|
agosto 31, 2011
O Nordeste negro por Natercia Rocha, Diário do Nordeste
O Nordeste negro
Matéria de Natercia Rocha originalmente publicada no Caderno 3 do jornal Diário do Nordeste em 31 de agosto de 2011.
O sincretismo entre a negritude e nordesti- nidade dão o tom da exposição "Maracatus e Orixás", que o artista popular João Pedro do Juazeiro abre hoje, no Sesc Fortaleza
Foi em um meio de tarde, abafada, após o já tradicional engarrafamento da Avenida Duque de Caxias, que a equipe do Caderno 3 chegou à casa do artista popular João Pedro de Carvalho Neto, mais conhecido como, João Pedro do Juazeiro, que fica ali, no final da Rua Pedro Pereira, já perto do Colégio Estadual Liceu do Ceará.
Casa simples, pintura amarela descascando, muro baixo, porta e janela. "É aqui!". E João Pedro abre logo as duas bandas da porta e, com um sorriso tímido-formal, vai fazendo os gestos de acolhimento, característico do povo do Cariri, e mostrando o ateliê apertado cheio de obras de arte. "Vamos entrando", e as mãos vão guiando o olhar do visitante para as obras de 95 x 65 cm, dependuradas em um cordão puxado rente à parede.
Dez anos depois de ter deixado a terra de "meu Padim", como ressalta, continuamente, o ex-vendedor da famosíssima Pomada Milagrosa do Padre Cícero, cordelista e xilogravador, que vem propagando, com sua arte-vida, a cultura nordestina, João Pedro agora envereda por novas searas e apresenta, amanhã, às 18h30, no Sesc Fortaleza, a exposição intitulada "Maracatus e Orixás". Ela fica em cartaz até 4 de novembro.
Pesquisa
"Como está o novo trabalho, seu João?" indago. "Seu João, não, porque se não eu vou pensar que eu sou velho", diz, bem humorado, o caboclo de 47 anos, fumante, que tenta ser discreto com a cicatriz vertical de uma cirurgia feita no coração, visível através do botão aberto da camisa social. E arremata.
"Olhe, vim para Fortaleza e aqui encontrei o Maracatu. Junto com Calé Alencar, passei a dançar e me veio a necessidade de fazer pesquisa sobre as origens afros. Me aprofundei na busca desse conhecimento e encontrei os orixás, na Umbanda. Fui buscar pessoas que tinham conhecimento dos fundamentos da Umbanda, e vi essa parte maravilhosa e envolvente, que não é o que alguns pensam ou trabalham com ela".
Enquanto mostra as grandes matrizes e impressões do Senhor Ogum, que em sua representação católica corresponde a São Jorge; o Senhor Oxóssi, com São Sebastião; Iansã com Santa Bárbara, e outros, João Pedro segue buscando explicações para esse universo simbolicamente talhado na madeira, com seu traço nordestinamente peculiar.
"Tem fusão, tem sincretismo. Se você prestar atenção, os deuses da mitologia grega são os mesmos da romana. E os afros são os mesmos das mitologias grego e romana. Comecei a trabalhar os orixás negros, mas também estou trabalhando os orixás brancos, com esse sincretismo religioso, que traz o orixá onde se ele torna branco. Venho há quatro anos fazendo pesquisas com um pai de santo maravilhoso, com historiadores da Universidade Federal do Ceará, e com alunos", detalha.
Enquanto ouvimos João, a companheira de vida há 22 anos, Célia (do Juazeiro), com jeitinho acanhado, olhos fortemente pintados, sorriso largo, traz para a roda cafés e cigarros. Sentamos todos. Os filhos do casal: Wallison, Wanderson e Willyane também estão por ali, trabalhando com o pai, o mais novo já casou e deu um neto a João e Célia.
Iconografia
"Cheguei em Fortaleza como vendedor ambulante, até que vi essa oportunidade de unir meus conhecimentos com vendas e a iniciação com a xilogravura. Vendia pomada Padre Cícero, que serve para dor de cabeça, inflamação, coceira, inchação, pé inchado. Subia e descia rua com a pomada milagrosa. Aqui eu passei a vender xilogravura e ministrar oficinas. O que me proporcionou mais desenvolvimento, porque, quando a gente ensina, a gente aprende. Porque eu sou um matuto, interiorano, quando cheguei aqui fui ministrar oficina para doutores, professores, alunos universitários. As exigências eram muitas, e me vi, mesmo como matuto, obrigado a me aprofundar na xilogravura", diz, João Pedro.
"Minha iconografia toda é nordestina. Trabalho a religiosidade do meu Padre Cícero Romão, porque sou afilhado dele, meu pai era afilhado dele e de Nossa Senhora das Dores. Não te disse? Em 1920, eles vieram de Pernambuco e meu pai foi batizado em Juazeiro, por meu Padim Ciço. Ele era romeiro pernambucano", confessa.
Pelos cálculos de João Pedro, a exposição "Maracatus e Orixás" é a primeira com o tema realizada através da xilogravura no Ceará. "Chegou o momento. Se você chegar na Bahia, tem orixás por todo canto, João Carybé fez orixás por toda a Bahia, tem escultura, pintura, gravura. No Ceará, não temos isso, mas é porque existe certo preconceito a respeito do culto de orixás. Mas toda humanidade cultua os orixás. Abaloaê é São Lázaro, Oxaguian é Jesus Cristo, então, que diferença existe nisso? Sou religioso, fiel e afilhado a meu ´Padim´ Cícero Romão. Mas o artista trabalha em toda existência do ser e, na xilogravura, tudo se grava. Deuses antigos foram gravados na madeira, na pedra, e os de hoje também podem ser gravados. Deus não quer ninguém sofrendo e acredito que existam anjos, energias que tomam contam de nós".
MAIS INFORMAÇÕES:
Exposição - "Maracatus e Orixás", de João Pedro do Juazeiro. Abertura hoje, às 18h30, na Galeria
do Sesc Fortaleza (Rua Clarindo de Queiroz, 1740). Visitação diária, das
10 horas às 18 horas. Gratuito.
Contato: (85) 3452.9090
Decantar o rio por Paula Alzugaray, Istoé
Decantar o rio
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada no caderno Artes Visuais da revista Istoé em 26 de agosto de 2011.
Em obra sonora realizada com águas das três principais bacias do País, Cildo Meireles encanta e lança um alerta
OCUPAÇÃO CILDO MEIRELES – RIO OIR/ Itaú Cultural, SP/ até 2/10
Deixar os trabalhos decantarem por muito tempo, na forma de ideia e anotações, antes de torná-los realidade. Esse é um procedimento comum na trajetória de Cildo Meireles. Nos anos – ou décadas – em que se dedica à decantação dos projetos, o artista garante a filtragem de suas impurezas, assemelhando seus processos criativos aos químicos. Esse ato de decantação marcou também a criação da instalação sonora “rio oir”, que teve sua primeira anotação em 1976 e agora ganha forma graças ao projeto Ocupação, do Itaú Cultural. Foram dois anos de viagens e gravações dos sons das águas das três principais bacias do País: Tocantins, Paraná e rio São Francisco. O resultado é uma obra sonora de primeira grandeza, em que Cildo tece seu elogio à natureza desenvolvendo todos os sentidos da palavra decantar: celebrar em cantos ou poemas.
O trabalho parte de um palíndromo, uma frase reversível e reveladora. O espelhamento de “oir” – ouvir em castelhano – com “rio” sugere que paremos para escutar o que as águas têm a dizer. E, ao prestar atenção aos fluxos dos rios, o artista e sua equipe descobriram em suas viagens um sistema de nascentes em estado de alarme, muitas delas natimortas. A fim de demarcar essa percepção, a obra sonora orquestra os sons grandiosos das fontes naturais – do estrondo das pororocas à arrebentação das marés – com os sons das águas encanadas dos sistemas residuais das cidades. “rio oir” é uma obra sonora em forma de LP de vinil. A sinfonia das águas ocupa o lado A. O lado B é formado pelo som de risada humana. Afinal, esse é o segundo sentido da palavra “rio”: rir na primeira pessoa do singular. Há uma série de duplos sentidos, espelhados e sobrepostos, nos dois lados desse palíndromo.
O trabalho funciona muito bem como vinil. O único ruído da nova obra sonora de Cildo Meireles é o caráter cenográfico de sua montagem no espaço, criada, em realidade, pelo curador da mostra, o arquiteto Guilherme Wisnik. Incomoda o aspecto provisório das salas concebidas para a escuta dos rios e das risadas e é desnecessário o circuito de imagens do making of das gravações, que circunda a instalação. Contudo, se a arte pudesse mudar o mundo, “rio oir” contribuiria para decantar nossas contaminações.
agosto 30, 2011
Geometria em questão por Maria Hirszman, O Estado de S.Paulo
Geometria em questão
Matéria de Maria Hirszman originalmente publicada no caderno Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 29 de agosto de 2011.
Mostra coloca em rico paralelo obras de Antonio Lizárraga e Paulo Roberto Leal
A exposição Geometria do Espaço Infinito, no Centro Cultural São Paulo, coloca em diálogo um leque amplo de obras de Antonio Lizárraga (1924-2009) e Paulo Roberto Leal (1946-1991), fazendo oportuna homenagem a esses dois importantes artistas ao mesmo tempo em que contribui para mostrar que a força do pensamento abstrato no Brasil é muito mais extensa do que costumam afirmar os manuais. Trata-se da primeira vez que a obra de Lizárraga é mostrada ao público desde sua morte. No caso de Leal o resgate é ainda mais importante, já que sua obra é praticamente desconhecida pelo público de São Paulo. Os dois artistas nunca mantiveram contato; pertencem a gerações, cidades e circuitos distintos. Tampouco há uma relação direta entre seus trabalhos. E, no entanto, têm em comum o questionamento rico, problematizador e bem humorado da abstração geométrica.
Segundo o curador José Augusto Ribeiro, a mostra pode ser pensada como uma espécie de dueto, no qual as singularidades de cada um são respeitadas. "São realizações muito inventivas, que tiveram uma ressonância pública muito aquém de sua importância", sintetiza. Para iluminar a presença de um espírito comum sem encobrir as soluções e caminhos individuais, a mostra propõe um percurso bem aberto, no qual se dá um permanente confronto entre as duas produções.
Com alguns trabalhos pontuais, realizados na década de 70, a seleção concentra-se sobretudo na década de 80, quando Leal manteve forte interlocução com a geração que despontava como um fenômeno de renovação da arte brasileira - ele foi um dos três curadores responsáveis pela mostra Como vai você, Geração 80? - e ao mesmo tempo dedicou-se a rever de forma questionadora o legado construtivo da geração que o antecedeu, evidenciando um grande diálogo com a produção neoconcreta. Sua produção é marcada pela experimentação de materiais (como papel e tecido), procedimentos e formas construtivas (como a mescla entre pintura e costura, entre bidimensionalidade e tridimensionalidade), mas sobretudo pelo que Ribeiro define como a procura de "um elo entre construtivismo e liberdade criativa". É recorrente o uso por Leal de títulos que remetam à paisagem carioca, explorando essa fronteira entre o caráter abstrato da construção e a possibilidade de figuração de uma paisagem por meio de formas geométricas, como nas pinturas Palmeira Imperial e Corcovado.
Os anos 80 também são determinantes no caso de Lizárraga, já que o mergulho no abstracionismo geométrico radical se dá depois de ele sofrer um acidente vascular cerebral, em 1983, e ficar tetraplégico. Passa então a explorar formas e cores para desestabilizar a percepção do espectador, investigando o projeto construtivista de um outro ponto de vista, desconstruindo preceitos e solapando certezas. Combina nas pinturas que projeta - já que está impossibilitado ele próprio de executá-las - cores cada vez mais dissonantes e sedutoras (como exemplificam duas telas inéditas) com equilíbrios geométricos instáveis.
Como que subvertendo a lógica esquemática, os dois artistas mostram que o construtivismo não se encerra em meados do século 20, nem tampouco se constrói apenas sobre certezas formais e utopias construtivas, mas se prolonga e interage com amplo raio de questões. E resgatam a potencialidade poética das formas puras ao investigar não o que têm de seguro, mas de problemático; não sua estabilidade, mas as dúvidas que elas suscitam.
ANTONIO LIZÁRRAGA E PAULO ROBERTO LEAL | 2ª MOSTRA DO PROGRAMA DE EXPOSIÇÕES 2011 |
CCSP. Rua Vergueiro, 1.000, Paraíso, 3397-4002. 10h às 20h (sáb. e dom., 10h às 18h; fecha 2ª). Grátis
Mostra faz leitura complexa do sexo na sociedade por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo
Mostra faz leitura complexa do sexo na sociedade
Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 27 de agosto de 2011.
Destaque é obra de Dora Longo Bahia que se apropria de repertório do cinema para criar narrativa épico-erótica
Poucos assuntos dominam tanto a sociedade contemporânea como o sexo. Por isso não é estranho que artistas contemporâneos se voltem a esse tema de forma tão contundente e explícita como na mostra "Destricted.br", em cartaz até hoje no Galpão Fortes Vilaça, na Barra Funda.
A exposição deriva do projeto "Destricted", lançado em 2006, que compila sete curtas de artistas estrangeiros, como Marina Abramovic e Matthew Barney, exibidos em salas de cinema e depois vendidos em DVD.
A versão brasileira reúne nove artistas, entre eles Adriana Varejão, Dora Longo Bahia, Karim Aïnouz, Miguel Rio Branco e Tunga, todos com filmes na mostra, além de obras em outros suportes, como desenhos, pinturas e esculturas.
As abordagens são muito distintas, e o panorama é amplo: sexo gay, sexo grupal, sexo na meia-idade, sexo pago.
Em algumas obras, predomina o caráter documental, como na ótima "Ponto de Vista", de Janaina Tschäpe, em que a artista instala uma câmera na cabeça de uma mulher que "fica" com três rapazes, posicionando na mulher o olhar do prazer, ao contrário das manjadas cenas de filmes da indústria pornô.
Outros, como "Cooking", de Tunga, e "Psinoe", de Adriana Varejão, incorporam o sexo a seus próprios repertórios imagéticos, como uma sereia numa piscina, espaço retratado por Varejão em várias de suas pinturas.
Contudo está em "petit a", de Longo Bahia, o grande momento de "Destricted.br". A artista se apropria de um imenso repertório visual do cinema, de filmes como "Laranja Mecânica", de Stanley Kubrick, ou "Veludo Azul", de David Lynch, para criar uma narrativa épico-erótica, com personagens bizarros.
Além do filme, desenhos da artista sobre páginas do livro "Flores do Mal", de Baudelaire, são apresentados e revelam todas as suas referências para a produção.
Aí condensa-se o que representou o primeiro "Destricted": uma leitura complexa dos caminhos que o sexo representa na sociedade.
Se nem todas as obras na versão nacional alcançaram esse nível, é porque ficaram apenas no sexo explícito e isso, convenhamos, está mais que disponível na internet.
Uma experiência radical por Ferreira Gullar, Folha de S. Paulo
Uma experiência radical
Matéria de Ferreira Gullar originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 28 de agosto de 2011.
O Manifesto Neoconcreto se caracterizou por não fazer promessa; foi a constatação do que estava sendo feito
Todas as pessoas, informadas nesse terreno, sabem que fui eu quem inventou o nome "neoconcreto", propus que criássemos um movimento com esse nome e escrevi o Manifesto Neoconcreto e a teoria do não objeto.
É verdade, também, como tenho dito, que nada disso teria sido possível nem teria consequências efetivas se se tratasse apenas de sacações minhas: de fato, não fiz mais do que formular o que já estava sendo criado pelos pintores, escultores e poetas que constituíam, àquela época, o grupo de concretistas do Rio de Janeiro.
E só por isso aquele movimento deu certo, marcando um momento de nossa história artística. Certamente, a tomada de consciência do processo de criação que o nosso grupo realizava foi um fator decisivo para o desdobramento que teria, pois era necessário que alguém formulasse teoricamente aquilo.
Coube a mim fazê-lo por ser eu, além de membro do grupo como poeta, também teórico e crítico de arte.
Sabemos todos, porém, que não é a teoria que produz as obras de arte, muito embora o processo criador exija a consciência crítica.
Desse equívoco estão cheios os manifestos dos diferentes movimentos de vanguarda do século 20, que, a exemplo dos manifestos políticos, prometem coisas que jamais serão realizadas.
Já o Manifesto Neoconcreto caracterizou-se por não fazer promessa nenhuma. Trata-se de um texto nascido da constatação do que estava sendo realizado: nos trabalhos de Lygia Clark, Amilcar de Castro, Franz Weissmann, Hélio Oiticica, Aluisio Carvão, Lygia Pape e dos poetas do grupo, algo surgira que diferia da concepção concretista herdada de Max Bill e dos conceitos da Escola de Ulm.
O fator principal dessa diferença era, no caso dos cariocas, o predomínio da busca intuitiva, ainda que sem romper com o rigor construtivo que caracterizava a arte concreta. A teoria do não objeto, por exemplo, surgiu como consequência de um trabalho de Lygia Clark que ela não sabia como classificar. Não era escultura, não era pintura, não era relevo. Entendi que era um objeto, mas um objeto sem função: só significação. Daí chamá-lo de "não objeto".
Disse, certa vez, que o primeiro "Bicho", de Lygia Clark, se inspirara no meu livro-poema "fruta". Mas observei, nesse mesmo texto, que era uma característica do nosso grupo a troca permanente de ideias e experiências, uma vez que estávamos frequentemente juntos a mostrar uns aos outros o que realizávamos.
A experiência neoconcreta foi muito rica, porque, particularmente no terreno das artes plásticas, levou às últimas consequências uma linha de experiência estética que começou no cubismo.
Esse processo de vanguarda terminou por desintegrar a linguagem artística. Resumindo: um dos objetivos surgidos dessa busca -a criação de uma arte não figurativa- conduziu Casemir Malévitch a pintar o quadro "Branco sobre Branco", que, a meu ver, estava a um passo do fim da pintura: a tela em branco. A saída que encontrou, então, foi abandonar a tela e partir para construções no espaço tridimensional, que chamou de "Construções Suprematistas".
Pois bem, Lygia, por outros caminhos, também chegou à tela em branco e -embora ignorando o que fizera o artista russo- partiu também para as construções no espaço tridimensional, que são os "Bichos".
Mas Lygia, antes de dar esse passo, desistira de pintar e passara a agir materialmente sobre o quadro, criando o que chamaria de "Casulos". Foi então que fiz os livros-poema, também para superar um impasse com que me defrontara ao escrever o poema "verde relva".
Ao ver que o leitor, diante da repetição da palavra verde, não lia o poema palavra por palavra, como eu pretendia, decidi escrevê-lo no verso das páginas, para obrigá-lo a isso. Intitulei-o de livro-poema porque ali poema e livro eram uma coisa só. O livro-poema "fruta" já não era um livro, embora feito em papel: o leitor o abria como se abrisse uma fruta, gomo por gomo.
Ao vê-lo, Lygia percebeu nele a solução para o impasse a que chegara e criou os seus "Bichos". No livro-poema, o manuseio não era invenção, já que livro é manuseável; nos "Bichos", sim.
Por isso mesmo o defini como "um ser novo no universo da arte". Era fascinante esse diálogo da poesia com as artes plásticas.
agosto 26, 2011
Terceiro Mundo: um outro lugar por Paula Alzugaray, Istoé
Terceiro Mundo: um outro lugar
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada no caderno de Artes Visuais da revista Istoé em 19 de agosto de 2011.
Nem a terra prometida nem o idealismo utópico. “Um outro lugar” é uma exposição, em cartaz no Museu de Arte Moderna de São Paulo, concebida para desmontar antigos mitos e apresentar um panorama múltiplo das utopias contemporâneas. Expostos entre 40 obras de 18 artistas, os três trabalhos de Marilá Dardot traduzem bem a noção da criação artística como abertura para outros espaços e temporalidades, criando alternativas ao aqui e agora. “Viagem”, “Terrorismo” e “Cartografia” são obras viajantes que estabelecem um eixo de conexão entre “Um outro lugar” e “Introdução ao Terceiro Mundo”, individual de Marilá Dardot, na Galeria Vermelho, que entra em sua última semana de exibição.
De acordo com a estratégia de comunicação costurada por Marilá Dardot entre as duas exposições, os três trabalhos presentes no MAM teriam sido retirados do “pequeno museu de pistas desencontradas sobre o Terceiro Mundo”, que compõe a mostra na Galeria Vermelho. Sutilmente demarcadas por linhas pontilhadas no espaço expositivo, essas obras ausentes apontam para o real assunto da individual de Marilá: a inexistência – de realidade ou de autenticidade – daquilo que a economia convencionou chamar de “Terceiro Mundo”.
A proximidade com as letras e a literatura faz de Marilá Dardot uma artista ficcionista. Depois de infinitas variações sobre o tema, como em “Atlas” (2003), “A biblioteca de Babel” (2005), “Avant et après la lettre” (2011), etc., a atual exposição dá segmento à sua investigação sobre escrituras utópicas e realidades intangíveis. A inserção de um verbete imaginário sobre o “Terceiro Mundo” na Enciclopédia Universo (“arquipélago situado a leste-sudeste da Nova Atlântida, composto de oito ilhas de dimensões variáveis e população flutuante”) dá início à viagem.
O pomo da discórdia por Silas Martí, Folha de S. Paulo
O pomo da discórdia
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 26 de agosto de 2011.
Após impasse, governo quer nova Pinacoteca no antigo Detran
Impasses nas negociações têm levado USP e governo de São Paulo a aceitar que o Museu de Arte Contemporânea da universidade, com 9.000 obras num dos acervos mais importantes do país, já não vá mais para o antigo prédio do Detran, no Ibirapuera.
É mais provável agora que o prédio seja destinado a uma segunda sede da Pinacoteca do Estado, que teria ali um espaço para sua coleção de obras contemporâneas. "Temos um projeto da Pinacoteca Contemporânea", disse Andrea Matarazzo, secretário estadual da Cultura, à Folha. "É uma possibilidade."
Depois que a Secretaria de Estado da Cultura gastou R$ 76 milhões na adaptação do espaço para receber o MAC, em obras que se arrastam há três anos, a reitoria da USP admite pensar em desistir da mudança da instituição por "problemas profundos". No caso, o reitor, João Grandino Rodas, briga para que o governo evite a construção do Clube das Arcadas, projeto do centro acadêmico da Faculdade de Direito da USP, no terreno vizinho.
Ele acredita que o museu seria prejudicado pela proximidade com um empreendimento privado que venderia títulos aos sócios e, portanto, tiraria proveito indevido da imagem do MAC-USP.
Em texto divulgado na semana passada no boletim interno da reitoria e depois enviado a Matarazzo, Rodas também levanta questões sobre a legalidade do complexo a ser construído pelo centro acadêmico e dá um ultimato ao governo do Estado.
"Somente quando tal empreendimento for esclarecido, a USP assinará convênio visando à instalação do MAC no Ibirapuera", escreveu. À Folha o reitor não quis falar em prazos para a mudança. "Isso não pode ser feito a qualquer preço", disse Rodas. "Em se mantendo problemas profundos, é melhor que o MAC fique onde está [na Cidade Universitária]."
Segundo Matarazzo, o reitor "errou o destinatário" de sua carta, já que não cabe ao governo resolver as questões levantadas a respeito do futuro Clube das Arcadas, obra orçada em R$ 40 milhões.
"Não estou nem otimista nem pessimista, mas realista", diz Matarazzo. "Pusemos um esforço imenso, financeiro e intelectual, para deixar a obra adequada. O prédio não vai ficar vazio, tem fila de gente querendo o lugar."
Além do problema do clube vizinho, USP e governo não chegaram a um acordo sobre quem pagaria as contas do MAC uma vez que o museu fosse para o Detran.
Enquanto a USP pedia um repasse de R$ 18 milhões por ano, o governo calculou um custo de R$ 10 milhões e discordava de bancar a despesa, acreditando que a USP tem condições de custeá-la.
REDUÇÃO NA LUZ
Ao mesmo tempo em que se agrava a situação do MAC, a Secretaria de Estado da Cultura admitiu redução no tamanho do Teatro da Dança e do complexo projetado na Luz pelos suíços Jacques Herzog e Pierre de Meuron.
Segundo Matarazzo, houve uma redução de 30% da área construída, que foi de 101 mil m2 para 71 mil m2.
Matarazzo reconheceu também que, em relação ao projeto original, foi descartada a construção de uma fábrica de cenários no complexo. Ele nega, no entanto, que a mudança tenha a ver com questões orçamentárias, dizendo que os próprios arquitetos decidiram recuar a construção no lote para ter mais área verde no entorno.
Galeria acusa Maria Bonita Extra de plagiar Ernesto Neto por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Galeria acusa Maria Bonita Extra de plagiar Ernesto Neto
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 25 de agosto de 2011.
Marca que já trabalhou com artistas como Volpi e Athos Bulcão, a Maria Bonita Extra está sendo acusada de plagiar em suas vitrines uma obra de Ernesto Neto.
Em comunicado à imprensa, a galeria Fortes Vilaça, que representa o artista, afirma que a grife "reproduz" suas esculturas em vitrines e diz que essa "prática se chama plágio, fere a lei e deveria ser considerada crime".
Neto diz que o objeto na vitrine das lojas é "muito parecido" com esculturas que expôs há dois anos em São Paulo. "Nem sei se considero um plágio, mas é surpreendente", disse à Folha. "Importa que as pessoas não achem que é minha escultura."
Em resposta à acusação, o diretor da marca, Alexandre Aquino, diz que as vitrines atuais "não têm nenhuma inspiração em Ernesto Neto".
"Ser acusado de plágio seria a maior das injustiças", diz Aquino. "A marca é a que mais trabalha com obras de arte. Às vezes as pessoas partem de áreas diversas e chegam a soluções parecidas."
Lise Marinho, artista que desenhou as vitrines, diz que se inspirou no parque High Line, em Nova York, e num brinquedo de acrílico de montar, popular nos anos 60, citado também por Neto como o ponto de partida para a sua série de esculturas. "Sinto muito pelo ocorrido, nunca soube que Ernesto Neto tinha feito essa obra", escreveu Marinho em carta enviada anteontem à Folha. "Meu processo criativo foi um arbusto contemporâneo, com formas geométricas, que remeteria a flores e cimento."
agosto 24, 2011
Retratos do ofício artístico por Marcos Robério, O Povo
Retratos do ofício artístico
Matéria de Marcos Robério originalmente publicada no caderno Vida e Arte do jornal O Povo em 24 de agosto de 2011.
Abordando os próprios artistas e evidenciando a riqueza da pintura cearense, a mostra Diálogos Fernando França será aberta hoje no Centro Dragão do Mar
Artistas plásticos estão acostumados a pintar sua impressão de mundo. Colocam na tela aquilo que seu olhar apurado apreende ou a mente imagina e, através da reunião de cores e traços, constroem uma significação de possibilidades diversas. Mas qual a imagem que nós temos dos artistas? Será que a figura deles próprios em seu ofício de arte não seria também digna de um belo quadro? Foi reconhecendo em cada pintor um ser cheio de beleza e riqueza de significados que o artista plástico Fernando França materializou a ideia da exposição Diálogos Fernando França, que entra em cartaz hoje (24), no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura.
A mostra reúne 23 grandes telas, cada uma delas com um retrato de um artista plástico cearense, pintados por Fernando França. A ideia surgiu em 2006, quando Fernando estava fazendo uma residência artística na França. O distanciamento de sua terra e de seus amigos provocou no artista a nostalgia seguida de uma visão mais clara de seu núcleo, sua realidade e seu lugar no mundo. “Quando você está fora do seu espaço, passa a ter uma visão mais clara do seu lugar”, explica Fernando. Ele compara essa percepção a uma tela impressionista, que é constituída por inúmeros pequenos pontos e, quando nos afastamos, podemos visualizar melhor a imagem formada pelos pontos.
Rememorando o ambiente artístico do qual já faz parte há mais de 20 anos, Fernando penetrou nos aspectos que constituíram sua própria identidade enquanto pessoa e artista. A intenção, segundo ele, foi fazer um recorte do panorama atual da pintura cearense, valorizando a “diversidade pictórica do Ceará e sua inquestionável qualidade”. Além disso, os quadros foram pensados também como uma forma de diálogo entre esses artistas, sendo que Fernando pintava os retratos e deixava um espaço para que os próprios retratados interferissem na tela, em uma espécie de balão inspirado nas histórias em quadrinhos. “Quis fazer a imagem do artista e do trabalho dele dentro do mesmo quadro, uma metalinguagem, como se fosse um quadro dentro do outro”, comenta Fernando.
Assim, ao longo de cinco anos, foram sendo postos na tela os retratos dos mais célebres pintores cearenses da atualidade, como Zé Tarcísio, Hélio Rôla e Nilo de Brito Firmeza, o Estrigas. Mais do que promover o diálogo artístico, Fernando explica que por trás da exposição está a vontade de fazer uma grande homenagem aos artistas, que muitas vezes não têm seu talento e importância reconhecidos como deveriam. “Por isso somos nós artistas que temos que valorizar mais a nossa cultura, nossa produção”, conclama.
Durante a abertura da exposição, será lançado também um documentário e um livro homônimo, editado a partir de edital da Secretaria de Cultura do Ceará (Secult) e que traz pinturas e descrições sobre o processo que culminou na exposição.
Cartaz da Bienal de SP será criação coletiva por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Cartaz da Bienal de SP será criação coletiva
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 24 de agosto de 2011.
Dupla holandesa Mevis & Van Deursten coordenará designers que farão linguagem visual da 30ã exposição
Autores da identidade da última Bienal de Arquitetura de Veneza, eles veem onda vintage e artesanal no design
Quando desenharam a identidade visual da última Bienal de Arquitetura de Veneza, os designers da dupla holandesa Armand Mevis e Linda van Deursten pensaram em desistir do processo.
"Foi uma montanha-russa", lembra Mevis, sobre as brigas com a curadoria. "Tudo era rejeitado, fizemos até seis propostas distintas e não chegamos a lugar nenhum."
Agora, Mevis e Van Deursten se preparam para um desafio diferente. Vão coordenar um workshop em outubro para construir, de modo coletivo, a identidade visual da 30ª Bienal de São Paulo.
Diferentemente do que foi feito até hoje, o cartaz da próxima Bienal será resultado de um esforço deles, da equipe da mostra e de designers escolhidos entre os que se inscreverem pelo site bienal.org.br até 2 de setembro.
Mevis adianta que mal conhece a tradição de design gráfico no Brasil, embora tenha como influência a obra da arquiteta Lina Bo Bardi. Também conta que na universidade onde estudou, na Holanda, design gráfico não era nem uma disciplina.
"Não temos ideias fixas sobre o trabalho, é bom ter uma relação de amor e ódio com o design", diz Mevis. "Vimos que isso tem mais a ver com a forma como respondemos a questões da sociedade."
Nesse diálogo, Mevis e Van Deursten já ajudaram a construir a linguagem visual do museu Boijmans van Beuningen, em Roterdã, do Stedelijk, em Amsterdã, e a logomarca da grife Viktor & Rolf.
Listam entre suas influências artistas como Ed Ruscha e Richard Prince e estilistas como Martin Margiela e a grife Comme des Garçons. São nomes que têm em comum o fato de terem adotado, em algum momento, processos manuais em composições simples, minimalistas.
"Existe um interesse, agora, por algo do início do século 20, uma atitude artesanal", diz Mevis. "Há uma tendência ao mínimo, ligações com a arte conceitual dos anos 70, até mesmo a simplicidade de usar algo como uma máquina de escrever ou empregar no máximo duas cores."
Mas, se os resultados hoje evocam tempos passados, o pensamento por trás é outro.
"Nos anos 70, estúdios de design tinham pegada modernista, achavam que podiam mudar o mundo", diz Mevis. "Hoje ninguém acha que vai mudar algo e, por isso, tenta se afirmar em estúdios menores, nos cantos, à margem dessa indústria."
Instituto faz digitalização de 7.500 desenhos por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo
Instituto faz digitalização de 7.500 desenhos
Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 24 de agosto de 2011.
A mostra idealizada por Hans-Ulrich Obrist para a casa de vidro de Lina Bo Bardi (1914-1992), obra construída em 1951, pode representar uma nova fase para o local.
Com horários de visitação bastante restritos, pouca gente conhece a casa no Morumbi, onde a arquiteta viveu com o marido, ex-diretor e criador do Masp, Pietro Maria Bardi (1900-1999), até a sua morte.
"Esperamos, com esse projeto, alavancar perspectivas de patrocínio", diz Renato Anelli, do conselho curador do Instituto Lina Bo e P.M. Bardi, que funciona na casa.
Segundo ele, o local vive graças a um fundo criado por Bardi, constituído a partir da venda de um quadro de Goya, em 1995, quando a casa foi doada para a criação do instituto.
Lá está o mobiliário original utilizado pelo casal, grande parte dele desenhado pela própria arquiteta, assim como obras de arte ou até perfumes usados por ela.
No momento, a instituição está digitalizando e catalogando os cerca de 7.500 desenhos da arquiteta. "Com eles, esperamos ganhar dinheiro com a venda de direitos de uso, como acontece com arquitetos norte-americanos", diz Anelli. Já foram obtidos recursos para a catalogação de 1.500 documentos.
Contudo, como se trata de uma casa, que para receber visitação precisa de segurança e funcionários, são agendados apenas dois grupos por semana pelo e-mail visita@institutobardi.com.br. Com a exposição no próximo ano, o local poderá, então, ter visitas diárias e em maior número.
Vidro arte por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo
Vidro arte
Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 24 de agosto de 2011.
Casa da arquiteta Lina Bo Bardi sediará exposição internacional organizada pelo suíço Hans-Ulrich Obrist; 30 artistas criarão obras específicas para o local
Pela primeira vez, a casa de vidro de Lina Bo Bardi -onde a arquiteta viveu por mais de 40 anos, em São Paulo- será sede de uma exposição internacional, com curadoria do suíço Hans-Ulrich Obrist.
Ele é o diretor de programação da galeria Serpentine, em Londres, e foi considerado pela revista britânica "Art Review" a segunda personalidade mais influente das artes plásticas, atrás do galerista americano Larry Gagosian.
"Quando comecei como curador, minha primeira exposição [aos 23 anos] foi numa cozinha. Eu sempre pensei que mostras num ambiente doméstico, com escala íntima, são especiais. E mesmo que eu faça bienais ou exposições em grande escala, nunca parei com mostras desse porte", disse Obrist.
O curador já organizou mostras na casa do arquiteto mexicano Luis Barragán (1902-1988), em 2002, e na casa do escritor espanhol Federico García Lorca, em 2007, ambas com produção da espanhola Isabela Mora, envolvida no novo projeto. Esta será a primeira mostra de Obrist no Brasil. O curador foi convidado para organizar a 30º Bienal de São Paulo, no ano que vem, mas não aceitou a proposta.
30 ARTISTAS
A exposição na casa de vidro terá cerca de 30 artistas, ainda em definição. Todos criarão obras específicas para o local. Anteontem, o arquiteto holandês Rem Koolhaas e o brasileiro Cildo Meireles visitaram a casa com o curador. Também já foram contatados artistas como Douglas Gordon, Ernesto Neto e Dominique Gonzalez-Foerster.
Amanhã, Obrist e Koolhaas apresentam o projeto numa palestra no Sesc Pompeia, projetado por Bardi. Essa não é a primeira vez que o prestigiado Koolhaas vem ao Brasil.
Em 2002, ele chegou a propor a instalação de um elevador de último geração no edifício São Vito, parte do projeto Arte Cidade. Não só a proposta não vingou, apesar de ele ter conseguido a doação do equipamento, como hoje o prédio não existe mais.
Foi naquela época, contudo, que ele entrou em contato com a obra de Lina Bo Bardi. "Eu vi o Masp e fiquei impressionado. Foi apenas há dois anos, devo admitir, na Bienal de Arquitetura de Veneza, que tive uma compreensão mais intensa de seus projetos, passei a ler sobre ela e descobri uma obra única."
Obrist e Koolhaas visitaram o Masp e não se mostraram satisfeitos com o que foi feito do museu. "Ficamos profundamente desapontados em perceber que os dispositivos de exposição criados pela Lina não estão mais lá e foram construídas paredes", contou Koolhaas. Ele também prepara uma exposição no Museu Hermitage, em São Petersburgo, em 2012, sobre organização de exposições e já incluiu projetos de Bardi na mostra.
Oscar Niemeyer costuma monopolizar as atenções quando se fala de arquitetura brasileira. Por que Obrist teria escolhido Bardi? "Converso com artistas todos os dias e muitos me falam de Lina. Existe uma real obsessão em torno dela, o que é interessante. Ela tem tudo a ver com os projetos que venho desenvolvendo", diz.
agosto 23, 2011
Pinceladas cearenses por Fábio Marques, Diário do Nordeste
Pinceladas cearenses
Matéria de Fábio Marques originalmente publicada no Caderno 3 do jornal Diário do Nordeste em 19 de agosto de 2011.
A exposição "Diálogos", de Fernando França, será inaugurada amanhã, às 19h30, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, reunindo retratos de artistas plásticos cearenses e dando uma mostra da atual produção no Estado
Os retratos dos 23 artistas plásticos cearenses impressionam pela grandeza das obras e pelas dimensões das telas em si. Em cada quadro de 1,5 x 2 metros, um artista é retratado por Fernando França e o próprio figurado interfere na tela, imprimindo um pouco de sua arte à composição, em uma inusitada busca metalinguística por identidade.
As obras estarão reunidas na exposição "Diálogos", que será aberta amanhã, às 19h30, no Memorial da Cultura Cearense, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC). Fazem parte do projeto os artistas Estrigas, Nice, Heloísa Juaçaba, Hélio Rôla, Zé Tarcísio, Descartes Gadelha, Ascal, Félix, José Mesquita, Aderson Medeiros, Alano, Roberto Galvão, Carlos Costa, Vando Figueiredo, Eduardo Eloy, Francisco Vidal Júnior, José Guedes, Cláudio César, Totonho Laprovitera, Mano Alencar, Francisco de Almeida, Hemeterio e o próprio Fernando.
Eles foram convidados para a abertura da exposição, que inclui ainda o lançamento de um livro com registros do processo criativo de cada quadro por meio de fotografias e um documentário.
As obras começaram a ser pintadas em 2006, com alguns hiatos entre a produção de um quadro e outro, consequências de uma proposta delicada que inclui o recorte dos 22 artistas e o convencimento de cada um em deixar-se ser tocado pela obra de Fernando. "Conversei com todos os envolvidos. Alguns não aceitaram de início, mas no fim todos participaram", lembra.
A ideia surgiu quando Fernando fazia uma residência artística na França, o que, segundo ele, deu-lhe o distanciamento necessário para perceber a realidade da produção de artes plásticas cearenses. "Percebi a qualidade e a diversidade de artistas que temos e que somos nós quem temos que valorizar essa produção, não esperar que alguém de fora faça. Eles fazem isso com seus artistas", defende.
Reverenciando os artistas da terra, a série é pautada de forma a abranger as diversas gerações de artistas em atividade no Estado e a diversidade de técnicas e estilos utilizadas. "Sempre tem quem fique de fora. A coisa do recorte é isso, não tem como abranger todo mundo. A ideia é fazer uma coisa representativa do momento da pintura hoje aqui", justifica, ainda, em referencia aos nomes que por ventura ficaram de fora.
Quadrinho
Traço marcante na obra de Fernando França, os elementos das histórias em quadrinhos são também aplicados nesta série como uma forma de ampliar as possibilidades da tela e abrindo espaço para a intervenção de cada artista. "Quando elementos dos quadrinhos são inseridos no retrato, dão um certo dinamismo. Aqui, o retratado expõe também a sua imagem e essa imagem constrói o retrato", reflete. Ele defende a importância dos quadrinhos para a arte ainda que seja uma expressão vinculada a cultura de massas. "Ainda leio, coleciono histórias em quadrinhos. Existem grandes artistas no mundo dos quadrinhos que geralmente quem trabalha com pintura desconhece". Fernando avalia que no atual momento as artes plásticas, em especial a pintura, têm voltado com força no mundo todo, sobretudo na linha mais figurativa. "Acho que essa série mostra que existe produção grande e significativa. Pessoas continuam pintando, mesmo com novas técnicas, novas formas de expressões", ilustra. O artista critica ainda uma tendência local a valorizar uma arte dita contemporânea, de formas abstratas, como única representante da produção atual.
"Existe, sobretudo, em espaços públicos a predominância de determinadas técnicas ou trabalho. Essa mostra expõe que há uma diversidade de linguagens. Mostra que, na contemporaneidade, tudo isso está inserido", argumenta. Todos os quadros foram pintados em óleo sobre tela, com um espaço para intervenção dos artistas retratados preparado para receber as técnicas de cada um. Entre elas, foram utilizadas, ainda, tinta acrílica, pastel, nanquim e carvão.
O livro
Cada artista foi convidado ao ateliê do anfitrião onde travavam um primeiro contato com o retrato e ali propunham sua intervenção. "Ele ficaram surpresos, até pela dimensão, porque a gente não é acostumado a se ver deste tamanho. Mas a maioria se reconheceu na tela e percebeu que eu tinha captado a personalidade de cada um", conta, destacando a natureza sublime da vivência que ele teve com cada artista, acompanhando seus processos criativos, aprendendo sobre suas técnicas e conversando com cada um.
Esse momentos foram registrados em fotografias reunidas em um livro que leva o mesmo nome da exposição, destacando um capítulo para cada artista onde é mostrado passo a passo da intervenção e o resultado final. O livro foi editado e impresso pela Secretaria da Cultura do Estado do Ceará, contemplado no Prêmio J. Ribeiro de Publicação de Álbum/Livro de Arte, do I Prêmio Literário para Autor(a) Cearense, em 2010. Ele será vendido na exposição por R$ 80.
Projeto rendeu documentário feito por alunos da Unifor
Além do registro fotográfico publicado em livro e das obras em si, a exposição "Diálogos" traz à luz do público um documentário elaborado por alunos do Grupo de Estudo de Documentário (GEDoc) do curso de Audiovisual e Novas Mídias da Universidade de Fortaleza (Unifor) com depoimento dos 22 artistas convidados por Fernando França, que falam de seus processos criativos, suas percepções e concepções de arte.
Durante três meses, os alunos se debruçaram sobre as obras dos artistas retratados na exposição, gravando depoimentos onde eles comentam a experiência de ter suas obras visitadas pela de Fernando França e o desafio de intervir no resultado final das telas, dialogando e imprimindo seus traços.
O vídeo será lançado em uma primeira exibição durante a abertura da exposição, no dia 24, às 19 horas, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC). De acordo com o coordenador do Grupo de Estudos professor Valdo Siqueira, a ideia é fazer também um recorte panorâmico da pintura cearense, "oferecendo ao espectador o retrato e a palavra gravada de cada criador".
Produção
O documentário foi produzido em 2011, após a finalização dos retratos da mostra. Cada artista comentou um pouco da sensação de se ver retratado e sobre a experiência criativa desenvolvida no ateliê de Fernando, propondo uma reflexão sobre os simbolismos da mostra, no uso da metalinguagem, dimensões das telas e recorte feito sobre a produção artística cearense.
Escultura nas mãos do experimentador por Antonio Gonçalves Filho, Estadão.com.br
Escultura nas mãos do experimentador
Matéria de Antonio Gonçalves Filho originalmente publicada no caderno de cultura do Estadão.com.br. em 23 de agosto de 2011
Ousado, José Resende concilia o grande e o pequeno em duas mostras simultâneas, uma no Rio e outra em SP
O artista José Resende expõe simultaneamente no Museu de Arte Moderna do Rio e, em São Paulo, na Galeria Raquel Arnaud (Rua Fidalga, 125), onde abre hoje, às 19 h, mostra com 24 peças de diferentes dimensões e materiais - desde o bronze, de uso clássico na escultura, até seda vermelha, com a qual fez seis "desenhos" que lembram bordados renascentistas, usando bastidores de fibra. No MAM carioca estão (até 18 de setembro) cinco obras cujas dimensões, segundo Resende, não estabelecem uma relação "acanhada" com a arquitetura do museu carioca. São trabalhos que almejam uma escala pública, acentua o escultor, como o que será instalado na Avenida Beira Mar, no Rio. Na galeria paulistana, Resende, um dos grandes da escultura ao lado de Waltercio Caldas, mostra trabalhos relacionados ao corpo, em que o bastidor "morde" a seda para esboçar um desenho, bexigas cheias d"água se espremem no gesso para criar novas formas e o mercúrio que espelha é também espelhado, num estimulante diálogo com a pintura.
Você é exceção, mas o descaso com que a escultura é tratada, de modo geral, pelos museus não estaria ligado ao fato de a arte contemporânea chamar de escultores gente como Jeff Koons e Takashi Murakami? Ao que atribui essa falta de interesse?
Chamar alguns trabalhos de escultura cria até certa dificuldade, é certo. Na realidade, os trabalhos estão se avolumando numa escala gigantesca, como as obras de Kiefer, que saíram da tela, viraram objetos e depois arquitetura. Hoje, a arquitetura cada dia se individualiza mais. Em vez de se pensar no acervo do museu, pensa-se nele próprio como uma referência artística. O museu é por si um acontecimento, como o de Bilbao, apesar de ter uma série de esculturas do Richard Serra em seu interior. No âmbito brasileiro, vivemos uma realidade muito diferente. Aqui, os museus ainda lidam com o problema do acervo a ser constituído, o que demanda algum esforço para que ele cumpra seu papel.
Você citou dois artistas, Kiefer e Serra, e eu acrescentaria mais um, Anish Kapoor, que trabalha com dimensões monumentais, tendência dominante na arte
contemporânea. Como vê essa direção?
Há uma certa diferença aí. Citamos três dos quais dois são essencialmente pictóricos, Kiefer e Kapoor. Embora a obra de Kapoor "aconteça" no espaço, ela é um acontecimento pictórico, não escultórico.
Mas, então, como considerar uma obra pública como Cloud Gate, a escultura de Kapoor em Chicago com 10 toneladas de aço e 20 metros de altura?
Eu veria a questão do reflexo das pessoas no aço da peça Cloud Gate mais como um fato pictórico, apesar da monumentalidade. Não sei, não vi pessoalmente.
De qualquer modo, ela serve como um exemplo oposto ao da obra que é neutralizada pela presença ostensiva do museu. Nesse caso particular, ela prescinde dele, rompe com suas paredes para conquistar o espaço urbano. O caminho da rua é o da escultura contemporânea?
Não no caso do Ibirapuera. Essa ideia de Jardim das Esculturas é extremamente infeliz. Transpor o museu para fora, como uma arrumação museológica daqueles trabalhos, não é a melhor solução. Essa coisa do site specific é uma ideia muito ligada às obras do Richard Serra e, mais particularmente, às teorias de Rosalind Krauss. Penso o oposto. Não se trata de um lugar específico para um trabalho. É o trabalho que torna específico um lugar.
Você, que tem formação de arquiteto, não sente que os escultores se submetem, voluntariamente, à monumentalidade da arquitetura?
Acho que é o contrário, é a arquitetura que está querendo tomar o espaço da arte, ao se tornar mais design do que gesto arquitetônico. No Brasil, temos um pensamento que, de alguma forma, se organiza muito em torno da escultura - com ressonâncias positivas, acrescentaria. Sergio Camargo, Amilcar de Castro, Franz Weissmann, há todo um pensamento coeso, que se articula, enquanto em outas áreas, como na gravura, Goeldi fica perdido em meio a tantos outros.
O uso de materiais clássicos da escultura, como o bronze, em sua obra, não teria um pouco o propósito de dialogar com a tradição e ir contra a corrente ilusionista de grande parte das obras contemporâneas?
Acho que não. O bronze, no meu caso, disfarça até um certo sorriso quanto à tradição, porque as formas surgem acidentalmente, na ação de colocar uma bexiga cheia de água em contato com outro material que, ao enrijecer, toma outro aspecto. O expressivo está, portanto, na ação, e não no material específico. Na verdade, não é próprio do meu fazer essa relação que passa pelo encantamento artesanal. O bronze ou a seda vermelha são escolhas expressivas que têm mais a ver com a raiz desses trabalhos, que é a de juntar coisas, num processo construtivo que agrega materiais, como em Picasso ou Julio Gonzalez.
Por falar em tradição, Philip Larratt-Smith, curador da exposição de Louise Bourgeois, nega a ligação dela com a escola surrealista. Por que essa resistência em filiar artistas a movimentos?
Há um processo classificatório no ensino acadêmico que se distribui por todo o sistema de arte e que leva qualquer análise a associar a obra com alguma referência. O pragmatismo da academia americana foi muito influente nesse processo. Ela liquida você em três tacadas e isso, evidentemente, não ajuda em nada. Eu não discordo do Larrat-Smith, porque, inclusive, Louise Bourgeois era uma ilha, até mesmo cerceada em determinada época.
Mas ao ver os orifícios nas peças de metal de sua exposição fica difícil não pensar na escultura inglesa de artistas influenciados pela arte arcaica, renascentista e surrealista como Barbara Hepworth ou Henry Moore.
Não tinha em mente essas relações, mas sim enfrentar os acidentes do próprio processo. É a fatura dos objetos que produz aqueles orifícios. No interior de uma caixa de gesso são colocadas bexigas cheias d"água que, pressionadas, produzem formas não manipuladas, puramente acidentais. Há uma mecânica que não é própria da cera perdida e das técnicas clássicas da tradição.
Associações orgânicas por Nina Gazire, Istoé
Associações orgânicas
Matéria de Nina Gazire originalmente publicada no caderno de Artes Visuais da revista Istoé em 19 de agosto de 2011.
Cem anos de arte brasileira na Coleção Itaú em Exposição, na qual as obras são relacionadas mais por conceitos do que por cronologia
Grande parte das coleções de arte de bancos brasileiros teve início na década de 1960, voltando-se para a aquisição de obras produzidas em períodos precedentes, em geral a pintura modernista de 1920 a 1940. Mas à medida que a arte brasileira avançava na produção de novas linguagens, essa jovem produção passou também a integrar o programa de aquisições dessas instituições. Na exposição “1911 – 2011: Arte Brasileira e Depois, na Coleção Itaú”, em cartaz em Belo Horizonte, é possível fazer um percurso por cem anos da arte feita no Brasil. Embora a coleção ostente grandes nomes do Modernismo, como Lasar Segall e Cícero Dias, o diferencial da curadoria de Teixeira Coelho – responsável pela coleção e também curador coordenador do Museu de Arte de São Paulo – está na ausência de um historicismo. Na mostra, que tem projeto cenográfico de Daniela Thomas e Felipe Tassara, a arte contemporânea e a arte modernista estão dispostas lado a lado, a partir de uma proposta que “aproxima as obras umas das outras por meio de uma associação orgânica”, como explica Teixeira Coelho.
O curador trabalhou sobre um recorte de 170 obras, agrupando-as em seis eixos temáticos. Em “Na linha da ideia”, estão reunidas obras que questionam a funcionalidade e a finalidade da arte e se alinham às propostas feitas pela arte conceitual da década de 1960. Um exemplo é a série de cartões produzida por Amélia Toledo, que fazia parte da publicação “On-Off”, de 1973, – criada com o artista Julio Plaza – e dava instruções didáticas para a realização de intervenções artísticas. Também integram este eixo temático a série “Paraíso”, fotografias que reproduzem obras de artes perfuradas, feitas por Albano Afonso entre 2001 e 2005, e “Campo de energia”, objeto feito de metais oxidantes por Antonio Dias em 1991. “Estas obras são feitas em momentos distintos, mas todas possuem um forte caráter conceitual. Mas cada uma trabalha o conceitual de maneira diferente”, enfatiza o curador.
Para além da diversidade da coleção, outro fator importante do projeto está na itinerância. Desde 2006, a coleção do Itaú tem sido mostrada em diferentes exposições, mas sempre em São Paulo. O projeto de itinerância foi retomado no ano passado com a exposição “Brasiliana Itaú”, que viajou pelo Brasil. A presente mostra “1911-2011 Arte Brasileira e Depois, na Coleção Itaú” deixa Belo Horizonte no mês de setembro e chega ao Rio de Janeiro em outubro. Em 2012, a coleção viajará pela primeira vez ao Exterior e será apresentada em Buenos Aires.
Artista do INVISÍVEL por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Artista do INVISÍVEL
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 22 de agosto de 2011.
Carlito Carvalhosa se consagra com mostra no MoMA e tem sua obra analisada em novo livro com textos críticos
Numa sala central da Pinacoteca do Estado, em São Paulo, Carlito Carvalhosa construiu um gigantesco labirinto de tecido branco, quase transparente, e convidou o compositor Philip Glass para tocar piano lá dentro.
De fora, era possível ver o vulto do músico e ouvir o eco dos acordes. Quem andava por dentro dos corredores de pano via silhuetas das esculturas do museu e o enxame de sombras dos passantes.
Um ano depois, o artista paulistano leva, nesta quarta, a mesma estrutura ao átrio do MoMA, em Nova York. Ele também é o artista escalado para inaugurar o anexo do Museu de Arte Contemporânea da USP, no antigo Detran, enchendo o prédio de postes.
De certa forma, esses trabalhos que transformam o espaço agora consagram o autor que despontou nos anos 90. Um livro que acaba de sair pelas editoras Cosac Naify e Charta, da Itália, analisa em retrospecto sua obsessão em moldar o espaço físico em experiências catárticas.
"É a ideia de memória como organizadora do lugar", diz Carvalhosa. "Aquilo que se torna invisível ainda está lá, então tem mais a ver com confronto do que adaptação."
No caso, suas esculturas criam um "enfrentamento" com o espaço ao redor. Mas acabam jogando luz sobre esse mesmo espaço e assumem a posição de escravas incômodas dessa arquitetura.
Ou também servem para exaltar os vazios e despropósitos do ambiente que ocupam. No fim do ano passado, o artista encheu de luzes uma galeria inteira em São Paulo. A sala vibrava branca, sem nada, num zunido elétrico que denunciava sua nudez.
Luis Pérez-Oramas, curador da mostra no MoMA e um dos autores do livro sobre Carvalhosa, enxerga nesse ato de desvestir a arquitetura uma herança dos ideais plásticos de Hélio Oiticica.
"Ele pensa a obra como vestimenta", diz Pérez-Oramas, comparando as peças de Carvalhosa aos "Parangolés", as roupas coloridas do neoconretista. "São trabalhos que só fazem sentido quando o corpo está dentro deles."
ROTA DE EXCESSOS
Mas se Oiticica buscava a volúpia do corpo e do movimento como alicerces visuais, Carvalhosa trilhou uma rota de excessos que provocam um impacto visual distinto, mais estático e sóbrio.
Não é a exuberância das cores, mas massas brancas imensas ou árvores desenraizadas que ditam outra forma de caminhar pelo espaço.
Numa exposição que fez no Museu de Arte Moderna do Rio, Carvalhosa replicou em gesso e pendurou de ponta-cabeça numa sala as formas do Pão de Açúcar, que pode ser visto da janela do museu.
Ele também suspendeu do teto árvores inteiras dentro do Palácio da Aclamação, em Salvador, e na antiga mansão de Eva Klabin, no Rio, como se fundisse dentro e fora, natureza e artifício, em composições visuais acachapantes.
Mas tanto no peso das árvores e dos blocos de gesso quanto na leveza escultural de seus tecidos e luzes, Carvalhosa quer o mesmo efeito, o assombro causado pelo que costuma chamar de suas "pequenas transformações".
Essa coerência no conjunto da obra sublinha sua trajetória na opinião de críticos que escreveram sobre ela.
"Ele encontrou seu espaço num processo contínuo e seguro, na dialética entre mostrar e esconder", diz Pérez-Oramas. "Sua obra tem impacto no campo da experiência e não da contemplação."
Artista japonesa exibe ETs e nave espacial por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Artista japonesa exibe ETs e nave espacial
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 20 de agosto de 2011.
Ex-modelo, Mariko Mori contrasta imagens da moda com alienígenas e budismo pop
Mariko Mori construiu uma nave espacial, mas a rota não podia ser mais intimista. No lugar de galáxias distantes, a artista japonesa armou uma estrutura que projeta desenhos abstratos usando impulsos do cérebro de quem entra na sua cápsula reluzente.
Visitantes ligados a eletrodos dirigem as formas que estampam a coisa agora no saguão do Centro Cultural Banco do Brasil em São Paulo.
Ela mesma parece estar conectada a outra realidade, como se recebesse dados extraterrestres. Fala devagar e pontua frases com acenos da cabeça, que parecem corroborados por um OK do além.
Tudo nela também gravita em torno de uma harmonia calculada. Suas pulseiras e presilhas têm o mesmo traçado orgânico da nave espacial e a anatomia dos alienígenas que expõe no segundo andar.
"É uma metáfora do estrangeiro", diz Mori sobre seus ETs. "Um artista deve sempre enxergar as coisas de fora para ter uma visão objetiva do mundo. Quando você não pertence a algum lugar, acaba pertencendo a todos."
Essa é a tradução de Mori para conceitos profundos da filosofia budista, que pauta suas obras mais recentes.
Depois que largou a carreira de modelo e se firmou como uma espécie de Lolita mangá, em fotografias e performances provocativas, Mori decidiu enveredar pelo que chama de "planos mais profundos da consciência".
Num dos trabalhos antigos, também na mostra, ela encarna uma sereia numa praia artificial do Japão, em contraste total com as obras místicas que vieram depois.
"Meu trabalho mais antigo tinha uma influência direta da minha experiência com o mundo da moda", diz Mori. "Mas agora as obras não têm a ver com questões sociais e culturais nem com aspectos linguísticos, não podem ser traduzidas em palavras."
Sem texto, ela também fez uma roda de nove estruturas brancas em volta de um vazio, representando planetas do sistema solar. "Quero lembrar que não estamos no centro do universo", diz ela. "Somos partes de um todo."
Cildo Meireles opõe rios e gargalhadas por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Cildo Meireles opõe rios e gargalhadas
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 20 de agosto de 2011.
Artista grava um disco em que compila sons de cursos d'água de um lado e uma composição de risos do outro
Duas salas, uma toda metálica e outra escura, servem de ambiente para a execução do som agora no Itaú Cultural
Quando chegou a Formosa, perto de Brasília, Cildo Meireles decidiu inverter todo o curso de seu projeto. Era para usar o som dos rios, numa gravação que ia de suas nascentes quase inaudíveis até a explosão da pororoca.
Mas lá o artista viu que o fio d'água que vira depois o São Francisco foi aterrado na construção de um bingo.
"É a morte que acaba dentro do poço", conta Meireles à Folha. Sua composição então começa no barulho ensurdecedor da pororoca e acaba em pingos no poço, que ele chama de "estertores do rio".
Na mostra que abre agora no Itaú Cultural, Meireles dá corpo a uma ideia de mais de 30 anos. Ele escreveu num caderno o palíndromo "rio oir", mistura de curso d'água e o verbo "rir" conjugado na primeira pessoa com a palavra espanhola para "ouvir".
Num LP, ele decidiu gravar de um lado o som dos maiores rios brasileiros, Amazonas, São Francisco e Paraná. Do outro, orquestrou uma composição de gargalhadas.
"Acabou virando um contraponto dessa tragédia que é a morte dos rios", diz Meireles. "Fica entre essa coisa solene, grande dos rios e a distensão que os risos têm."
Também contrapõe a placidez de um lugar como Águas Emendadas, estação ecológica nos arredores da capital federal onde nascem as maiores bacias hidrográficas do país, e a fúria dos rios desaguando no Atlântico.
Mas Meireles quer ilustrar esse contraste só com o som. Se dependesse dele, não haveria toda a estrutura montada no espaço como acessório de sua aventura sonora.
São duas salas encalacradas, uma abraçando a outra em contraste absoluto. Um lado do disco toca num ambiente metálico, como se evocasse o espelho d'água do rio, enquanto o outro toca numa escuridão que forra o riso.
"Todos querem sempre privilegiar a vista, a civilização ocidental é muito imagética", diz ele. "Mas minha intenção era ter esse arquivo sonoro."
No fim, Meireles esconde a paisagem para escutar seu estrondo no mar ou a morte calada no subsolo de um bingo.
agosto 19, 2011
Vila ampliada por Ana Cecília Soares, Diário do Nordeste
Vila ampliada
Matéria de Ana Cecília Soares originalmente publicada no Caderno 3 do jornal Diário do Nordeste em 19 de agosto de 2011.
Novos editais dão continuidade ao programa de formação da Vila das Artes. Somando-se aos cursos de audiovisual e dança, o espaço oferece agora duas novas modalidades: teatro e artes visuais
Em meio a um cenário quase sempre carente, quando se trata de investimento e estímulo à criação e a formação no campo das artes, Fortaleza ganhou recentemente um importante reforço com a inauguração de dois novos espaços na Vila das Artes (equipamento da Prefeitura Municipal): um centro de artes visuais, em parceria com o Centro Cultural Banco do Nordeste, e uma escola pública de teatro.
As novas modalidades endossam o conjunto de atividades desenvolvidas pela Vila das Artes, por meio das já estabelecidas escolas de audiovisual, dança e do núcleo de produção digital, que funcionam desde 2006, data de fundação do lugar.
Para o pesquisador Enrico Rocha, um dos coordenadores do Centro de Artes Visuais ao lado do artista e curador Solon Ribeiro, essa é a oportunidade de reunir experiências e de discutir aspectos importantes aos segmentos artísticos. Ampliando o conhecimento e proporcionando aos participantes outras leituras e visões críticas. "Desde o início da Vila das Artes estava previsto um núcleo para as artes visuais", conta Rocha. "A gente vem batalhando nesse projeto há muito tempo e, finalmente, conseguimos realizá-lo. Este núcleo constitui-se como um programa integrado de sensibilização, formação e pesquisa, orientado para intervir criticamente no circuito de arte contemporânea da cidade. Além de buscar incluir Fortaleza no circuito nacional", diz.
Solon Ribeiro observa que a Vila das Artes se torna uma experiência única de formação ao abrigar diferentes linguagens artísticas. Oportunizando, no caso do Centro de Artes Visuais, cursos não só para o público especializado, mas a todos que se interesse pela arte de uma maneira geral. "A Vila tem experiência no quesito formação e o Centro Cultural Banco do Nordeste, na formação de plateia. A nossa expectativa é a melhor possível, pois temos uma boa estrutura e excelentes profissionais que irão ministrar cada um dos cursos. Tenho certeza que daqui sairão bons artistas e bons pesquisadores".
Possibilidades e parceria
A diretora da Vila das Artes, Sílvia Bessa explica que a formação de teatro não era inicialmente planejada para acontecer no espaço. Ela surge a partir do movimento de pessoas interessadas em artes cênicas na cidade que abriram um diálogo com a Secretaria de Cultura de Fortaleza (Secultfor). "Como política pública não deve apenas seguir protocolo, mas estar aberta a esses rearranjos, decidimos começar aqui a formação, articulada a outras ações para a área na Secretaria. Foi o tempo de discutir, formular e começar. Já o Centro de Artes Visuais estava previsto desde o início, para começar na Casa do Barão de Camocim, em relação com um espaço expositivo. Antecipamos o início da formação", diz.
Quanto a parceria entre a Vila das Artes e o Centro Cultural Banco do Nordeste, em relação ao núcleo de artes visuais, a diretora destaca que não houve repasse financeiro entre as duas instituições. Esforços foram somados para apresentar um programa mais consistente e abrangente na área.
"A parceria foi um desejo mútuo das instituições, tudo foi muito claro e discutido desde o início. Essa foi uma maneira que nós encontramos de tornar a formação mais sistemática. O Programa de Pesquisa em Artes Visuais e o Laboratório de Linguagens Visuais não são as únicas ações que teremos. Vamos ter ainda sete cursos de apreciação ao longo de um ano para o público em geral interessado em aproximar-se criticamente da produção artística contemporânea. E encontros com artistas que receberá outros de referência nacional para uma apresentação da sua trajetória. Acontecerão cinco encontros ao longo de um ano", ressalta Jacqueline Medeiros, coordenadora do Núcleo de Artes Visuais do Centro Cultural Banco do Nordeste.
Editais
O Centro de Artes Visuais realizará as seguintes ações: Laboratório de Linguagens Visuais, programa composto por 12 cursos livres modulares de caráter teórico-prático, que têm por finalidade proporcionar ao participante a compreensão de seu processo criativo e situar criticamente seu trabalho diante do circuito de arte contemporânea. E o Programa de Pesquisa em Artes Visuais, cujo intuito é atender artistas e interessados em desenvolver projetos de crítica e curadoria que buscam aprofundar suas investigações. Serão selecionados 12 projetos de pesquisa, sendo 8 pesquisas de linguagem e 4 pesquisas de crítica ou curadoria. As inscrições para cada uma das ações podem ser realizadas até 9 de setembro, através do site da Vila das Artes (abaixo).
Já a escola pública de teatro inicia suas atividades com o curso "Teatro: Conexões Contemporâneas", elaborado a partir de encontros públicos que discutiram o panorama e os caminhos da formação teatral na cidade. A pretensão é estimular a reflexão e o exercício de teatro de grupo, além de provocar o intercâmbio de saberes entre pesquisadores e artistas locais e de outras cidades do Brasil e exterior.
O trabalho desenvolvido pela Vila das Artes, através de seu núcleo de audiovisual, tem ajudado a revelar inúmeros talentos e a divulgar o nome do Ceará em diversos festivais nacionais, como a Mostra de Cinema de Tiradentes, uma das mais conceituadas do Brasil. Resta a torcida de que o espaço continue funcionando e sendo um importante centro formador de artistas, mesmo depois do fim da atual gestão.
agosto 18, 2011
O mínimo como máximo por Nina Gazire, Istoé
O mínimo como máximo
Matéria de Nina Gazire originalmente publicada no caderno de Artes Visuais da revista Istoé em 12 de agosto de 2011.
Courtney Smith e Ivan Navarro - The construction of volumetric inter-relationships/ Baró Galeria, SP/ até 10/9
O grupo de artistas De Stijl surgiu no início do século XX, na Holanda, mas influencia até hoje a arte e o design contemporâneos. De origem holandesa, o termo pode ser traduzido em português para “do estilo”. E apesar de ter o abstracionismo em comum com outras propostas estéticas vanguardistas, na produção do De Stijl a abstração ressaltava a pureza das formas. A este apreço pelo minimalismo de composição geométrica deu-se o nome de neoplasticismo e, entre seus representantes, está o célebre holandês Piet Mondrian e o belga Georges Vantongerloo, cuja escultura “The Construction of Volume Relations” inspirou a mostra “The Construction of Volumetric Inter-relationships”, em cartaz na Baró Galeria, em São Paulo.
A ideia de usar a obra de Vantongerloo como inspiração partiu do casal de artistas Courtney Smith, francesa radicada no Brasil, e Ivan Navarro, chileno. Tanto Courtney quanto Navarro possuem uma produção artística que se apropria de materiais domésticos, como móveis, luminárias e restos de assoalhos. Nesta mostra os objetos e instalações criadas pelos artistas encontram eco nas esculturas de características modulares e geométricas do artista belga. “A ideia foi fazer uma reinterpretação do formalismo e da geometria de George Vantonge rloo pelo viés da arte conceitual contemporânea”, afirma Courtney Smith. Exemplo é o painel em grandes dimensões feito com restos de pisos de taco (foto) de diferentes cores, apresentando uma composição que também se assemelha às sobreposições geométricas de Mondrian. Se os neoplasticistas prezavam pelo minimalismo das formas, Courtney e Navarro nos lembram que também é possível alcançar o máximo de simplicidade usando os restos e os excessos do cotidiano.
Praias de nudismo por Paula Alzugaray, Istoé
Praias de nudismo
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada no caderno de Artes Visuais da revista Istoé em 12 de agosto de 2011.
Controvertido e explícito, o projeto internacional Destricted promove a interação entre arte, cinema e pornografia
Em inglês, destrict quer dizer “ilimitar a restrição”, ou “desconstruir fronteiras”. O termo dá nome a um projeto concebido pelo curador inglês Neville Wakefield que, em 2007, convidou oito artistas para mostrar em vídeos e filmes curtos suas visões da pornografia. Neste caso, destricted refere-se então à exploração – de maneira incansável, ilimitada – das relações entre arte, cinema e sexo. O resultado foi um longa-metragem exibido nos festivais de Sundance, Cannes, Locarno e Amsterdã. “Destricted.br”, versão brasileira do projeto, foi produzida por Marcia Fortes e Alessandra D’Aloia, proprietárias da galeria Fortes Vilaça. Oito diretores – sete brasileiros, um português e um espanhol naturalizado – foram convidados. Todos comparecem com vídeos, mas também com fotografias, pinturas e desenhos.
O resultado é diversificado, mas irregular. São inevitáveis as comparações. Adriana Varejão apresenta um trabalho frágil e tímido, diante da radicalidade – não apenas de carga sexual, mas, especialmente, de cinematografia – dos trabalhos de Miguel Rio Branco, Janaína Tschäpe e Dora Longo Bahia. Com uso excessivo de efeitos – transparências, fusões, câmeras lentas – o vídeo “Psinoe” denuncia a pouca familiaridade que Adriana tem com a imagem em movimento e certo deslumbramento em relação aos recursos dessa mídia. A fotografia “A Sereia e o Cinema”, still do vídeo, é mais eficiente.
Já “Petit a”, de Dora Longo Bahia, é um dos trabalhos mais intensos e provocadores da mostra. A artista, que tem o vídeo como linguagem de expressão há pelos menos 15 anos, realiza aqui uma orquestração bastante madura de todas as etapas de realização cinematográfica. Dora manufatura desde os elementos de cena – como o taco de baseball com ponta fálica para a cena do sexo na cozinha – até a trilha sonora, de autoria da banda “Blá Blá Blá”, na qual é baixista. Nesse sentido, seus procedimentos chegam a lembrar os do americano Matthew Barney, celebrizado pela série “Cremaster Cycle”, e um dos artistas integrantes do projeto americano.
A mostra brasileira ostenta diferentes graus de envolvimento com o tema. Há desde o sexo explícito de “Day and Night Shots”, de Marcos Chaves, até o lirismo de “Bichos Pretos Coloridos”, do cineasta Karim Aïnouz, que evoca a técnica bucólica da fotografia de nudismo ao ar livre, ou “Cooking”, de Tunga, que faz escatalogia em alta definição, o que é bastante desconcertante. O vídeo de Tunga é o único que integrou o projeto original, lançado na Inglaterra.
Família Nemirovsky fica isolada na fundação por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Família Nemirovsky fica isolada na fundação
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 18 de agosto de 2011.
Marcelo Araújo deve assumir a presidência
Com a renúncia do conselheiro João Carlos Camargo anteontem, a família Nemirovsky está isolada no conselho da fundação responsável por uma das maiores coleções de arte moderna do país.
É um quadro que se agrava desde o afastamento da antiga gestão, em março, e a nomeação pela família em junho de José Dirceu como patrono do acervo, desencadeando uma onda de renúncias.
Para substituir as baixas, devem ser oficializados no conselho na semana que vem Marcelo Araújo, diretor da Pinacoteca do Estado, onde está abrigada a fundação, e o empresário Toninho Abdalla.
Mas restam dúvidas sobre quem vai presidir a fundação, cargo provisoriamente ocupado pela neta dos colecionadores José e Paulina, Maria Carolina Nemirovsky de Moraes Leme.
Enquanto o MPE tenta emplacar Araújo, a família cogita nomear Paulo Kauffmann, único conselheiro não membro da família que continua na entidade.
Na semana passada, a promotoria questionou em ofício por que a fundação deixou de responder a pedidos de empréstimo de obras, o que levou a uma troca de acusações entre a família e o ex-presidente da fundação Arnoldo Wald Filho.
agosto 17, 2011
Artista plástico brasileiro acusa trio argentino de plagiar obra por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Artista plástico brasileiro acusa trio argentino de plagiar obra
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 17 de agosto de 2011.
Jaime Prades retirou denúncia após acordo
Quando viu no Flickr imagens da montagem da exposição "De Dentro e De Fora", Jaime Prades levou um susto.
Três artistas argentinos, Tec, Defi e Chu, estavam construindo no Masp, para a mostra que começa hoje, uma estrutura quase idêntica a uma obra que o brasileiro já havia mostrado em São Paulo e que estampou na capa de um livro sobre seu trabalho.
Agravou a situação o fato de o artista ter dado antes uma cópia do livro lançado em 2009 a Baixo Ribeiro, curador da mostra no Masp. Prades então criou um evento no Facebook denunciando o plágio da obra, postando imagens dos trabalhos lado a lado e incitando uma extensa discussão on-line.
"Fiquei indignado pelo fato de a curadoria ser aqui de São Paulo", disse Prades à Folha. "Foi como se tivesse acontecido uma usurpação."
Todo o barulho nas redes sociais acabou chegando ao ouvido de Ribeiro, que propôs um encontro entre os artistas argentinos e Prades para tentar resolver a questão.
"Foi um engano", resume o curador. "Tiraram fotografias desse processo ainda no começo, o Jaime viu e o identificou muito com o trabalho dele. Toda essa polêmica foi feita em cima de uma foto na primeira semana da obra."
Tec, um dos artistas argentinos que assina a peça do Masp, chamou de "coincidência total" a semelhança entre as obras. "Foi uma coisa que surgiu do nosso trabalho", diz ele. "Trabalhamos sempre com madeira da rua."
Depois de receber Ribeiro em seu ateliê e marcar encontro com Tec, Defi e Chu, Prades tirou do ar a denúncia de plágio e recuou no discurso.
"Não sei se é plágio ou não, é uma discussão que implica um degradê de interpretações", diz o brasileiro. "Não posso me achar dono de pegar madeira na rua e juntar material. Tem uma cultura de atropelo nessa arte de rua."
Mas ajudou na reconciliação um acordo selado de última hora. Semanas antes do início da mostra, o curador concordou em incluir o ateliê de Prades num roteiro de visitas por São Paulo indicado no site da exposição do Masp.
É menos do que o artista queria, já que chegou a dizer que o "ideal seria o museu pôr um trabalho meu ali".
Não será o caso. Quem quiser comparar terá de visitar a obra dos argentinos no Masp e o ateliê de Prades, cheio de madeira, em Perdizes, na zona oeste da cidade.
"Não quero criar uma guerra com artistas, com ninguém. Dei uma zerada", diz Prades. "Estamos trabalhando para um final feliz."
Masp recebe obras de artistas em diálogo com a arquitetura por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Masp recebe obras de artistas em diálogo com a arquitetura
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 17 de agosto de 2011.
Num domingo, sozinho no subsolo do Masp, Remed fez os primeiros traços do enorme mural que mostra agora no museu. É uma espécie de narrativa, colorida e geométrica, de um homem que morre e ressuscita na metrópole.
"Tento fazer algo em que as pessoas se reconheçam", diz o francês. "Esse é o melhor estúdio de São Paulo."
Ele é um dos oito artistas agora juntos numa exposição que transformou o andar debaixo do Masp em ateliê aberto nas últimas semanas. Todos estrangeiros, eles trazem uma visão de fora para dentro de São Paulo, criando trabalhos também informados pela arquitetura da cidade e o espaço monumental do museu, um dos desenhos icônicos de Lina Bo Bardi.
No caso de Point, uma enorme escultura soletra a alcunha do muralista tcheco usando as escadas vermelhas do subsolo do Masp como parte das letras no espaço.
"Eles colocam o trabalho na cidade e também levam uma visão aprofundada daqui para fora", diz Baixo Ribeiro, curador da mostra. "A ideia é valorizar essa visão do lugar com outros olhos."
Falando em olhos, JR, o artista francês que fotografou e ampliou os olhos de mulheres importantes no morro da Providência, no Rio, mostra esses mesmos olhares arregalados agora no Masp.
Ele também estampa a reprodução de uma imagem do acervo do museu nos tapumes das obras no prédio ao lado, agora em restauro. JR também espera autorização e verba para uma obra urbana mais ambiciosa, que cobriria a face do túnel da Nove de Julho, que passa embaixo do museu da Paulista.
Depois de desenhar mulheres que chamou de Iemanjá em painéis na exposição, a americana Swoon deve fazer, no mês que vem, intervenções no vão livre do museu.
Enquanto isso, estão espalhados pela cidade os bichos pixelados do francês Invader, também com obras suas na mostra central.
Labirinto no Olimpo por Bruno Moreschi, Bravo!
Labirinto no Olimpo
Matéria de Bruno Moreschi originalmente publicada no caderno Artes Visuais da revista Bravo! em 12 de agosto de 2011.
Como Carlito Carvalhosa, que em 30 anos de carreira nunca havia feito uma individual de peso no exterior, conseguiu chegar ao concorrido átrio do Museu de Arte Moderna de Nova York.
O paulistano Carlito Carvalhosa nunca fez uma exibição individual de peso no exterior. E a estreia, no dia 24 deste mês, vai ocorrer justamente em um dos endereços mais nobres das artes visuais do mundo: o átrio do Museu de Arte Moderna de Nova York, o MoMA. Para ter uma ideia da aura que embrulha o espaço, de março a maio do ano passado, 561 mil pessoas entraram no museu para assistir à artista sérvia Marina Abramovic, que, sentada em uma cadeira no centro da sala, convidava os visitantes a fazer o mesmo e encará-la. Em julho de 2010, a japonesa Yoko Ono instalou um microfone no endereço e pediu para os espectadores gritarem diante do aparelho. A suíça Pipilotti Rist projetou seus vídeos fantasiosos nas quatro paredes do átrio entre novembro de 2008 e fevereiro de 2009. Todas elas, estrelas de primeira grandeza no circuito internacional, de uma forma ou de outra sempre estiveram na lista dos curadores do museu para, em algum momento, ocuparem a prestigiosa entrada da instituição. Com Carlito, que é ainda o primeiro brasileiro a se apresentar no espaço, a história foi diferente.
Até setembro do ano passado, o curador de arte latino-americana do MoMA, o venezuelano Luis Pérez-Oramas, nem cogitava escalar o artista para uma exposição, embora já conhecesse algumas de suas obras: “Carlito é um artista sério. Seu trabalho tem uma estrutura física muito suave, mas, ao mesmo tempo, é denso em significados. Até o ano passado, porém, eu não tinha tido a experiência de estar em uma de suas grandes instalações”. A experiência aconteceu na Pinacoteca do Estado de São Paulo, onde Carlito montou a impressionante A Soma dos Dias. Pensada especialmente para um espaço em forma de octógono no museu paulistano, a obra pode ser descrita como um labirinto feito por camadas de tecido TNT (um tipo de tecido muito barato que não passa pelo processo têxtil) branco de 14 m de altura, que faziam com que os visitantes literalmente se perdessem dentro de uma imensidão alva. O título da peça era uma clara referência aos gravadores e alto-falantes espalhados pelo caminho: os primeiros captavam o som ambiente do museu e os alto-falantes reproduziam os barulhos registrados no dia anterior.
Pérez-Oramas, que visitava o Brasil com outros profissionais do MoMA por ocasião da 29ª Bienal de São Paulo, lembra bem do exato momento em que entrou no labirinto branco de Carlito: “Ficamos completamente impressionados. E decidimos praticamente naquela hora que o trabalho deveria ser exibido no museu”, diz. O espanto entre os curadores é ilustrativo de como uma obra possui o poder de fascinar e fazer um artista alçar voos maiores. Diferentemente de outros brasileiros, que conseguiram um reconhecimento internacional depois de várias exposições no exterior – caso do carioca Cildo Meireles, que antes de uma individual na Tate de Londres integrou mostras coletivas de prestígio, como a Documenta de Kassel, na Alemanha –, Carlito nunca teve uma carreira consolidada fora do Brasil. Mesmo assim, a qualidade de A Soma dos Dias – e uma dose de sorte para que os superpoderosos do MoMA estivessem no Brasil justamente em seu período de exibição – bastou para que ele fosse alçado a um dos olimpos das artes visuais atualmente. “Jamais esperava que uma conversa com os curadores era na verdade um convite para expor no MoMA”, diz Carlito.
Até o dia 14 de novembro, o átrio do museu norte-americano ficará tomado por uma versão ampliada da instalação vista na Pinacoteca de São Paulo. Em Nova York, o labirinto, que será chamado de Sum of Days e montado em uma área de 300 m2, atingirá 19 m de altura. Assim como ocorreu na capital paulista, quatro microfones também irão gravar o som do local e 60 alto-falantes presos ao tecido reproduzirão os sons captados no dia anterior. Performances do compositor norte-americano Philip Glass estão agendadas para ocorrer no centro do labirinto. Amigo do artista há pelo menos uma década, Glass, que também se apresentou na instalação em São Paulo, tocará piano entre as camadas de tecido: “Os dois possuem muita coisa em comum. Ambos trabalham com o tempo e a participação do público para produzir o som”, diz Pérez-Oramas.
Pão de Açúcar em gesso
Mas Carlito não está agora no MoMA somente por causa de uma obra de impacto e um pouco de sorte. Formado na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, o artista iniciou a carreira na Casa 7, um ateliê em São Paulo que na década de 1980 abrigava outros nomes hoje festejados, como Rodrigo Andrade, Fábio Miguez, Paulo Monteiro e Nuno Ramos. Nos últimos anos, ele vem cada vez mais chamando a atenção com a sua capacidade de transformar radicalmente os locais onde cria suas instalações. Em 2006, o artista suspendeu um imenso pedaço de gesso no interior do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Muitos compararam o objeto ao Pão de Açúcar, cartão-postal da paisagem carioca. A escolha do gesso não foi por acaso. Como faz agora ao usar um tecido barato. Carlito frequentemente opta por materiais tidos como de pouco valor e os confronta com o mundo das artes.
Neste ano, ele fez um conjunto de intervenções para a Fundação Eva Klabin, no Rio de Janeiro. Diante de uma casa conhecida por abrigar quase 2 mil peças, muitas delas objetos clássicos, Carlito hesitou por um instante: como preencher um espaço já tão carregado de significado? Em cada cômodo da habitação, ele acrescentou um estranhamento diferente. Em uma das salas, por exemplo, todos os móveis acabaram erguidos sobre copos de vidro, suspensos à altura de 20 cm do chão. Ao reparar que não havia nenhuma planta no interior do endereço, colocou árvores no banheiro. O curador Fernando Cocchiarale analisa: “Carlito está sempre aberto para trabalhar com novos materiais. Sua obra é movida sempre pelo desafio de ocupar de forma surpreendente um local específico”. O curador Marcio Doctors, que convidou o artista para realizar a mostra na Fundação Eva Klabin, complementa: “Ele possui uma incrível capacidade de intervir no espaço. Seu interesse principal é trabalhar com um olhar pouco habitual e fazer a gente ver os objetos de outra maneira”. Assim é com os móveis que parecem flutuar, com o gesso e vai ser no MoMA, com o átrio tomado por um labirinto feito de camadas de tecido branco. Os visitantes do museu certamente verão sua entrada de um jeito diferente depois de Sum of Days. E é bem provável que a carreira de Carlito Carvalhosa também se divida em antes e depois dessa peça.
agosto 16, 2011
Diálogos com as imagens, Diário do Nordeste
Diálogos com as imagens
Matéria originalmente publicada no Caderno 3 do jornal Diário do Nordeste em 16 de agosto de 2011.
A exposição "Correspondências visuais", com trabalhos dos fotógrafos Marcelo Brodsky, Tiago Santana e Cássio Vasconcellos será inaugurada hoje no CCBNB Fortaleza
A partir da ideia de que o fotógrafo é um ser solitário, cujo exercício de captação da imagem se faz através de um processo pessoal, no qual intervêm anos de vivência, sensibilidade, intuição e olhares percorridos; o fotógrafo argentino Marcelo Brodsky pensou na possibilidade de reiterar essa solidão com base na partilha de experiências com amigos fotógrafos de diversas partes do mundo, por meio de trocas de imagens produzidas por cada um deles. Brodsky acredita que o diálogo visual entre dois ou mais criadores rompe o centro que está no "Eu" do autor e suscita algo diferente.
"O que determina cada decisão não são apenas os ensaios, os projetos pessoais, a elaboração de um discurso coerente com as obras anteriores e as próximas na construção de uma identidade visual própria. A correspondência não é um solilóquio, e sim se sustenta com um interlocutor, um outro que também olha, que também escolhe, que também fotografa, desenha, pensa", explica.
Projeto
Assim, nasceu o projeto "Correspondências Visuais", onde ele passou a se comunicar visualmente com outros fotógrafos. Ao enviar uma foto para um amigo, Marcelo recebia outra imagem de volta. E, a troca ia continuando.
O resultado desses diálogos pode ser conferido na exposição homônima ao projeto "Correspondências Visuais", que será inaugurada hoje, às 18 horas, no Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBNB)- Fortaleza. A coletiva é constituída pelas trocas de Marcelo Brodsky com Tiago Santana (CE) e Cássio Vasconcellos (SP). Serão apresentadas ao público, um total de 108 fotos, sendo 36 de cada diálogo.
"O Marcelo tem realizado esse projeto com fotógrafos do mundo inteiro. É um trabalho muito interessante que nos deixa bem livre para atuar. Eu não preciso responder a um amigo com uma imagem de mesma temática, cor ou textura. Por exemplo, o Cássio Vasconcellos me enviava fotos urbanas, enquanto lhe respondia com imagens do sertão. Os trabalhos se misturam e nos tornamos um só", ressalta Tiago Santana.
A exposição "Correspondências Visuais" concede à fotografia um novo espaço para a reflexão artística. Ela não apenas permite um diálogo entre artistas, mas introduz uma nova dimensão da fotografia como linguagem, criando um conjunto autônomo de sentido. Um sentido resultante da provocação visual de dois ou mais pontos de vista que, em sua união, formam uma nova obra.
Imagem e comunicação
"Não a palavra, mas as imagens como forma de comunicação. Sua polissemia admite distintos cursos de ação possíveis diante de cada encruzilhada. O diálogo visual não tem dicionário. Não remete a um diálogo anterior, nem se baseia em uma tradição sólida e estruturada, literária. O diálogo visual muda, sacode-se com rapidez, tem um tempo próprio, e raízes na cultura visual daquele que o protagoniza".
O fotógrafo argentino também acrescenta: "Se o autor se libera de seu ´Eu´ criativo como principal referência e ensaia uma construção visual a duas mãos, um modo de ver compartilhado, a fotografia e a criação de imagens se aproximam da interpretação musical. O resultado é um dueto de imagens sem partitura, improvisado. Uma composição visual que convida a uma interpretação aberta. Uma poética que sugere imagens a um terceiro, àquele que vê, para que se relacione com elas através do seu próprio olhar".
Pai e filha divergem sobre a presidência por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Pai e filha divergem sobre a presidência
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 16 de agosto de 2011.
Maria Carolina quer nomear Paulo Kauffmann para seu cargo, mas seu pai quer João Carlos Camargo no posto
Atual presidente sonha em comprar Van Gogh e Monet para coleção e compara a antiga gestão à ditadura líbia
Desde que assumiu o cargo de presidente da Fundação Nemirovsky, Maria Carolina é cobrada pelo Ministério Público paulista para nomear outro presidente e aceitar Marcelo Araújo, diretor da Pinacoteca do Estado, no conselho da entidade.
Uma reunião que pode resolver o impasse está marcada para depois de amanhã.
Para Maria Carolina, o conselheiro Paulo Kauffmann é "a pessoa de mais confiança" para assumir o posto de presidente. Mas seu pai, o empresário Paulo de Moraes Leme, disse à Folha que a filha "vai indicar João Carlos Camargo", outro conselheiro.
Com a exigência de que Marcelo Araújo passe a fazer parte do conselho da fundação, o MP tenta contrabalançar o poder da família e evitar que eles levem as obras do acervo para outro endereço.
Este plano foi aventado por José Dirceu, eleito o patrono da coleção, o que gerou desconforto entre conselheiros. Coincidência ou não, dois deles renunciaram após a escolha. "É amigo do meu pai. Foi uma homenagem", diz ela.
Depois que a promotoria apontou irregularidades na posição de Dirceu, a família voltou atrás no discurso, dizendo que ele não tem funções administrativas.
"A Pinacoteca faz parte de uma história do Brasil que não pode ser esquecida, mas não acho justo que mais de 200 quadros estejam na reserva técnica", critica ela. "Eu passo por aqui e sinto que essas paredes estão vazias."
Essa é uma sensação recente. Até duas semanas atrás, Maria Carolina não sabia o caminho até a Estação Pinacoteca, na Luz, onde fica a coleção. Depois que seu segurança mostrou a rota, ela diz se sentir à vontade ali.
"Demorou muito tempo para a gente assumir, mas eu sabia que a justiça seria feita", diz Maria Carolina, tomando água de coco. "A gente achava que o [Jorge] Wilheim estava igual ao [Muammar] Gaddafi, um ditador."
Wilheim preferiu não comentar a comparação.
Os Nemirovsky querem divulgar o acervo, um dos maiores de arte moderna no país.
Maria Carolina sonha em comprar quadros de Monet e Van Gogh para a coleção dos avós. Numa folha, ela escreveu à mão outra meta de sua gestão: acabar com as brigas na fundação.
A princesinha das artes por Silas Martí, Folha de S. Paulo
A princesinha das artes
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 16 de agosto de 2011.
Neta dos Nemirovsky, Maria Carolina comanda coleção de R$ 322 mi entre aulas de ginástica e psicologia na PUC
Ela se acomoda como um bibelô, vestida de rosa e sapatinhos beges, numa poltrona em frente a "Antropofagia", de Tarsila do Amaral. O quadro de 1928, agora na Estação Pinacoteca, enfeitou sua infância na sala da avó.
Maria Carolina Nemirovsky de Moraes Leme, neta de José e Paulina Nemirovsky, 21, agora se divide entre a malhação, o curso de psicologia na PUC-SP e a presidência da Fundação Nemirovsky.
Depois que a família se mobilizou para remover o arquiteto Jorge Wilheim do cargo, e após a renúncia de seu substituto, Arnoldo Wald Filho, Maria Carolina ascendeu ao posto há duas semanas.
Está encarregada de gerenciar um acervo avaliado em R$ 322 milhões, com obras de Picasso, Volpi, Tarsila, Guignard e dos contemporâneos Hélio Oiticica e Lygia Clark.
"É uma coisa grande. Eu me sinto preparada para ser presidente", diz ela à Folha. "Se a presidente Dilma, uma mulher, conseguiu..." Um ofício do Ministério Público Estadual, no entanto, exige que ela deixe o cargo até a semana que vem, por desequilibrar o conselho em favor da família com o voto duplo de presidente.
Ainda assim, ela acha que "justiça foi feita", comparando a permanência no poder de Wilheim à do ditador líbio Muammar Gaddafi. Procurado, o arquiteto não quis falar.
Mesmo saindo do cargo, ela vai indicar um substituto, seguindo o desejo dos pais.
agosto 15, 2011
"Ex Isto" tropeça na sintaxe do escritor Paulo Leminski por Manuel da Costa Pinto, Folha de S. Paulo
"Ex Isto" tropeça na sintaxe do escritor Paulo Leminski
Matéria de Manuel da Costa Pinto originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 13 de agosto de 2011.
Filme se baseia em "Catatau", armadilha para apuro visual de Cao Guimarães
Baseado em "Catatau", de Paulo Leminski, "Ex Isto" é um filme que tropeça na sintaxe do escritor paranaense, sem conseguir recriá-la. Escrito por nove anos, com um fluxo verbal cujas invenções linguísticas o colocam ao lado de "Galáxias", de Haroldo de Campos (1929-2003), como grande realização em prosa da poética concreta, "Catatau" é uma armadilha para um diretor com o apuro visual de Cao Guimarães.
Uma breve sinopse do livro mostra seu apelo cinematográfico: o filósofo francês René Descartes embarca na expedição do holandês Maurício de Nassau ao Brasil e, aqui, enlouquece com a exuberância tropical e com os efeitos de uma erva que turva seu projeto de fundar um racionalismo desconfiado da percepção sensível.
Partindo da fantasia biográfica (ele de fato viveu na Holanda e se engajou no Exército de Nassau, mas foi para a Alemanha), Leminski introduz duas personagens.
Um delas, histórica, é o polonês Artyczewski, que na ficção teria apresentado Descartes à erva maldita. A outra, imaginária, é Occam, uma espécie de sombra oculta, cujo nome remete a Guilherme de Ockham (pensador inglês do século 14). Ocorre que tais personagens só existem como entidades abstratas na tela mental de Cartesius (forma latina de Descartes): ele espera Artyczewski como um messias que o liberte do caos, no qual Occam entra como monstro textual que governa seu solilóquio desordenado, saturado de neologismos.
Cao Guimarães escolhe com sensibilidade os trechos de "Catatau" ditos pelo ator João Miguel, na pele de um Descartes vagando entorpecido por selvas tropicais e ruas atuais do Recife e de Brasília (onde Leminski projeta a erosão solar, e intemporal, do racionalismo cartesiano).
Mas há nítida dissonância entre a escrita espasmódica do livro e os planos-sequências de "Ex Isto", cuja plasticidade, límpida até numa cena de mercado popular, é um refúgio para a incapacidade de recriar os fantasmas da prosa mutante de Leminski.
Mostra destaca obra abstrata de Ianelli por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Mostra destaca obra abstrata de Ianelli
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 13 agosto de 2011.
Retrospectiva exibe evolução da obra do artista morto há dois anos, da figuração aos experimentos abstratos
Cerca de 40 telas, entre elas 13 de seu espólio, fazem parte de exposição no Museu de Arte Brasileira da Faap
Na rota da abstração, Arcangelo Ianelli despiu o mundo de seus contornos. Encontrou na vibração silenciosa da cor uma forma de exacerbar a harmonia e afogar qualquer impulso mais rebelde.
Dois anos depois de sua morte, aos 86, uma retrospectiva no Museu de Arte Brasileira da Faap revisita agora a trajetória discreta, não menor, do artista conhecido como um mestre do abstrato.
Mas suas telas não prescindem da forma física, da verossimilhança. Operam num plano reduzido, da essência. Na mostra, desenhos em carvão e depois paisagens convencionais, obras dos anos 40, acabam sendo diluídas na passagem dos 50 para os 60 em quase abstrações.
Um geometrismo latente começa a subverter a forma reconhecível. "Barcos a Vela", de 1957, é uma sucessão de manchas mais cruas, como se fosse vaga lembrança do assunto real do quadro.
Ianelli radicalizou esse registro no mesmo ano, pintando uma marinha em que céu e mar se fundem num fiapo de paisagem -não a praia, mas o mormaço, de cinzas e azuis profundos ou celestes.
Nas primeiras abstrações, ele parece mensurar o peso da cor, trabalha o acúmulo da tinta como se buscasse uma vibração escondida no objeto do quadro, uma luminosidade concreta capaz de expressar mais que linhas e formas mais bem definidas.
Mais tarde, no começo dos anos 60, Ianelli chamou um de seus quadros de "Transição", uma espécie de adeus ao peso opressor e abertura de uma fase de composições mais diáfanas, de cor pura.
Talvez sejam essas as abstrações reais, sem qualquer lastro de realidade. Nos experimentos com guache e depois pastel, nos anos 70, sua obra perde de vez essa âncora, abrindo espaço para as serigrafias da última década.
E, nesses últimos anos de vida, Ianelli se fixou como colorista disciplinado, alheio aos desarranjos do mundo.
Mostra contempla diversidade e verve visceral de Bourgeois por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo
Mostra contempla diversidade e verve visceral de Bourgeois
Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada no caderno Ilustrada do joranal Folha de S. Paulo em 15 de agosto de 2011.
"Louise Bourgeois: o retorno do desejo proibido", em cartaz no Instituto Tomie Othake, em São Paulo, é mostra rara no cenário brasileiro, onde grandes nomes estrangeiros costumam comparecer com poucas obras ou trabalhos não tão representativos de suas carreiras.
Em geral, tais exposições costumam frustrar quem busca um panorama adequado que exemplifique por que um artista é tão valorizado. Não é este o caso. Com 112 obras de Bourgeois (1911- 2010), a mostra reverbera toda a sua verve visceral, a começar da primeira sala, onde estão ao menos três trabalhos centrais de sua produção: "Quarto Vermelho" (1994),"Spider" (1997) e "A Destruição do Pai" (1974).
Neles, concentra-se a linguagem poética da artista, que transformou em arte seus grandes traumas.
Melhor ainda é que a mostra respeita a obra da artista, mesmo baseando-se num forte conceito curatorial, que coloca a psicanálise como impulso fundamental para a criação de Bourgeois -tese de seu organizador, o canadense Philip Larratt-Smith.
Tais ideias estão defendidas no ótimo catálogo da exposição, com escritos da artista e muitos textos teóricos.
Assim, a exposição coloca em primeiro plano as obras, dispostas de forma elegante e sem grandes encenações.
Com uma seleção impressionante, que explora toda a diversidade de materiais utilizados por Bourgeois, seja vidro, aço ou delicados tecidos, a exposição, organizada em parceria com a Fundação Proa, de Buenos Aires, faz justiça a um nome central da arte contemporânea.
agosto 11, 2011
Delírio tropical por Ana Cecília Soares, Diário do Nordeste
Delírio tropical
Matéria de Ana Cecília Soares originalmente publicada no Caderno 3 do jornal Diário do Nordeste em 11 de agosto de 2011.
Segundo filme da série Iconoclássicos, produzida pelo Itaú Cultural, estreia amanhã. Dirigido pelo artista visual Cao Guimarães, "Ex Isto" é inspirado em "Catatau", romance experimental do poeta Paulo Leminski
Em "Catatau" (1975), romance emblemático de Paulo Leminski, o experimentalismo da linguagem é a forma adotada pelas ideias, que se entrecruzam e perpassam cada página devorada pelo leitor. Sem meias palavras, com todos os pingos nos "is", o poeta curitibano não vacila em dizer, ao longo da narrativa, que "esta história não é estável, não é bem assim. É um pouco diferente, talvez seja outra coisa: quem sabe uma outra natureza trabalhou nisso, com manhas e ares outras, e na continuação, seguramente nada tem que ver com o que já vimos, e no fundo é a mesma coisa, mas não confundam". Na contramão do pensamento cartesiano e da narrativa linear, "Catatau" é uma das obras mais consistentes e elogiadas de Paulo Leminski. Nela, o autor se deixa levar por uma hipótese histórica: "E se o filósofo René Descartes tivesse vindo ao Brasil com a corte do holandês Maurício de Nassau?".
Num entrelaçamento entre a desconstrução da narrativa tradicional e a implosão da filosofia cartesiana, o livro apresenta-nos um Descartes confuso, com uma luneta na mão e um cachimbo cheio de ervas alucinógenas na outra. O filósofo pensa ter ficado louco no país tropical e o texto mostra sua alucinação. Descartes espera por Artaxerxes, seu amigo. Ele acredita que este, ao chegar ao Brasil, explicará toda a confusão que volteia sua mente. A "viagem" do francês se corporifica num experimentalismo verbal que segue a tradição de grandes obras como "Finnegans Wake", de James Joyce, e "Galáxias," de Haroldo de Campos.
Filme
Inspirado no romance de Leminski, o filme "Ex Isto" é um exercício puro da liberdade de criar. Na visão do diretor, Cao Guimarães, Descartes chega em terras brasileiras para deparar-se com a natureza atemporal do rio Araguari, no Amapá, e com as ruas e feiras coloridas do Recife contemporâneo. O filósofo avança neste mundo completamente estranho a si, onde seu pensamento racionalista não consegue explicar as experiências vividas por ele. Cao constrói uma narrativa tão experimental quanto a criada por Leminski. Algo que inquieta o espectador.
Cansativo no início, o filme melhorando do meio para o fim. Traz cenas hilárias do ator João Miguel na pele de um Descartes atordoado pelas ruas do Centro de Recife. Mais uma vez o ator dá provas de seu talento e de sua capacidade de se metamorfosear em qualquer que seja a personagem que encarne.
"Conhecia muito pouco da obra de Leminski. Então, li sua biografia e alguns de seus poemas, até chegar em ´Catatau´. Leminski desconstrói o tempo todo, mostra que o método cartesiano se derrete nos trópicos. Acredito que o filme é bastante fiel ao livro. ´Ex Isto´ foi uma experiência incrível. O que mais me marcou foi a fluidez e a liberdade de criar, parecido com o que eu fazia no teatro. Além disso, foi muito interessante esse encontro com o meu amigo Cao, um artista híbrido e muito talentoso", elogia o ator.
Processo
Antes de começar as gravações, Cao Guimarães reuniu a equipe de seis pessoas para um mergulho na obra completa do poeta curitibano, fazendo do trabalho de concepção do filme um processo colaborativo. Para ele, ainda que todo o texto presente no filme seja retirado do livro, exceto alguns trechos saídos de "O Discurso do Método", de Descartes, muitas cenas surgiram diante da liberdade criativa que permite trabalhar com um romance inovador marcado pela experimentação na linguagem.
O diretor utilizou de informações sobre a vida do filósofo e de cenários da atualidade, fazendo do filme uma narrativa fantástica em que as estruturas de tempo se dissolvem junto ao delírio tropical do pensador francês.
O filme é uma homenagem a Paulo Leminski e ao romance, uma de suas obras favoritas, à qual ele dedicou por dez anos de trabalho. "Ele foi, sem dúvida, uma das grandes referências da minha geração e, hoje em dia, é muito difícil encontrar edições de muitos de seus livros. Espero que o filme ajude de alguma forma a trazer novas edições da obra dele para o público", explica o cineasta.
"Ex Isto" tem estreia prevista para o dia 12 de agosto. Ficará em cartaz durante um mês no Espaço Unibanco Dragão do Mar e todas as sessões serão gratuitas. O filme é o segundo da série Iconoclássicos (o primeiro foi "Daquele instante em diante", sobre a vida e a obra do músico Itamar Assumpção), produzida pelo Itaú Cultural.
Os próximos filmes da série são: "Assim é, se lhe parece" (em setembro), em que o artista plástico Nelson Leirner tem sua poética filmada por Carla Gallo. Em novembro é a vez de uma homenagem a José Celso Martinez. Em dezembro, ao cineasta Rogério Sganzerla, por Joel Pizzini.
FIQUE POR DENTRO
O polaco
Filho de pai polonês e mãe brasileira, Paulo Leminski Filho (1944 - 1989) nasceu em Curitiba e passou toda a sua vida na cidade. Notabilizou-se como poeta, mas chegou a escrever contos, novelas, ensaios e um único romance, o experimental "Catatau". Em 1964, publica seus primeiros poemas na revista "Invenção", editada pelos concretistas Augusto de Campos, Décio Pignatari e Haroldo de Campos. A poesia do grupo foi uma referência para toda a vida, assim como a tradição poética japonesa do haicai, com seus versos breves e precisos. Uma das principais atividades exercidas por Leminski foi a de tradutor, vertendo para o português obras de James Joyce, Samuel Beckett, Yukio Mishima, dentre outros. Realizou também parcerias musicais com Caetano Veloso e Itamar Assumpção. Em 1968, casa-se com a poeta Alice Ruiz, com quem viveu durante 20 anos, e teve três filhos: Miguel Ângelo (morto aos dez anos de idade), Áurea e Estrela. Boêmio inveterado, o poeta faleceu em 7 de junho de 1989, vítima de cirrose hepática.
Circo voador vira 'playground' de arte e tecnologia com festival de cultura digital por Carlos Albuquerque, oglobo.globo.com
Circo voador vira 'playground' de arte e tecnologia com festival de cultura digital
Matéria de Carlos Albuquerque originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Globo em 11 de agosto de 2011.
RIO - Em vez de janelas, um mouse pode abrir portas, levando ao 2º Festival de Cultura Digital, que acontece de quinta, às 20h, até domingo, no Circo Voador. Promovendo a reciclagem eletrônica, através da troca de uma peça de computador por um ingresso, o evento pretende fazer um link entre arte e tecnologia, com shows, instalações interativas, festas e oficinas.
De apresentações de pioneiros da nova era musical, como o grupo pernambucano Mundo Livre S.A. (sexta), a obras recém-criadas, como a "Fecundation", do artista plástico Julio Lucio (na qual a imagem virtual de um espermatozoide vai acompanhar os movimentos de quem entrar numa cabine montada no local); passando por uma maquete interativa de um projeto sobre a ocupação da Praça Tiradentes ("Central Futuros", do grupo Studio X Rio, formado, entre outros, pelo arquiteto e designer Raul Correa-Smith ) e oficinas de animação com softwares livres, o evento tenta abraçar um pouco do que aconteceu nesse acelerado universo, desde 2009, quando aconteceu a sua primeira edição, no mesmo local.
- No mundo digital, dois anos são quase duas décadas. E, claro, muita coisa mudou entre a primeira edição do festival e a atual - reconhece Gaby Morenah, idealizadora do projeto. - Em 2009, nosso foco foi a discussão sobre downloads gratuitos, pirataria e os novos rumos da produção digital, com muitos debates sobre isso. Agora, como esses temas já parecem absorvidos, deixamos os debates de lado e nos voltamos para os resultados, mostrando a face artística de pessoas que têm a tecnologia como principal ferramenta de trabalho.
De caixas de suco a Lobão
No festival, esse conceito é vasto e generoso o suficiente para abrigar bandas de última geração, como a Nova Lapa Jazz (cujas apresentações, às quartas, nas ruas do Centro, foram amplificadas pelas redes sociais, num boca a boca virtual) e instalações como a "Tela Móbile", do artista visual Bernardo Marques, que enche caixas de suco de projeções de vídeos.
- São 65 caixas de suco reaproveitadas, formando 13 fileiras, em cima das quais são projetados loops de vídeos caseiros meus, também reciclados - explica Marques, que vai atuar também como VJ, sexta, na festa Tonga da Mironga, ao lado dos DJs Negralha e Babão. - As fileiras de baixo têm sensores eletrônicos, que modificam os vídeos quando as caixas são apertadas. É uma forma de simbolizar como se dá a reciclagem cultural em tempos de Creative Commons.
Para a criadora do evento - que vai promover também o lançamento do curta "Não há estilo sem fracasso", sobre Lobão, que também faz show ali, sábado - , o festival tem a mesma natureza que o local que o abriga.
- A interatividade, o toque e o contato são as marcas dessa edição - garante Gaby. - Se fosse em um museu, talvez as pessoas ficassem mais respeitosas. Mas o Circo é um lugar onde subir ao palco é quase uma tradição do público. Num ambiente assim, fica mais fácil desmistificar a tecnologia e aproximá-la de todos.
Bienal corta pela metade mostra que comemora seus 60 anos por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo
Bienal corta pela metade mostra que comemora seus 60 anos
Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 11 de agosto de 2011.
Fundação diz que redução aconteceu "para não cansar público"
Foi reduzida pela metade a mostra "Em Nome dos Artistas", que celebra 60 anos de criação da Bienal de São Paulo com o acervo do museu norueguês Astrup Fearnley.
Em março passado, o curador do museu e da mostra, Gunnar Kvaran, disse à Folha que iria apresentar 111 artistas no pavilhão da Bienal, com quase 30 mil m2. Agora, devem ser 51 artistas, prevendo o uso de 15 mil m2.
O evento iria englobar outras mostras organizadas pelo museu em colaboração com a galeria Serpentine, de Londres, como "Uncertain States of America", sobre jovens artistas norte-americanos, e "China Power Station", sobre chineses emergentes.
A última foi descartada, e a primeira, reduzida. Contudo permanecem os grandes nomes previstos, como Jeff Koons e Damien Hirst. No site do Ministério da Cultura, a exposição prevê a captação de R$ 14 milhões (R$ 8 milhões para a mostra e R$ 6 milhões para o educativo). Até ontem, só R$ 4 milhões estavam garantidos.
"Sempre enfrentamos problemas com captação, mas a redução não ocorre por questões financeiras, pois temos mais apoios já garantidos. A redução ocorreu porque a mostra seria muito grande no formato original e as pessoas se cansam de exposições assim", diz Heitor Martins, presidente da Fundação Bienal.
A maior dificuldade é a captação para o educativo da mostra: apenas R$ 100 mil foram conseguidos. "Essa é uma área difícil para obter recursos, precisamos conquistar um apoio com caráter permanente", defende Martins.
Para ajudar na mostra, no entanto, está programado um jantar beneficente, no dia 20 de setembro, nos moldes do evento organizado logo que Martins assumiu o cargo, em 2009, com a instituição afundada em dívidas de cerca de R$ 3 milhões.
Agora, cada convite custa R$ 5.000, mas esse valor pode ser abatido por quem comprá-lo através de lei de incentivo à cultura desde que o contribuinte deva ao menos cerca R$ 100 mil ao Imposto de Renda -a alíquota para pessoa física é de 6%.
"É parte de um programa que vamos lançar no jantar, chamado Mais Bienal, para estimular que pessoas físicas também façam doações à Bienal, porque nem todo mundo sabe que isso é possível", afirma o presidente.
Martins também não considera que a dificuldade em obter recursos seja porque o MinC tenha fechado a torneira: "Eles estão proibidos por lei de repassar recursos. O que precisamos é envolver a sociedade, sejam empresas, pessoas ou o poder municipal, estadual e federal".
Novas políticas para a arte contemporânea por Nina Gazire, Istoé
Matéria de Nina Gazire originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 5 de agosto de 2011.
Desde que foi criado em 2009, o Instituto Brasileiro de Museus vem fazendo uma série de ações voltadas para a manutenção e modernização dos museus
Desde que foi criado em 2009, o Instituto Brasileiro de Museus vem fazendo uma série de ações voltadas para a manutenção e modernização dos museus. Entre as necessidades levantadas durante esse período pelo órgão ligado ao Ministério da Cultura está a formação de uma coleção nacional de arte contemporânea. Em agosto, o Ibram pretende selecionar por meio de um edital um grupo de dez artistas que terão verba de R$ 1,4 milhão para realizar uma obra cada um, destinadas aos museus de arte fora do eixo Rio–São Paulo. “A escolha dos artistas será dada por meio de uma comissão de curadores. Queremos formar uma coleção continuada de obras contemporâneas para que o País possa se relacionar com esse tipo de produção”, diz o presidente do Ibram, José Nascimento Júnior. Além desse edital, que deve ser anual, este mês o governo divulga um edital para o Prêmio Ibram RioArt Fair, que acontecerá em setembro, na primeira edição da feira de arte do Rio de Janeiro. As obras de arte premiadas serão depois expostas no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio.
agosto 10, 2011
Teatros de vertigem por Paula Alzugaray, Istoé
Teatros de vertigem
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 29 de julho de 2011.
A literatura de Beckett, a infância e seus mitos são revisitados em trabalhos de 30 artistas, sob a curadoria de Josué Mattos
Na entrada da exposição na galeria Casa Triângulo, em São Paulo, uma caixinha de acrílico contém pequeníssimos acetatos coloridos recortados com a palavra “Time”. O objeto, intitulado “250TIMES”, de autoria de Maurício Ianês, funciona como uma charada, uma espécie de buraco da fechadura, por meio do qual vislumbra-se o grande conceito da mostra: a passagem do tempo – ou sua suspensão. Também na porta de entrada, um objeto lúdico, redondo, com um fone de ouvido acoplado, convida o visitante. Trata-se da obra “Cantos”, de Renata Padovan, e pode se tornar a trilha sonora da exposição, caso o visitante opte por passear entre as obras, portando o objeto. “Como o tempo passa quando a gente se diverte”, título extraído de “Esperando Godot”, de Samuel Beckett, tem curadoria de Josué Mattos e reúne trabalhos de 30 artistas.
O som influencia definitivamente o olhar, e com ele a exposição tem acentuado o seu caráter dramático e narrativo. Embalados por cantigas de roda em diversas línguas, revisitamos o imaginário e as iconografias da infância. Com toda a sua luz e sombra. As máscaras, fantasias e os títeres povoam as esculturas de Flávio Cerqueira e as pinturas de Camila Macedo, Rodrigo Bivar e Eduardo Berliner. O circo é evocado por Vania Mignone e por Thereza Salazar. O balanço está desenhado no cavalinho de Sandra Cinto, pintado na tela de Flávia Metzler e associado à vertigem no vídeo de Milena Travassos.
Já as formigas que escapam do desenho de Ana Teixeira – feito diretamente sobre a parede – liberam uma narrativa oculta. O “Autorretrato com formigas” é, como a fotografia “Uma festa”, de Rochelle Costi, o fim da ingenuidade. O corpo depois do salto. O jogador depois da partida. A evidência de que as escolhas de Josué Mattos não fazem apologia aos parques de diversões de nossa infância se consolida em “Fim de partida”, fotografias em que Tatiana Blass homenageia Beckett.
Fotografia como arte, Diário do Nordeste
Fotografia como arte
Matéria originalmente publicada no Caderno 3 do Diário do Nordeste em 10 de agosto de 2011.
No mês em que se comemora o Dia Mundial da Fotografia, o Fórum da Fotografia - Ceará mobiliza fotógrafos e espaços culturais da cidade com exposições, seminários, workshop e debates, lançando olhares sobre a fotografia em sua expressão mais sublime: a arte
No caminho em busca do fortalecimento da fotografia enquanto linguagem artística, organizada, atuante e bem articulada, fotógrafos cearenses aproveitam a efeméride do Dia Internacional da Fotografia, comemorado dia 19 de agosto, para atrair olhares à produção do Estado. A iniciativa, encabeçada pelo recém criado Fórum da Fotografia - Ceará, inclui exposições de mais de 50 artistas, seminários, debates e workshop, em uma grade extensa de atividades batizada de Encontros de Agosto.
Curadores de importantes centros, como Argentina e São Paulo, foram ainda convidados a prestigiar as mostras, em um primeiro esforço para divulgar e incluir a obra de artistas cearenses em exposições Brasil afora. Com o tema "Fotografia Contemporânea - linguagem e pensamento", o evento promove, a partir de hoje, exposições coletivas e individuais, ocupando diversas galerias e centros culturais da cidade, e, entre os dias 16 e 20 deste mês, um seminário no Centro Cultural Banco do Nordeste.
"Como existe certa carência, dificuldade, defasagem, na inserção de produção de fotógrafos cearenses em exposições nacionais e internacionais, faremos uma discussão sobre esse viés da fotografia, atraindo também olhares sobre nossos fotógrafos que atuam nessa linguagem. É uma ação de difusão e formação", resume Patrícia Veloso, coordenadora geral do Encontros de Agosto 2011 e participante do Fórum. Ela explica que a ação foi pensada e discutida durante as reuniões do Fórum, que começou a ser articulado em abril deste ano.
Inaugurando a programação, partir de hoje será aberta a exposição Encontro de Olhares, na Galeria Multiarte, reunindo trabalhos de quatro fotógrafos: uma homenagem a Chico Albuquerque, que terá exposto seu consagrado ensaio "Mucuripe", de 1952, documentando o cotidiano dos jangadeiros em Fortaleza; também o fotógrafo José Albano, que expõe sua série "Europa", com registros tomados entre os anos de 1972 e 1973 em 12 países do continente; e as mostras "Die Reise", de Beatriz Pontes e "Rendez-Vous", de Bia Fiúza.
Amanhã, serão abertas, ainda, as exposições "Do Instante à Imaginação", de Gentil Barreiram, na Galeria Casa D´Arte, e "Na Avenida", de Chico Gomes, na Galeria Antônio Bandeira. O Sobrado Doutor José Lourenço recebe o maior volume de fotografias, em uma grande mostra coletiva que será inaugurada dia 19, às 20 horas. A curadora e galerista Isabel Amado, de São Paulo, foi responsável pela seleção das obras.
Mobilização
O Fórum de Fotografia lançou, no início do mês, uma convocatória aos fotógrafos atuantes no Estado convidando a inscreverem seus trabalhos para participar das mostras. Além de terem suas obras inclusas em uma das mostras do evento, a convocatória mobilizou os profissionais por se colocar como oportunidade de expor as obras aos curadores convidados. Mais de 50 trabalhos foram selecionados, de autoria de fotógrafos jovens e experientes.
"Temos um mercado fotográfico muito restrito (no Ceará). O fotojornalismo é muito pequeno, limitado a assessorias de imprensa e três jornais principais. (No Encontros de Agosto) vão trazer galeristas importantes como o Miguel Chikaoka, Isabel Amado, Eder Chiodetto. Quando se traz esses caras, você fomenta outro mercado, ligado a arte", destaca o fotógrafo e professor do curso de fotografia da Casa Amarela, Igor Grazianno. Ele é um dos participantes da mostra coletiva, que também conta com alguns de seus alunos entre os selecionados.
Igor conta que incentivou seus alunos e mais fotógrafos participantes de um grupo online com mais de 300 integrantes a inscreverem seus trabalhos. "Durante a reunião, colocamos como palavra de ordem participar dos concursos e mostras", diz Igor, ressaltando o esforço do Fórum em mobilizar o maior número de profissionais. "Quando você vai a exposições em outros estados, não tem fotógrafos cearenses em destaque. Fui recentemente a uma mostra de fotografia no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), do Rio de Janeiro. Tinha fotos do Rodrigo Braga, que é pernambucano, mas de nenhum cearense", ilustra Grazianno.
Seminário
Investindo ainda na formação dos fotógrafos, os curadores e outros fotógrafos convidados ministram palestras, seminário e workshop, discutindo temas voltado para a fotografia e a arte. O seminário é realizado em parceria com o programa Agosto da Arte do Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBNB). A programação do evento será aberta dia 16, com o lançamento das mostras "Buena Vista" e "Correspondências Visuais", de Marcelo Brodsky (Argentina); Tiago Santana (CE) e Cássio Vasconcellos (SP), que estarão presentes para uma conversa com o público.
Entre os temas discutidos nos seminários e palestra ministrados de 17 a 19 de agosto, destaca-se "O retrato como fonte para um inventário de fotógrafos" (Bertrand Lira - PB), "Fotografia Contemporânea (O retrato no Ceará)" (Silas de Paula - CE), "EGOSHOT: território do rosto ágrafo" (Flavya Mutran - PA), "Fotografia - galerias e colecionismo" (Eduardo Brandão - SP e Max Perlingeiro - SP) e "Internacionalização da Fotografia Brasileira" (Rubens Fernandes - SP).
Encerrando a programação, no dia 20, a curadora e galerista Isabel Amado ministra, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC), o workshop "Fotografia e o mercado da arte". Ela traz orientações aos fotógrafos de como atuar no circuito autoral, montar um portfólio para apresentar suas imagens e publicar suas fotografias valorizando-a enquanto obra de arte. As vagas já estão esgotadas.
Encontros de agosto
Seminários e Palestras - De 16 a 20 de agosto no Centro Cultural Banco do Nordeste. Workshop Fotografia e o mercado da arte, com Isabel Amado (SP), dia 20, no Auditório do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura em Fortaleza/CE. Inscrições para seminários e palestras: abertas no CCBNB (cultura@bnb.gov.br); inscrições para workshop com Isabel Amado encerradas. Contato: (85) 3261.0525. As inscrições e a participação nas atividades são gratuitas.
Exposição encontro de olhares - Die Reise (Beatriz Pontes), Rendez-Vous (Bia Fiúza), Europa (José Albano) e Mucuripe 1952 (homenagem a Chico Albuquerque) - Abertura, hoje, às 20h, na Galeria Multiarte (Rua Barbosa de Freitas, 1727 - Aldeota). Visitação de segunda a sexta-feira, das 9h às 18h, aos sábados, de 14h às 20h. Até 10 de setembro. A exposição integra a programação do Encontros de Agosto 2011.
Contato: (85) 3261.7724 e www.galeriamultiarte.com.br
agosto 9, 2011
Cidade tridimensional por Ana Cecília Soares, Diário do Nordeste
Cidade tridimensional
Matéria de Ana Cecília Soares originalmente publicada no Caderno 3 do jornal Diário do Nordeste em 9 de agosto de 2011.
O artista visual Erickson Britto inaugura, amanhã, às 19 horas, a exposição "A arte e a cidade", na sala Multiuso, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura
Ainda menino em João Pessoa, sua cidade natal, o artista visual Erickson Britto teve uma experiência fantástica que selaria o interesse futuro pelo mundo das artes. A partir de uma vista aérea, ao subir no edifício mais alto da cidade, o menino emocionou-se com o traçado das ruas, placas sinalizadoras, casas, praças e blocos compactos de telhados distribuídos pelo corpo da capital paraibana. Sim, era o início do amor pela geometrização dos objetos. Amor pelas formas escultóricas.
Passados 18 anos dessa experiência de infância, Erickson Britto potencializou o caminho de sua poética, ativando um mecanismo de observação da tridimensionalidade e a percepção da volumetria dos equipamentos urbanos das cidades por onde tem viajado.
Joias e esculturas
O artista começou sua carreira desenhando e produzindo joias que mais tarde o levariam às esculturas. "Foi uma longa trajetória como designer de joias. Morei em Recife por 16 anos, lá trabalhei e conheci outros artistas, foi um período muito importante de aprendizagem. Também tive contato com a herança portuguesa na joalheria, trabalhei com o ouro e a prata. Aprendi a manipular o metal e a exercitar a liberdade criativa. Depois percebi que era preciso atuar num corpo maior, então, veio o desejo pelo campo escultórico", explica.
Com 30 anos de carreira, atuando como escultor e designer, Erickson construiu uma linguagem própria, muito próxima da tradição construtivista brasileira, dialogando com a tridimensionalidade da estrutura moldada pela percepção que ele tem do espaço.
Exposição
Numa espécie de retrospectiva desses anos dedicados a arte, ele abrirá, a partir de amanhã, a exposição "A arte e a cidade", na sala Multiuso do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, na Praia de Iracema.
Com curadoria de Vera Barros, a individual reúne cerca de 30 trabalhos, entre esculturas, maquetes de obras públicas, objetos, joias e obras de diversos períodos do artista que se encontram e se complementam.
A mostra estimula o visitante a explorar várias possibilidades de observação de cada trabalho, com base numa aproximação dos princípios da Gestalt (teoria psicológica relacionada ao estudo da percepção), a partir do deslocamento do ponto de observação, explorando os ângulos como partes, em contradição à soma do todo.
Segundo o artista, esse deslocamento alegórico do olhar permite o contato com uma nova realidade visual, trazendo um diálogo que muitas vezes encontra respaldo conceitual quando levado para as questões pessoais do observador.
Influências
Britto também busca trazer para sua pesquisa artística questões referentes ao equilíbrio, transparência e opacidade, tão presentes no percurso de artistas como Franz Weismann, cujos espaços vazios se tornaram concretos. Além disso, ele considera elementos, como as linhas inflexíveis e maleáveis ao olhar, presentes nas obras monumentais do escultor Richard Serra, que sugerem um novo ponto de equilíbrio.
Serra, inclusive, trabalha com peças que pesam toneladas e possuem autossustentação. Em suas obras não há pregos, amarras ao chão, fundações ou outros meios para manter as esculturas estáveis. Apenas a gravidade aplicada à massa do aço somados a cálculos precisos fazem tais estruturas manterem-se em pé, muitas vezes, sendo curvadas e inclinadas em ângulos surpreendentes.
Outros aspectos que servem de referências ao trabalho de Erickson Britto é a economia de formas e a simplicidade do minimalismo proposto por Donald Judd; e o corte, recorte e dobras nas questões trazidas pela poética de Amilcar de Castro, onde o corte não é adereço, mas estrutural. "Eu sempre tenho a sensação, no momento da criação, de que todo projeto executado é sempre um protótipo de algo maior, para um espaço mais democrático, para o público que circula nas cidades", conclui o artista visual.
Fique por dentro
Perfil do artista
Natural de João Pessoa (PB), o escultor Erickson Britto, por meio de sua observação da cidade, iniciou uma pesquisa como designer de joias, ampliando, posteriormente, sua percepção e expressão artística para o universo escultórico. É nesse momento que nascem as primeiras esculturas sob forma de pequenos troféus em prata, aço e outros materiais, que evoluem em suas formas e dimensões e invadem espaços, ambientes e cidades. O artista foi aprovado, recentemente, no Mestrado em Poéticas Visuais na Universidade Federal da Baia (Ufba), onde busca aprofundar sua poética visual. "Todas essas inquietações me levam à necessidade de uma compreensão mais profunda sobre a minha própria produção", destaca Erickson Britto.
MAIS INFORMAÇÕES
Abertura da exposição "A arte e a cidade", de Erickson Britto, amanhã, às 19h, no Centro Dragão do Mar. Contato: (85) 3488. 8596.
MAC versus USP por Silas Martí, Folha de S. Paulo
MAC versus USP
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 9 de agosto de 2011.
Governo e universidade divergem sobre contas do museu
Mais do que o atraso nas obras, uma disputa entre a Secretaria de Estado da Cultura e a Universidade de São Paulo sobre quem deve pagar as contas do Museu de Arte Contemporânea (MAC-USP) é o maior entrave na mudança da instituição para o antigo Detran, no Ibirapuera.
Além disso, USP e governo paulista não entraram em acordo sobre a construção de um clube no terreno vizinho ao novo endereço do museu.
Segundo apurou a Folha, o problema é a exigência da reitoria da USP de que o governo banque a manutenção do MAC no Detran, um custo anual de R$ 18 milhões, segundo a universidade. No cálculo do governo, a manutenção do prédio custaria, no máximo, R$ 10 milhões.
"Estamos discutindo para chegar a um valor que seja compatível para os dois", disse o secretário estadual da Cultura, Andrea Matarazzo.
Procurada pela reportagem, a USP não quis se manifestar. A Folha também tentou contato direto com o reitor, João Grandino Rodas, que não se pronunciou.
A falta de precedentes jurídicos para que a Secretaria da Cultura arque com os custos de um museu universitário, já que ambos são órgãos subordinados ao governo estadual, é outro problema.
Enquanto o orçamento anual da USP é de cerca de R$ 3,6 bilhões, o da Cultura paulista é de R$ 1 bilhão.
Ainda de acordo com fontes ouvidas pela Folha, a USP até hoje não formalizou os convênios de transferência do acervo para o novo endereço nem iniciou licitações necessárias para a mudança.
Em tempo, as obras de adaptação do prédio para o MAC consumiram R$ 76 milhões de verba do governo e devem terminar em setembro.
A abertura do museu, com uma das maiores coleções de arte moderna no país, no entanto, já foi adiada pelo menos quatro vezes. Do prazo inicial de junho de 2009, a previsão agora é que o museu seja inaugurado em 2012.
"Parei de fazer projeções", diz Tadeu Chiarelli, diretor do MAC. "Só no dia em que estiver tudo terminado, tudo bacana, a gente vai para lá."
CLUBE VIZINHO
Outro impasse na mudança é o plano do Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito da USP, de construir um clube e um estacionamento no terreno ao lado, doado aos alunos por Jânio Quadros nos anos 1950.
Segundo apurou a Folha, o reitor da USP estaria preocupado com a concorrência entre clube e museu, que terá serviços semelhantes.
Diretores do centro acadêmico dizem que a Secretaria de Estado da Cultura tentou, sem sucesso, negociar uma troca de terrenos, liberando o espaço para um jardim de esculturas, mas acabou entrando num acordo com o XI de Agosto. Agora, o projeto deve sair do papel com aval do governo e à revelia da USP.
agosto 8, 2011
Delírio tropical por Paula Alzugaray, Istoé
Delírio tropical
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 5 de agosto de 2011.
Cinema experimental renasce em "Ex Isto", de Cao Guimarães, projeto incentivado pelo Itaú Cultural
No mundo da arte, o espaço cartesiano corresponde ao cubo branco. Trata-se de um espaço neutro, organizado de forma a se manter o mais distante possível da complexidade da vida exterior. Assim são construídos os museus e as galerias, sob os preceitos da arquitetura moderna. Já na literatura e no cinema, ao cartesianismo correspondem as narrativas lineares. Ser cartesiano é combater o caos com as luzes da lógica e da razão. Assim determinou o filósofo francês René Descartes (1596-1650), entre outros iluministas, para tirar a Europa das trevas. Mas “e se René Descartes tivesse vindo ao Brasil com Mauricio de Nassau?” Talvez tivesse perdido a razão para os delírios e os desvarios dos trópicos. Essa é a tese do escritor Paulo Leminski (1944-1989) no romance “Catatau” (1976), que ganha versão de Cao Guimarães para o cinema, em projeto incentivado pelo Itaú Cultural. Leminski e Guimarães, dois artistas que não se deixaram domar pelas leis do cubo branco, se encontram em “Ex Isto”, em cartaz nos cinemas a partir de 12 de agosto, em várias capitais brasileiras.
Em “Ex Isto”, Descartes, interpretado pelo ator João Miguel, mergulha em crise existencial tão logo se depara com a complexidade impenetrável da selva brasileira. Nessa paisagem estranha, situada em algum lugar “entre a apatia e o nervosismo”, segundo texto de Leminski, Descartes vai aos poucos se despir. O chapéu, primeiro elemento que lhe escapa, é sintomático de sua gradual perda da razão. No embate filosófico com a floresta, Descartes contracena com aranhas e papagaios, testando princípios e paradigmas. No rito de passagem a que será conduzido, chega a ficar nu e a se enlamear, como num ritual primitivo. Já em franco delírio, abandona seu tempo e visita o Recife contemporâneo. Como um bom turista, vai à favela e ao mercado, provar as frutas, a música, a mulher, as delícias tropicais.
O terreno das alucinações é próprio da poética de Cao Guimarães, artista que sabe, como poucos, inverter os sentidos de uma imagem. O diretor, que já acompanhou eremitas e outros desajustados em seus longas anteriores – “A Alma do Osso” (2004) e “Andarilho” (2006) –, chega em “Ex Isto” à integração perfeita entre cinema, performance e intervenção urbana. A sequência em que Descartes divaga pelo mercado, ação visivelmente realizada a partir de improvisações cênicas de João Miguel, é performance pura. Já sua relação com o papagaio, na floresta, chega a remeter a um dos momentos clássicos da performance contemporânea: a interação entre a artista alemã Rebecca Horn e uma cacatua em um de seus “Berlin Exercises”. Destaque também para a mais que acertada escolha da canção “Luzes”, letra de Leminski e música de Arnaldo Antunes, para os créditos finais. Um grandíssimo final.
Um projeto da série Iconoclássicos, do Itaú Cultural, “Ex Isto” retoma uma tradição de experimentalismo que desde a década de 1970 não se fazia com tanto vigor no cinema nacional.
Cartografias fronteiriças por Paula Alzugaray e Nina Gazire, Istoé
Cartografias fronteiriças
Matéria de Paula Alzugaray e Nina Gazire originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 15 de julho de 2011.
Anna Bella Geiger e Letícia Parente, que compartilham o título de pioneiras da videoarte brasileira, ganham retrospectivas
Letícia Parente (1930-1991) e Anna Bella Geiger escreveram o primeiro capítulo da videoarte no Brasil: as duas artistas integraram o grupo que, em meados dos anos 1970, realizou experimentações com uma Sony Portapak, a primeira câmera de vídeo portátil. Quando realizou os vídeos “Passagens” (1974), Anna Bella já tinha uma trajetória artística de 20 anos utilizando materiais e técnicas como nanquim, crayon, pintura a óleo, guache, fotografia e gravura em metal. E dava aulas em seu ateliê.
A baiana Letícia, que veio de Fortaleza para o Rio de Janeiro em 1974, ingressando no ateliê de Anna Bella, já havia realizado uma exposição individual de gravuras. No seu primeiro vídeo, o já clássico “Marca Registrada” (1975), Letícia costura a frase “made in Brasil” na sola do pé. Embora reconhecidas como pioneiras dessa nova mídia eletrônica, as duas artistas ganham hoje retrospectivas que acentuam o caráter multimidiático de suas carreiras.
A exposição “Circa MMXI” se organiza como uma espécie de mapa, que desenha regiões exploradas em 60 anos de trajetória de Anna Bella Geiger. Ao utilizar no título o termo “Circa” – designação de data provável de obra artística, histórica ou arquitetônica – a artista demarca o interesse com noções de tempo e espaço, que sempre acompanhou seu trabalho. “Territórios e localizações são temas que estou sempre trabalhando. E sempre volto à ideia do cais e do porto”, diz ela, que assumiu como ponto de partida da mostra a zona portuária.
O visitante que aportar na primeira sala é recebido pela gravura panorâmica “Zona Portuária com Águas dos Mares” (2010) e obras de décadas anteriores que têm a viagem e a cidade como tema. A mostra, uma autocuradoria de Anna Bella, transcorre em percursos ora cronológicos, ora relacionais – traçando tensões e correspondências entre diferentes obras e períodos. Embora comece com o barco, talvez o símbolo máximo do trajeto seja o trem, elemento presente nas instalações “Circa IV” e “Circa V”. Ambas têm a modernidade como tema e alavancam toda uma carga simbólica sugerida pela figura do trem: a circularidade, a travessia, a imagem em movimento, o cinema.
Ao contrário de Anna Bella, Letícia Parente é muito mais conhecida por seus vídeos, que são 11 no total. Recentemente restaurada, sua obra videográfica completa será mostrada no Oi Futuro, no Rio. Mas a exposição acontece concomitantemente em três cidades – Rio, Salvador e Fortaleza –, onde a artista viveu. No MAC de Fortaleza serão expostas as gravuras e pinturas produzidas na fase cearense. Já em Salvador, o vídeo “De Aflicti – Ora Pro Nobis” e fotografias ocuparão a capela do MAM Bahia. “Em função do espaço que cada museu oferece, podemos pensar uma conversa dos vídeos com alguma outra obra da produção da artista”, diz o filho André Parente, que assina a curadoria da retrospectiva “Arqueologias do Cotidiano” com a artista Katia Maciel. “Esse conceito de arqueologia do cotidiano foi encontrado nos próprios textos da Letícia. Todos os seus vídeos têm a ver com preparações de tarefas relacionadas ao cotidiano. Partindo de atos banais, você pode passar para outras camadas e atingir a problematização desses gestos”, diz Parente.
Novas políticas para a arte contemporânea por Nina Gazire, Istoé
Novas políticas para a arte contemporânea
Matéria de Nina Gazire originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 5 de agosto de 2011.
Desde que foi criado em 2009, o Instituto Brasileiro de Museus vem fazendo uma série de ações voltadas para a manutenção e modernização dos museus
Desde que foi criado em 2009, o Instituto Brasileiro de Museus vem fazendo uma série de ações voltadas para a manutenção e modernização dos museus. Entre as necessidades levantadas durante esse período pelo órgão ligado ao Ministério da Cultura está a formação de uma coleção nacional de arte contemporânea. Em agosto, o Ibram pretende selecionar por meio de um edital um grupo de dez artistas que terão verba de R$ 1,4 milhão para realizar uma obra cada um, destinadas aos museus de arte fora do eixo Rio–São Paulo. “A escolha dos artistas será dada por meio de uma comissão de curadores. Queremos formar uma coleção continuada de obras contemporâneas para que o País possa se relacionar com esse tipo de produção”, diz o presidente do Ibram, José Nascimento Júnior. Além desse edital, que deve ser anual, este mês o governo divulga um edital para o Prêmio Ibram RioArt Fair, que acontecerá em setembro, na primeira edição da feira de arte do Rio de Janeiro. As obras de arte premiadas serão depois expostas no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio.
Fotografia: arte de primeira grandeza por Nina Gazire, Istoé
Fotografia: arte de primeira grandeza
Matéria de Nina Gazire originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 22 de julho de 2011.
Coleção de Fotografia Contemporânea da Telefônica / Instituto Tomie Ohtake, SP/ até 18/9
Em maio, a fotografia bateu um novo recorde no mundo da arte. A foto “Untitled#96”, feita pela americana Cindy Sherman em 1981, foi arrematada em um leilão da Christie’s por US$ 3,89 milhões. Até então, o título de foto mais cara pertencia ao fotógrafo alemão Andreas Gursky. Sua imagem “99 Cents II”, que retrata um supermercado, foi leiloada por US$ 3,3 milhões em 2007. “Isso mostra a consolidação da fotografia no mercado de arte. Há alguns anos esse valor só poderia ser atribuído a uma pintura ou uma escultura”, comenta a curadora espanhola Laura Fernandez, responsável pela Coleção de Fotografia Contemporânea da Telefônica. Tanto Gursky quanto Cindy integram essa importante coleção, que é mostrada até setembro no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo.
A Coleção de Fotografia da Fundación Telefónica teve início nos anos 2000, em Madrí, com o objetivo de mapear a trajetória da produção fotógrafica. Dividida em quatro eixos temáticos, a exposição traz parte da coleção, apresentando 36 obras que abordam paisagem, arquitetura, identidade e simulacros.
O eixo “A paisagem e a natureza” reúne fotógrafos especializados no registro de cenas naturalistas. Exemplo deste eixo é “Alba” (foto), imagem em grandes dimensões do rio homônimo localizado na Romênia, feita por Gursky em 1989. Já o eixo “Identidade” apresenta trabalhos que questionam estereótipos sociais ou apresentam o corpo como veículo de expressão. Aqui podem ser vistos os autorretratos de Cindy Sherman, bem como da artista Marina Abramovic (foto), que apresenta um encontro entre a fotografia e a arte da performance. “A coleção é muito versátil e pode ter outras abordagens além desses eixos, mas, do ponto de vista geral, identificamos que estes temas prevalecem no campo da fotografia contemporânea”, explica a curadora da coleção, que também possui trabalhos do brasileiro Vik Muniz.
Pintura em preto e branco por Paula Alzugaray, Istoé
Pintura em preto e branco
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 22 de julho de 2011.
Pinacoteca expõe o alemão Gerhard Richter, artista para quem a fotografia é matriz e fim da pintura
Abstracionismo x figurativismo: essa foi uma das rixas mais acentuadas da história da arte. Deu-se especialmente após o surgimento da fotografia, que logo desbancou a pintura do posto de espelho da realidade. O pintor moderno veio afirmar, desde o final do século XIX/início do século XX, a autonomia da arte em relação ao real e instaurou, assim, a crise da representação. Mas esse grande postulado moderno não foi assimilado sem resistência e assistimos, ao longo do século passado, a oscilações permanentes entre as forças da tradição e as da ruptura. Até que, um belo dia, um pintor alemão afirmou que não havia oposição entre esses dois postulados. Seu gesto foi tão significativo que, desde então, Gerhard Richter é aclamado entre os mais importantes artistas da contemporaneidade. “Gerhard Richter: Sinopse”, exposição com 27 obras realizadas entre os anos 1960 e 1990, na Pinacoteca de São Paulo, mostra o percurso desse grande artista que realiza uma pintura tão figurativa quanto abstrata e conceitual.
O impulso figurativista brota em Richter logo no início de sua trajetória, no contexto do realismo socialista que o cerca em Dresden, cidade natal, parte da antiga República Democrática Alemã. Mas, em 1961, quando transfere-se para Düsseldorf, na então Alemanha Ocidental, o jovem artista entraria em contato com a pintura informal (abstrata) e com a iniciante pop art (figurativa). Talvez a partir desse choque cultural tenha surgido a forte integração da pintura e da fotografia em seu trabalho.
A relação de Richter com a representação fotográfica da realidade passa a ser marcante. Em Düsseldorf, ele começa a colecionar fotografias de várias procedências: de imagens de própria autoria a fotografia amadora e fotojornalismo. A partir desse acervo, começa uma série de pinturas monocromáticas em cinza. Nesse gesto de reduzir a foto colorida à pintura em preto e branco, assume autoria da imagem apropriada. Para além das competências de um pintor padrão, assume o apropriacionismo como gesto artístico. Com isso, dá início a uma pintura de cunho altamente conceitual, que influenciaria várias gerações em meio mundo.
O ciclo completo das relações entre foto e pintura na obra de Richter pode ser apreciado na Pinacoteca do Estado de São Paulo. A exposição inclui uma série de pinturas que foram produzidas a partir de fotografias. Mais surpreendentes são aquelas pinturas nascidas de fotos e depois novamente convertidas em imagens fotográficas. Esse é o caso de “Uncle Rudi”, retrato de militar apropriado e pintado em 1965 e depois fotografado em 2000, e “Betty”, retrato pintado em 1988 e fotografado em 1991. A Pinacoteca expõe as versões fotográficas dessas obras, em cibachrome, técnica em que a imagem é captada e ampliada diretamente no papel e em off-set.
Iluminar a paisagem por Nina Gazire, Istoé
Iluminar a paisagem
Matéria de Nina Gazire originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 29 de julho de 2011.
ESTELA SOKOL - A Morte das Ofélias / Anita Schwartz Galeria de Arte, RJ / até 8/10
Segundo o filósofo Pitágoras, a realidade e seus fenômenos físicos como luz, matéria e som podem ser manipulados harmonicamente e em consonância pela geometria e a matemática. A obra da artista paulistana Estela Sokol faz a ponte entre esse conhecimento naturalista e a escola Suprematista, movimento artístico russo centrado em formas geométricas básicas. Na maioria de seus trabalhos, a essência das formas é atingida não só pela geometria, mas também pela latência da cor. “Esta busca pela materialidade da cor e da luz está em quase todos os meus trabalhos. A ideia é criar campos físicos partindo de elementos supostamente invisíveis, porém decisivos: a irradiação do objeto e sua apropriação do entorno”, diz Estela.
Essa junção entre uma geometria milenar e a intenção pictórica se dá especialmente na sua nova série de intervenções em espaços naturais, realizadas durante uma residência artística na Áustria. A artista posicionou, na paisagem dos Alpes austríacos, objetos geométricos de cores fosforescentes. O registro dessas ações resultou em duas séries de fotografias: “Secret Forest” e “Polarlicht”, presentes em sua individual “A Morte das Ofélias”, no Rio. Exemplo dessa orquestração é “Voo” (foto), parte da série “Polarlicht”. Neste trabalho, Estela sincroniza forma e luminosidade de um triângulo pousado no gelo com as formas orgânicas das montanhas ao fundo. “Os trabalhos da série Polarlicht foram pensados para espaços naturalmente luminosos. A ideia foi explorar a relação com a luz natural. Dessa forma, o gelo e a neve passam a ser parte das obras, como materiais escultóricos essenciais e proponentes da refração da cor e da luz”, diz a artista, que na mesma exposição apresenta a obra “Ofélia”, fazendo uma referência ao personagem shakespeareano retratado por diferentes pintores ao longo da história da arte.
Entrevista com a artista Estela Sokol
Qual é o conceito por detrás da série “Secret Forest” e “Polarlicth”? Como se deu a escolha dos lugares onde as intervenções foram feitas?
Em muitos de meus trabalhos (relevos, esculturas e instalações) tenho pesquisado questões relacionadas à refração da cor e da luz. Para tanto, sempre tive muita preocupação com a escolha dos espaços expositivos, procurando lugares brancos, claros, próximos a janelas, clarabóias – ambientes que proporcionam a vibração e a refração da cor-luz. A fim de dar continuidade a esta pesquisa, surgiram estes trabalhos, assim como os trabalhos da série “Polarlicht”, realizada na mesma época nos Alpes austríacos, pensada para espaços naturalmente luminosos. A idéia foi explorar a relação com a luz natural e seu embate direto sobre os trabalhos. A refração se dá a partir do rebatimento de cor e de luz e esta potencializa a tridimensionalidade da cor-luz. Gelo e neve passam a ser elementos constitutivos das obras, como materiais escultóricos essenciais e proponentes da refração da cor e da luz. Assim, a intenção é que estes campos expandidos de cor sejam resultados de uma relação direta com a natureza da upper Áustria. A superfície de gelo e neve, os tons soturnos das florestas e bosques, as diferentes luminosidades dos dias geram um embate com as bolas de látex, com as placas de acrílico enterradas ou apoiadas nas superfícies nevadas projetando cor e luz sobre a superfície alva.
Você parece querer dar uma materialidade a luz e a cor na série Ofélias? Como isso se deu?
Na verdade eu diária que esta busca pela materialidade da cor e da luz esta presente em quase todos os meus trabalhos. A idéia é criar campos físicos partindo de elementos supostamente invisíveis, porém decisivos: o irradiar-se do objeto e sua apropriação do entorno, investindo-lhe de outra corporeidade escultórica que é evidenciada pela expansão da cor. Dessa forma, a mesma passa a ser parte do volume da obra.
Você apresentou esses trabalhos em uma mostra anterior em Londres. Existe alguma diferença na curadoria e apresentação dos trabalhos nesta exposição brasileira?
A montagem da mostra em Londres fez referencia a minha então última exposição “Clarabóia”, realizada no Paço das Artes entre novembro de 2010 a janeiro de 2011. Nesta exposição a montagem evocava uma relação com “O Habitat Natural das Obras”_ texto que a crítica Paula Braga escreveu na ocasião da exposição_ o atelier “X” e a estética museográfica moderna, como por exemplo, a exposição de obras suprematistas “0-10” de 1915. A montagem de a “A Morte Das Ofélias” pretende dar continuidade a este diálogo, mas, diferentemente das mostras “Secret Forest”, Londres e “Clarabóia”. Todos os trabalhos apresentados na grande sala terão, escala institucional.
Como a figura da Ofélia de Shakespeare aparece nestes trabalhos abstratos? Como essa figura literária foi transformada em conceito nestes trabalhos?
Minha intenção não foi transformar a figura literária em conceito, mas sim evocá-la para adensar um diálogo com a tradição da pintura, na qual a Ofélia de Shakespeare foi retratada por diferentes pintores como Millais, Delacroix e outros. No entanto, para além das possíveis relações pictóricas, a escolha da Ofélia de Shakespeare se deu também para falar da beleza congelada pela morte da princesa suicida. Por esta luminosidade simultaneamente soturna e radiante.
Sonhos satíricos por Nina Gazire, Istoé
Sonhos satíricos
Matéria de Nina Gazire originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 5 de agosto de 2011.
BRUNO VIEIRA - DAS JANGADAS E OUTRAS DIATRIBES/ Galeria Mariana Moura, Recife/ até 20/8
O termo diatribe aplica-se a um texto satírico. Mas a possibilidade de se fazer uma diatribe não reside apenas no uso das palavras. No Renascimento, os flamengos Hieronymus Bosch e Pieter Bruegel (O Velho) construíram genuínas diatribes por meio de suas pinturas. Através de metáforas visuais, eles criticavam a sociedade e os costumes da época em que viviam. Hoje, o artista pernambucano Bruno Vieira realiza um resgate dessa tradição na exposição “Das Jangadas e Outras Diatribes”. Assim como as imagens oníricas de Bosch e Bruegel foram muito além da sátira, revelando camadas simbólicas do inconsciente coletivo daquele período, Vieira utiliza as imagens populares da cultura nordestina para fazer sua própria diatribe em relação aos ideais estabelecidos ao longo da história da arte ocidental.
Exemplo entre os trabalhos apresentados é a imagem “Jangada da Medusa” (foto), retirada de um vídeo desenvolvido durante residência realizada na Fundação Joaquim Nabuco, em 2010. “O arquétipo da barca aparece em textos da psicologia como figura para as flutuações emocionais. Está na “Bíblia” com Noé e na mitologia grega com a barca da Medusa”, diz o artista, que realiza sua leitura utilizando a jangada e o burro, ícones da cultura popular brasileira. Outros trabalhos do artista também poderão ser vistos em São Paulo a partir de 27 de agosto, dentro do Programa de Exposições do Centro Cultural São Paulo, e em novembro em uma individual na Galeria Zipper.
O sonho no papel por Adriana Martins, Diário do Nordeste
O sonho no papel
Matéria de Adriana Martins originalmente publicada no Caderno 3 do jornal Diário do Nordeste em 8 de agosto de 2011.
Hora de arrumar a documentação e ir à luta. O mês de agosto reúne prazos finais de várias seleções no Estado e no País, para projetos nos setores de música, dança, cinema e vídeo e artes plásticas
Atenção artistas e produtores, apressem o passo. Agosto começa com vários editais, cursos e outros projetos, cujos prazos de inscrições distribuem-se ao longo do mês. Há oportunidades nas áreas de dança, cinema e vídeo, música e artes plásticas.
Hoje, por exemplo, já começa o curso de residência artística "Performance, Performatividade: inventar o contexto, tocar na política", oferecido pelo Curso Técnico em Dança, realizado pelo Instituto de Arte e Cultura do Ceará (IACC).
A residência segue até o próximo dia 12, das 14 às 17 horas, no Sesc Senac Iracema. No sentido de desenvolver a noção de performance artística como uma atividade estético-política que recria contextos sociais e históricos, serão apresentados estudos de casos nos campos de cultura e arte. No programa, participantes têm a oportunidade de refletir sobre relações entre mundo e arte, através das concepções dos facilitadores Pablo Assumpção e Felipe Ribeiro.
Ainda no setor da dança, segue até dia 19 deste mês o processo seletivo da Convocatória 2011, da 8ª Bienal Internacional de Dança do Ceará. Coreógrafos, bailarinos e grupos do estado podem enviar suas propostas de apresentação nas categorias Programação Oficial e Mostra Nova Cena. A Convocatória 2011 também selecionará artistas cearenses e argentinos que desejem participar da residência coreográfica Surprised Body, a ser conduzida pelo italiano Francesco Scavetta, de 10 a 19 de outubro.
O resultado da residência Surprised Body será divulgado no dia 29 de agosto. Já os selecionados para a programação oficial e para a Mostra Nova Cena serão conhecidos a partir do dia 2 de setembro. A Bienal de Dança acontecerá de 21 a 29 de outubro.
Para realizadores em audiovisual, a Secretaria da Cultura do Ceará lançou, no último dia 3, o IX Edital Ceará de Cinema e Vídeo 2011. Nesta edição, serão destinados ao segmento R$ 2 milhões e 400 mil, do Fundo Estadual de Cultura (Fec), e mais R$ 600 mil para a formação de cineastas.
Os interessados têm entre 10 de agosto e 23 de setembro para enviar seus projetos nas modalidades de desenvolvimento de roteiro, longa e curta metragem, projeto de TV, novas mídias, além de criação e manutenção de cineclubes.
De acordo com o secretário da Cultura, Francisco Pinheiro, a verba específica para formação era uma reivindicação antiga das entidades de produção audiovisual no Estado.
Outra oportunidade é a 4ª Mostra Outros Cinemas, exclusiva de curtas-metragens brasileiros, cujas inscrições foram prorrogadas para 31 de agosto. O evento acontece em Fortaleza na semana de 22 a 26 de novembro. Os filmes selecionados não serão exibidos em nível competitivo, tendo como principal objetivo o incentivo à realização audiovisual, além de fomentar o aparecimento de novos realizadores e difundir a produção no campo da arte.
Podem ser inscritas produções de todo o País, sobre qualquer tema e que não tenha participado de edições anteriores desta mostra.
Na mesma semana acontece o 6º Encontro Nacional de Cinema e Vídeo dos Sertões, no Piauí, cujas inscrições seguem até 30 de agosto, nas categorias curta-metragem, longa-metragem e curta-metragem oriundo de Pontos de Cultura. Os selecionados recebem uma premiação pela exibição do filme e concorrem ao prêmio final. Poderão, ainda, enviar um representante da produtora ou filme, com despesas custeadas pelo encontro.
Para os artistas plásticos, uma boa oportunidade é a XVI edição da Unifor Plástica, cujas inscrições foram prorrogadas até 31 de agosto. O concurso é aberto a qualquer categoria artística, desde que se adote o tema proposto, "Educação pela arte". As obras selecionadas serão expostas no período de 13 de outubro a 18 de dezembro.
Os três primeiros trabalhos selecionados serão premiados com uma viagem à Bienal de Veneza, considerada um dos eventos de arte mais importantes do mundo. Levam ainda uma ajuda de custo de dois mil euros. Já o quarto e o quinto lugares ganham passagem aérea para visitar a Bienal do Mercosul e ajuda de custo no valor de R$ 1,5 mil.
Os músicos não ficam de fora. Até 19 de agosto o Edital Nacional 2011 do Natura Musical aceita inscrições para sua seleção. Os interessados podem concorrer para a captação de patrocínio a projetos de gravação de CD, turnê de shows ou festival, até mesmo produção de livro, filme, realização de pesquisa ou ação sócio-educativa - desde que ligados à música.
O edital irá contemplar propostas em diferentes estágios e processos de produção. Os projetos inscritos devem ter o registro no Programa Nacional de Apoio à Cultura (PRONAC) ou estar aptos à captação de recursos por meio da Lei Rouanet ou da Lei do Audiovisual.
Inscrições
Convocatória 2011 da 8ª Bienal Internacional de Dança do Ceará - www.bienaldedanca.com
IX Edital Ceará de Cinema e Vídeo 2011 - www.secult.ce.gov.br
4ª Mostra Outros Cinemas - mostraoutroscinemas.blogspot.com
6º Encontro Nacional de Cinema e Vídeo dos Sertões (PI) - www.cinemadossertoes.com
XVI Unifor Plástica - Inscrições: www.unifor.br
Edital Nacional 2011 do Natura Musical - www.naturamusical.com.br
agosto 5, 2011
Artista francês que fez intervenções em 20 cidades ocupa São Paulo por Fernanda Mena, Folha de S. Paulo
Artista francês que fez intervenções em 20 cidades ocupa São Paulo
Matéria de Fernanda Mena originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 5 de agosto em 2011.
Na noite de ontem, um avião cruzou os céus de São Paulo levando embora um artista francês que, em 20 dias de visita à capital paulista, deixou um rastro de 50 "invasores do espaço" espalhados pelas ruas da cidade.
O que ele chama de "invasão" é um processo pelo qual já passaram cidades como Londres, Nova York, Tóquio, Melbourne e até Katmandu, no Nepal. São Paulo é a 21ª a ser tomada pelo artista.
O projeto faz parte da exposição "De Dentro e de Fora", que reúne no Masp oito dos mais importantes nomes da chamada "street art" internacional.
O processo é sempre o mesmo. Sob o codinome Invader e com uma coleção de azulejos na mala, ele estuda o mapa da cidade, compra cimento na loja de construção mais próxima e espera a noite chegar para cobrir muros e viadutos com mosaicos em forma de "space invaders", personagens do videogame homônimo do final dos anos 70.
"É a minha missão poética", disse à Folha o artista, que não revela o nome real.
Sua obra nasceu na ilegalidade, como a de muitos grafiteiros e artistas de rua. Há menos de dez anos, era caso de polícia. Hoje, ocupa museus e galerias mundo afora.
"Antes, preservava minha identidade porque o que eu fazia era proibido. Perdi a conta de quantas vezes fui preso", lembra.
"Quando minha obra foi reconhecida como arte, mantive o anonimato. Isso acabou se tornando parte do projeto. Até porque sou um cara meio antissocial mesmo; se não fosse, não teria criado tantos invasores por aí", explica ele, que não se deixa fotografar ou filmar sem que esteja mascarado.
VIDEOGAME URBANO
A maior de suas intervenções ocorreu em sua Paris natal, cujas ruas hoje abrigam nada menos que mil invasores, todos diferentes entre si.
"Quero surpreender as pessoas e criar alternativas às placas de trânsito e à publicidade. É como um videogame urbano", diz. "Nas ruas, a arte pode chegar a todos, do presidente ao morador de rua. Num museu, não atinge 10% da população local."
Segundo Invader, cada mosaico é uma obra de arte única. "Mas a obra mais interessante é a rede formada pelos invasores do mundo todo em conjunto, como uma escultura sobre o planeta."
Para Baixo Ribeiro, curador da mostra no Masp, Invader criou uma linguagem muito própria, que ampliou o repertório da arte urbana, muitas vezes restrito a grafite e adesivos ("stickers"). "É algo sofisticado e divertido."
VERSÃO VINTAGE
Sobre uma mesa improvisada na montagem da mostra no Masp, Invader abre um mapa surrado em que registrou cada ponto "invadido" em São Paulo. Alguns foram eleitos por sua visibilidade. Outros, ao contrário, por serem confidenciosos.
Num caderno de bolso, ele anota endereço e número de azulejos utilizados. Depois, sob a luz do dia, fotografa cada "invasor" como uma sentinela da cidade.
As informações são armazenadas numa base de dados e transformadas em mapa, que é impresso e distribuído. "Sou totalmente obcecado pelo meu trabalho", diz.
E frisa que São Paulo é a primeira cidade da América do Sul "invadida". Aqui, ele descobriu uma nova matéria-prima: cerâmicas vintage de cemitérios de azulejos.
"Fiquei fascinado e resolvi trabalhar com azulejos estampados pela primeira vez", diz. "É algo brasileiro, que já esteve na casa de alguém e pode ser reutilizado agora para fazer arte."
Mostra reúne grandes nomes da 'street art'
"De Dentro e de Fora" é a segunda mostra de arte urbana a ocupar o Masp, fazendo dele um espelho da cidade.
A exposição reúne oito dos principais nomes da chamada "street art" no mundo: os franceses Invader, JR e Remed, os argentinos Chu, Defi e Tec, o tcheco Point e a norte-americana Swoon.
"Street art" ou arte urbana designa a produção de artistas que fazem das ruas das grandes cidades, de seus muros e equipamentos públicos, o suporte para suas obras.
Os artistas foram convidados a criar não só nas paredes do mezanino do Masp mas também fora dali, na paisagem urbana.
"Queríamos desafiá-los a lidar com a cidade e se integrar a ela", explica o curador Baixo Ribeiro. "É algo experimental, que cria novos campos para a arte."
Em 2009, o Masp reuniu artistas de rua brasileiros na exposição "De Dentro para Fora/De Fora para Dentro", que teve 140 mil visitantes.
Mais cedo, no mesmo ano, tal sucesso não se imaginava. Em janeiro, o comitê de curadoria do museu recusou uma exposição de OsGêmeos, dupla brasileira de renome internacional. "Essa arte urbana era considerada menor", diz Teixeira Coelho, curador do Masp. "Mas isso mudou."
agosto 2, 2011
Museu Afro Brasil vive crise na direção por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Museu Afro Brasil vive crise na direção
Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 2 de agosto de 2011.
Instituição ligada ao governo paulista demitiu diretor-executivo e perdeu cinco conselheiros no mês passado
Diretor-geral, Emanoel Araujo, chama episódio de 'desentendimento' e secretário da Cultura diz que é 'contornável'
Uma crise se instalou na direção do Museu Afro Brasil. Depois que foi demitido o diretor-executivo, Luiz Henrique Neves, a presidente do conselho, Lígia Ferreira, e outros quatro membros do grupo abandonaram seus cargos.
Saíram do conselho em julho, além da presidente, Maria Cristina de Oliveira Bruno, Vagner Gonçalves da Silva, Renato de Almeida Vieira e Silva e Lourivaldo Ribeiro.
Dirigido e idealizado pelo artista Emanoel Araujo, o museu, que é subordinado à Secretaria de Estado da Cultura desde 2009 --quando chegou a ficar uma semana fechado por falta de verba--, agora enfrenta um apagão na gestão.
Neves diz ter sido demitido "sem razão", mas alega que já queria sair. Foi ele quem coordenou a conversão do museu para o modelo de organização social hoje vigente no Estado, que se aproxima mais do setor privado, mas com verbas estatais.
No caso do Museu Afro Brasil, o orçamento anual, repassado pelo governo, gira em torno de R$ 8,5 milhões. Embora todos os conselheiros tenham afirmado em suas cartas de demissão que deixam o posto por motivos pessoais, a dificuldade em trabalhar com Emanoel Araujo é citada por quase todas as fontes ouvidas pela Folha.
"Ele é uma pessoa difícil de lidar, tem sua genialidade, mas é uma pessoa muito complicada", diz Neves. "Foi se desgastando, meu relacionamento com ele, então resolvi por bem terminar isso."
Araujo afirmou à Folha que a demissão de Neves visava tornar "mais eficiente" a gestão do museu, além de cortar gastos. Também disse que o ex-diretor não se ocupava de planos institucionais nem foi capaz de entregar o que o conselho cobrava dele. "Houve um certo estresse, mas é natural que haja entendimentos e desentendimentos", diz Araujo, que não pretende contratar outro profissional para substituir Neves. "Não houve nada grave."
Quanto à substituição dos conselheiros e do presidente do grupo, nenhuma decisão foi tomada, mas a Secretaria de Estado da Cultura vem acompanhando o caso.
"Foi um desentendimento, mas nada que não seja contornável e superável", disse Andrea Matarazzo, secretário paulista da Cultura. "Estamos empenhados para que eles recomponham o conselho."
Números também são monitorados pelo governo. De acordo com os dados, o Museu Afro Brasil só superou sua meta de público no ano passado, mas teve desempenho mais tímido em 2009 e neste primeiro semestre.
Voltado a exposições de cultura e artes visuais afro-brasileiras, o museu tem um acervo de mais de 4.000 obras, 2.000 delas doadas pelo próprio Emanoel Araujo para compor a coleção.
agosto 1, 2011
Carta dos Trabalhadores da Funarte SP
Carta dos Trabalhadores da Funarte SP
Os funcionários da Funarte SP vêm a público manifestar sua perplexidade com relação à Moção de Apoio divulgada em 27 de julho pelo Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Federal no estado de São Paulo (Sindsef-SP).
Não é verdadeira a informação de que os servidores da Funarte concordam com o movimento de ocupação da sede da entidade, deflagrado na segunda-feira. Eles sequer foram consultados pelo Sindsef a este respeito.
Nós, trabalhadores da Funarte SP, somos sim solidários às reivindicações feitas pelos manifestantes. Mas termina aí toda a nossa simpatia e adesão ao movimento.
A ocupação da Funarte representa, para nós, a destruição de um trabalho duro: o de transformar velhos galpões, que estiveram entregues por quase duas décadas ao mais completo abandono, no que é hoje o Complexo Cultural Funarte São Paulo.
Temos orgulho de ter ajudado a erguer e a preencher com boa programação, em uma das regiões mais necessitadas de cultura da cidade, as salas de música, teatro, dança e artes visuais do Complexo. Talvez nem todos saibam, mas muitos de nós chegamos à Funarte por meio do primeiro concurso público da história do Ministério da Cultura, em 2006, exatamente com a missão de fazer existir uma Funarte em São Paulo.
É do nosso trabalho cotidiano que nascem oportunidades, cada vez maiores, de acesso à cultura e ao lazer para a população do bairro. Sentimos orgulho disso também.
Na última segunda-feira, 25 de julho, vimos pela primeira vez os portões da Funarte serem trancados, com correntes e cadeado. Nós, funcionários, e todo o público da Funarte, fomos expulsos, às vezes sob ameaça.
Esta semana, não houve espetáculo. E talvez não haja nenhum outro nas próximas semanas. Porque não nos deixam trabalhar.
Pedimos desculpas a todos. E prometemos seguir lutando.
Atenciosamente,
Funcionários em exercício da Funarte São Paulo
Artistas reinventam formato clássico dos livros em mostra por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Artistas reinventam formato clássico dos livros em mostra
Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 30 de julho de 2011.
Exposição no Museu Lasar Segall destaca volumes conceituais
Livro é um conceito elástico na visão de alguns artistas. Vai além de páginas encadernadas entre duas capas para abraçar cidades inteiras, mundos ou mesmo oceanos.
Na mostra que abre hoje no Museu Lasar Segall, a forma clássica do livro é interrogada, distorcida e ampliada. Em certos casos, parte da subversão de seu conteúdo. Noutros, é a reavaliação de sua estrutura física, ou seja, questiona as margens, lombadas, folhas de rosto e afins.
Jorge Macchi cria rotas por Buenos Aires usando como base um guia da cidade. Mas ele não segue um roteiro fixo, prefere quebrar um vidro sobre a página e se guiar pelas linhas que aparecem ao acaso, marcas dos estilhaços.
Esse mesmo artista também desfaz um caderno de partituras. Na sucessão de páginas, as linhas das notas musicais vão subindo e se acumulam no topo da última folha, como se embaralhassem uma canção possível.
Lúcia Mindlin Loeb arrasta o andar da narrativa criando um volume só de guardas dos livros que encontrou na coleção de seu avô, o bibliófilo José Mindlin. "É uma história que não sai desse começo", observa a curadora da mostra, Ana Luiza Fonseca.
Na mesma pegada, Edith Derdyk faz um catálogo de frestas dos livros, fotografias de páginas amontoadas e detalhes da encadernação.
Essa natureza indevassável do livro ressurge nos trabalhos de Marcius Galan, Marilá Dardot e Odires Mlászho.
Enquanto Galan e Mlászho criam invólucros solipsistas, de capas e lombadas que abraçam todas as páginas sem deixar nenhuma à vista, Dardot une dois volumes por páginas alongadas, como uma espécie de ponte entre dois livros impossíveis de ler.
É o que ela chama de "Terceira Margem", alusão ao não lugar inventado por Guimarães Rosa e ao mesmo tempo uma chave de leitura para outros livros de artista que tentam mapear territórios.
Fábio Morais fez uma série em que recorta as próprias pegadas em mapas de oceanos que encontra em atlas geográficos. Recortando guias turísticos, Daniel Escobar faz saltar no texto todos os monumentos enumerados.
Outras obras de Odires Mlászho parecem tomar partido dessa arquitetura, sendo os próprios livros material construtivo para esculturas. Uma enciclopédia vira uma espécie de templo enquanto outra dá forma a uma estante de ondas de papel.