, por fim, o bom momento da economia brasileira, impulsionando vendas de obras em feiras de arte pelo mundo, e se tem um esquema do processo em curso de canonização dos dois nomes.

Vale reter as palavras do crítico Paulo Venâncio Filho, também convidado para a série de depoimentos sobre Lygia Clark: "Vou a debates no exterior e a leitura que está se cristalizando é que a arte brasileira depois dos anos 60 só se deve ao Hélio e à Lygia. É preciso colocar isso em questão".

Posted by Guilherme Nicolau at 1:53 PM | Comentários (1)

Exposição interativa mostra aos visitantes espaços menos conhecidos do Parque Nacional da Tijuca, Jornal Dia Dia

Exposição interativa mostra aos visitantes espaços menos conhecidos do Parque Nacional da Tijuca

Matéria originalmente publicada no caderno Meio Ambiente do Jornal Dia Dia em 19 de março de 2012.

Rio de Janeiro - Em parceria com o Núcleo de Arte e Tecnologia (NAT) da Escola de Artes Visuais (EAV) do Parque Lage, da Secretaria Estadual de Cultura do Rio de Janeiro, o Parque Nacional da Tijuca (PNT) inaugurou a exposição permanente e gratuita Verde Memória e o Centro de Informações da unidade, que funcionará em espaço anexo às cavalariças, no Parque Lage.

A exposição permitirá à população fazer uma visita virtual pela unidade, com a possibilidade de conhecer áreas menos frequentadas. Segundo explicou a assessoria de imprensa do PNT, por estar localizado em meio a uma zona urbana e ser dividido em quatro setores, o parque muitas vezes não é percebido em sua totalidade pelos visitantes.

O mapeamento do Parque Nacional da Tijuca foi feito por equipes do Núcleo de Arte e Tecnologia da EAV no período de quatro meses. Elas usaram câmeras de celular para fazer os registros fotográficos e em gravação em vídeo. A exposição ficará aberta ao público de terça-feira a domingo, das 9 horas às 17 horas.

Ao visitar a exposição, o público poderá interagir com o que contempla, publicando suas próprias memórias digitais do Parque Nacional da Tijuca. Além de poder brincar com um jogo da memória, que permite ao visitante rever espaços do PNT, um monitor treinado ajudará os visitantes a deixar registrada sua visita ao parque, explorando seus principais atrativos, entre os quais estão a Pedra da Gávea, a Capela Mayrink, a Cascatinha, a Vista Chinesa, a Mesa do Imperador, o Parque Lage, o Morro do Corcovado e o Mirante Dona Marta.

A diretora da EAV do Parque Lage, Claudia Saldanha, explicou que o visitante terá a oportunidade de conhecer dados importantes sobre a flora e a fauna do PNT, além dos principais roteiros e trilhas.

Posted by Guilherme Nicolau at 1:43 PM

Nova meta de Inhotim é se tornar referência em educação por Audrey Furlaneto, O Globo

Nova meta de Inhotim é se tornar referência em educação

Matéria de Audrey Furlaneto originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de São Paulo em 19 de março de 2012.

RIO - Seis anos depois de ser inaugurado distante do principal eixo cultural do país (a 545 km de São Paulo e a 400 km do Rio), o Instituto Inhotim já se consagrou como o principal centro de exposição de arte contemporânea do país. Os visitantes saltaram de pouco mais de sete mil, no ano de inauguração, para 247 mil em 2011. A forma como estão distribuídas as cerca de 500 obras de arte pelo parque - com nada menos que dois milhões de metros quadrados - chama a atenção de espectadores e especialistas em todo o mundo. Unanimidade na área, Inhotim tem nova ambição: tornar-se referência em educação.

Em abril, a megainstituição, cujo empreendimento é avaliado em algo como US$ 200 milhões, dará um importante passo para isso. Vai sediar o primeiro curso intensivo de curadoria - a arte de montar exposições - de um dos mais importantes institutos voltados para a profissão, o Independent Curators International (ICI), de Nova York. A presidente da escola, Kate Fowle, visitou Inhotim pela primeira vez em 2010 e sentiu estar num lugar "incrivelmente único para pensar curadoria".

- Se tivesse que ilustrar o trabalho de um curador, desenharia um iceberg. A exposição seria a parte que se vê acima da água, e toda a pesquisa e o engajamento que se produz seriam o que está escondido debaixo da superfície - diz Kate. - O tempo que curadores gastam vendo arte, falando com artistas e entendendo contextos de produção artística supera de longe a duração de uma exposição.

Maioria dos inscritos não é do Brasil

Na próxima semana, ela e o corpo de curadores de Inhotim anunciam os 15 escolhidos entre os 48 candidatos que apresentaram projetos para conseguir uma vaga no intensivo. São apenas seis dias, de 22 a 28 de abril, ao custo de R$ 4 mil por aluno, para ter encontros com a presidente do ICI, os curadores independentes Victoria Noorthoorn e Adriano Pedrosa, o codiretor da galeria Artangel, de Londres, James Lingwood, e o corpo curatorial do instituto, formado por Allan Schwartzman, Rodrigo Moura e Jochen Volz.

A maioria dos inscritos não é do Brasil: curadores europeus, latino-americanos, turcos e até da Oceania tentam uma vaga no intensivo do ICI no país. Todos têm pelo menos cinco anos de experiência - ou, como define o curador de Inhotim Jochen Volz, "um bom repertório de fiascos e sucessos".

- Inhotim é diferente de qualquer outra instituição que conheci no mundo, pela evolução única de um incrível programa de arte. Além do lugar magnífico e das atitudes inovadoras, que são simplesmente incríveis de se vivenciar, a equipe curatorial tem pensado e abordado questões como a adaptação de obras site-specific e a recriação de projetos perdidos ou não realizados.

Fowle se refere a trabalhos como a Galeria Cosmococa, que reúne num único ambiente e em caráter permanente as cinco cosmococas de Hélio Oiticica e Neville d'Almeida. As obras, de 1973, ganham espaço raro no instituto e, antes, só haviam sido vistas juntas em uma exposição temporária. Há ainda a recriação da obra "Narcissus Garden", que a japonesa Yayoi Kusama fez para a Bienal de Veneza de 1966. Em Inhotim, as esferas brilhantes de aço inoxidável da obra de Kusama flutuam em espelhos d'água imaginados especialmente para abrigá-las.

Para o curador Rodrigo Moura, que entre 2004 e 2006 esteve à frente do Museu de Arte da Pampulha, em Belo Horizonte, o curso com o ICI é o "reconhecimento de Inhotim como ponto de discussão".

- O que temos constatado é que há um número crescente de estrangeiros que têm Inhotim como destino principal da viagem. O instituto parece ter entrado para a proposta do turismo de peregrinação, de procurar lugares remotos para conhecer, espécie de tendência do mundo contemporâneo - avalia Moura.

Há, por exemplo, um grupo de colecionadores da Coreia com visita agendada para o segundo semestre. Assim como os grupos leigos - ou seja, não especializados em artes plásticas, que, segundo Moura, costumam ter "respostas muito generosas" -, colecionadores e estudiosos mostram-se "surpresos, parecem estar diante de algo muito novo":

- Os museus normalmente fragmentam a presença do artista. Nós fazemos o oposto: buscamos o aprofundamento e a intensificação de uma trajetória, da individualidade de um artista.

Formação para o lidar com o mercado

Para Jochen Volz, a curadoria de Inhotim ainda se beneficia de um elemento: a jornada. O instituto não é exatamente próximo do eixo turístico do país e, para conhecê-lo, os espectadores (exceto os da vizinha Brumadinho) farão uma viagem.

- O espectador já se deslocou de seu lugar, está num parque, caminha e, de repente, está numa obra de Cildo Meirelles. Temos a ideia de ele ser guiado, sem ser conduzido - explica Volz.

Ele foi, entre outras mostras, curador da Aichi Trienal de Nagoya, no Japão, em 2010, da 53 Bienal de Veneza, na Itália, em 2009, e curador convidado da 27 Bienal de São Paulo, em 2006.

- Curadoria se aprende fazendo e vendo. Eu mesmo nunca fiz um curso - diz, rindo. - Mas pude ver muitas exposições.

Ainda assim, Volz defende a necessidade de formação de curadores com "pensamento mais elaborado e sofisticado" para lidar com "um mercado de arte também cada vez mais sofisticado e complexo". Inhotim, ele completa, reforça essa complexidade:

- É desafiador criar um conjunto que será permanente e que ganhe, com os anos, mais relevância. Vejo o curador também como um produtor que facilita e provoca o trabalho do artista. O curador é um pouco sócio no crime.

A proposta dos intensivos do ICI é colocar frente a frente profissionais de diferentes origens e expectativas, a fim de criar debates e, claro, soluções expositivas.

O ICI, segundo Fowle, reconhece a "invisibilidade" da profissão e foi criado em 1975 para apoiar mostras de curadores independentes que já buscavam levar a arte a públicos maiores. A primeira exposição, aliás, ocorreu no Brasil, na Bienal de São Paulo de 1975. O ICI viabilizou o projeto dos Estados Unidos, trazendo ao país obras de 32 artistas que estavam começando a ter notoriedade. Entre os nomes, por exemplo, estava Nam June Paik.

Posted by Guilherme Nicolau at 1:29 PM

Uma fila para verbas por Mariana Durão, O Estado de São Paulo

Uma fila para verbas

Matéria de Mariana Durão originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de São Paulo em 19 de março de 2012.

Produtores culturais cariocas que pleiteiam recursos do edital 2012 da Lei Municipal de Incentivo à Cultura para seus projetos estão desde sexta-feira na porta do Centro de Artes Calouste Gulbekian, no centro do Rio, determinados a lá permanecer até a próxima sexta. Vale a ordem de chegada, daí a disposição para a vigília. Ontem, a fila passava de 60 pessoas.

O Calouste, que fica numa área movimentada apenas em dia de semana, e sempre deserta durante a noite, é o local designado pela prefeitura para a entrega de documentos necessários ao recebimento de verba por produtores previamente cadastrados. Todos os projetos já conseguiram patrocínio de empresas interessadas na renúncia fiscal do Imposto Sobre Serviços (ISS). Mas as patrocinadoras só liberam o dinheiro quando o processo é concluído na Secretaria de Cultura, o que só poderá ser feito na sexta-feira, com a entrega do Termo de Compromisso e Adesão.

O cenário no "assentamento cultural" é digno do teatro do absurdo ou do roteiro de um filme de horror. Sem banheiro ou restaurantes próximos, os candidatos tomam chuva e tentam se acomodar no chão ou em cadeiras de praia. Representantes de empresas também estão na fila.

Algumas optaram por fazer um rodízio de funcionários. Na disputa, estão projetos de música, dança, teatro, cinema, fotografia, artes plásticas, literatura e restauração. Os produtores podem captar até R$ 800 mil por projeto. Já as empresas podem ter imposto deduzido até o valor de R$ 3 milhões.

Assistente administrativa da Casa da Palavra, Maria Cassiana vai se revezar com outras três pessoas da editora. "É uma prova de resistência física e psicológica. Já fizemos esse esquema quatro vezes, mas nunca por uma semana, como agora." Dormindo numa barraca, o produtor Paulo Branquinho tenta defender a verba para duas exposições de arte. Para conseguir a senha de número 40, ele chegou ao meio-dia de sexta. "O primeiro grupo chegou às 8 da manhã. Passei de 54º para 40º porque muitos desistiram. Outros produtores contrataram pessoas para esperar, mas acho que ficar aqui é uma forma de pressionar o prefeito Eduardo Paes."

A esperança de Branquinho e de outros produtores é que Paes eleve a renúncia do ISS prevista para fomentar projetos este ano. O total soma R$ 14,8 milhões. Produtores ouvidos pelo Estado dizem que a adesão de empresas patrocinadoras no Rio superou R$ 60 milhões, mas a Prefeitura tem optado por praticar a renúncia mínima, de apenas 0,35% do ISS arrecadado, bem abaixo do limite de 1% estabelecido pela lei municipal. Pelos cálculos de quem aguardava, o dinheiro deve acabar no 21º da fila.

Para Viviane Ayres, produtora da Associação Cultural Cidadela, o crescimento da fila tem a ver também com o desequilíbrio entre o volume de projetos aprovados e os recursos disponíveis para a realização. Em junho de 2011, centenas deles receberam o OK da Prefeitura, que em dezembro analisou outros tantos. "A categoria é pouco articulada e fica aqui com o pires na mão. Mas a demanda é muito maior que a oferta."

Outro ponto citado pelos produtores é o predomínio de grandes patrocinadoras entre os contemplados. Empresas como Unimed, Chemtech e Operador Nacional do Sistema (ONS) tinham anteontem representantes nos primeiros lugares da fila. O valor de 3 milhões (R$ 800 mil por projeto) é muito diante de uma subvenção total de R$ 14,8 milhões. No ano passado, juntas, elas inscreveram incentivos de mais de R$ 8 milhões. Contax, Amil e Odebrecht entraram com outros R$ 6 milhões.

Posted by Guilherme Nicolau at 1:00 PM

'Despreparo é dolorosamente evidente', dizem intelectuais sobre gestão do MinC, Estado de São Paulo

'Despreparo é dolorosamente evidente', dizem intelectuais sobre gestão do MinC

Carta assinada por Eduardo Viveiros de Castro, Gabriel Cohn, Laymert Garcia dos Santos, Manuela Carneiro da Cunha, Marilena Chauí, Moacir dos Anjos e Suely Rolnik originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de São Paulo em 18 de março de 2012.

Carta é endossada por meio de abaixo-assinado no Petição Pública.

Na última década, o Ministério da Cultura transformou-se em uma área especialmente dinâmica do governo federal. Ao reconhecer a importância primária das práticas de sentido para a vida social, o Estado deu-se finalmente conta de que tem responsabilidades incontornáveis no que toca ao estímulo, apoio e defesa das manifestações criativas que emergem do povo, ou melhor, dos povos brasileiros como expressão de sua vitalidade e de sua personalidade.

À medida que o país foi ganhando projeção internacional, maior foi se tornando a necessidade de definirmos e consolidarmos a contribuição distintiva que o Brasil espera estar em condições de dar à civilização mundial. Com este objetivo, a abertura da esfera pública a uma multiplicidade de agentes e ações, oriundos de todas as regiões do Brasil, ligados à criação de cultura, isto é, de valor existencial - artistas, ativistas digitais, produtores culturais, editoras independentes, coletivos experimentais, criadores da moda e do design, intelectuais, povos indígenas, comunidades tradicionais, quilombolas, movimentos contra a discriminação de gênero e de orientação sexual, ambientalistas, grupos culturais dos mais variados matizes e propósitos - constituiu-se em uma das experiências institucionais mais inovadoras que o Estado brasileiro jamais promoveu.

Sob a liderança das gestões da cultura durante os 8 anos do governo Lula, o acolhimento entusiástico de uma vasta gama de manifestações antropológicas, tradicionais como modernas, regionais como nacionais, locais como globais, deu direito de cidadania e densidade politica a vários conceitos novos, doravante parte de nosso vocabulário de política pública: "cultura digital", "pontos de cultura", "cultura viva", "patrimônio imaterial", "cidades criativas", "economia da cultura", "diversidade cultural", "creative commons", "compartilhamento", "cultura e pensamento", "cidadania colaborativa", "participação setorial" e tantos outros. Um Plano Nacional de Cultura foi redigido pelo MinC com ampla participação dos setores interessados, e foi aprovado pelo Congresso Nacional. Tratou-se de um esforço consistentemente democrático de transformação da agitação social em meio de conquista de uma voz pública, de expressão da força viva dos povos de nosso país nos termos de um discurso de dimensões propriamente políticas, no sentido mais nobre da palavra.

Como herdeiro legítimo deste legado, o governo Dilma tem um grande desafio pela frente. É enorme a expectativa dos inúmeros grupos envolvidos no processo de emancipação cultural iniciado nas gestões passadas. Os que acompanham, como cidadãos, essa histórica reviravolta inquietam-se sobre a orientação que irá prevalecer uma vez encerrado o primeiro ano de uma gestão federal de cultura marcado por hesitações, conflitos e por mudanças de rumo que nos têm parecido infelizes.

É inevitável constatar que houve inúmeras perdas de visibilidade e de nitidez no horizonte da política cultural, comprometendo a imagem de um país que avança para o futuro sem perder a relação com seu passado, e que se moderniza sem destruir suas tradições. Depois de inúmeras notícias desalentadoras ao longo do ano que passou, a opinião pública constata que a presente gestão de nossa política cultural vem se mostrando descomprometida com o legado das conquistas recentes neste âmbito, como o atestam as inúmeras iniciativas de grande impacto dentro e fora do País. É digno de nota, em particular, o que parece ser o total desconhecimento, por parte da atual gestão do MinC, do debate internacional sobre os desafios que o novo regime capitalista globalizado coloca para os criadores em todos os âmbitos da cultura, nesta época em que a criação de valores existenciais se viu capturada e sujeitada pela produção de valor econômico.

O despreparo para a prática do diálogo e do embate crítico por parte dos atuais responsáveis pelo MinC é dolorosamente evidente. É assustador, por exemplo, que em recente entrevista a ministra afirme que tem vivido uma "guerra de nervos" e que todo o seu universo de preocupação esteja reduzido à sensação de que os que discordam de sua gestão estejam apenas querendo derrubá-la de seu posto, deixando de lado o sentido maior da vida democrática que é a possibilidade do diálogo e da reconciliação em benefício de algo público e de grandeza comum.

A criação cultural é indissociável da construção inovadora de horizontes para o País, é a cultura que forma as realidades que nos condicionam e projetam os destinos da vida em comum. Não faz mais sentido pensar nos quadros anacrônicos que tinham a chamada "infraestrutura", ou economia, como elemento primacial da vida humana, ao passo que a cultura, ou "superestrutura", era vista como artigo de luxo. Pois não é possível, justamente, entrarmos em pleno século 21 equipados com uma "superestrutura" mental que data do século 19. É um engano gravíssimo um Estado contemporâneo não dar a devida importância à agenda das políticas culturais, pois a economia sem a cultura não pode mais do que propagar a desvalorização de uma sociedade, colocando-a a mercê de interesses estritamente econômicos.

Desde que a crise global se abateu sobre o ocidente capitalista em 2008, a agenda cultural se tornou um tema ainda mais importante para nós e as disputas de sentido vão direcionando os possíveis caminhos a seguir. Ora, foi precisamente neste momento crítico que passamos a constatar a decadência do protagonismo do governo federal na área da política cultural, com a trágica perda de capacidade para gerar consensos mínimos e coordenar o desenho de horizontes para os inúmeros segmentos que estavam sendo reconhecidos pelo governo Lula. Esse perigoso isolamento do MinC pode nos fazer retroceder mais e mais nos próximos anos, ainda que a prosperidade econômica se mantenha. A mera celebração de uma "cultura" concebida como excedente simbólico entregue a profissionais consagrados da indústria de entretenimento certamente não pode substituir a consciência ativa do papel central que a força de trabalho criativa passou a desempenhar no cenário do novo regime capitalista. O MinC de hoje desconhece os sistemas de acumulação financeira, de ganho unilateral de corporações com os direitos autorais e de imagens. Ao tornar-se refém de um modelo institucional arcaico, o governo federal vai aceitando que as forças mais reativas do modelo neoliberal passem a conduzir as subjetividades, tornando-se um instrumento para sustentar apenas desejos sociais compulsivos de consumo, como se estes fossem o meio de produção de sociabilidade.

Neste sentido, a escolha do(a) ministro(a) que a Presidenta tem em suas mãos é um dos trunfos fundamentais na consolidação do projeto de país que se começou a implantar desde o fim da ditadura militar. Esta é uma responsabilidade crucial do governo federal e da sociedade civil, não podendo ser deixada ao sabor da Realpolitik e seus jogos de acomodação partidária. Esperamos que Dilma Rousseff, que tem mostrado grande competência na condução do País em outros setores, confirmada pelos altos índices de aceitação popular, tenha sensibilidade e coragem para indicar um ministro da cultura à altura do que requer este cargo, em vista da importância do Brasil no cenário mundial contemporâneo. Um(a) ministro(a) que alie uma escuta fina para a diversidade cultural, no acompanhamento das complexas demandas culturais internas e na articulação ousada com o cenário internacional, sobretudo em torno dos problemas deste novo estatuto da cultura.

A experiência acumulada por este nome escolhido é algo essencial neste momento. Quer em termos profissionais, quer em familiaridade com a política da criação contemporânea e a rica variedade a de suas manifestações, uma liderança suprapartidária e democrática é o que pode garantir um pulso firme e uma capacidade de gestão dinâmica, de verdadeira liderança nesta direção que o presente nos aponta. Nós signatários, como todos os produtores de cultura neste País, temos nossa parcela de responsabilidade nesta tarefa: cabe a nós o apoio ao futuro portador desta inteligência de qualidade cultural e a exigência de uma escolha acertada para os próximos anos da atual gestão federal neste importante âmbito da vida nacional.

POR MARILENA CHAUÍ, EDUARDO VIVEIROS DE CASTRO, SUELY ROLNIK, LAYMERT GARCIA DOS SANTOS, GABRIEL COHN, MANUELA CARNEIRO DA CUNHA, MOACIR DOS ANJOS

Posted by Guilherme Nicolau at 12:53 PM

Intelectuais pedem, em manifestos, saída de Ana de Hollanda do MinC por Jotabê Medeiros, O Estado de São Paulo

Intelectuais pedem, em manifestos, saída de Ana de Hollanda do MinC

Matéria de Jotabê Medeiros originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de São Paulo em 19 de março de 2012.

Um dos documentos sugere Danilo Santos de Miranda, diretor do Sesc São Paulo, para o Ministério da Cultura; outro aponta 'despreparo' de responsáveis por pasta

Este é o início de uma semana crucial para a atual ministra da Cultura, Ana de Hollanda. Desde o final da semana passada, manifestos de artistas e intelectuais começaram a circular pedindo abertamente sua substituição à presidência Dilma Rousseff. São assinados por gente à direita e à esquerda, moderados e radicais, notáveis e anônimos militantes da cultura digital.

O Caderno 2 publica abaixo uma das manifestações. Outro documento, uma carta de intelectuais e artistas que será entregue à Casa Civil (cujo primeiro nome assinado é o da atriz Fernanda Montenegro) diz que, "na hipótese de haver a decisão de substituição do titular da pasta da Cultura – tema veiculado na mídia, mas não necessariamente verdadeiro – a classe cultural, aqui representada em suas diversas linguagens e regiões, vem dar sua contribuição cívica, politico-participativa, e apresentar um nome que, certamente, faria a diferença na história do Ministério da Cultura, e aglutinaria os mais diversos segmentos ao seu redor: Danilo Santos de Miranda."

Danilo Miranda, diretor do Sesc São Paulo, é um nome sempre recorrente em época de crise no MinC. Anteriormente, ele se mostrava reticente, mas agora diz a interlocutores que, se convidado, aceitaria. Quarta-feira, em São Paulo, na festa dos 25 anos do Itaú Cultural, o ator Dan Stulbach disse que "se ministro da Cultura fosse eleito pelo voto direto, Danilo Miranda teria o meu voto". Mas outros nomes também estão sendo lançados por diversos grupos, entre eles o da atriz Carla Camurati (diretora do Teatro Municipal do Rio de Janeiro) e o da historiadora Rosa Maria Araújo, do MIS carioca (irmã do novelista Gilberto Braga e parceira de Sergio Cabral no musical Sassaricando).

São manifestações desinibidas, calcadas no fato de que Ana de Hollanda desfruta hoje de uma rara unanimidade negativa. A gota d’água, na semana passada, foi a revelação (pelo blog Farofafá) de que o MinC advogou em favor do Escritório de Arrecadação e Distribuição de Direitos (Ecad) em um processo no qual a instituição autoral é acusada de cartelização e gestão fraudulenta. O processo está em julgamento no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). O Ministério da Cultura recusou-se a comentar o caso.

Por causa da denúncia, baseada em documento enviado pelo MinC ao Ministério Público Federal, a ministra foi convidada a se explicar no Senado. Ainda não disse se vai aceitar o convite. Caso aceite, dificilmente terá argumentos para convencer os senadores, já que está demonstrada sua defesa do Ecad (denunciado pelo próprio governo, por meio do Ministério da Justiça). Caso não aceite, poderá municiar ainda mais a oposição à sua gestão, corroborando acusações.

É uma associação desconfortável para o governo. A revista IstoÉ revelou essa semana que a CPI do Senado que investiga o Ecad deverá propor, em seu relatório final, daqui a um mês, o indiciamento de quatro dos seus diretores por formação de quadrilha, cartel e apropriação indébita.

Há rumores também que o isolamento da ministra causa uma caça às bruxas dentro da própria estrutura do ministério. Desde que assumiu, há 14 meses, Ana de Hollanda já demitiu dois chefes de Comunicação de sua assessoria, creditando aos subordinados os problemas de suas relações com a imprensa. Também se diz que ela e o homem que viabilizou seu nome para o MinC, Antonio Grassi (atual presidente da Funarte), só se falam agora de forma protocolar – na sexta, a ministra desautorizou nota oficial da Funarte informando que ela e seu secretário executivo, Vitor Ortiz, participariam de encontro da Funarte no Rio.

A ministra procura se afirmar tocando uma agenda "positiva". Antecipou editais do Fundo Nacional de Cultura de R$ 133 milhões – mas sem revelar o fato de que os editais não são um investimento extraordinário, apenas o adiantamento de uma agenda, já que, em julho, por conta da legislação eleitoral, será proibido destinar recursos a Estados e municípios (pode caracterizar favorecimento político). Entretanto, nem uma palavra sobre o corte de R$ 440 milhões do orçamento de 2012 (R$ 105 milhões da verba direta e R$ 335 milhões em emendas parlamentares).

A situação, como se vê, é tensa, mas dois dos mais lidos colunistas das Organizações Globo (Jorge Bastos Moreno e Ricardo Noblat) garantiram sábado, sem meias palavras, que "Dilma já decidiu: Ana de Hollanda fica na Cultura". Mais lenha na fogueira.

Posted by Guilherme Nicolau at 12:36 PM

Entrevista exclusiva com artista chinês Ai Weiwei é destaque da "Ilustríssima", Folha de São Paulo

Entrevista exclusiva com artista chinês Ai Weiwei é destaque da "Ilustríssima"

Matéria originalmente publicada no caderno de Ilustríssima do jornal Folha de São Paulo em 18 de março de 2012.

A edição da "Ilustríssima" desta semana traz na capa uma entrevista exclusiva com o artista e ativista chinês Ai Weiwei, um dos principais contestadores da ditadura comunista.

A entrevista, concedida ao correspondente da Folha em Pequim, Fabiano Maisonnave, representa um desafio à censura que as autoridades chinesas impuseram a Ai Weiwei, entre as quais não falar à imprensa estrangeira.

Ai Weiwei passou 81 dias preso no final do ano passado, sob acusação de sonegação de impostos. Na entrevista, ele alega não ter sido infomado dos motivos da prisão e afirma que o governo chinês não realizou um processo legal.

Ai Weiwei tornou-se conhecido mundialmente após fazer de seu blog uma plataforma de oposição ao governo. Com o blog retirado do ar, prosseguiu a contestação em seu trabalho artístico e foi sucessivas vezes retaliado.

Reprodução

Capa da edição da "Ilustríssima" deste domingo, de 18 de março, produzida pelo cartunista Laerte Coutinho
A entrevista, realizada em seu ateliê, permanentemente vigiado pelo governo chinês, ainda fala do pai de Ai Weiwei, um poeta de renome que caiu em desgraça e foi enviado com a família para a região conhecida como "pequena Sibéria", onde os Ai passaram 16 anos. Entre outros assuntos, fala também do iPhone, objeto de desejo em todo o mundo (usado pelo próprio artista) que é fabricado em condições que Ai Weiwei chama de "escravidão".

EXPOSIÇÃO

A obra de Ai Weiwei pode ser conhecida na retrospectiva "Entralacs" (Entrelaços), atualmente em cartaz no museu Jeu de Paume, em Paris. A exposição reúne grande número de fotografias e vídeos, além de tuítes e postagens feitas em seu blog.

O editor-executivo da Folha, Sérgio Dávila, esteve no Jeu de Paume e comenta a exposição em texto na "Ilustríssima".

Veja aqui algumas imagens da exposição

Para Dávila, a mostra deixa algumas questões sem resposta, como a imprecisa delimitação entre o que é artístico e o que é político em seus trabalhos. Outro ponto de dúvida é a possível condescendência de críticos, curadores e do público com as contradições de um artista que, embora perseguido pelo regime, colaborou muito recentemente com ele, ao participar do projeto do estádio Ninho de Pássaro, construído para os Jogos Olímpicos de Pequim.

Para ilustrar a capa, a "Ilustríssima" convidou um artista brasileiro cujo trabalho vem ganhando forte conotação política: o cartunista Laerte Coutinho.

Posted by Guilherme Nicolau at 12:22 PM

Morre aos 40 anos o poeta Ericson Pires, O Globo

Morre aos 40 anos o poeta Ericson Pires

Matéria originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Globo em 17 de março de 2012.

Internado há um mês com pancreatite aguda, ele será enterrado às 15h deste sábado, no Catumbi

RIO - Nascido na Rua Gomes Freire, no coração da Lapa, em 1971, Ericson Siqueira Pires era um corpo em constante movimento pela cidade. Poeta, performer, ator, músico, produtor e agitador cultural, além de mestre e doutor em Literatura pela PUC-RJ, Ericson foi um dos fundadores do CEP 20.000, ao lado de Guilherme Zarvos e Ricardo Chacal, criador do coletivo musical HAPAX, um combo auto-denominado “grupo de afro-industrial”, do coletivo RRRadical e participante de uma série de outros. Militante ativo nas artes, na política e no cotidiano urbano da cidade, lançou como poeta os livros “Cinema de garganta” (Azougue, 2002) e “Pele tecido” (7 Letras, 2010).

No primeiro, a inquietação e o lirismo potente do autor saltava de poemas que mesclavam prosa narrativa e versos de teor fabular. Ele também flertava com as artes plásticas em poemas iconográficos que dialogavam com ilustrações, num fluxo livre que apontava uma das marcas do pensamento e da ação de Ericson, o compromisso com “a instantaneidade do instante do instante”, também evidenciado em “Pele tecido”, amostra poética de toda volatilidade, urgência, risco e beleza de um corpo colocado inteiro e ativo a serviço de uma experimentação da vida.

“O homem dança. O homem descobre a poesia para aconchegar a fúria. O homem é também política”, escreveu Guilherme Zarvos.

Faixa-preta e ex-professor de jiu-jitsu, Pires fazia da arte ação, luta, resistência e estratégia de combate. Fruto de suas andanças pela urbe nasceu também o livro “Cidade ocupada” (Aeroplano, 2007), um manifesto em defesa da arte urbana como forma de resistência, um escrito que partia de suas aventuras e vivências em coletivos artísticos. O autor defendia uma ocupação da cidade com expressões coletivas, de múltiplas vertentes, que pudessem diluir as barreiras entre a arte dos centros e da periferia.

Filiado à academia, Ericson deixou trabalhos importantes como o livro “Zé Celso Oficina-Uzyna de corpos” (Editora Annablume, 2004), desdobramento de sua dissertação de mestrado entregue ao departamento de Letras da PUC-RJ. Foi também pesquisador do Programa Avançado de Cultura Contemporânea (PACC) da UFRJ e professor adjunto do Instituto de Arte da UERJ.

Ericson Siqueira Pires estava internado há um mês, logo após ter sido diagnosticado com uma pancreatite aguda. Ele faleceu às 4h deste sábado, no Hospital Universitário Pedro Ernesto, em decorrência de complicações em seu quadro. O corpo será enterrado neste sábado, às 15h, no cemitério do Catumbi.

Posted by Patricia Canetti at 12:07 PM

Lygia Pape ganha novo sentido em tempos de revolução política por Silas Martí, Folha de São Paulo

Lygia Pape ganha novo sentido em tempos de revolução política

Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno de Ilustrada do jornal Folha de São Paulo em 17 de março de 2012.

Numa era de revoluções em praça pública, como as que abalaram o mundo no ano passado, a obra de Lygia Pape nunca esteve tão atual.

Enquanto o museu Reina Sofía abria há pouco menos de um ano em Madri a retrospectiva da artista que chega hoje à Estação Pinacoteca, os chamados indignados ocupavam a praça do Sol no coração da capital espanhola.

Pape, morta aos 77 em 2004, teria visto naquela ocupação um exemplo do que fotografou ao longo da vida como "Espaços Imantados", lugares na cidade com um poder de atração magnético, pontos fulcrais de vida e movimento na trama urbana.

Mas tanto nos experimentos mais formais, como desenhos e gravuras de abstrações geométricas, quanto nas performances sensoriais que arquitetou, Pape buscava uma fusão entre arte e vida.

Divulgação

Xilogravuras sobre papel japonês da série 'Tecelar', de Lygia Pape, na Estação Pinacoteca
Em seu "Livro do Tempo", megainstalação composta de 365 quadros coloridos, todos variações geométricas de um quadrado, Pape faz justamente isso: funde a passagem do tempo, um ano, à mutação das formas no espaço.

Sua disposição no museu também induz à caminhada, dando a sensação de marcha e progresso e, ao mesmo tempo, de insignificância diante da extensão dos quadrados que se alastram pela parede.

"Ela faz esse 'livro' pensando no sentido rítmico das palavras", diz Manuel Borja- Villel, curador do Reina Sofía. "É como uma dança."

Essa elasticidade, uma alternância entre forma abstrata e presença potente e física no mundo, marca toda a obra da artista. Nada ali é ornamento, acessório ou gratuito.

Quando cobriu uma multidão com um enorme manto branco, deixando buracos para as cabeças, Pape criou a imagem contundente de corpos separados da razão, cabeças decepadas no momento mais crítico da política nacional --1968, ano do AI-5.

Registros dessa performance, que aconteceu pela primeira vez nos jardins do Museu de Arte Moderna do Rio e depois foi repetida em Nova York, Madri e São Paulo, estão na mostra da Pinacoteca.

"Uma obra dessas nunca está fechada", diz Borja- Villel. "Tanto a política quanto as formas abstratas fazem parte da ética do questionamento, uma atitude vital."

Numa quase ilustração dessa arte vital, Pape se fechou num cubo e saiu dele, rompendo suas faces, na performance "O Ovo", de 1967.

Ou seja, no ano em que despontou a tropicália, Pape fez o trabalho que ajudou a enquadrar sua obra no que alguns críticos chamam de modernidade tropical, a forma como brasileiros, antropofágicos ou não, distorceram cânones artísticos de europeus e norte-americanos.

"Precisou passar um certo tempo para que se pudesse entender Lygia Pape", diz o curador. "Ela questiona a essência de todos os cânones."

Lygia Pape - Espaço Imantado, Estação Pinacoteca, São Paulo - SP, 18/03/2012 a 13/05/2012

Posted by Guilherme Nicolau at 12:02 PM

março 16, 2012

Retrospectiva do artista Leonilson será aberta nesta sexta por Roger Lerina, Zero Hora

Retrospectiva do artista Leonilson será aberta nesta sexta

Mostra reúne 361 trabalhos do artista cearense

A Fundação Iberê Camargo inaugura a temporada 2012 de grandes exposições trazendo a Porto Alegre a maior retrospectiva já montada de um nome central na arte brasileira contemporânea: José Leonilson (1957 – 1993).

Em cartaz a partir desta sexta-feira, a mostra Leonilson – Sob o Peso dos meus Amores reúne 361 trabalhos do artista cearense que criou uma poética ao mesmo tempo lírica, dolorida e irônica, expressa em pinturas, desenhos, bordados e instalações.

A exposição lança um olhar panorâmico sobre a trajetória do artista – dos primeiros estudos, datados de 1972, até o ano de sua morte, por complicações decorrentes da Aids. Trata-se de uma nova montagem do evento apresentado em São Paulo em 2011, no Itaú Cultural. Em Porto Alegre, Sob o Peso dos meus Amores vai exibir 126 trabalhos inéditos, incluindo um conjunto de ilustrações realizadas entre 1991 e 1993 para a coluna da jornalista Barbara Gancia no jornal Folha de S. Paulo.

– São cem desenhos que comentam o cotidiano da cidade de São Paulo, do país e do mundo de forma irônica e com humor – explica o cocurador Ricardo Resende, também consultor do Projeto Leonilson e diretor-geral do Centro Cultural São Paulo.

Artista que integrou o grupo conhecido como Geração 80, responsável por um vigoroso retorno à pintura na arte brasileira contemporânea, Leonilson participou em 1985 das bienais de São Paulo e Paris. Sua obra ganhou mais projeção internacional especialmente a partir dos anos 1990, migrando de uma pintura com caráter mais violento para manifestações artísticas delicadas e intimistas, expressas em pequenos desenhos, esculturas e bordados.

– Leonilson teve um papel importante na retomada da pintura, mas o que o diferencia de seus colegas de geração é uma escrita confessional, existencial, autobiográfica, que vai imprimir em sua obra de uma forma bastante fluente. Essa projeção do secreto e do confidencial fica mais intensa no final da vida – diz o cocurador e crítico de arte Bitu Cassundé.

A mostra inclui ainda nove agendas de Leonilson – onde ele esboçava suas obras e registrava suas atividades culturais –, digitalizadas e disponíveis ao público em iPads instalados em tótens, e a exibição do filme Com o Oceano Inteiro para Nadar, documentário sobre o artista dirigido por Karen Harley.

– É uma exposição com muitas obras e textos, demorada, que envolve. É para se ver com calma – recomenda Bitu.

Saiba mais sobre a exposição na Agenda de Eventos

Posted by Cecília Bedê at 4:08 PM

MAM deve tornar-se o realizador oficial da 30ª Bienal de SP por Camila Molina, O Estado de S Paulo

MAM deve tornar-se o realizador oficial da 30ª Bienal de SP

Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 16 de março de 2012.

Ministério da Cultura anuncia nos próximos dias a instituição que será proponente legal do evento, em setembro

Fontes do Ministério da Cultura (MinC) afirmam que o Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo deve ser anunciado nos próximos dias como o novo proponente da 30.ª Bienal de São Paulo, prevista para ser inaugurada em setembro. Acirradas, as últimas negociações do governo federal com representantes da Fundação Bienal de São Paulo, Advocacia-Geral da União (AGU), MAM e do Instituto Tomie Ohtake - este também indicado pelo MinC para o projeto de troca do proponente da mostra - ocorreram anteontem em São Paulo. A decisão ainda será anunciada pelo Ministério da Cultura, e um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) vai ser assinado entre os envolvidos para que a mostra seja aberta para o público no dia 7 de setembro.

"Precisamos que o MinC defina a instituição para que a gente possa começar a ter um processo de negociação mais detalhado para realizar a mostra. Estamos otimistas", afirmou anteontem Heitor Martins, presidente da Fundação Bienal de São Paulo, em evento dos 25 anos do Itaú Cultural no Auditório Ibirapuera. "Os R$ 12 milhões já captados vão ser transferidos para o novo proponente", disse Martins. Segundo ele, a 30.ª Bienal de São Paulo está orçada entre R$ 20 milhões e R$ 21 milhões - os recursos restantes ainda terão de ser captados.

"A única saída é ter outro proponente para que haja a mostra. O conselho endossa todas as negociações da diretoria da Bienal", afirmou, na terça-feira, o colecionador Adolpho Leirner, membro do conselho da Fundação Bienal de São Paulo, depois de reunião dos conselheiros da instituição. "Mas temos de deixar claro que essa é uma solução pontual para o problema da instituição, para que não se construa aquela ideia de que a Bienal de São Paulo está voltando para o MAM", disse Julio Landmann, também conselheiro da fundação.

Ele se referia à história dos primórdios da Fundação Bienal, que, quando instituída, em 1951, tinha como sede o MAM.

O problema sobre o futuro da 30.ª Bienal começou em janeiro. No início do ano, a Fundação Bienal de São Paulo entrou na lista de inadimplentes do MinC por causa de questionamentos da Controladoria-Geral da União (CGU) sobre convênios firmados pela instituição paulistana entre 1999 e 2007 (das gestões de Carlos Bratke e Manoel Pires da Costa, ambas anteriores à atual diretoria da entidade).

Pelos cálculos da CGU, a irregularidade dos convênios teria acarretado rombo de cerca de R$ 75 milhões. Com a criação de um TAC para que a 30.ª Bienal tenha outro proponente legal que não a própria fundação, o processo de prestação de contas dos convênios questionados ocorrerá em paralelo.

Posted by Cecília Bedê at 3:49 PM

março 15, 2012

Bienal de São Paulo ainda espera por uma salvação por Márcia Abos, O Globo

Bienal de São Paulo ainda espera por uma salvação

Matéria de Márcia Abos originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Globo em 15 de março de 2012.

Conselho da Fundação reconhece o esforço do MinC e adia a desmobilização da mostra

O conselho da Fundação Bienal decidiu aguardar mais antes de desmobilizar curadores e artistas e cancelar a realização da 30 edição do evento, marcada para ser aberta ao público em 7 de setembro deste ano. A decisão, tomada numa reunião na noite de anteontem na sede da Bienal, em São Paulo, é uma demonstração do reconhecimento do esforço do Ministério da Cultura (MinC) para a realização da mostra na data prevista.

O MinC tem negociado saídas para liberar os recursos que viabilizariam a exposição, cerca de R$ 12 milhões, bloqueados pelo próprio governo em janeiro, quando a fundação Bienal foi listada como inadimplente por recomendação da Controladoria Geral da União (CGU). É o ministério que comanda o diálogo com o Instituto Tomie Ohtake e o Museu de Arte Moderna de São Paulo — uma destas instituições será parceira da Bienal e irá receber e gerir os recursos captados via Lei Rouanet para a realização da mostra.

— Por reconhecer um esforço genuíno do MinC para viabilizar a realização da Bienal, decidimos dar mais tempo às negociações. Estamos esperançosos, porém ainda não podemos garantir que a exposição vai acontecer — disse Heitor Martins, presidente da Fundação Bienal. — Estamos satisfeitos com a parceria de qualquer uma das instituições. Mas a decisão final sobre qual delas será nossa parceira cabe ao MinC.
A expectativa é que nos próximos 15 dias seja discutido e assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), tratando das irregularidades em prestações de contas apontadas pela CGU que totalizam R$ 32 milhões. A Bienal deve se comprometer a devolver parte deste valor ao Ministério da Cultura. O passo seguinte será a definição de uma dinâmica de trabalho entre a Bienal e a instituição parceira.

Enquanto o impasse continua, a Bienal tem mantido parte dos preparativos para edição deste ano usando os R$ 5 milhões que tinha livres em caixa, recursos que não foram captados via lei de incentivo fiscal ou convênios com o poder público.

R$ 12 milhões bloqueados

A Fundação Bienal foi listada como inadimplente pelo MinC em 2 de janeiro, o que resultou no bloqueio de R$ 12 milhões e impediu a captação de outros R$ 8 milhões já comprometidos por empresas via lei Rouanet. A princípio, a 30 edição da mostra foi orçada em R$ 30 milhões quando começou a ser planejada, há dois anos, após a escolha do curador venezuelano Luis Pérez-Oramas.
Sem recursos para pagar colaboradores, a Fundação Bienal dispensou em fevereiro uma equipe de 150 pessoas do programa educativo e já trabalha atualmente com um orçamento menor, de cerca de R$ 18 milhões.

A inadimplência e o bloqueio das contas foram recomendados pela CGU após uma auditoria iniciada em 2009 que encontrou irregularidades em 13 prestações de contas entre 1999 e 2006, período em que a fundação foi presidida por Carlos Bratke e Manoel Francisco Pires da Costa.

Dossiê 30ª Bienal de São Paulo

Dossiê 30ª Bienal de São Paulo.

Posted by Cecília Bedê at 2:29 PM

Inimigo público por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Inimigo público

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 15 de março de 2012.

Pichador da Bienal vira celebridade e faz longa sobre o controvertido movimento

Na hora em que pichou uma obra da Bienal de São Paulo, há dois anos, Djan Ivson, o Cripta, foi enforcado por seguranças e arrastado para um quartinho no térreo do pavilhão no Ibirapuera. Levou uns socos, perdeu o fôlego, achou que fosse morrer - até que outro guarda o deixou fugir para o parque.

Agora ele quer contar detalhes daquilo que o catapultou à fama. Imagens inéditas do momento em que Ivson invadiu o viveiro de urubus montado pelo artista Nuno Ramos na Bienal e pichou "liberte os urubu" (sic) estão num vídeo na mostra "São Paulo, Mon Amour", no Museu Brasileiro da Escultura.

É uma espécie de trailer para um longa-metragem em pré-produção, escrito por ele, que conta a história dos pichadores na metrópole, gente "que anda sujo, sai sem um puto na carteira e passa por baixo da catraca no trem".

Mas é também gente que invade uma Bienal de São Paulo, depois volta pelas portas da frente como convidado, vai à Fundação Cartier, em Paris, onde Ivson expôs há três anos, vira tema de documentário, roteirista de filme, palestrante em escolas e acaba sendo escalada para a próxima Bienal de Berlim, para onde ele vai em abril.

Ivson foi de inimigo público, com dez processos de vandalismo nas costas, a queridinho de parte do mercado das artes e fetiche de curadores que tentam domesticar a fúria das ruas em ações controladas em museu e galeria.

Mas isso ele esconde no roteiro do filme, que deve custar R$ 8 milhões e teve os direitos comprados por um publicitário. Prefere exaltar os perigos da vida de pichador a narrar o glamour que conquistou. "Tem muita ação, aventura, o público entra em outro mundo, tipo 'Matrix'. É um olhar profundo da vida do pichador", diz ele. "E não vai ter um final feliz."

Esse final feliz aconteceu só na vida real, por enquanto. Ivson era o moleque rebelde que começou a pichar aos 12 anos em Barueri, na Grande São Paulo, e abandonou a escola na oitava série. Depois, virou porta-voz do "pixo" e celebridade da contracultura. Vive das vendas dos DVDs de suas ações e das palestras que dá em universidades.

POLÍTICA DO 'PIXO'

Até hoje, ele é pivô do debate sobre o "pixo" que se estende no meio das artes desde que ele e um grupo de amigos picharam o andar que ficou vazio, por falta de verbas, na Bienal de 2008. Na época, os curadores da mostra tacharam a ação de "destrutiva" e "autoritária", comparando o caso a um "arrastão".

Dois anos depois, Ivson foi convidado como artista para a 29ª Bienal e não se contentou em mostrar vídeos de ações. "Tinha de ter conflito para ficar real", diz ele. "Não é só estar na Bienal. Pichação é guerrilha." Mas nem a curadoria nem Nuno Ramos, vítima da ação, prestaram queixas contra o pichador.

Na pose e no discurso, Ivson ainda encara a arte como luta de classes. Não é uma corrente estética que se opõe a outra, mas um estilo de vida e origem social em fricção com um circuito elitista.

"Nossa estética está sendo assimilada", diz Ivson. "Mas a gente só vai fazer pichação autorizada, sem quebrar as regras, quando a gente não tiver mais vergonha na cara."

Posted by Cecília Bedê at 2:12 PM

Nota: Conselho confirma realização da Bienal, Folha de S. Paulo

Conselho confirma realização da Bienal

Nota originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 15 de dezembro de 2012.

DE SÃO PAULO - O Conselho da Fundação Bienal resolveu não suspender a realização da 30ª edição do evento, cuja abertura está programada para 7 de setembro deste ano. Com suas contas bloqueadas pelo MinC (Ministério da Cultura) por inadimplência, a instituição teria até anteontem para decidir se conseguiria ou não realizar a mostra. Hoje deve ser decidido em Brasília qual entidade (o Museu de Arte Moderna ou o Instituto Tomie Ohtake) passará a ser a proponente do projeto da Bienal, tornando sua realização possível.

Dossiê Bienal de 30ª São Paulo.

Posted by Cecília Bedê at 2:04 PM

Arte de Leonilson no Iberê Camargo por Dalviane Pires, Diário do Nordeste

Arte de Leonilson no Iberê Camargo

Matéria de Dalviane Pires originalmente publicada no caderno Cultura do jornal Diário do Nordeste em 15 de março de 2012.

Bitu Cassundé, cocurador de "Leonilson - Sob o peso dos meus amores", fala da exposição

A delicadeza poética e visual que torna única a obra do artista plástico cearense Leonilson está em movimento. A exposição "Leonilson - Sob o Peso dos Meus Amores", apresentada ano passado no Itaú Cultural, em São Paulo, chega agora a Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre.

O cearense Bitu Cassundé, curador da exposição junto com Ricardo Resende, conta que a primeira itinerância acontece com alguns eixos diferentes da primeira. Entre as novidades, um conjunto de ilustrações realizadas entre 1991 e 1993 para a coluna da jornalista Barbara Gancia no jornal Folha de S. Paulo. "Resolvemos trabalhar também com um acervo não apresentado no Itaú Cultural, o que torna essa exposição ainda maior", conta Cassundé que pesquisa Leonilson há sete anos.

A reedição de "Leonilson - Sob o Peso dos Meus Amores" reforça a cartografia afetiva do artista. Os visitantes irão encontrar obras de nomes responsáveis por uma grande movimentação na arte brasileira, conhecidos como Geração 80: Leda Catunda, Sérgio Romagnolo, Daniel Senise, Luiz Zerbini e Albert Hien. Esses artistas convidados eram amigos e parceiros de Leonilson. A mostra apresenta uma obra de cada um. "São cinco amigos que se aproximam de Leonilson pelo diálogo fluente", contextualiza Cassundé.

A viagem de "Leonilson - Sob o Peso dos Meus Amores" exigiu dos curadores alternativas no que diz respeito a expografia. Enquanto no Itaú Cultural havia uma grande caixa de madeira para que o público se sentisse acolhido pelo lirismo de Leonilson, na Fundação Iberê Camargo a mostra foi toda pensada para a montagem em ambiente que não poderia sofrer tantas intervenções. "Nós repensamos a exposição de forma que fosse montada em um grande cubo branco. Então optamos por repensar, acrescentar, aproximar amigos e outros trabalhos", diz.

O público vai poder tocar, por meio de iPads, as agendas de Leonilson, onde ele costumava fazer experimentações artísticas. É um material riquíssimo, cheio de detalhes e afetos, digitalizados pelo Projeto Leonilson e Itaú Cultural. A parceria está garantindo ainda a digitalização da parte documental da obra do artista, como cartas e postais.

Na Fundação Iberê Camargo, a mostra será aberta junto com o lançamento de um livro de mesmo nome, com textos dos curadores e de Maria Esther Maciel, escritora e professora de Teoria da Literatura da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Maria Esther foi convidada por pesquisar a taxonomia na literatura e na arte contemporânea, característica recorrente na constituição das obras de Leonilson.

Cassundé adianta que a próxima cidade a receber a exposição "Leonilson - Sob o Peso dos Meus Amores" deve ser o Rio de Janeiro. Até o momento não se sabe que Fortaleza vai receber a mostra. "Seria maravilhoso se o público cearense pudesse ter acesso a uma exposição com mais de 300 obras de um artista importante como o Leonilson", diz. Fica então a nossa torcida.

Mais de Leonilson

José Leonilson Bezerra Dias nasceu em Fortaleza, em 1957. Mudou-se para São Paulo ainda pequeno. O interesse pela arte aparece na infância se manifestou em forma de desenhos e nas brincadeiras que Leonilson faz com os retalhos do atelier de costura da mãe. Passou pela escola Panamericana de Arte e depois ingressou no curso de Artes Plásticas da Fundação Armando Álvares Penteado, mas não chegou a terminar.

Na década de 1980, fez parte do grupo de artistas que revolucionou o meio artístico brasileiro conhecido como Geração 80. Participou, em 1985, das Bienais de São Paulo e Paris. Mas foi nos primeiros anos da década de 1990 que o artista se firmou como um dos destaques no panorama cultural brasileiro, com uma obra contundente, expressando como nenhum outro, os dramas e as angústias do homem contemporâneo.

O artista morreu em São Paulo, em 1993, deixando uma obra autêntica e extensa. Na Bienal de São Paulo de 1998, foi homenageado com uma sala especial. Atualmente, quem organiza e zela pelo trabalho do artista é o Projeto Leonilson.

Saiba mais sobre a exposição na Agenda de Eventos.

Posted by Cecília Bedê at 1:23 PM

março 14, 2012

A arte não fala por si por Bruno Yutaka Saito, Valor Econômico

A arte não fala por si

Matéria de Bruno Yutaka Saito originalmente publicada no caderno Cultura & Estilo em 9 de março de 2012.

Arte moderna = eu poderia fazer isso + sim, mas você não fez. Essa simples equação, que se estende para a arte contemporânea e reflete antigo preconceito, circula hoje em forma de piada nas redes sociais. No entanto, em um momento de incertezas econômicas como o atual, em que o mercado de arte se torna mais atrativo para investidores, nem equações de mentira dão conta de simplificar uma realidade intrigante. O que faz uma obra atingir elevadas cifras em leilões e vendas privadas? Como funciona o circuito que garante o reconhecimento de determinado artista?

Respostas para essas questões tornam-se ainda mais subjetivas quando se leva em conta que obras de artistas vivos estão atualmente no foco dos donos do dinheiro. Em outro extremo do mercado, uma versão de "Jogadores de Cartas", do francês Paul Cézanne (1839-1906), foi adquirida por cerca de US$ 250 milhões, estabelecendo um novo recorde para uma pintura, no ano passado. Ainda que pesem os interesses estratégicos dos compradores, a família real do Qatar - cuja filha do emir, Sheikha Al-Mayassa, foi eleita recentemente a pessoa mais poderosa do mundo das artes, pela revista "Art Auction" -, e que o valor seja exagerado, a obra tem a seu favor a raridade e a importância histórica de seu autor.

Mas, quando se fala em artista vivo valorizado, é necessário lembrar que diferentes instâncias se beneficiam de uma produção em ritmo constante. No caminho para se chegar "lá", o artista passa por um processo informal conhecido como validação. O "lá" pode ser o mercado ou o reconhecimento crítico e institucional, áreas que nem sempre se cruzam. Em qualquer um dos casos, diferentes personagens das artes precisam dar uma espécie de selo de aprovação. "É um sistema muito complexo. Não são só uma ou duas pessoas que decidem. Um número extenso de plataformas de visibilidade e de fatores é que determina a validação de um artista", afirma Adriano Pedrosa, que recentemente foi curador da 12ª Bienal de Istambul, ao lado do americano nascido na Costa Rica Jens Hoffmann.

A ideia romântica de que talentos natos não precisam concluir uma faculdade de artes não tem muito espaço na realidade atual, apesar do sucesso de brasileiros como Leonilson (1957-1993), que não chegou a se formar. A inexistência de uma instituição nos moldes da CalArts (California Institute of the Arts, nos EUA) é uma das peculiaridades do circuito brasileiro, acredita a escritora e socióloga canadense Sarah Thornton, que aborda o mercado de arte em publicações como "The Economist" e "The Guardian".

Em um dos capítulos do seu livro "Sete Dias no Mundo da Arte", Sarah descreve uma aula que chega a durar 15 horas, em que alunos expõem seus trabalhos para debates com colegas de sala e o professor. Com mais de 250 entrevistados, o livro descreve sete diferentes instâncias percorridas por um artista: leilão, escola, bienal, mídia, ateliê, feira e premiação.

A faculdade, nesse contexto, não é apenas o local onde o aluno aprende os fundamentos teóricos e práticos da arte. É, também, onde o candidato a artista fará os seus primeiros contatos profissionais. Foi na Goldsmiths College onde o "blockbuster" Damien Hirst conheceu colegas do grupo que ficou conhecido como Young British Artists, em fins dos anos 1980. Márcia Fortes, da galeria Fortes Vilaça, em São Paulo, diz que foi em uma visita à tradicional exposição Anual de Artes da Faap (exposição dos formandos da faculdade) que conheceu a artista Marina Rheingantz e seu trabalho. Hoje, ela é representada pela galeria, ao lado de nomes estabelecidos como Beatriz Milhazes e Adriana Varejão. "O artista, hoje, acaba tendo que fazer networking. É quase uma regra ele ir à abertura de uma exposição com seus trabalhos. Mas o mais importante deveria ser a obra. Ela deveria falar por si só", afirma Sarah.

Mostras como o Rumos Itaú Cultural, Panorama da Arte Brasileira (no MAM-SP) e o Salão Nacional de Arte de Belo Horizonte/Bolsa Pampulha são espaços coletivos importantes para os novos artistas. "São museus participando desse início, onde nomes ainda não inseridos são apresentados ao circuito. É um primeiro momento, institucional, em que o artista atua por si só", diz Márcia. "Os galeristas e curadores antenados circulam nesses locais."

"Descobrir" um novo talento é glorioso em praticamente todas as áreas da cultura, mas há um sabor extra nas artes plásticas. Mundo afora, não faltam relatos de colecionadores que se gabam daquela obra de artista em início de carreira adquirida por uma pechincha. É famoso o caso do ator e colecionador Dennis Hopper (1936-2010), que, nos anos 1960, comprou por US$ 75 uma das pinturas de sopa Campbell de Andy Warhol (1928-1987). Há inúmeras variações do trabalho cujos valores hoje ultrapassam a faixa do US$ 1 milhão.

São perspectivas positivas como essa que estimularam o surgimento, em 2010, do Brazil Golden Art, fundo de investimento pioneiro no país. Artistas ainda não consagrados, mas com alto potencial de valorização, estão no foco. Heitor Reis, que já foi diretor do MAM - Bahia, é hoje gestor do fundo e conta que entre 10% e 15% das obras adquiridas são "blue chips". Atualmente, o fundo tem 300 obras de 200 artistas brasileiros contemporâneos. "Cerca de 80% da nossa coleção são 'small caps'. Esses artistas não consagrados serão o grande acerto do nosso fundo", acredita Reis. Com um patrimônio de R$ 40 milhões, o BGA já está fechado em 70 investidores (a cota mínima era de R$ 100 mil). O fundo pretende montar uma coleção com mil obras.

Não há regras para as escolhas de curadores e galeristas. Tudo depende de olhares individuais. "Meu interesse é pesquisar e disseminar artistas fora do eixo do Atlântico Norte e da Europa: um Sul ampliado, o antigo Terceiro Mundo", explica Adriano Pedrosa. Galerista pioneiro no Brasil dos anos 1980, Thomas Cohn ajudou a lançar nomes como Leonilson e Adriana Varejão e diz que, em muitos casos, levou apenas cinco minutos para ver potencial em uma obra. "Às vezes, você vê o talento, mas ainda verde. É necessário usar, então, o fator tempo. Você pode queimar um artista se decidir lançá-lo no mercado prematuramente. A sutileza vem com a experiência", diz Cohn, que anunciou o fechamento de sua galeria (ele irá abrir uma relojoaria com peças feitas por artistas, designers e arquitetos).

Para Márcia e Cohn, o galerista tem também função de crítico e conselheiro, sempre atento ao desenvolvimento do trabalho do seu artista. É uma atualização da imagem clássica e secular do mecenas. "Artista sozinho com seu trabalho, por mais talentoso que seja, não chega a lugar nenhum. O circuito institucional, de museus, não vai garantir sua sobrevivência", diz Márcia, para quem um artista de peso relevante deve ter representações também nos EUA, na Europa e na Ásia. Muitos artistas, conforme vão vendo sua cotação subir, trocam de galerista. "Para nós é ruim lançar, fazer um esforço danado, começar com valores baixos, atingir determinado ponto e o artista se despedir dele", afirma Cohn. "É como se ele dissesse: 'Bom, você já me serviu de escada, agora me despeço porque preciso chegar a outro patamar'. Antes de mais nada, artistas são seres humanos, com desejos pessoais."

Participar de uma importante exposição internacional quase sempre garante uma validação, ao menos institucional. Bienal de Veneza, Documenta de Kassel, além da Bienal de São Paulo e a de Istambul, são algumas das principais. No passado, as participações de Cildo Meireles, Jac Leirner, José Resende e Waltercio Caldas na Documenta de 1992 foram marcantes não apenas nas suas carreiras individuais, mas também etapa marcante no processo de internacionalização dos artistas brasileiros. A partir dos anos 1990, o interesse estrangeiro pela arte latino-americana, além do retorno da democracia ao Brasil, ajudou na profissionalização do mercado nacional. Já não seria tão estranho ver obras de brasileiros em importantes coleções de museus como o MoMA (Museu of Modern Art, em Nova York) e a Tate, no Reino Unido.

"Em tese, qualquer artista que é adquirido pelo MoMA ganha um ponto muito elevado no circuito. Mas existem artistas que entraram na coleção do museu e nem por isso conseguiram ou demoraram muito para ser reconhecidos. [O brasileiro Alberto da Veiga] Guignard [1896-1962] é um exemplo", diz Tadeu Chiarelli, diretor do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC-USP). "Há artistas com uma validação extraordinária no mercado, seja em leilão, seja em galeria, que são totalmente desprezados pelo circuito institucional", afirma Adriano Pedrosa. Como exemplo, o curador cita o artista colombiano Fernando Botero, que, apesar de estar na coleção do MoMA e ser o artista latino-americano vivo recordista em leilão (US$ 2,03 milhão por pintura em 2006), não é unanimidade entre a crítica.

Quando o assunto é venda negociada por galeristas, quantias elevadas podem até prejudicar a reputação de um artista, caso o colecionador em questão não tiver boa fama no mercado. Atualmente, no Brasil, ter uma obra no Centro de Arte Contemporânea Inhotim, em Brumadinho (MG), conta pontos positivos. Formado pela coleção do empresário Bernardo Paz, o espaço exibe obras de brasileiros e estrangeiros consagrados, como Ernesto Neto e Matthew Barney. Numa recente lista da revista "ArtReview" com o ranking das cem pessoas mais poderosas do mundo das artes, Paz é o único brasileiro, em 76º lugar.

Revistas especializadas e a crítica são importantes nesse processo. A "Artforum", nos EUA, e a "Frieze", no Reino Unido, são as publicações que mais possuem força mundial na construção da reputação de um artista. Apesar de sua credibilidade ser constantemente questionada devido aos caros anúncios das principais galerias mundiais em suas páginas, a "Artforum" tem papel de destaque no que deve ser levado a sério ou não no circuito. Damien Hirst, Jeff Koons e Takashi Murakami, a trindade que hoje alcança os maiores valores do mercado, embaralhando as fronteiras entre arte e a empresarialização da arte, raramente têm estudos críticos nas páginas da revista. Por outro lado, Adriana Varejão recentemente foi tema de um longo artigo. Sua colega de geração Rivane Neuenschwander, além de Hélio Oiticica (1937-1980), referência no processo de internacionalização da arte brasileira, também estão nessa restrita lista.

Não há, no Brasil, publicações com o mesmo peso, ainda que o fortalecimento do mercado gere uma demanda. Por isso, muitos profissionais que atuam no circuito apontam particularidades do colecionador local. "O Brasil tem um mercado provinciano e desinformado, muito ligado à moda. O artista que se destaca é o que aparece nas colunas sociais, e não aquele que está na cultura", diz Celso Fioravante, editor do site/informativo Mapa das Artes, que traz notícias e roteiros sobre o circuito de exposições no Brasil.

No Brasil, o mercado de arte é relativamente novo, se for feita uma comparação com Europa ou Estados Unidos. Da geração que se destacou nos anos 1990 chamam a atenção a carioca Adriana Varejão, cuja tela "Parede com Incisões à La Fontana II" (2001) foi arrebatada por 1,1 milhão de libras em leilão na Christie's de Londres no ano passado (maior valor já pago por obra de um artista brasileiro vivo), e Beatriz Milhazes. "O sucesso delas não foi da noite para o dia. Não há um momento de virada. Elas estão pintando há mais de 20 anos, estão na labuta no ateliê. O que gerou esse sucesso? Foi todo um desenvolvimento de currículo, diversas mostras institucionais", diz Márcia Fortes. "E temos que lembrar que esse 1 milhão foi em um leilão. Nem Adriana e nem a galeria viram a cor desse dinheiro."

O caso de Beatriz é exemplar nesse circuito de validação. Ela iniciou-se nas artes plásticas na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio, e, com a coletiva "Como Vai Você, Geração 80?", realizada no mesmo local em 1984, foi identificada como parte de um grupo que incluía, entre vários outros, Leda Catunda, Daniel Senise. Já nessa época, é observada por curadores brasileiros como Paulo Herkenhoff e Ivo Mesquita, e iniciou participações em exposições internacionais na América Latina.

Em 1995, Beatriz entrou no circuito mais badalado da arte, em exposição no Carnegie Museum of Art, em Pittsburgh, EUA. No mesmo ano, começou a ser representada em Nova York por Edward Thorp, com quem fez sua primeira exposição em galeria estrangeira - resultando em crítica positiva no "The New York Times". A partir daí, Beatriz circula com desenvoltura no circuito internacional, entrando na coleção de museus como o MoMA (EUA) e o Reina Sofía (Espanha). As participações na Bienal de São Paulo (1998) e na Bienal de Veneza (2003) também são pontos altos da carreira da artista. No mercado, Beatriz fez história em 2008, quando se tornou a primeira artista brasileira viva a atingir a marca de US$ 1 milhão ("O Mágico" foi vendida por US$ 1,049 mi na Sotheby's, em Nova York).

O mercado de arte em expansão no Brasil tem estimulado o surgimento de novas feiras. No ano passado, a primeira edição da ArtRio teve um total de vendas de R$ 120 milhões. Em São Paulo, a Parte apostou em galerias menores, com obras de jovens artistas com preços até R$ 15 mil. Fernanda Feitosa, diretora da principal feira de arte do Brasil, a SP-Arte, diz que o perfil do comprador mudou e está mais jovem, na casa dos 20 e poucos anos. Ela cita uma "sofisticação da informação" e o papel dos cursos livres nessa mudança de perfil. Seguindo um mercado que existe no exterior, a Escola São Paulo, por exemplo, oferece cursos e palestras que ensinam o aluno a colecionar arte. "Mercado de arte é atrelado à economia. No momento em que o Brasil bombou, sendo a bola da vez, com o PIB crescendo, muita gente jovem chegando ao patamar dos ricos, com possibilidade de diversificar suas carteiras, surgiu essa tendência de termos mais investidores e colecionadores", afirma Heitor Reis.

Cifras milionárias em leilões internacionais, no entanto, não estão necessariamente relacionadas a esse bom momento da arte brasileira. Profissionais da área lembram que leilões são pontuais, guiados pela emoção e pela pressão psicológica e, por isso, servem como validação apenas mercadológica. De olho nas "possibilidades" que estão se abrindo no Brasil, a tradicional casa de leilões Sotheby's recentemente abriu um escritório no país. Para Katia Mindlin Leite Barbosa, presidente da Sotheby's Brasil, o interesse do mercado por arte contemporânea responde a uma simples equação: "Existe mais demanda para esse segmento porque a oferta de arte moderna e impressionistas está diminuindo no mercado".

Em 2011, a Sotheby's teve o segundo melhor resultado em sua história, com um total consolidado de vendas de US$ 5,8 bilhões. A concorrente Christie's teve US$ 5,7 bi em vendas e anunciou um crescimento de 27% (em dólares) no setor de arte contemporânea. Essa explosão, claro, não vem apenas de um amor súbito por arte dos grandes compradores. Segundo o jornal "Financial Times", em uma pesquisa da Family Bhive, espécie de rede social de milionários, entre mais de 70 banqueiros e gestores de investimento internacionais, arte foi identificada como o ativo com melhores chances de retorno em 2012. "Obra de arte não vira pó como as ações. Na pior das hipóteses, você continua usufruindo o prazer de ser dono da obra", diz Katia, da Sotheby's.

Ao menos em leilões, os critérios na determinação de um preço são subjetivos, ditados por especialistas próprios, e não pelo vendedor. "Quando um artista chega à Sotheby's, já se pressupõe que ele tenha certa bagagem, uma rede de colecionadores, 'dealers', de pessoas interessadas, que ajudam a movimentar o mercado", diz Katia. Fatores como a reputação do artista, a fase correspondente da obra, vendas anteriores de trabalhos parecidos são levados em conta no estabelecimento do preço. "Temos uma expressão que são os 'comparáveis', que vão dar o parâmetro para aquela avaliação", afirma Kátia. Heitor Reis, do fundo de investimentos BGA, diz que é necessário um trabalho de acompanhamento do mercado de arte para determinar quais obras irá comprar. "Fazemos prospecção o tempo todo, indo a ateliês, conversando com os formadores de opinião, diretores de museus, críticos. Tudo isso proporciona a valorização de um artista", afirma. Empolgado, Reis diz que o potencial de valorização é variável, mas pode chegar a otimistas 300 e 500% acima do CDI.

A aposta no novo e incerto é grande, e distorções podem surgir. "O mercado está dando as regras. Isso coloca em risco a produção e a qualidade dos artistas", afirma André Millan, da Galeria Millan. Quando se compara a rápida aceitação pelo mercado de jovens recém-saídos da faculdade com veteranos como Tunga, Cildo Meireles ou Waltercio Caldas, que levaram anos, nota-se uma aceleração que reflete uma demanda "inconsequente", segundo o galerista. "Não se sabe se essa produção de hoje existirá daqui a dez anos. É uma produção que não tem lastro", diz Millan. Há anos no circuito, Tadeu Chiarelli aponta mudanças no cenário brasileiro. Para ele, há uma certa "banalização" de certas profissões, como a de curador, profissão que também passa por um "boom" de novos nomes. Outra mudança, aponta, é o pouco interesse de muitos jovens artistas, recém-saídos da faculdade, mas já em importantes galerias, em doar obras a museus, tradicionalmente vistos como ponto culminante no reconhecimento artístico. "A grande confusão no Brasil hoje é: acredita-se que arte boa é aquela que está no mercado. Os colecionadores confiam muito no mercado. Não existe a ponderação, a clareza de que é necessário um tempo. O tempo da produção artística, do amadurecimento, é um pouco mais lento que o do mercado."

Quando acertam em suas escolhas, críticos e curadores são celebrados como visionários; galeristas e leiloeiros ganham de forma literal; museus emprestam e ganham credibilidade ao adquirir obras. Uma vez que os critérios para a validação de um artista são fluidos, não seriam possíveis manipulações? Sarah Thornton acredita que fenômenos assim não podem ser criados, como acontece na indústria musical - que rotineiramente cria "boy bands". "Você pode mentir uma ou duas vezes, mas você não pode convencer uma multidão por muito tempo", diz Sarah. Ainda que sejam muitos os atores no processo, apenas um é determinante e real, tanto do ponto de vista mercadológico quanto crítico: o tempo.

Posted by Cecília Bedê at 12:14 PM

março 13, 2012

MinC destinará R$ 7,3 milhões do Fundo Nacional de Cultura para a área de museus, Ibram

MinC destinará R$ 7,3 milhões do Fundo Nacional de Cultura para a área de museus

Nota do Ibram originalmente publicada no site do Ibram em 9 de março de 2012.

Foram anunciados no dia 8 de março, pela Ministra da Cultura (MinC), Ana de Hollanda, os primeiros investimentos a serem realizados pelo Fundo Nacional de Cultura (FNC) em 2012. Mais de 50% dos recursos já têm destinação definida: do orçamento de R$ 256 milhões do FNC em 2012, um total de R$ 133 milhões já têm rumo traçado.

Para o setor de museus, o MinC vai conceder via Fundo Nacional de Cultura um total de R$ 7,3 milhões, destinados à conclusão do Programa Ibram de Fomento aos Museus, com o conveniamento dos projetos selecionados em 2011 dos Editais de Modernização de Museus, Mais Museus, e Criação e Fortalecimento de Sistemas de Museus.

Os recursos prevêem ainda a modernização do Museu Júlio de Castilhos e do Museu do Trem, ambos localizados no Rio Grande do Sul e também selecionados em 2011. Todos os recursos previstos serão executados até junho de 2012.

A ministra Ana de Hollanda destacou a importância estratégica dos investimentos. “Os Sistemas de Museus abrangem instituições de todas as regiões do país e a memória é muito importante para as comunidades locais. Valorizar suas memórias é também uma questão de cidadania”, disse.

Entre os projetos apresentados também estava o Programa Cultura Viva, que terá um total de R$ 46 milhões, sendo R$ 35 milhões dedicados ao empenho da segunda e da terceira parcelas dos convênios em andamento; outros R$ 11,6 milhões se voltarão ao edital Pontões de Cultura. Mas o fundo alavancará um leque amplo de rubricas, que vão da economia criativa ao patrimônio, passando pela área do livro e da leitura e pelo financiamento de microprojetos. Saiba mais.

Posted by Cecília Bedê at 2:12 PM

março 12, 2012

Natureza x cultura por Paula Alzugaray, Istoé

Natureza x cultura

Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na seção Arte Visuais da Istoé em 9 de março de 2012.

Dupla Gisela Motta e Leandro Lima se volta para a fragilidade dos limites entre natureza, homem e máquina

ANTI-HORÁRIO – GISELA MOTTA E LEANDRO LIMA/ Galeria Vermelho, SP/ até 5/4

Os limites cada vez mais indeterminados entre homem, máquina e natureza são preocupações constantes da dupla Gisela Motta e Leandro Lima. Produzir um equilíbrio tênue entre esses domínios – ou, em certos casos, incentivar seu desbalanceamento – é a intenção de praticamente todos os trabalhos expostos na mostra “Anti-Horário”, em cartaz na Galeria Vermelho, em São Paulo.

A impactante instalação “Zero Hidrográfico”, que foi concebida para a exposição “Água na Oca”, em 2010, é uma espécie de esquema visual em três dimensões, que simula o movimento das ondas e as oscilações do nível do mar. Realizado com um sistema motor simples – e imperfeito – e lâmpadas de neon, o objeto expõe de maneira esquemática o que seriam as variações da superfície da água. Esse “mar” confinado aos limites de um quadrado e de uma rede representa bem o tensionamento natureza e cultura, que a dupla desenvolve com perspicácia e sofisticação.

A insubordinação às leis naturais do tempo – e a firme determinação de resistir a elas – é o tema levantado em “Anti-Horário”. O vídeo que dá nome à mostra se refere ao movimento cíclico da existência humana: é uma espécie de linha do tempo circular, em que corpos funcionam como os ponteiros de um relógio. Os corpos de um certo casal percorrem tal linha ao longo de uma hora; e a criança, mais ágil, faz o trajeto em um minuto. Os três correm a favor do relógio, e o campo sobre o qual pisam se impõe a essa vontade em movimento anti-horário.

A natureza humana, seus afetos e desafetos, está expressa na videoinstalação “Calar”. O trabalho foi realizado com uma câmera de termografia, que é utilizada em vários ramos da indústria para detectar o calor gerado em zonas de tensão e defeito em sistemas. Em duas telas, o trabalho simula uma conversa entre dois corpos. Eles se enfrentam e se tocam, produzindo frio e calor um sobre o outro. As marcas dessa relação que oscila entre afeto e violência são visualizadas na pele dos dois protagonistas, graças às imagens geradas pela câmera termográfica. Seus corpos e emoções são, portanto, colocados na posição de sistemas – ou máquinas – a ser rastreados e documentados.

Saiba mais sobre a exposição na Agenda de Eventos

Posted by Cecília Bedê at 7:55 PM

Um projeto para a sociedade da informação por Nina Gazire, Istoé

Um projeto para a sociedade da informação

Matéria de Nina Gazire originalmente publicada na seção Artes Visuais da Istoé em 9 de março de 2012.

Marco Maggi - Desinformação Funcional, Desenhos em Português/ Instituto Tomie Ohtake, até 13/5

No livro “Jornalismo e Desinformação”, o jornalista Leão Serva explica que a desinformação funcional corresponde a um fenômeno definido pelo fato de as pessoas consumirem informações por intermédio de um ou mais meios de comunicação, mas não conseguirem compor com estas uma compreensão do mundo ou dos fatos. Em tempos de Google, quando um fato pode ser visualizado desde inúmeros pontos de vista a partir de alguns cliques, a desinformação funcional parece ser o que efetivamente está regendo o estado das coisas. “Estamos fundando uma sociedade da informação disfuncional: a realidade se faz ilegível; e as artes visuais, invisíveis”. Com essa declaração, o artista uruguaio Marco Maggi desloca a discussão para o campo da arte contemporânea.

Na exposição “Desinformação Funcional, Desenhos em Português”, Maggi – um dos artistas mais importantes da cena contemporânea uruguaia – apresenta trabalhos em alumínio, papel e acrílico para uma espécie de cartografia para a sociedade da desinformação. A instalação “Incubadora” (foto), por exemplo, é composta de pilhas de folhas de papel que contêm desenhos de formas abstratas lembrando códigos. O papel ocupado com uma informação ilegível e empilhado de maneira excessiva serve de metáfora para pensar esse excesso de informação inavegável no qual nos afogamos diariamente. Mas, para além da questão da sociedade da informação, Maggi também quer repensar o uso do papel como suporte físico para a comunicação. “O trabalho de Marco Maggi vem liberar o papel desse tratamento inconsequente. Interessa-lhe o papel-padrão e vulgar que será transformado em um campo de surpresas”, declara o curador Agnaldo Farias em texto escrito para a mostra.

Mídias obsoletas, como projetores de slides, também aparecem como símbolos da substituição que as tecnologias de comunicação sofrem de modo vertiginoso para se tornar mais eficientes. Os slides, que um dia transmitiram imagens por meio da película – e hoje foram substituídos pelas mídias digitais –, são transformados em objetos artísticos. Deslocados de sua função original, foram convertidos em molduras para impressões em folhas de alumínio. A mostra tem trabalhos produzidos entre 2008 e 2012. É uma boa oportunidade para conhecer esse artista latino-americano, que vive na ponte área entre Montevidéu e Nova York.

Posted by Cecília Bedê at 7:41 PM

Contatos imediatos por Nina Gazire, Istoé

Contatos imediatos

Matéria de Nina Gazire originalmente publicada na seção Artes Visuais da Istoé em 2 de março de 2012.

OFNIs - OBJETOS FLUTUANTES NÃO IDENTIFICADOS IBIRAPUERA/ Parque do Ibirapuera, SP/ 4 e 11/3

No ano de 1989, Guto Lacaz realizou uma inusitada intervenção no lago do Ibirapuera. “Auditório para Questões Delicadas” constituía-se, literalmente, de um auditório cujas cadeiras flutuavam no lago do parque. Apaixonado por náutica e pela água, o artista estudou meticulosamente a possibilidade de fazer as cadeiras deslizarem sobre a superfície do lago sem afundar. “Acho lindo o fenômeno da flutuação na água. Eu queria ser engenheiro naval antes de tudo, mas era ruim em matemática. Hoje, em vez de construir barcos, faço objetos de arte que flutuam”, comenta o artista cuja criação é, acima de tudo, repleta de engenhosidade.

Mais de 20 anos depois de sua primeira intervenção aquática, Lacaz apresentou em 25 de janeiro, em comemoração ao aniversário da cidade de São Paulo, o trabalho “OFNIs – Objetos Flutuantes não Identificados Ibirapuera” (foto) no mesmo lago. Constituídos de dois cubos brancos metálicos e equipados com motores de popa pilotados por Lacaz e um assistente – escondidos no interior das estranhas embarcações –, os OFNIS chamaram a atenção de quem passou pelo parque naquela data. “É interessante ver a reação das pessoas. Alguns querem uma resposta pronta e acharam que era um instrumento para medir a poluição. Mas no mundo da arte contemporânea o interessante é observar essa angústia de não se ter certezas”, diz Lacaz. Os objetos não identificados de Guto Lacaz poderão ser novamente avistados no lago do Ibirapuera nos próximos domingos, 4 e 11 de março, entre as 10 e 11 horas e entre as 16 e 17 horas.

Os OFNIS surgiram em junho de 2011, quando o artista foi convidado para o evento “Aberto Brasília – Intervenções Urbanas”, que teve curadoria de Wagner Bajar. Para a ocasião, desenvolveu uma espécie de protótipo feito de 79 caixas de isopor. “Era um material mais barato e fácil de montar. Em Brasília a intervenção foi feita com apenas um OFNI, que flutuou sobre o lago Paranoá”, explica Lacaz, cuja principal inspiração para esse invento foi a arte cinética. “Eu queria criar um híbrido de arte cinética e intervenção urbana que dialogasse com a paisagem. No fim das contas é uma espécie de objeto-happening porque também depende da reação das pessoas que o observam”, afirma.

Posted by Cecília Bedê at 7:33 PM

Fotógrafa Gordana Manic expõe obra sobre isolamento no MIS por Camila Molina, O Estado de S. Paulo

Fotógrafa Gordana Manic expõe obra sobre isolamento no MIS

Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 12 de março de 2012.

Artista e matemática sérvia vem conquistando espaço no Brasil com temática, presente em 'Réquiem'

Quando a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) atacou a Sérvia em março de 1999, Gordana Manic teve certeza de que queria fugir de seu país. "Passei um mês na Hungria, tentando arrumar o visto para algum lugar da Europa, mas foi impossível por causa da situação política", conta. Natural da cidade de Novi Sad, formada em matemática, professora em uma universidade local e funcionária de um banco, Gordana (pronuncia-se Górdana) Manic e seus amigos sérvios não vislumbravam, naquela época, algum futuro nos Bálcãs, em plena crise do governo de Slobodan Milosevic. O Brasil não era, de longe, sua primeira opção de destino, mas foi aqui que ela chegou no fim de 1999 e onde vive até hoje. Outra espécie de salvação vem sendo a fotografia, a linguagem "mais eloquente" para expressar uma poética intimista, que tem como pano de fundo sentimentos de isolamento, crise, depressão, como ela enumera.

As imagens criadas por Gordana Manic são sempre em preto e branco. "Na minha fotografia, acho a cor desnecessária, me incomoda", diz a matemática e fotógrafa, de 38 anos. Réquiem, exposição que ela acaba de inaugurar no Museu da Imagem e do Som (MIS), é uma série de 2010 formada por obras em que figuras se tornam quase fumaça em locais escuros, enigmáticos. "Como que embalados por uma música fúnebre, esses diáfanos personagens flagrados na noite por Gordana Manic realizam uma espécie de dança ora sensual, ora macabra", escreve o curador Eder Chiodetto, crítico e professor que vem acompanhando o trabalho da artista.

A atual mostra de Gordana Manic integra o projeto Nova Fotografia do MIS, mas, recentemente, seu denso trabalho fotográfico vem aparecendo em exposições e editais. No ano passado, por exemplo, a sérvia participou do Arte Pará Ano 30, conceituado e tradicional salão realizado em Belém (no qual foi contemplada com o Prêmio Aquisição do evento), como também foi selecionada no Programa de Fotografia do Centro Cultural São Paulo. Por meio do concurso, Gordana vai exibir em 2013, na instituição paulistana, obras da série Dentro (2010), autorretratos sutis que realizou em seu apartamento. Ela também acaba de expor na Galeria Ímpar, em São Paulo, a mostra Distante Presente, com curadoria de Mario Gioia.

Posted by Cecília Bedê at 6:30 PM

Artistas levam obras a espaços públicos por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Artistas levam obras a espaços públicos

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 11 de março de 2012.

Trabalhos vão desde pintura num prédio a cubos que flutuam num lago e alterações na iluminação pública

SP tem intervenções de Guto Lacaz, Thiago Rocha Pitta, José Spaniol, Laura Vinci, Tatiana Blass e outros

Na chuva, a pintura no topo do prédio se dissolve e faz escorrer listras negras pela enorme fachada branca. Não é uma falha da arquitetura, mas uma obra de arte que se camufla no espaço urbano.

Thiago Rocha Pitta fez uma pintura que se transforma com a passagem do tempo. Da mesma forma, trabalhos de outros artistas espalhados por São Paulo vêm mudando a cara da metrópole.

Enquanto Guto Lacaz põe cubos brancos para flutuar no lago do parque Ibirapuera hoje, intervenções de Tatiana Blass, que ocupa a capela do Morumbi, José Spaniol, no parque Burle Marx, Laura Vinci, no centro, e Eduardo Coimbra, no Pacaembu, criam brechas na cidade.

Coimbra ocupa a árida praça Charles Miller, no Pacaembu, com fotografias de nuvens iluminadas. Suas laterais são espelhadas, dando a sensação de

Posted by Cecília Bedê at 6:11 PM

Projeto Rumos mostra arte comportada e convencional por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo

Projeto Rumos mostra arte comportada e convencional

Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 10 de fevereiro de 2012.

Programa, que antes mapeava circuito, hoje parece salão de belas artes

A cada edição do Rumos Artes Visuais, realizado de três em três anos no Itaú Cultural, a jovem arte contemporânea brasileira parece mais comportada e convencional.

Já havia sido assim, em 2009, mas a mostra com os 45 artistas selecionados para esta edição é tão inodora quanto uma feira de arte.

Desde 1999, o Rumos tem realizado um mapeamento nacional da produção em artes plásticas.

O projeto surgiu num momento em que o circuito brasileiro de exposições, tanto em galerias comerciais como em instituições públicas, era bastante frágil e não conseguia abarcar a crescente produção. Desde o início, o Rumos Artes Visuais funciona por edital, ou seja, os artistas precisam apresentar seus portfólios à instituição, para então entrarem num processo de seleção.

Talvez aí esteja o problema do atual momento: com um circuito robusto, o programa não é mais um dos poucos espaços de inserção nesse universo. Assim, em vez de mapeamento nacional, mesmo com 1.770 inscritos, de acordo com o Itaú, o programa está mais próximo de um salão de belas artes.

Ao menos é isso o que se constata com a seleção da curadoria de 12 profissionais chefiados por Agnaldo Farias.

"Convite à viagem", aliás, é uma exposição com tema repetitivo: o Panorama da Arte Brasileira, realizado no ano passado, no Museu de Arte Moderna de São Paulo, partiu da mesma questão e apresentou trabalhos mais fortes.

ARTE DOMESTICADA

É até difícil saber se, na mostra em cartaz no Itaú Cultural, os artistas utilizam formatos prontos para consumo ou a seleção e sua disposição os igualaram nesse padrão.

Artistas como Carlos Contente ou Adriano Costa, conhecidos por obras experimentais, por exemplo, participam da exposição de forma tão domesticada que perderam sua radicalidade.

Dessa forma, cria-se um percurso agradável, que transforma as 126 obras da mostra em belos trabalhos, todos com discursos poéticos e um tanto vazios nas legendas escritas pelos curadores.

A questão que fica é se a arte brasileira é que está tão sem graça ou se é o pensamento dos curadores que anda preguiçoso.

Saiba mais sobre a exposição na agenda de eventos.


Posted by Cecília Bedê at 5:59 PM | Comentários (1)

Mostras no MAC-USP mostram duas vertentes antagônicas da instituição por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo

Mostras no MAC-USP mostram duas vertentes antagônicas da instituição

Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 9 de março de 2012.

Duas mostras em cartaz no MAC-USP (Museu de Arte Contemporânea) apresentam duas vertentes da instituição totalmente antagônicas.

Enquanto "Redes Alternativas" exibe um acervo homogêneo, constituído pela ação transgressora do MAC nos anos 1970, "Fotógrafos da Cena Contemporânea" reflete o personalismo do polêmico mecenas Edemar Cid Ferreira, já que traz, em sua maioria, obras da coleção do Banco Santos, sob guarda provisória no museu.

"Redes Alternativas" reúne um conjunto de obras de 34 artistas que enviaram trabalhos ao museu por correio, como forma de criar um circuito alternativo tanto ao mercado de arte quanto à ditadura no Brasil.

Grande parte dessas obras, selecionadas pela curadora Cristina Freire, traz documentos de ações realizadas pelos próprios artistas.

Bom exemplo é o vídeo "Estômago Embrulhado" (1975), de Paulo Herkenhoff, no qual o artista come jornal, reflexão sobre o papel dos meios de comunicação.

Na seleção, a curadora priorizou obras de artistas latinos e do Leste Europeu, o que mostra ainda um importante esforço do museu em criar um eixo alternativo à produção de centros de arte dos EUA e da Europa.

Já "Fotógrafos da Cena Contemporânea", com curadoria de Helouise Costa, por partir da coleção de Cid Ferreira, propõe uma visão muito distinta do circuito da arte.

Diversificada, por ter fotógrafos de escolas de diferentes gerações e tendências, e um tanto inusitada, por ter foco em imagens com nu feminino, predileção do ex-banqueiro, a exposição revela como o colecionismo privado pode ser fútil e sem conceito.

Posted by Cecília Bedê at 5:27 PM

março 8, 2012

Infância reúne trabalhos de Nan Goldin, Cao Guimarães e Paula Trope por Diogo Guedes, Jornal do Commercio

Infância reúne trabalhos de Nan Goldin, Cao Guimarães e Paula Trope

Matéria de Diogo Guedes originalmente publicada no caderno de Artes Plásticas do Jornal do Commercio em 7 de março de 2012.

Com curadoria de Moacir dos Anjos, a mostra coletiva tematiza em vídeos a utopia política que pode ser a infância

De certa forma, todas as crianças enxergam o mundo a partir de um olhar utópico, idealizado, em que a vida ainda é um campo absoluto de possibilidades. Infância, exposição com curadoria de Moacir dos Anjos, é uma tentativa de procurar o poder de transformação presente na imaginação infantil. Com trabalhos da americana Nan Goldin, do mineiro Cao Guimarães e da carioca Paula Trope, a mostra tem sua abertura na quinta-feira (8/3), às 19h, na Galeria Vicente do Rego Monteiro, na Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) do Derby. A entrada é livre.

Parte do projeto Política da Arte, da Coordenação de Arte Visuais da Fundaj, a coletiva busca mostrar que, no distante lugar que a infância parece ser para um adulto, pode existir um questionamento das formas convencionadas de se ver o mundo. A ideia de mostra, segundo Moacir, surgiu quando ele se deparou com o vídeo de Nan Goldin, Fire leap (2010, 15 minutos), um slide-show com fotos saturadas e lúdicas retratando crianças (em algumas imagens, mulheres grávidas e adolescentes) em momentos de recreação e felicidade.

Cao Guimarães, por sua vez, colabora para a mostra com dois vídeos: Peiote (2007, quatro minutos) e Da janela do meu quarto (2004, cinco minutos). São gravações acidentais, frutos da conspiração do acaso, que retratam crianças sendo crianças a partir de suas ações singulares, do prazer de estar ali fazendo algo.

Paula Trope também trouxe dois trabalhos para a exposição – um deles, bastante semelhante na forma de exibição ao de Nan Goldin. Translados (1996-1998, 10’56’’), apesar de também ser um slide-show, traz fotos de crianças brasileiras e cubanas lado a lado, evocando a infância como um conceito sem geografia, capaz de unir os diferentes. Contos de passagem (2001, 15 minutos) traz entrevistas e gravações de crianças de rua no Rio de Janeiro, em que elas mostram a natureza genuinamente afetiva e natural da criança.

Até pelo tema do projeto, é inevitável tomar os vídeos como metáforas políticas. De certa forma, eles mostram que a imaginação da criança não vê os limites que a racionalidade e a materialidade adulta impõe. “A ideia da exposição é mostrar a infância como o momento em que outros futuros são possíveis”, explica Moacir. “As crianças são exemplos que o mundo poderia ser diferente”.

Saiba mais sobre a exposição na Agenda de Eventos.

Posted by Cecília Bedê at 5:51 PM

Bienal faz exigências ao MinC por Camila Molina, O Estado de S. Paulo

Bienal faz exigências ao MinC

Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 7 de março de 2012.

A Fundação Bienal de São Paulo fez ao Ministério da Cultura (MinC) uma série de exigências para aceitar que a 30.ª mostra da instituição seja realizada por um outro proponente. Uma delas está relacionada ao curador-geral da exposição, o venezuelano Luis Pérez-Oramas. "Neste diapasão da preservação artística e para que a Fundação Bienal em momento nenhum terceirize seu objeto de existência, no espírito de parceria presente nessa missiva, que o curador já contratado Luis Pérez-Oramas continue vinculado à Fundação e pago com recursos próprios da mesma", afirmou a entidade ao governo federal.

No ano passado, Oramas licenciou-se, temporariamente, do Museum of Modern Art (MoMA) de Nova York, onde é curador de arte latino-americana, para se dedicar ao desenvolvimento da 30.ª Bienal de São Paulo, marcada para ocorrer entre setembro e dezembro de 2012. Ele já havia definido o projeto da mostra, sob o título A Iminência das Poéticas, que teria entre 110 e 115 artistas participantes. Desde que a Bienal de São Paulo foi classificada inadimplente pelo MinC e teve seus recursos bloqueados, o processo da 30.ª mostra está paralisado - corre até risco de não ocorrer este ano.

As exigências da Bienal estão relacionadas a considerações apresentadas anteriormente pela Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura do MinC, sobre o processo de alteração de proponente da 30.ª Bienal de Artes de São Paulo como uma manobra para que a mostra ocorra. "O proponente substituto não poderá assumir posição de mero intermediário da Fundação Bienal, ou seja, todo o objeto dos Pronacs deverá ser integralmente assumido pelo novo proponente", afirmou o Ministério em documento.

Na semana passada, o MinC reuniu-se, em São Paulo, com representantes da Pinacoteca do Estado, Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo e Instituto Tomie Ohtake - indicados pelo governo federal - para apresentar o projeto de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para a troca do proponente da 30.ª Bienal. O conselho da Pinacoteca resolveu retirar-se do processo. O Estado apurou que o MAM tem mais chances de criar a estrutura jurídica e administrativa necessária para a mostra e que o ministério deverá anunciar a instituição escolhida até o fim desta semana.

Informalmente, conselheiros da Fundação Bienal de São Paulo reclamam de "embaraços com o MinC, que estão inviabilizando a realização da 30.ª Bienal". Está marcada para terça-feira a reunião do conselho da instituição para decidir o futuro da exposição. O governo federal quer resolver a situação até o dia 15.

Outra demanda da diretoria da Fundação Bienal de São Paulo, presidida pelo consultor diretor da McKinsey, Heitor Martins, é a de ser correalizadora da 30.ª edição da mostra. "A Fundação Bienal participará das decisões relativas ao evento, sobretudo no que se refere a questões de natureza técnica e artística, como previsto em seu Estatuto Social e atendendo à finalidade para a qual foi instituída. Sendo assim, a Fundação será o primeiro interlocutor e porta-voz do evento. Todas as demais medidas relativas à execução do projeto, tais como convites a artistas, serão realizadas conjuntamente pelas duas instituições (Fundação Bienal e proponente)."

"É o reconhecimento do projeto da 30.ª Bienal como foi pensado. É uma questão emergencial. A realização da mostra vai ser fator de fortalecimento da Bienal", opinou o diretor da Pinacoteca do Estado sobre o processo para driblar mais uma crise da instituição (leia mais ao lado).

A Fundação Bienal de São Paulo entrou, em janeiro, na lista de inadimplentes do MinC por causa de questionamentos da Controladoria Geral da União (CGU) sobre convênios firmados pela instituição paulistana entre 1999 e 2007 (de gestões de Carlos Bratke e Manoel Pires da Costa, ambas anteriores à atual diretoria da entidade). Pelos cálculos da CGU, a irregularidade dos convênios teria acarretado rombo de cerca de R$ 75 milhões aos cofres públicos. A instituição está preparando a prestação de contas.

Posted by Cecília Bedê at 5:34 PM

março 7, 2012

Atenção às evidências por Carlos Jimenez, Revista Select

Atenção às evidências

Matéria de Carlos Jimenez originalmente publicada na seção crítica / artes visuais em 5 de março de 2012.

Mostra no Reina Sofía inclui obras emblemáticas do artista

Exposição de Antoni Muntadas no Museo Reina Sofía mapeia as reflexões do artista sobre o ambiente midiático que define a atualidade

Muntadas está entre os artistas que melhor respondem aos desafios apresentados por nossa época, tão radicalmente marcada pelo propósito compartilhado entre estado e mercado de moldar ao seu gosto a vida cotidiana, a vida comum. Esta é a conclusão definitiva oferecida pela visita à grande exposição sobre sua obra, em cartaz desde novembro de 2011 e que vai até março de 2012, no Museu Reina Sofía de Madri, que mostra tanto a riqueza poliédrica de seu trabalho quanto seu obstinado interesse pelos meios e técnicas que permitem essa crucial manipulação.

Na busca de seus objetivos, Muntadas optou com frequência por uma tática que não é descobrir o que está escondido, mas chamar a atenção sobre o que é evidente. Foi assim que ele realizou, em 1980, The Limousine Project, colocando para circular em Manhattan uma imponente limusine preta com vidros escuros e monitores de vídeo nas janelas traseiras, exibindo imagens que enfatizavam os traços enigmáticos desse símbolo de poder e status social característico de Nova York. Nenhum nova-iorquino ignora a existência desses automóveis, mas é provável que poucos deles, antes da intervenção de Muntadas, tenham se dedicado a refletir sobre a ostentação de poder que o seu uso faz supor.

Essa estratégia elíptica valeu a Muntadas o questionamento eficiente de duas maneiras muito poderosas de controle da vida contemporânea: a arquitetura e as mídias. A exposição traz Architektur/Räume/Gesten, peça crucial de 1991, composta da reunião, em uma série de slides, de imagens de exteriores de edifícios imponentes com imagens de escritórios onde se tomam as decisões e os gestos corporais característicos dos que efetivamente comandam essas decisões. A arquitetura revela-se nessas imagens como um dispositivo de poder formalmente congruente com a retórica gestual daqueles que o agenciam e representam.

O mesmo assunto ocupa a instalação de 1987, The Board Room, uma grande sala de reuniões na penumbra, de cujas paredes pendem retratos de 13 personalidades religiosas, políticas e televisivas, com um pequeno monitor de vídeo em vez da boca, emitindo fragmentos de seus discursos habituais que, sobrepostos, geram um rumor ininteligível.

A grande mostra no Reina Sofía inclui ainda outra obra emblemática do artista: Stadium, que interroga tanto a história de um arquétipo arquitetônico originário do circo romano quanto os usos esportivos e políticos que ele tem em uma sociedade definitivamente entregue ao espetáculo. Cabe mencionar ainda Situación 2011, uma intervenção realizada entre os edifícios de Francesco Sabatini e Jean Nouvel, que servem de sede ao Reina Sofía. Esse trabalho analisa tanto as diferenças entre edifícios de épocas tão distintas quanto as existentes em termos de políticas expositivas e concepções museográficas que orientaram o projeto inicial do centro de arte Reina Sofía e o atual Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofía.

Em relação à importância da televisão na obra de Muntadas, deve ser dito que ele qualifica de Media landscape (paisagem Midiática) o ambiente eletroacústico que tem na televisão seu principal meio de realização e projeção. na exposição sobram exemplos do que Muntadas fez com essa paisagem, começando pelas tentativas de democratizá-la, nos anos 70, com os projetos de televisão comunitária cadaqués canal local e Barcelona distrito uno. ou ainda de sabotá-la, como em Acción TV, que pretendia interromper as transmissões normais da televisão com um vídeo em que o artista aparece com a letras T e V tapando seus olhos.

Talvez o projeto com formato televisivo mais ambicioso do artista catalão seja o que explora o medo, sentimento que divide mais do que as fronteiras físicas. esse assunto aparece em duas versões: Fear/Miedo, realizada na fronteira entre tijuana (México) e San Diego (Eua), em 2005, e Miedo/Jauf, realizada na região do estreito de Gibraltar, entre Tarifa (Espanha) e Tanger (Marrocos), em 2007. Impressionantes.
Carlos Jimenez é critico de arte e curador independente. Professor de Estética da Univeridad Europea de Madrid e autor dos livros Extraños en el Paraiso e Los Rostros de Medusa.

Posted by Cecília Bedê at 10:08 AM

Desacerte os ponteiros por Giselle Beiguelman, Revista Select

Desacerte os ponteiros

Texto de Giselle Beiguelman originalmente publicada na seção crítica / artemídia da Revista Select em 6 de março de 2012.

Anti-horário abre 2012 na Vermelho

Exposição de Gisela Motta e Leandro Lima desfaz obviedades para multiplicar sentidos

Anti-horário é o nome da exposição que a dupla Gisela Motta e Leandro Lima apresenta na Galeria Vermelho, em São Paulo de 06/03 a 05/04. Reúne um conjunto de obras recentes dos artistas, a maior parte delas inéditas.

A única já apresentada em São Paulo é Zero Hidrográfico, que esteve até bem pouco tempo no OK Center em Linz, na Áustria, e é até hoje, a única peça tridimensional criada pelos artistas.

“Apesar de ser um objeto, retoma o que sempre quisemos do vídeo: pensar o tempo em suspensão e também a repetição, o loop”, diz Leandro.

Espécie de mar de neon, de ondas remexidas por motores e dobradiças de gavetas que sobem e descem, é um híbrido de gambiolgia avançada com baixa tecnologia.

Esse tipo de estratégia, a combinação de elementos opostos em racionais exercícios de desprogramação de rotinas é um dos traços da produção de Lima e Motta.

Em várias obras, aparece na forma como os equipamentos são tomados para executar as mesmas funções para que foram projetados, porém não do modo como o fazem no cotidiano.

É o caso de Calar (2011), uma vídeo instalação duocanal feita com uma câmera termográfica.
Esse tipo de câmera mapeia, sem contato físico, os padrões térmicos da superfície de um objeto. É utilizada na indústria para teste de rigidez de partes de automóveis e até em aeroportos para investigar se os passageiros são saudáveis ou não.

Mas ao ser usada num jogo que revela a energia em forma de calor emitida pelos corpos, e que se transforma através do toque, ao mesmo tempo que sublinha exatamente o que já vinha prescrito no pacote pronto do dispositivo, o subverte de ponta a ponta.

Mas ao ser usada num jogo que revela a energia em forma de calor emitida pelos corpos, e que se transforma através do toque, ao mesmo tempo que sublinha exatamente o que já vinha prescrito no pacote pronto do dispositivo, o subverte de ponta a ponta.

Encantador, para dizer o mínimo, Anti-horário retrata a paisagem em torno das ruínas da antiga casa do faroleiro de Recife como se fosse o pano de fundo de um relógio de parede.

Nesse relógio, que é um verdadeiro poema de imagens, os adultos, o casal, são os ponteiros das horas e a criança, o dos minutos. A ruína parece andar para trás, os adultos parecem não sair do lugar e a criança, ligeira, mas sem andar retilíneo, vai, aos poucos ocupando o círculo e o centro da tela. Em torno de tudo, o movimento delicado das nuvens.

Entre as obras nunca antes expostas -- Xabori, DNA e Captcha--destaca-se a última série. Ela é feita com frases retiradas do clássico da ficção científica 2001, Uma Odisséia no Espaço de A. C. Clarke, filmado por Stanley Kubrick, que encena o célebre embate entre o supercomputador HAL 9000 e a humanidade que acaba por dominar.

São justamente as frases emblemáticas da vitória da HAL sobre o homem que aparecem na série dos artistas. Porém essas frases aparecem grafadas na tipologia do padrão captcha.

Esse padrão é utilizado por quase todos os sistemas on-line para verificar se é realmente um ser humano quem está preenchendo o cadastro e não um script malicioso. “Hoje em dia tornou-se comum você ter que provar o tempo todo para seu computador que você é humano”, comenta Leandro.

Em Captcha, as frases de HAL foram bordadas por máquinas industriais, simulando essa tipologia. Mas isso não sinaliza a vitória definitiva de HAL, até mesmo porque essa dicotomia perdeu o sentido. “O que importa é qual é a distinção entre as coisas – água, bordado, DNA -- e como isso se torna vivo”, pontua Gisela.
Hora de desacertar os ponteiros e se abrir às ambiguidades.

Saiba mais sobre a exposição na agenda de eventos.

Posted by Cecília Bedê at 9:56 AM

Galeria de Barcelona mistura arte brasileira e curadoria espanhola por Cristina Tardáguila, O Globo

Galeria de Barcelona mistura arte brasileira e curadoria espanhola

Matéria de Cristina Tardáguila originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Globo em 7 de março de 2012.

As cariocas Cristina Salgado e Regina de Paula abrem R exposição na Paradigmas

Funciona no conceituado bairro da Gracia, em Barcelona, uma galeria que, através da arte, pretende incrementar o diálogo entre o Brasil e a Espanha. Mas o caminho escolhido pelos fundadores da Paradigmas para atingir a meta é bem mais espinhoso do que se pode supor. Focado em arte contemporânea, o espaço tem como premissa misturar produções artísticas de um país com curadoria do outro, numa tentativa quase obsessiva de trazer à tona o cruzamento de olhares enraizados em continentes diferentes.

Seguindo essa filosofia, a casa fundada pelos artistas plásticos e designers Francisco Amaral e Angélica Padovani inaugura hoje uma mostra (sua sexta, desde a inauguração) que reúne trabalhos de duas cariocas que passaram pela Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Até o dia 5 de maio, obras das artistas plásticas Cristina Salgado e Regina de Paula, selecionadas a dedo pelos curadores espanhóis Gloria Fernandez e Victor Ramírez, ocuparão a galeria de 90 metros quadrados que se esconde por trás do mais imponente portão da Rua Francisco Gine — o único de ferro pintado de verde-bandeira-do-Brasil.

— Todos os trabalhos dessa mostra têm em comum a questão do corpo e da anatomia como suporte para a produção de significados — explica Cristina, que também é professora do Instituto de Artes da Uerj. — Quem for à Paradigmas verá que trabalho o problema das fronteiras entre interioridade e exterioridade.

Cristina apresenta na galeria catalã uma série de 15 desenhos intitulada “Tremores e permutações”. Feita com imagens de carimbos sobrepostas à exaustão em papel e até mesmo pelas paredes do espaço (sim, ela transborda qualquer fronteira), a artista dá vida a figuras que parecem em 3D e provoca o olhar.

— Ao repetir quatro imagens quase que ao infinito, um cavalo, um cavaleiro, uma moça sentada e uma musa, o resultado é uma ilusão que faz lembrar uma pintura — explica o fundador da galeria.

Além da série de carimbos, Cristina também leva a Barcelona o trabalho tridimensional “Moça nua sentada”, que consiste numa caixa retangular de 95 centímetros de altura adornada com tecido emborrachado cor de rosa por fora e com feltro vermelho por dentro. O visitante é convidado a observar seu interior através de uma única abertura oval.

Regina de Paula apresenta, por sua vez, dois vídeos feitos com base numa mistura um tanto inusitada: as páginas do livro “Le vignole de poche” (1890), considerado um tratado clássico da arquitetura, e as plantas baixas do Centro Comercial de Copacabana.

— Regina sempre trabalhou em torno de espaços não habitáveis — diz Amaral. — Desta vez, ela filmou e fotografou o shopping ao lado do qual sempre viveu e sobrepôs as imagens nas páginas desse livro do século XIX. Trata-se de uma experiência muito intrigante.

Ao longo do último ano, e com o intuito de fomentar as trocas entre Brasil e Espanha, passaram pela Paradigmas artistas como Gê Orthof, Leopoldo Wolf, Karina Dias e Ilana Lichtenstein.

Posted by Cecília Bedê at 9:10 AM

março 6, 2012

30ª Bienal de Artes de SP corre o risco de não ser realizada por Camila Molina, O Estado de S. Paulo

30ª Bienal de Artes de SP corre o risco de não ser realizada

Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 6 de março de 2012.

Justiça mantém contas da instituição bloqueadas; fundação foi declarada inadimplente pelo Ministério da Cultura

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Uma decisão judicial ameaça a realização da 30.ª edição da Bienal de São Paulo, prevista para setembro deste ano. A 9.ª Vara de Seção Judiciária da Capital, da Justiça Federal, negou liminar para desbloquear as contas da instituição, congeladas desde 2 de janeiro deste ano.

A Fundação Bienal de São Paulo foi declarada inadimplente pelo Ministério da Cultura e pela Controladoria-Geral da União (CGU) por causa de questionamentos sobre 13 convênios firmados pela instituição paulistana entre 1999 e 2007 (de gestões anteriores). A Fundação Bienal de São Paulo informou que vai recorrer da decisão. "Vamos usar os mesmos argumentos", disse o diretor jurídico da instituição, Salo Kibrit.

Com as contas bloqueadas, todo o procedimento de preparação da 30.ª Bienal fica paralisado. O presidente da fundação, o empresário Heitor Martins (foto), não quis se pronunciar sobre a nova decisão judicial.

Em sua última entrevista ao Estado, em 1.º de fevereiro, ele afirmou que "por causa do passado, estão inviabilizando o presente da instituição". Martins assumiu o cargo de diretor-presidente da Bienal em maio de 2009 e foi reeleito em dezembro de 2010.

A instituição alegou que teve prazo muito reduzido para responder e analisar os questionamentos do Ministério da Cultura. Quando Martins tomou posse, em 2009, a CGU pediu informações sobre os 13 convênios irregulares, relacionados a problemas de falta de licitações e despesas fora de contratos. Um relatório da Fundação Bienal de São Paulo foi enviado na época ao órgão. Desde então, não houve mais pedidos, até que, em outubro do ano passado, a instituição foi notificada que estava no cadastro de inadimplentes.

Os pedidos de esclarecimentos ocorreram a partir de então e o último chegou à fundação em 23 de dezembro, mas a instituição teria apenas até o dia 31 para enviar os documentos.

Valores milionários. Os convênios questionados chegam a R$ 32 milhões. Referem-se a repasses usados para a realização de edições da Bienal e da organização de representações nacionais na Bienal de Veneza, reformas no prédio da instituição, no Parque do Ibirapuera, e publicações. A entidade tem em caixa R$ 12 milhões, montante congelado.

A Bienal informou também que o bloqueio de suas contas e a impossibilidade de captar recursos por meio da Lei Rouanet para a 30.ª Bienal paralisa o processo de realização da exposição, considerada a mais importante mostra de arte do País, e impede a continuidade de seu projeto educativo, em andamento desde 2011.

No requerimento enviado à 9.ª Vara, obtido pelo Estado, a instituição afirmou que a "inabilitação" é irregular. "Isso porque, nem a Instrução Normativa n.º 1, de 5 de outubro de 2010, do Ministério da Cultura, e tampouco a Lei Rouanet, preveem que a instituição eventualmente inabilitada terá, como penalidade, a paralisação dos projetos em andamento."

Em sua última nota sobre o processo, de 27 de janeiro, o Ministério da Cultura declarou que "a direção do MinC tem mantido contato aberto e estreito para que não haja prejuízos à realização do evento. Diversas alternativas de encaminhamento já foram discutidas com representantes da fundação". O órgão do governo federal não se pronunciou sobre a nova decisão judicial.

O projeto da 30.ª Bienal já estava adiantado e praticamente definido. Tendo como curador-geral o venezuelano Luis Pérez-Oramas, curador licenciado do MoMA, de Nova York, a mostra, prevista para ocorrer entre setembro e dezembro, com entrada gratuita, tem como título A Iminência das Poéticas.

A lista dos artistas participantes da mostra seria anunciada entre fevereiro e março. Seu orçamento é de cerca de R$ 20 milhões.

Posted by Patricia Canetti at 2:27 PM

A Bienal precisa acontecer por Rubens Barbosa, O Estado de S. Paulo

A Bienal precisa acontecer

Artigo de Rubens Barbosa, presidente do conselho de Comércio Exterior da Fiesp, originalmente publicado no caderno de Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 6 de março de 2012.

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A Fundação Bienal de São Paulo deve comemorar, em 2012, a realização de sua 30.ª exposição internacional. Desde sua criação, em 1951, passou por períodos de altos e baixos. Por duas vezes deixou de organizar a exposição, reconhecida como umas das principais entre as grandes mostras internacionais de arte. Neste momento, questões administrativas e burocráticas - não de gestão - ameaçam a sua realização em setembro.

Como amplamente noticiado, em fins de 2011 o Ministério da Cultura (MinC) questionou a Fundação Bienal no tocante às prestações de contas de 13 convênios assinados no período 1999-2007. Apesar dos esclarecimentos, o MinC novamente incluiu a instituição no seu cadastro de inadimplentes no início de janeiro e bloqueou os recursos destinados à 30.ª Bienal. A fundação entrou imediatamente com ação judicial, com pedido de desbloqueio dos patrocínios captados via Lei Rouanet em 2010 e 2011. A liminar solicitada foi negada e a apelação até hoje não foi julgada.

O bloqueio das contas pegou de surpresa a atual diretoria, comandada com competência por Heitor Martins, que desde que assumiu tem procurado - com sucesso - resolver as pendências anteriores à sua gestão, devolvendo a Bienal aos seus bons tempos. Na prática, o que ocorre é que o bloqueio dos bens da fundação não permite a utilização dos recursos (R$ 12 milhões), captados recentemente via Lei Rouanet, para a realização da mostra deste ano. A imobilização desses bens, assim, torna inviável a captação de mais R$ 8 milhões já comprometidos por empresas, também via incentivo fiscal. Somente R$ 5 milhões estão livres, mas o valor é insuficiente para a realização da Bienal, orçada em pelo menos R$ 18 milhões.

A decisão do MinC de bloquear os bens da Fundação Bienal está repercutindo fortemente no meio artístico: curadores, galeristas e gestores culturais no Brasil e no exterior. Nossa Bienal, do porte da Bienal de Veneza e da Documenta de Kassel, desde sua fundação passou a fazer parte do calendário das artes internacionais. Exposições paralelas organizadas por galeristas brasileiros e museus, realizadas simultaneamente à mostra internacional, poderão ser canceladas. Se o impasse persistir, a própria existência da fundação está ameaçada, num momento justamente de maior projeção internacional do Brasil, o que poderá afetar nossas credibilidade e imagem no exterior.

O que acontece com a Bienal é mais um exemplo da falta de sensibilidade para com o interesse público e o real prejuízo que sua suspensão ou seu desaparecimento representariam para o Brasil. Não se trata de ignorar os erros do passado, mas de encontrar uma fórmula para separar o joio do trigo. É o que se tenta fazer agora para que a mostra possa tornar-se viável em setembro.

A divulgação da arte brasileira, cada vez mais conhecida e reconhecida internacionalmente, é em grande parte resultado de um trabalho eficiente dos agentes culturais e galeristas brasileiros, que vão sentir na pele as consequências de um eventual cancelamento da Bienal. Por outro lado, deveria ser de nosso interesse que a arte contemporânea se torne mais acessível ao grande público no País.

Como corretamente parece reconhecer o MinC, há interesse em que a Bienal de São Paulo seja realizada dentro do calendário previsto. Apesar dos entraves burocráticos, o MinC tem consciência de que sua realização é importante para o desenvolvimento e a projeção do Brasil lá fora, e que ela pode servir para ampliar as perspectivas de intercâmbio cultural com o exterior. Sabe ainda que a mostra tem o papel de proporcionar ao público brasileiro a possibilidade de conhecer diretamente o que de melhor está sendo produzido na arte contemporânea brasileira e internacional. Reconhece, igualmente, que o interesse do público brasileiro e estrangeiro (colecionadores, galeristas e críticos de arte) pela Bienal é crescente (cerca de 700 mil pessoas a visitaram na última edição) e que com isso o turismo cultural seria incentivado.

Com a realização no Brasil de eventos internacionais importantes, como a conferência Rio+20, pouco antes da Bienal, da Copa do Mundo e da Olimpíada, o cancelamento da mostra prejudicaria a percepção externa quanto à nossa capacidade de organizar eventos de grande porte. A repercussão no exterior do eventual cancelamento será maior ainda pela visibilidade que o Brasil hoje desfruta.

Situações excepcionais - como a que ocorre neste momento - devem justificar soluções diferenciadas, sempre respaldadas do ponto de vista legal, mas devidamente motivadas pelo claro interesse público.

Enquanto se busca uma solução definitiva para as questões financeiras pendentes, a Bienal, por meio de sua diretoria e membros de seu conselho, apresentou uma sugestão para, de imediato, solucionar o problema. Os projetos amparados pela Lei Rouanet seriam transferidos para um novo proponente, ou seja, uma nova instituição, que passaria a ser responsável pela realização do evento, como forma possível de tornar a mostra viável. A Pinacoteca do Estado, por exemplo, poderia gerenciar a execução da Bienal mediante um termo de ajustamento de conduta. Precedente existe e, segundo se sabe, o MinC estaria demonstrando boa vontade para encontrar uma fórmula que atenda a todas as partes envolvidas.

O mundo artístico e a sociedade em geral esperam que todos os interessados, Bienal, MinC, Controladoria-Geral da União, Tribunal de Contas da União, Ministério Público Federal e Estadual se empenhem para chegar a um acordo.

A Bienal tem de ser vista sob uma dimensão mais ampla, e não como questão isolada. Sua suspensão, em decorrência da falta de sensibilidade oficial, seria uma perda irreparável para São Paulo e para o Brasil.

Posted by Patricia Canetti at 2:21 PM

Futuro da 30ª Bienal de SP deverá ser definido no dia 13 por Camila Molina, O Estado de S. Paulo

Futuro da 30ª Bienal de SP deverá ser definido no dia 13

Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 6 de março de 2012.

Conselho da Fundação se reúne na próxima semana para decidir se aceita o MAM como proponente substituto da mostra

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O futuro da 30.ª Bienal de São Paulo - que corre o risco de não acontecer - poderá ser definido dentro de uma semana. O governo federal ainda negocia parcerias e a Fundação Bienal de São Paulo marcou uma reunião de seu conselho no dia 13 para decidir o assunto.

Com contas bloqueadas, a Bienal está incapacitada de captar recursos para a 30.ª exposição, marcada para setembro. Desde janeiro, a fundação está na lista de inadimplentes do Ministério da Cultura (MinC) por questionamentos sobre 13 convênios firmados pela instituição paulistana entre 1999 e 2007 - o período se refere às gestões de Carlos Bratke e Manoel Pires da Costa na presidência da entidade.

Na semana passada, o MinC realizou uma reunião em São Paulo com dirigentes da Pinacoteca do Estado, do Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo e do Instituto Tomie Ohtake para tentar uma manobra: transformar uma dessas instituições em proponente legal da 30.ª Bienal. O conselho da Pinacoteca resolveu se retirar do processo. Há indícios de que o MAM seja escolhido para a função.

"Existe a vontade de contribuir com a Bienal, mas ficou claro que as necessidades jurídicas e administrativas são inviáveis para a Pinacoteca, por ser uma organização social vinculada à Secretaria de Estado da Cultura", disse Marcelo Mattos Araujo, diretor da Pinacoteca do Estado. "Nossa associação teria de promover alterações no estatuto. Mas, nesse contexto, existe uma demanda imediata, emergencial, a situação concreta que é o risco de a 30.ª Bienal não ocorrer." O MinC afirma que a possibilidade de encontrar um proponente para a exposição está sendo avaliada e que, provavelmente, o gabinete da ministra Ana de Hollanda e a Secretaria Executiva do órgão deverão se pronunciar nos próximos dias.

Bloqueio. Por outro lado, segue ainda indefinido o pedido de liminar da Fundação Bienal de São Paulo no Tribunal Regional Federal para o desbloqueio das contas da entidade.

Dos cerca de R$ 20 milhões necessários para a realização da 30.ª Bienal, estão paralisados R$ 12 milhões que já haviam sido captados por meio da Lei Rouanet - entre eles, R$ 5 milhões referentes a dois novos convênios que poderiam ser firmados, respectivamente, entre a instituição, a Prefeitura de São Paulo e o governo do Estado.

Posted by Patricia Canetti at 2:12 PM | Comentários (1)

março 5, 2012

Para onde vai a crítica de arte? por Suzana Velasco, Blog Prosa Online O Globo

Para onde vai a crítica de arte?

Texto de Suzana Velasco originalmente publicada no blog Prosa Online no O Globo Blogs em 3 de março de 2012.

Entre cifras em alta e instituições fracas, críticos debatem o lugar do pensamento sobre a produção artística nacional

A pergunta, lembra a crítica de arte Glória Ferreira, já era feita por Charles Baudelaire no século XIX: para que serve a crítica? Assim como as respostas a ela, essa é uma pergunta que não tem prazo de validade, mas parece emergir com mais força em alguns momentos. Em tempos em que a arte brasileira está nos holofotes de bienais, feiras e leilões de arte, e em que se falar em boom internacional da nossa produção artística já é senso comum, ela se faz premente mais uma vez.

Pensar o lugar da crítica neste momento em que instituições culturais buscam se adequar às demandas do mercado sem nem ter bem se consolidado foi uma das motivações do crítico de arte Sérgio Bruno Martins ao editar um número especial da revista inglesa “Third Text” dedicado à arte brasileira. Ela acaba de ser lançada na Inglaterra pela Routledge, com artigos de brasileiros, ingleses e americanos, e terá uma versão brasileira este ano, em parceria com a editora Azougue.

No primeiro número da “Third Text”, em 1987, o crítico britânico Guy Brett assinou um artigo dedicado a Lygia Clark. Vinte cinco anos depois, a obra da artista vale milhões de dólares, e Lygia se tornou símbolo da valorização da nossa arte lá fora — tanto nas cifras quanto na qualidade. São dois atributos que frequentemente se confundem, mas nem sempre se sabe por quê. Para Sérgio Bruno Martins, a crítica é o lugar para que haja essa distinção, e se pensem os porquês. É o que ele pretende com a edição da revista dedicada à arte brasileira.

— A ideia é refletir sobre como reter uma carga crítica da arte brasileira em vez de simplesmente se tornar um novo membro de um clube em que as regras já estão prontas. Há o risco de ser vítima do sucesso, de uma pressão para que as histórias da arte se conformem às narrativas mais bem estabelecidas. A revista tem uma certa intenção de mostrar a complexidade ou a irredutibilidade dessas narrativas mais fáceis — afirma Martins, que também assina um artigo na edição, sobre a teoria do não objeto.

O título da “Third Text” dedicada ao Brasil, “Bursting on the scene”, foi retirado de um artigo de Guy Brett de 1989, em que ele pensava sobre uma possibilidade de “irromper na cena” alternativa ao fenômeno do boom. Posicionar-se em relação ao mercado e a esse boom contemporâneo, no entanto, não é o tema da publicação, mas um ponto de partida para se pensar no próprio papel da crítica, uma motivação para buscar novas narrativas sobre a arte brasileira, de recortes pouco abordados a assuntos que se tornaram senso comum de tão repetidos. Sobre esse último caso, o crítico dá o exemplo de Hélio Oiticica — que, ao lado de Lygia, forma o casal mais citado da arte nacional. Foi por meio de Oiticica que Martins, mestre e doutor em história da arte pela University College de Londres, chegou à “Third Text”. Ele publicou um artigo sobre o artista na revista em 2010, sendo convidado para editar seu primeiro número dedicado ao Brasil.

— Hélio Oiticica é um artista canônico, mas paradoxalmente muito mal conhecido. Ele surge na cena internacional nos anos 1990, na mesma década da estética relacional, que em grande medida legitima sua poética. Mas existe um antagonismo na obra do Hélio que essa estética harmoniosa não tem — sustenta. — No Brasil, falta um pouco a crítica desvinculada do meio curatorial. Um texto de catálogo raramente vai dar lugar para o dissenso. Corre-se o risco de os objetos serem engolidos pela máquina crítica lá fora.

Posted by Cecília Bedê at 5:10 PM

Uma ponte artística entre Ceará e Minas Gerais por Adriana Martins, Diário do Nordeste

Uma ponte artística entre Ceará e Minas Gerais

Matéria de Adriana Martins originalmente publicada no Caderno 3 do jornal Diário do Nordeste em 5 de março de 2012.

Até de abril, o Centro Cultural Banco do Nordeste exibe a mostra "Campo Branco", de artistas mineiros

Uma conexão geográfica e artística entre Ceará e Minas Gerais. A primeira, pela partilha de uma vegetação em comum, a caatinga, espalhada entre os estados do Nordeste e o norte de Minas. A segunda, pelo trabalho artístico que a paisagem árida inspirou - uma coleção de seis obras, entre pinturas, fotografias e desenhos, realizada por seis artistas mineiros.

A mostra, batizada "Campo Branco", foi montada pela primeira vez na capital cearense, no Centro Cultural Banco do Nordeste. Nada de telas com paisagens secas e retorcidas. Na exposição, a caatinga faz-se presente mais em sentido metafórico que literal. É ponto de partida para reflexões sobre o espaço de atuação do artista, o aparente "vazio" do bioma como oportunidade de criação, sobre o diálogo entre aridez e pujança, vida e esterilidade, entre outras questões.

"A princípio tudo ali parece árido, mas, na verdade, é um espaço bastante profícuo, um lugar por descobrir, passível de ação artística. Está tudo ali e, ao mesmo tempo, vazio", observa Júnia Penna, uma das integrantes do grupo.

Além dela, há ainda trabalhos de Francisco Magalhães, Isaura Pena, Pedro Motta, Ricardo Homen e Rodrigo Borges. Não se trata de um coletivo, mas de um grupo de nomes significativos no cenário mineiro da arte contemporânea, ligados por afinidades em relação a temas - entre eles o das paisagens, da espacialidade, das referências geográficas - embora desenvolvam pesquisas diversas e carreiras independentes.

Segundo Francisco Magalhães, em texto para a exposição, o termo "caatinga" é originário do tupi-guarani e significa mata branca. "´Paisagem interior´, a parte mais dentro do Brasil, sob um mesmo céu: Minas Gerais e Ceará. O termo ´campo branco´, que dá nome à exposição, alude a um lugar supostamente árido, lugar ainda por ser, suporte e território no qual esses artistas estabelecem suas criações", analisa o artista mineiro.

Afinidades

Magalhães segue ao explicar que a paisagem aparece de diferentes maneiras. Em alguns momentos, mais formalmente; em outros, mais simbólica. Os integrantes do grupo "revelam uma aproximação poética entre as obras, presente na espacialidade, na noção de vazio e no sentido construtivo, e buscam, no trabalho com a superfície, o espaço e a matéria, o símbolo, o lastro para suas ações", destaca no texto.

"Vimos desenvolvendo esse trabalho há algum tempo, ele deriva de uma outra exposição que iniciamos em 2006, chamada ´Geometria Impura´, na qual já explorávamos essa questão do vazio, da geometria como ponto forte. Depois de Belo Horizonte, levamos essa mostra para várias capitais, como Salvador, Recife e Rio", recorda Penna. "Somos mais ou menos da mesma geração, e sempre trombamos uns com os outros em ocasiões diversas, guiados pelas mesmas afinidades", complementa a artista. A ressalva é reforçada pelo colega Rodrigo Borges. "É um grupo heterogêneo, tem desde pessoas que atuam desde anos 80 até gente como eu, que passou a trabalhar mais tarde, no final dos anos 90, começo dos anos 2000", explica.

"Mas ao longo das respectivas trajetórias passamos a reconhecer nos trabalhos uns dos outros questões comuns, embora abordadas de maneiras bem diversas - entre elas está a questão da paisagem", avalia Borges.

O artista detalha aspectos de sua obra em "Campo Branco". "Trata-se de uma série chamada ´Caixa Aberta´, que venho desenvolvendo com volumes de papelão e fitas adesivas, sempre de maneira a intervir na arquitetura do local de exibição", explica. "Assim, crio situações espaciais nos espaços expositivos. É um trabalho bem pictórico, colorido. Inicialmente era tridimensional, em ´Campo Branco´ desdobrou-se em um painel bidimensional, instalado na parede, porém maleável", ressalta.

A escolha pela bidimensionalidade e a extensão do tamanho da obra está relacionada ao tema da paisagem. "É a maior versão que já fiz, tem quase quatro metros. Evoca a questão geográfica, de horizonte", explica Borges. Fortaleza é a primeira cidade a receber "Campo Branco". Daqui, os artistas ainda estão decidindo para onde levar o conjunto de trabalhos.

Mais informações sobre a exposição na agenda de eventos.

Posted by Cecília Bedê at 4:51 PM

Coletivos criam performances urbanas por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Coletivos criam performances urbanas

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 5 de março de 2012.

Grupos em São Paulo, Rio e Belo Horizonte promovem situações inusitadas para combater a "anestesia do olhar"

Artistas tentam manter autonomia em relação ao sistema financiando suas ações por meio de "vaquinha" na internet

Atento à transformação radical em curso no centro de São Paulo, este coletivo organiza festas, festivais de choro, peças de teatro ao ar livre e baladas de todo tipo no entorno do Minhocão, elevado que corta o coração da capital

No fim do ano passado, um quarteirão de Copacabana, no Rio, amanheceu interditado. Fitas demarcavam uma zona de desapropriação para a "construção de turbinas subaquáticas de geração de energia", o que causou espanto entre os moradores.

Na verdade, não existiriam turbinas nem se tratava de uma obra real, mas sim de uma ação do coletivo Brecha, que cria performances em espaços públicos com a intenção de despertar questionamentos no público.

"Exploramos mesmo essas brechas", diz Patrick Sampaio, um dos artistas do grupo. "Quando dão conta da história, a gente já terminou, desaparece e surge de novo em algum outro lugar."

Esse não é único conjunto de artistas, ativistas, hackers, atores e DJs que se juntam pelas metrópoles do país para combater o que alguns chamam de "anestesia do olhar".

"Nosso trabalho cria situações de sutileza, um olhar poético sobre o cotidiano", explica Brígida Campbell, do grupo Poro, de Belo Horizonte. "Usamos cartazes, lambe-lambes, faixas, coisas que criam uma espécie de ruptura."

ESPECULAÇÃO

No caso, uma ruptura com a ocupação tradicional de espaços muitas vezes vítimas do mau urbanismo e às voltas com a transformação desordenada causada pela especulação imobiliária e por problemas sociais.

Tentando manter certa autonomia em relação ao sistema oficial da arte no país, de editais e leis de incentivo, muitos desses grupos financiam suas ações por sites de "crowdfunding", ou seja, pedindo dinheiro a seu próprio público direto pela internet.

"Nossa lógica é fazer uma campanha, a gente não se vê sentando com um patrocinador para discutir", diz Lucas Pretti, do coletivo paulistano Baixo Centro. "Queremos uma dose de descontrole."

No caso deles, o "descontrole" é se instalar na região central de São Paulo, às voltas com a tentativa de revitalização da cracolândia.

"Não é o centro bonito, a Sé, a [avenida] Paulista", diz Pretti. "É uma coisa mais suja, feia, o eixo do Minhocão, que a gente quer ocupar com cultura, justiça, mobilidade. Queremos colocar uma coisa aberta na cidade fechada."

BLOCO, BIKE E KOMBI

Até agora, o Baixo Centro, em parceria com grupos de música, artes plásticas e teatro, já conseguiu armar um bloco de Carnaval, que desfilou pelo Minhocão, além de rodas de choro e de uma série de eventos de arte de rua.

Da mesma forma, o Nuvem, no Rio, vem criando festas ambulantes com um sistema de som acoplado a bicicletas -tudo isso também bancado com o velho esquema de vaquinhas virtuais.

"São caixas de som conectadas via rádio", diz Ícaro dos Santos, do Nuvem. "A proposta é fazer uso de um lugar que não é ocupado direito. No aterro do Flamengo, nossa festa parecia um festival na Califórnia, com 300 pessoas."

Depois de dois anos dominando espaços abandonados no centro paulistano, como o subsolo de prédios desativados ou bordéis decadentes, o coletivo Voodoohop também planeja juntar dinheiro via "crowdfunding" para pôr uma Kombi de som nas ruas.

"A ideia é ter um café, um cinema e uma balada móveis", conta Thomas Haferlach. "Vamos povoar o centro usando espaços alternativos."

Posted by Cecília Bedê at 4:46 PM | Comentários (1)

Anatomia barroca por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Anatomia barroca

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 3 de março de 2012.

Novo estudo mostra que Caravaggio fez versão anterior, com esboços preparatórios, da célebre Medusa

Do hábito de assistir a execuções públicas em Roma, Caravaggio desenvolveu sua habilidade assombrosa para retratar cabeças decepadas.

Mas uma nova decapitada tem roubado a cena desde que foi anunciada na semana passada na Itália. Aquilo que pensavam ser uma cópia da célebre Medusa que o artista pintou sobre um escudo é, na verdade, a primeira versão, também dele, da obra que hoje está em Florença.

Na Galleria degli Uffizi, na cidade que foi epicentro do Renascimento, o rosto desesperado da mulher de cabelos de serpente sempre foi um sucesso de público, estando entre as 25 obras mais importantes do palácio onde mora também a Vênus de Botticelli.

Agora, especialistas debatem o impacto da versão recém-descoberta. Enquanto o escudo do Uffizi data de 1600, dez anos antes da morte de Caravaggio, aos 38 anos, a nova Medusa é de 1596.

"Ele não largava esse escudo, dormia com isso debaixo da cama", conta Samanta Angelone, uma das pesquisadoras da primeira versão da obra. "Depois é que ele fez a cópia que foi parar no Uffizi."

Ao contrário da Medusa conhecida até hoje, a primeira versão esconde por baixo da pintura um raro desenho preparatório do artista -Caravaggio, que pertencia à escola veneziana de pintura, não costumava fazer esboços e pintava direto sobre a tela.

Nesse caso, especialistas sustentam que o mestre do barroco tenha feito esse desenho inicial pela dificuldade em trabalhar sobre a superfície convexa do escudo.

Seguindo o mito grego, Caravaggio retratou a Medusa sobre a arma porque Perseu, que derrotou o monstro, usou depois sua cabeça presa ao escudo para transformar inimigos em pedra -um dos poderes daquela mulher capaz de congelar com o olhar.

Tentando garantir a eficácia desses olhos, Caravaggio chegou a esboçar quatro versões deles no estudo, escondidas debaixo da tinta. Radiografias dessa nova Medusa também mostram três posições diferentes para o nariz e outras quatro para a boca.

"Essa Medusa é um protótipo da outra, com cerca de 20 desenhos preparatórios", conta a historiadora italiana Federica Gasparrini. "Só depois de superar as dificuldades da primeira é que ele executou a segunda versão."

Exames da Medusa já conhecida mostram que não há estudos ou esboços por baixo da tinta, o que sempre intrigou especialistas, já que o traço contínuo e sem falhas da obra parece ter sido feito sem muito esforço e na primeira tentativa do artista.

Uma extensa análise da nova Medusa agora indica que aquele desenho inicial do primeiro escudo foi transposto pelo artista para uma chapa de vidro e projetado sobre o segundo escudo com uma fonte luminosa, o que permitiu que ele pintasse direto sobre o suporte da réplica.

"Não há, na versão do Uffizi, nenhum sinal ou indício de que ele tenha feito uma cópia ali", diz Gasparrini. "Não aparecem nem mesmo as incisões na tinta que ele costumava fazer com a ponta do pincel, o que reforça a hipótese dessa cópia ter sido executada a partir das sombras."

Nisso, Caravaggio teve a ajuda provável do cardeal Francesco del Monte, seu mecenas, que se dividia entre a religião e estudos de alquimia, matemática e geometria.

Segundo estudiosos, Del Monte, que encomendou a segunda versão da Medusa para presentear o nobre florentino Ferdinando dei Medici, ensinou o artista a usar luz e sombra para fazer a cópia.

DESESPERO E DOÇURA

Mas mesmo com todo o esmero técnico, não são idênticas as duas Medusas. Caravaggio, que usou o próprio rosto como modelo para suas feições, fez mudanças e correções na expressão do monstro ao transpor a obra.

Enquanto a versão descoberta agora traz um olhar exasperado, mais austero e masculino, a Medusa do Uffizi é mais doce e feminina.

"Na primeira, ele faz uma advertência em nome da razão e da ciência, como se apontasse para as armadilhas da paixão", analisa Gasparrini. "A segunda fala da mulher como tentação, uma referência à virtude moral e militar, que não pode se render às tentações da carne."

Mas essa é uma comparação que ficará para os livros, já que o Uffizi descarta expor as duas Medusas juntas.

"Não é a primeira vez que descobrem uma cópia ou versão que seria mais bela e mais original do que a antiga", diz Antonio Natali, diretor do Uffizi. "Estudiosos têm o direito de achar o que quiserem, mas, se fôssemos expor tudo que descobrem aqui, o museu viraria uma feira."

Masp quer Medusa em exposição

Enquanto especialistas na Itália se digladiam sobre o real significado da nova Medusa, o Masp tem ampliado negociações para trazer ao país a Medusa clássica, do Uffizi de Florença. Teixeira Coelho, curador do museu paulistano, afirma que já estão confirmadas telas importantes do artista, como "Narciso na Fonte", na mostra dedicada ao mestre barroco marcada para junho deste ano. Mas Antonio Natali, diretor do Uffizi, diz que a Medusa não está autorizada a sair da Itália.

Posted by Cecília Bedê at 4:36 PM

março 2, 2012

Conversa entre gerações por Angélica de Moraes, Revista Select

Conversa entre gerações

Matéria de Angélica de Moraes originalmente publicada na seção crítica / artes visuais da Revista Select em 1 de março de 2012.

O corpo, a sexualidade e a memória são os temas da mostra dos dois artistas, em exposição até 17 de março

Galeria Jaqueline Martins reúne colagens e assemblages de Hudinilson Jr e Nino Cais

Hoje, primeiro de março, às 20h, Hudinilson Jr e Nino Cais vão conversar entre eles e com o público na galeria Jaqueline Martins, com mediação da crítica e curadora Thais Rivitti. Na verdade, essa conversa já vem acontecendo nas paredes da galeria há algumas semanas, demonstrando que os dois artistas têm muito em comum e que a exposição resultou bem afinada.

São 60 peças de pequeno e médio formato, criadas a partir de recortes de jornais, livros, documentos pessoais e objetos, que ocupam, lado a lado e em grande harmonia, o térreo e mezanino da galeria.

Apesar de pertencerem a duas gerações diversas e terem desenvolvido linguagens autorais inconfundíveis, Hudinilson Jr (1957) e Cais (1969) dedicam à colagem e à assemblage o foco principal de suas produções. Os dois trabalham a memória aderida aos objetos e aos corpos, embora Hudinilson seja mais focado no homoerotismo hard core e Cais realize a uma delicada arqueologia sobre as fragilidades das coisas passadas que resistem e flutuam no tempo até a atualidade.

O conjunto de trabalhos está muito bem costurado ao longo da mostra, estabelecendo semelhanças e diferenças de abordagens temáticas sem romper a fruição do público. A mostra se oferece inteira especialmente àqueles que já aprenderam a prática civilizada e civilizatória de recusar julgamentos morais e censura de costumes.

Um dos pontos altos da mostra é o resgate de meia dúzia de assemblages realizadas por Hudinilson nos anos 1980 e em 2002, com eficaz articulação visual de objetos e imagens retiradas de revistas e outras publicações da cultura de massas. São peças que frequentam com muita propriedade o território da poesia visual, com certa doçura surpreendente.

Grau máximo de irreverência - Ao longo da carreira e nas obras recentes, Hudinilson costuma imprimir grau máximo de irreverência à glorificação da sensualidade do corpo masculino, em registro homoerótico, sem limites nem censura. Temática, aliás, que lhe rendeu polêmica colossal quando, nos anos 1980, xerocou e ampliou para outdoors exibidos nas ruas de São Paulo imagens de seus genitais em close. Postura política radical ainda hoje, aliás, quando o politicamente correto castra boa parte da produção cultural.

As obras de maior voltagem poética da participação de Nino Cais na mostra são seus três objetos/esculturas, em que soma naturezas diversas de objetos, atualizando atitudes e processos da herança estética do surrealismo. Há sínteses raras como em Marretas (2011), onde pousa a ferramenta-símbolo da força e da destruição sobre xícaras de porcelana, atingindo excelência de resultados que o aproximam do poeta visual catalão Joan Brossa.

Signos da fragilidade da vida e da memória são articulados por Cais ainda na cadeira com foices (morte) sugerindo um balanço impossível. Outra cadeira teve prótese ortopédica acoplada a suas “pernas”, amplificando o conceito de assemblage para operação simbólica mais afinada com a contemporaneidade.

As colagens com raras e belas estampas (litografias e rotogravuras) do século 19 ou início do século 20, garimpadas em sebos e reunidas a intrigantes recortes de papel completam a sólida contribuição de Cais a esta exposição. A mostra de Hudinilson Jr e Nino Cais reafirma a vocação da galeria de Jaqueline Martins no resgate cultural, contextualização e pesquisa que já nos ofereceu, há poucos meses, uma antológica mostra individual do pioneiro do grafite Alex Vallauri, que colocou muitos pingos nos iis sobre a História desse movimento que os desavisados imaginam ser fenômeno recente.

SERVIÇO
Hudinilson Jr e Nino Cais: colagens
Até 10 de março
Galeria Jaqueline Martins
Rua Dr. Virgílio de Carvalho Pinto, 74, São Paulo (SP)
de 2ª a 6ª, das 11h30 às 19h; sábados, das 11h30 às 17h


Posted by Cecília Bedê at 5:06 PM

Ministério da Cultura abre operação para realizar Bienal por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo

Ministério da Cultura abre operação para realizar Bienal

Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada no jornal Folha S. Paulo, em 25 de fevereiro de 2012.

Está em curso operação organizada pelo Ministério da Cultura (MinC) para viabilizar a realização da 30ª Bienal de São Paulo. A mostra seria gerenciada por outra instituição com situação regular, definida entre a Pinacoteca do Estado de São Paulo, o Museu de Arte Moderna e o Instituto Tomie Ohtake, segundo a Folha apurou.

Com suas contas vinculadas à lei Rouanet bloqueadas por inadimplência, a Fundação Bienal não pode mexer nos mais de R$ 8 milhões já arrecadados em incentivos.

A inadimplência foi decretada no dia 2 de janeiro por conta de processo da CGU (Controladoria Geral da União), que teve início em abril de 2009. Ele apontava irregularidades em 13 processos da Bienal, ocorridos entre 1999 e 2006, nas gestões de Carlos Bratke e Manoel Francisco Pires da Costa.

A Bienal teria feito mau uso de verbas públicas no total de R$ 32 milhões.

PRAZOS

O presidente da Bienal, Heitor Martins, disse à Folha, no mês passado, que, se as contas não fossem liberadas em meados de fevereiro, a Bienal estaria em risco.

"Os cerca de R$ 5 milhões arrecadados fora das leis de incentivo não seriam suficientes para a mostra, orçada em R$ 27 milhões", disse.

Esse prazo, segundo a assessoria de imprensa da Bienal, foi definido agora como 15 de março. No entanto, já há atrasos no cronograma: o material didático do setor educativo, que deveria ter ido para a gráfica, está parado.

Martins não quis comentar a negociação em curso com o Ministério da Cultura.

Segundo a Folha apurou, a saída em negociação seria transferir o proponente do projeto da 30ª Bienal para um das três entidades já mencionadas. O projeto, inserido na Lei Rouanet, prevê a captação de R$ 27 milhões e, segundo Martins, a maior parte dele já estaria garantido.

INTERESSADOS

As instituições devem ser consultadas, na próxima semana, se estão interessadas em participar do acordo.

Ainda segundo fontes da Folha, a entidade com maior chance é a Pinacoteca, que tem seu diretor, Marcelo Araújo, entre os conselheiros da Fundação Bienal.

Questionada sobre a negociação, a assessoria do Ministério da Cultura não respondeu ao jornal até o fechamento desta edição.

Posted by Patricia Canetti at 9:39 AM

março 1, 2012

De que se fala quando falam de natureza por Juliana Monachesi, Revista Select

De que se fala quando falam de natureza

Matéria de Juliana Monachesi originalmente publicada na seção crítica / artes visuais da Revista Select em 25 de fevereiro de 2012.

Trabalhos e mostras associados inconsequentemente ao meio ambiente banalizam a discussão em torno da arte ecológica

Exposições em São Paulo e Belo Horizonte tentam estabelecer uma conexão entre arte e natureza, com resultados incoerentes

Um índio algo deslocado, empunhando uma arco-e-flecha imaginário à beira de um dos lagos do Horto Florestal, o corpo coberto de tinta vermelha, parece ser um trabalho de denúncia sobre a relação mutuamente excludente entre grandes metrópoles (o horto, apesar de ser um pedaço de floresta preservada enquanto tal dentro de São Paulo, não deixa de ser artificial em seus aspectos de fauna e flora "domadas") e povos indígenas nativos. Certo? A julgar pelo depoimento do artista em material de divulgação da mostra Arte e Meio Ambiente: Rompendo Fronteiras, em cartaz no Museu do Horto desde o dia 12, a impressão está errada.

Tanto Mello Witkowski Pinto, autor da escultura em resina e fibra de vidro intitulada Índio Puro (2008), quanto Margherita Leoni, que são os dois artistas cujos trabalhos estão reunidos na exposição, defendem que o propósito das obras apresentadas é abordar a "relação de equilíbrio com a natureza". Leoni, em um painel monumental também instalado fora do museu, retrata plantas brasileiras nativas em escala agigantada. São 40 metros de painéis que formam um percurso em S e que resultam da ampliação e impressão de desenhos de observação que a artista realiza há dez anos - seu acervo de aquarelas tem registrados mais de 200 tipos de vegetação tipicamente brasileira.

Não fui conferir pessoalmente, mas ambos os trabalhos mencionados parecem ter lá o seu interesse. A escultura, se observada à parte do discurso algo maniqueísta do artista (e considero apenas aquilo que foi veiculado no press release, pois tampouco conversei com os artistas), remete às peças do israelense Yoram Wolberger em que discute estereótipos culturais por meio da ampliação de soldadinhos, índios e cowboys das brincadeiras infantis. A instalação de Margherita Leoni (a não ser pela estrutura metálica em que os painéis foram montados, que polui a obra) promove um contraste instigante entre a atualidade da natureza-morta e os equívocos da land art.

Porém, o descompasso entre o discurso dos artistas e os trabalhos expostos (como, por exemplo, ao intitular a mostra Arte e Meio Ambiente: Rompendo Fronteiras - de que fronteiras se trataria?) vai mais além quando se confrontam as obras com o contexto em que são apresentadas. A exposição, de acorco ainda com o material de divulgação, é uma parceria do Governo Italiano com o Governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria do Meio Ambiente: "Após o período em cartaz no Horto [12 de fevereiro a 10 de agosto], a exposição percorrerá, durante quatro anos, os Parques do Estado. A inauguração teve a presença do Senhor Geraldo Alckmin, Governador do Estado de São Paulo e do Senhor Bruno Covas, Secretário de Estado do Meio Ambiente".

Ou seja, esta visão ingênua da relação entre arte e meio ambiente tem o aval de uma secretaria de Estado e representaria, sobretudo na referida itinerância por diversos parques de São Paulo, a visão do governo estadual sobre a contribuição que a arte pode dar para o debate ecológico. É isso mesmo? Os dois artistas citam preocupações ambientais nas respectivas declarações coligidas no material de divulgação para a mídia, mas ao mesmo tempo demonstram desconhecer as discussões da arte e da teoria ambiental contemporâneas com afirmações como "o desequilíbrio da natureza é um sinal de que o planeta está reagindo às agressões sofridas". Será que não estamos em uma fase do debate ecoartístico que exige mais sofisticação?

Palácio das Artes apresenta mostra de artistas mineiros que utilizam "matérias-primas encontradas na natureza"

A ecologia virou moeda de troca cultural, modismo que afeta qualidade e relevância das obras militantes do tema. Uma exposição em cartaz desde o dia 5 no Palácio das Artes, em Belo Horizonte, também é divulgada como uma evento focado na ecologia: "Referências à natureza serão o destaque na Grande Galeria. Com obras dedicadas a esse tema, a mostra Duo pretende estabelecer um diálogo entre as produções recentes dos artistas Annie Rottenstein e José Alberto Nemer", informa o material distribuído para a imprensa. Em realidade, o único e frágil ponto de contato com a natureza nas obras expostas é a utilização de materiais "naturais".

Bambu, junco, fibras e pigmentos de terra constituem a matéria-prima das esculturas de Annie Rottenstein. As aquarelas de José Alberto Nemer, de resto bastante delicadas e elegantes, fazem uso de água e pigmentos que o texto de divulgação não esclarece se são particularmente "naturais". Ora, se a ideia era estabelecer um diálogo entre obras recentes de Rottenstein e Nemer, não teria ocorrido a alguém cotejar a organicidade de formas ou a paleta crua presente na produção de ambos? Por que apelar para a natureza quando ela evidentemente não é tema, nem assunto, nem leitmotiv, nem causa ou consequência de obra alguma?

Um último exemplo: Nesta terça-feira, 28, uma nova galeria, chamada Fibra, vai ser inaugurada no Pacaembú. A coletiva de inauguração, de nome Origem, reúne trabalhos de Gen Duarte, Ronah Carraro e Fredone Fone. Adivinhe qual elemento entrelaça a produção dos artistas? A fibra de bananeira. Informa o release: "Metade dos trabalhos a serem apresentados foi pintada sobre folhas de fibra de bananeira. Este material reciclado - utilizado na construção civil, nas indústrias automobilística, têxtil e moveleira - na Fibra Galeria passa a ser tratado como suporte para arte".

Quando foi que a reciclagem, a ecologia, a aproximação com a natureza ou sua tematização se tornaram um valor estético "em si"? O fato de a questão ambiental estar "na moda", em grande parte devido à sua urgência e inescapabilidade, não justifica a utilização indiscriminada e gratuita do tema para conferir atualidade ou relevância a eventos de arte, obras ou o que quer que seja. Pelo contrário, exige dos artistas ou de quem pretenda abraçar a causa maior seriedade e compromisso com seu objeto de estudo/trabalho, tendo em vista o risco de uma dupla banalização: da própria obra ou, pior, do tema em questão. Ou seria mero acaso o fato de os experts do meio artístico torcerem o nariz de antemão quando ouvem falar de arte e ecologia?

Posted by Cecília Bedê at 3:13 PM