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junho 30, 2011
Exposição reúne obras de arte cibernética em SP por Agência Estado, O Estado de S. Paulo
Exposição reúne obras de arte cibernética em SP
Matéria da Agência Estado originalmente publicada no caderno de cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 30 de junho de 2011.
Não foi de propósito, mas o júri do edital Rumos Arte Cibernética, do Itaú Cultural, selecionou na última edição do programa, de 2009, apenas criações de artistas jovens. "Existe uma demanda muito grande nesse segmento", diz Marcos Cuzziol, gerente do Itaulab, núcleo de arte cibernética da instituição. As obras escolhidas no edital foram produzidas pelo Itaú - sendo três prêmios para trabalhos de até R$ 50 mil e cinco de até R$ 25 mil - e agora são apresentadas para o público em mostra que ocupa todo o prédio do instituto, na Avenida Paulista. Além das oito criações inéditas, duas, do edital de 2006, também foram incorporadas à exposição.
É a interatividade que permeia a mostra deste Rumos, com obras que misturam tecnologia e poética. "Cibernética trata de interação entre agentes, que podem ser máquinas, softwares, sistemas ou pessoas", explica Cuzziol, exemplificando ainda que até uma peça de teatro pode ser considerada "cibernética".
Por três andares do Itaú Cultural, as dez instalações, todas de brasileiros, são diversificadas, mas, curiosamente, algumas características destacam-se na exposição, como a recorrência do som em muitos trabalhos; criações com robótica, o que Cuzziol acha interessante em se tratando do Brasil; e "uma tendência de trabalhar entre o real e o virtual". Um seminário ocorre paralelamente à exposição.
A complexidade cibernética, muitas vezes, é algo mais dos bastidores do processo de criação de obras que se utilizam da tecnologia. Quando o visitante da exposição chega a uma instalação como "Idance", do curitibano Leandro Trindade, basta a ele, literalmente, apenas se movimentar - ou dançar, se quiser. É uma obra que Cuzziol acredita ter, até mesmo, um potencial ''mercadológico'' - um software cria imagens e sons ao reagir com as pessoas, "diferente do trabalho de DJ".
O movimento também é o gatilho da obra 12i - A Roda da Vida, do paulistano Marcio Ambrosio. Em uma homenagem ao zootrópio, máquina circular criada no século 19 na qual desenhos giram ganhando vida, o trabalho contemporâneo de Ambrosio pede que o espectador crie animações com 12 imagens. Mas a interatividade pode ser suave também ou apenas contemplada. É o caso dos trabalhos "Reações Visuais", do mineiro Leandro Araujo - o ruído captado da esquina da Paulista com a Rua Leôncio de Carvalho faz reconstituir em imagem uma paisagem da mata atlântica. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
A arte da interação por Camila Molina, O Estado de S. Paulo
A arte da interação
Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno de cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 30 de junho de 2011.
'Rumos Cibernética' apresenta obras que conjugam tecnologia e poética
Não foi de propósito, mas o júri do edital Rumos Arte Cibernética, do Itaú Cultural, selecionou na última edição do programa, de 2009, apenas criações de artistas jovens. "Existe uma demanda muito grande nesse segmento", diz Marcos Cuzziol, gerente do Itaulab, núcleo de arte cibernética da instituição. As obras escolhidas no edital foram produzidas pelo Itaú - sendo três prêmios para trabalhos de até R$ 50 mil e cinco de até R$ 25 mil - e agora são apresentadas para o público em mostra que ocupa todo o prédio do instituto, na Avenida Paulista. Além das oito criações inéditas, duas, do edital de 2006, também foram incorporadas à exposição.
É a interatividade que permeia a mostra deste Rumos, com obras que misturam tecnologia e poética. "Cibernética trata de interação entre agentes, que podem ser máquinas, softwares, sistemas ou pessoas", explica Cuzziol, exemplificando ainda que até uma peça de teatro pode ser considerada "cibernética".
Por três andares do Itaú Cultural, as dez instalações, todas de brasileiros, são diversificadas, mas, curiosamente, algumas características destacam-se na exposição, como a recorrência do som em muitos trabalhos; criações com robótica, o que Cuzziol acha interessante em se tratando do Brasil; e "uma tendência de trabalhar entre o real e o virtual". Um seminário ocorre paralelamente à exposição.
Pista de dança. A complexidade cibernética, muitas vezes, é algo mais dos bastidores do processo de criação de obras que se utilizam da tecnologia. Quando o visitante da exposição chega a uma instalação como Idance, do curitibano Leandro Trindade, basta a ele, literalmente, apenas se movimentar - ou dançar, se quiser. É uma obra que Cuzziol acredita ter, até mesmo, um potencial "mercadológico" - um software cria imagens e sons ao reagir com as pessoas, "diferente do trabalho de DJ".
O movimento também é o gatilho da obra 12i - A Roda da Vida, do paulistano Marcio Ambrosio. Em uma homenagem ao zootrópio, máquina circular criada no século 19 na qual desenhos giram ganhando vida, o trabalho contemporâneo de Ambrosio pede que o espectador crie animações com 12 imagens.
Ainda no segmento do jogo, Campo Minado, do paulistano Claudio Bueno, é "game-performance" que ocorre diariamente (exceto, às segundas-feiras), das 11 às 15 h, na Praça Alexandre de Gusmão, na região do Trianon. Por meio de celulares, os "jogadores" são orientados por um mapa a caminhar em uma área repleta de "minas" virtuais. "É um trabalho de ocupação de espaços públicos sem grande estrutura física", comenta Bueno, que se utilizou de ferramentas do Google Maps e do GPS, por exemplo, para criar a obra. "É crítico, porque trata de desvios de caminhos e tem um dado poético também, porque fala do imponderável", continua o artista, que recebeu menção honrosa do prêmio Ars Eletronica. O jogo é exibido em tempo real no Itaú.
Mas a interatividade pode ser suave também ou apenas contemplada (porque ocorre entre sistemas ou máquinas). É o caso dos trabalhos Reações Visuais, do mineiro Leandro Araujo - o ruído captado da esquina da Paulista com a Rua Leôncio de Carvalho faz reconstituir em imagem uma paisagem da mata atlântica; ou RePartitura, que Mariana Shellard criou com o músico José Fornari - desenhos ganham representação sonora. No campo da robótica, Alexandre da Silva Simões criou I, Hamlet, humanoide que interpreta Shakespeare a partir de estímulos dos visitantes, e Amigoide, do coletivo CAYCE POLLARD - um robô cilíndrico "carente" que tenta se relacionar com os espectadores.
junho 29, 2011
Sétima temporada do projeto Multiplicidade, que começa nesta quarta-feira, leva a interatividade ao extremo por Carlos Albuquerque, O Globo
Sétima temporada do projeto Multiplicidade, que começa nesta quarta-feira, leva a interatividade ao extremo
Matéria de Carlos Albuquerque originalmente publicada no caderno de cultura do jornal O Globo em 29 de junho de 2011.
Vai começar de forma chocante a nova temporada do Multiplicidade. Há sete anos unindo imagens e sons, de forma inusitada e sob as bênçãos da tecnologia, o projeto inicia 2011, nesta quarta-feira, no Oi Futuro Flamengo, com uma apresentação conjunta do americano Zach Lieberman - que altera sinais de vídeo em tempo real, com sua instalação "Drawn" - e o japonês Daito Manabe - que cria sons a partir das suas expressões faciais, com o projeto "Electric stimulus".
- Imagine que você faz uma pintura, e a tinta ganha vida - explica Lieberman. - É mais ou menos assim.
VÍDEO: Veja 'Eletric viral', de Daito
Por sua vez, como o nome "Electric stimulus" indica, Daito, um dos destaques do último festival Sonar, realizado há duas semanas em Barcelona, recebe estímulos elétricos - em média, 96 mil volts a cada apresentação. Tudo em nome da arte. Da arte avançada.
- Faço isso há algum tempo e já estou acostumado com os choques - garante o artista japonês, que iniciou o projeto em 2009. - Mas para outras pessoas isso pode ser realmente incômodo.
Idealizador e curador do Multiplicidade, Batman Zavareze reconhece que ficou impressionado com a performance superplugada do japonês.
- Fiz as contas com o nosso chefe eletricista e chegamos a esse número, que é impressionante. Mas tudo é feito com muito cuidado, claro, para não ultrapassar esse limite. É um trabalho de grande impacto, que deve se casar perfeitamente com as coisas que o Zach faz. Digo isso porque é a primeira vez que eles se apresentam juntos nesse formato e ninguém sabe o que pode acontecer. Só sabemos que os dois se complementam.
O "deve" da frase de Batman e suas dúvidas dizem muito sobre o sucesso do Multiplicidade. Desde o começo, o projeto se desenvolveu cruzando música e imagens, mas longe de lugares-comuns ("Só não vale projetar em tela branca", diz o curador), procurando sempre as zonas de risco.
Foram assim as 70 apresentações nesses seis anos de Multiplicidade, unindo músicos como João Donato, Arnaldo Antunes, Fausto Fawcett, Diplo, DJ Spooky e Cinematic Orchestra e artistas visuais como Muti Randolph, Gualter Pupo, Arterial, Breno Pineschi Peter Greenaway.
- Tentamos sempre instigar o artista, oferecer condições para que ele vá ao seu extremo e faça coisas inéditas - explica Batman. - E isso também tem sido uma forma de nos reinventarmos a cada temporada.
Nessa busca de novos formatos para o projeto, num momento em que a tecnologia se populariza e seu uso se aproxima perigosamente da banalização, a interatividade é a palavra-chave do Multiplicidade 2011.
- Uma marca dessa nova geração digital e dos artistas que vamos trazer este ano é a total interação, é a troca de informação, o compartilhamento completo de conhecimento - garante Batman. - Tanto o Zach como o Daito são perfeitos exemplos disso. Eles têm um profundo conhecimento em suas áreas, mas atuam em grupo, cada um trazendo o seu saber, convergindo para um produto final. Isso dá a eles um potencial incrível.
No projeto, que terá cinco edições este ano (em vez das dez de 2010), a interatividade começa no camarim, que é minimamente abastecido, forçando os artistas a sair da toca e fazer contato com o público.
- Isso também tem sido uma marca do Multiplicidade: o camarim praticamente pelado - brinca o curador. - É uma forma de quebrarmos os vícios do show business e fazermos com que os artistas saiam da clausura e se misturem com o público. No final, todos acabam adorando essa interação.
Depois de Zack Lieberman e Daito Manabe, as próximas atrações são: o coletivo carioca Moleculagem (dia 28 de julho), o músico e produtor inglês Scanner (18 de agosto), que tem Björk como fã; e a dupla Lise + L-Ar, com seu projeto Reações Visuais (29 de setembro), além de uma semana inteira de ocupação do Oi Futuro Flamengo, com ações que vão de projeções de filmes a performances (de 27 de outubro a 3 de novembro).
Mas o extremo da interação e o namoro com um formato que Batman chama de "analógico" devem acontecer na última apresentação do ano, nos dias 24 e 27 de novembro. É o inusitado projeto Cavalo. Idealizado pelo músico e artista plástico Cadu, o projeto colaborativo inclui a performance de uma banda ("Chamamos de Orquestra Equestre de Libertação") com os sons obtidos através de microfones colados no corpo de um cavalo. Depois do show, o animal ficará a postos numa charrete, para quem quiser fazer um estranho passeio pela área em torno do Oi Futuro Flamengo.
- Já testamos esse projeto ano passado, mas nunca fizemos algo nessa dimensão - conta Cadu. - Vamos ter caixas de som na charrete, amplificando os sons do animal. É uma coisa muito fora do normal. Ninguém sabe direito o que vai acontecer. Mas acho que a graça é essa.
junho 28, 2011
Panorama busca arte fora do eixo Rio-SP por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo
Panorama busca arte fora do eixo Rio-SP
Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 28 de junho de 2011.
Para curadoria, descentralização de recursos da cultura impulsionou a produção em outras regiões do país
Mostra no MAM-SP pretende expor painel das artes visuais brasileiras na primeira década do século 21
A maioria dos artistas selecionados para o Panorama da Arte Brasileira 2011 (19 dos 33 nomes) não tem origem no eixo Rio-São Paulo.
Essa proporção, que contraria parte das mostras com caráter nacional até então realizadas, é resultado, em parte, de políticas públicas adotadas pelo governo Lula (2003-2010) que favoreceram a produção das artes visuais em outras regiões do país.
"Eu sinto na pele a mudança desse paradigma, da descentralização de recursos na cultura, que transformou a precariedade e o anacronismo em certas regiões. Claro que, como a questão das cotas, pode também ter um lado ruim. Mas não posso ser contra já que essa política favoreceu em muito o meu lugar", afirma a curadora Cristiana Tejo, do Recife.
Com a seleção da mostra, ela e Cauê Alves, responsáveis pelo Panorama 2011, pretendem realizar também um balanço do sistema da arte brasileira na primeira década do século 21.
"A redistribuição de verbas na cultura teve o mesmo efeito que o Enem [Exame Nacional do Ensino Médio, que vale para o ingresso em universidades públicas de todo o país] na educação. Ou seja, aumentou a circulação", diz Alves.
PARA EXPORTAÇÃO
Se, por um lado, o Panorama indicará como as políticas públicas refletiram positivamente nas artes visuais, por outro, ele também irá assinalar a voracidade do circuito comercial.
"O mercado de arte é predador. Ele só quer colher a fruta bonita para exportação. Mas, hoje, os artistas podem sair desse problema por editais e, por isso, há locais como Recife, Belém ou Florianópolis, que vivem sem mercado de arte", diz Tejo.
Outra transformação que a mostra deve exibir é a mutação do discurso político. Há dez anos, na edição de 2001, o Panorama apresentou uma série de obras bastante engajadas com o contexto do país.
"Nós percebemos que ser político hoje é o modo como o artista responde ao mercado, como ele lida com esse sistema", complementa Tejo.
Arte em trânsito por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo
Arte em trânsito
Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 28 de junho de 2011.
Panorama do MAM-SP reincorpora brasileiros dois anos após edição polêmica sem representantes do país
Os brasileiros estão de volta. Após a polêmica edição de 2009, quando o Panorama da Arte Brasileira do MAM (Museu de Arte Moderna de São Paulo), então organizado por Adriano Pedrosa, excluiu artistas nacionais -com uma exceção- da bienal, em 2011 a reserva de mercado nativa está garantida.
Sob a responsabilidade dos curadores Cauê Alves e Cristiana Tejo, o Panorama 2011 terá, desta vez, 33 artistas, sendo apenas um de fato estrangeiro: Raphael Grisey, francês que vive em Berlim.
É preciso descontar, no entanto, artistas como o argentino Nicolas Robbio ou o mexicano Hector Zamora, que vivem e produzem no Brasil.
É possível ainda que um novo nome se agregue à lista obtida com exclusividade pela Folha.
"A primeira pergunta que nos fazem é se vamos ter brasileiros", afirma, rindo, Alves. "Mas a gente não se preocupou em dar uma resposta ao Panorama anterior." Com o título "Itinerários, Itinerâncias", a mostra programada para ser aberta no dia 15 de outubro, "não vai discutir nacionalidade", afirma o curador.
Segundo Tejo, que já foi diretora do Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães, no Recife, e trabalha na Fundação Joaquim Nabuco, "para a curadoria, não há mais a questão da nacionalidade, já que nossas raízes são mais fluídas e o que percebemos é que existe um fluxo cada vez mais urgente".
DESLOCAMENTOS
Pois é essa agitação do circuito artístico nacional que será um dos eixos centrais da mostra. "Na última década, cresceu muito o número de residências artísticas no país, e o sistema de arte se alterou muito. Nós nem conseguimos encontrar alguns artistas porque eles viajam o tempo todo", explica Alves.
Ao usar o deslocamento como metáfora, os curadores pretendem também alterar a própria concepção da mostra: "O Panorama não será apenas uma exposição de arte, estamos pensando também no lado educativo do museu e a ele agregando artistas como Jorge Menna Barreto ou Bruno Faria".
E completa: "Teremos uma mostra de cinema e, também, Chiara Banfi e Kassim serão DJ's residentes no programa existente no MAM, entre outras iniciativas".
O mesmo Panorama que aborda as residências artísticas como motor criativo não vai, no entanto, ter uma. "Na última edição, a residência era fundamental, agora não. Mas nós estamos conversando com o Helmut Batista, que há 14 anos organiza residências e talvez tenha sido o primeiro a adotar esse sistema no país, para ver como ele poderia contribuir", diz Tejo.
junho 27, 2011
Era uma casa muito engraçada por Paula Alzugaray, Istoé
Era uma casa muito engraçada
Estética do absurdo conduz visitante na exposição individual de Ana Linnemann, no Rio de Janeiro
A experiência propiciada pela exposição “Cartoon”, de Ana Linnemann, começa do lado de fora da galeria. Para ser mais exata, começa dentro do táxi, que para diante da Galeria Laura Alvim, em Ipanema, na expressão do taxista, que, com o pescoço virado e o olhar vitrificado, se pergunta se ficou maluco. À descida do carro, a surpresa do taxista é compartilhada com outros transeuntes da avenida Vieira Souto: uma palmeira indomável que gira sobre o próprio eixo, como se tivesse sido tocada por um tufão. A palmeira faz parte da série “Os invisíveis”, de Ana Linnemann, composta por objetos motorizados, submetidos a movimentos repentinos e discretos, que acontecem em intervalos regulares. De discreta, a palmeira realmente não tem nada. Mas para quem passa por ali, imerso em si mesmo, seu giro enlouquecido poderia facilmente ser confundido com o efeito de uma ventania vinda do mar. Lá dentro da casa, sobre uma pilha de livros no alto de uma prateleira, uma garrafa de Coca-Cola – que subitamente se desloca de um lado para outro – tem o mesmo efeito fantasmagórico. A exposição chama-se “Cartoon”, mas poderia muito bem chamar-se “A Mulher Invisível”.
Toda a exposição ocorre durante o trajeto de uma prateleira, que percorre todas as paredes da galeria. Inconstante, o objeto se oferece à primeira vista como uma estante ordinária qualquer. Mas logo evolui de forma “malcomportada”, fazendo as vezes de rodapé, sanfona, moldura, zigue-zague. Ao longo do caminho, a prateleira sustenta outros objetos criados por Ana desde o ano 2000. Sempre objetos domésticos, modificados pela presença invisível da artista. Entre eles, um relógio e um globo terrestre, cortados como uma laranja descascada, ou um grupo de pedras bordadas com flores em ponto de cruz. Na saída, uma parede viva despede-se do visitante, deixando-o entrever absurdos movimentos de bolhas que brotam.
Ana Linnemann residiu durante 16 anos em Nova York, onde construiu uma carreira dinâmica, com mostras em instituições importantes como o El Museo del Barrio. Expôs também no Malba, em Buenos Aires. A exposição inaugura um novo ano curatorial da Galeria Laura Alvim, agora sob a tutela de Fernando Cocchiarale. Em 2009 e 2010, com Ligia Canongia, o espaço se destacou pela qualidade dos projetos, a maioria de cunho experimental. Ao que tudo indica, a tradição continua e o Laura Alvim se firma como espaço diferenciado.
Tradição de ruptura por Angélica de Moraes, Istoé
Tradição de ruptura
Matéria de Angélica de Moraes originalmente publicada na Istoé em 10 de junho de 2011.
Sob a batuta de curadora suíça, a Bienal de Veneza tem uma edição eurocêntrica. Entre os destaques, obra de norte-americanos faz alusão e crítica à cultura da guerra
No topo absoluto do ranking dos grandes eventos de artes visuais, a Bienal de Veneza consegue, como o protagonista do livro “O Leopardo”, de Tomasi di Lampedusa, transformar-se para garantir que o poder continue em suas mãos. A 54ª Bienal, que abriu no sábado 4, é a pioneira e matriz de centenas de bienais ao redor do mundo. Esta edição, com mais de dez mil metros quadrados de área expositiva, reúne elenco recorde de 83 artistas na curadoria principal, a cargo da crítica suíça Bice Curigan, e 89 países participantes.
Em 2009, os países eram 77. Mais uma vez, são as representações nacionais que garantem algumas das melhores atrações.
Entre as imagens fortes desta edição está a performance de atletas olímpicos dos EUA em uma esteira ergométrica acoplada e sincronizada a um tanque de guerra. O tanque-aparelho de ginástica, signo do império da força e da competição (extensível ao supostamente pacífico mundo das artes), é uma das excelentes obras que compõem a representação oficial americana. A autoria é da dupla Allora & Calzadilla, eles próprios símbolos da realidade cultural mutante destes novos tempos: Guillermo Calzadilla é cubano naturalizado americano e Jennifer Allora é americana da Pensilvânia. Moram em Porto Rico.
Donos de um humor quase anárquico, a dupla Allora & Calzadilla apresenta pelo menos outra masterpiece: “Algoritmo”, máquina de autoatendimento bancário 24 horas acoplada a um órgão. A música soa quando o visitante insere seu cartão de crédito na máquina. Se o cartão for aceito, saca notas de dinheiro de verdade. Fina ironia à fé e à sacralidade do sistema capitalista.
O Brasil, que na edição passada (2009) teve presença de vários jovens talentos e a impactante instalação de fios dourados, “Ttéia”, de Lygia Pape em lugar de honra, desta vez está fora do radar da curadoria central, em evidente falta de sincronia com a realidade do circuito, que desde o final dos anos 90 vem destacando a produção brasileira. A suíça Bice Curiger fez uma curadoria eurocêntrica. Com algumas pitadas de especiarias politicamente corretas vindas da África e da Ásia. O pavilhão brasileiro trouxe a obra de Artur Barrio em excelente mostra que contextualiza a contribuição do artista desde suas famosas performances antiditadura dos anos 60 até uma instalação feita especificamente para a ocasião. Barrio, que acaba de ganhar o Prêmio Velázquez, um dos maiores do gênero no mundo, concedido pelo governo espanhol, está em plena forma. Extraiu linhas de força das caixas de luz do pavilhão para amarrar todo o espaço, em composição que celebra a penosa trajetória do artista até a iluminação, ou seja, a criação.
“ILLUMinations” (Iluminações) é o título da curadoria central da 54ª Bienal, fazendo um jogo de palavras com nações e iluminações, apostando na improvável reciclagem do papel de guia cultural que a Europa ocupou desde o chamado Século das Luzes (século XVIII). Enquanto os livros de história da arte são reescritos para incorporar a produção de outras culturas e latitudes, Bice Curiger parece nostálgica da Europa como umbigo do mundo.
O resultado desse iluminismo requentado oscila entre o ótimo e o péssimo. O conjunto qualitativamente mais coeso está concentrado no pavilhão La Biennale, com elenco capitaneado por insólito conjunto de telas do mestre veneziano Tintoretto (1518-1594). Felizmente, os artistas sobrevivem a qualquer tese curatorial e garantem a festa dos olhos: a suíça Pipilotti Rist, o alemão Sigmar Polke e a americana Cindy Sherman são fortes presenças. O inglês Nathaniel Mellors apresenta escultura de duas cabeças animatrônicas “conversando”. Um dispositivo servo computadorizado movimenta as cabeças e as expressões faciais de fisionomias moldadas em látex.
No Arsenale há o ótimo suíço Urs Fischer, mas o destaque absoluto é do americano Christian Marclay com o filme “The Clock” (O Relógio), com duração de 24 horas e resultado de uma incrível pesquisa nos arquivos da história do cinema. Marclay reúne passagens de filmes antigos e famosos em que há relógios em cena. O detalhe é que o horário do filme corresponde ao horário real e em ordem cronológica. A obra acabou garantindo a Marclay o Leão de Ouro de melhor artista da exposição. À 54ª Bienal de Veneza não faltam polêmicas nem boa arte, como sempre.
O devorador de cabeças por Paula Alzugaray, Istoé
O devorador de cabeças
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na Istoé em 17 de junho de 2011.
Pitoresca viagem pitoresca-NINO CAIS/ Galeria Oscar Cruz, SP/ até 25/6
Conta a historiadora Lilia Moritz Schwarcz que a Missão Artística Francesa chegou ao Rio de Janeiro em 1816 graças a uma convergência de interesses. De um lado, artistas formados pela Academia francesa repentinamente desempregados, após a queda de Napoleão. De outro, a corte portuguesa de dom João, carente de representação oficial. Segundo Lilia, os artistas napoleônicos não vieram convidados, muito embora o pintor Jean-Baptiste Taunay, em sua “Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil” (1834-1839), mencione um “convite”.
Convidados ou não, os franceses recém-chegados usaram sua expertise em pintura histórica para documentar a vida na colônia. Entre eles, Debret foi o que teve a obra mais exaustivamente reproduzida e popularizada. Hoje, ela é revisitada pelo artista Nino Cais, na exposição “Pitoresca Viagem Pitoresca”.
Cais é um artista-cronista dessa primeira década do século XXI, assim como Jean-Baptiste Debret foi pintor do cotidiano oitocentista brasileiro. Em dez anos de trabalho, Cais explora sua relação com os objetos. No modo como se veste com cestos, vassouras e bacias ou na maneira como se debruça sobre cristais ou xicrinhas de café, o artista tece sua história íntima da vida urbana. Em cada uma de suas imagens, há uma evidente adoração pelos objetos. Sua relação com eles é sempre de delicadeza e reverência.
Nesta exposição, Cais pouco usa o próprio corpo para falar de costumes. Em seu lugar, desfilam os personagens retratados por Debret. Reis afundados em suas coroas. Negros, índios e brancos decapitados pelas tesouras de Cais. À primeira vista, essas figuras parecem camufladas.
Mas a estratégia, mais que esconder, indica a vocação de Cais para a devoração de imagens.
Cais é um consumidor voraz de imagens prontas, achadas em sebos, livros e revistas antigos. Ao apropriar-se da “Viagem Pitoresca”, ele revela um apetite antropofágico e traz à tona um Debret de visões étnicas estereotipadas, que, como outros artistas viajantes europeus, representou nativos brasileiros como bárbaros canibais. P.A.
Arte de preencher o vazio por Paula Alzugaray, Istoé
Arte de preencher o vazio
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na Istoé Independente em 4 de junho de 2011.
Coleção de arte contemporânea peruana do Museo de Arte de Lima viaja pela primeira vez ao Exterior. Estação Pinacoteca recebe a mostra
Nos anos 1950, seduzidas pela mesma promessa modernizante que no Brasil erigiu Brasília, as populações rurais do Peru migraram para as cidades. Vinte anos depois, o êxodo massivo levou a capital Lima a viver a explosão da economia informal e ao surgimento de uma nova categoria de postos de trabalho, apelidada “al paso” (de passagem). Em 1980, o coletivo de arte E.P.S. Huayco realizou o projeto “Arte al paso”, promovendo uma arte para ser consumida na rua. Hoje, reconhecida como uma das manifestações mais marcantes da arte peruana da segunda metade do século 20, a ação “Arte al paso” dá nome à exposição de arte contemporânea do Museo de Arte de Lima (Mali), que chega à São Paulo.
Essa é a primeira vez que parte da coleção do Mali é exposta no exterior. Para esse importante evento, os curadores Tatiana Cuevas e Rodrigo Quijano trazem 100 trabalhos que ao longo dos últimos 40 anos têm refletido sobre a paisagem sociopolítica e a situação de precariedade institucional no Peru. Enquanto o E.P.S. Huayco buscava estabelecer outros circuitos para a veiculação da arte, artistas como Emilio Hernandez Saavedra denunciavam o vazio de instituições culturais. Seu projeto “El museo de arte borrado” aponta para a ausência de um museu de arte moderna, em 1970.
Dispostos a preencher o vazio, os artistas peruanos têm criado instituições fictícias. Sandra Gamarra inventou o “Museo Limac” (2002), para o qual montou um acervo e um espaço físico. Suzana Torres criou o “Museo neo Inka” (1999-2011), cujo objetivo institucional é promover a desmistificação da identidade nacional. Fernando Bryce instituiu a “Huaco TV” (2002), em que uma cópia de cerâmica pré-colombiana é gravada por câmera de vídeo e transmitida ao vivo.
Por todo o percurso da exposição, encontram-se sinais de uma cultura que busca repensar-se a si mesma, considerando as relações entre um passado recente de violência política e militar e os efeitos de uma promessa de modernização. Em “Katatay (Temblar)”, Alfredo Márquez denuncia a ideia do atraso cultural, a que os países latino-americanos são frequentemente associados pela cultura européia. “Se eu dissesse que a América Latina sofreu a síndrome-da-modernidade-atrasada, eu estaria estimulando um terrível erro conceitual”, declarou o artista Armando Andrade Tudela quando expôs na 27ª Bienal de São Paulo, em 2006.
Arte e militância política na exposição Paulo Bruscky - Arte Correio por AD Luna, Jornal do Commercio
Arte e militância política na exposição Paulo Bruscky - Arte Correio
Matéria de AD Luna originalmente publicada na seção de Cultura do Jornal do Commercio em 10 de junho de 2011.
Com curadoria de Cristiana Tejo, a mostra apresenta um conjunto de experimentos artísticos desenvolvidos pelo artista pernambucano e seus companheiros internacionais de batalha
Início dos anos 1970. Na América Latina, as ditaduras se recrudesciam e tornavam-se ainda mais opressivas. A Guerra Fria e a ameaça nuclear amedrontavam o mundo. A crença no consumo desenfreado como lenitivo para as angústias e dores do mundo capitalista ganhava força e milhões de adeptos, principalmente os inconscientes. Enquanto isso, uma conspiração silenciosa, comandada por artistas "subversivos" de vários pontos do planeta criticava tais conjunturas por meio de (re)criações trocadas por correspondência. A partir de hoje até o dia 24 de agosto, no Centro Cultural dos Correios, os recifenses poderão conhecer abrangente recorte dessa curiosa comunicação de guerrilha na exposição Paulo Bruscky - Arte Correio.
Com curadoria de Cristiana Tejo, a mostra apresenta um conjunto de experimentos artísticos desenvolvidos pelo artista (e rebelde) pernambucano Paulo Bruscky e por alguns de seus companheiros internacionais de batalha. “No Recife, o trabalho de Bruscky é mais falado do que realmente visto. Estamos trabalhando para dar mais visibilidade à sua obra”, explica Cristiana.
Entre as peças que estarão expostas na Arte Correio, selos, telegramas, correntes de cartas, aerogramas e envelopes de diferentes locais. "A gente já trabalhava, naquela época, com o conceito de rede antes da era da internet. Não havia preocupação com a estética dos trabalhos, mas com a comunicação em si. Fronteira era algo inexistente para nós", rememora Bruscky. Esse intercâmbio proporcionava aos missivistas a oportunidade de se manterem informados sobre as dificuldades vividas por seus interlocutores, ao mesmo tempo em que podiam denunciar as mazelas e censuras à liberdade de expressão que sofriam em seus países.
Mostra redescobre Sérvulo Esmeraldo por Gabriela Longman, Folha de S. Paulo
Mostra redescobre Sérvulo Esmeraldo
Matéria de Gabriela Longman originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 23 de junho de 2011.
Vídeo intervenção de Alexandre Rangel (VJ Xorume) na escultura "Quadrado", de Sérvulo Esmeraldo. (contribuição de Alexandre Rangel em comentário do post)
Artista cearense é tema de retrospectiva na Pinacoteca do Estado, com 117 obras de seus 60 anos de carreira
Gravurista e escultor, Sérvulo bebeu na fonte da arte cinética, movimento que eclodia em Paris nos anos 70
Em 1951, um jovem cearense ajudava a martelar gravuras de Goeldi e Aldemir Martins na montagem da primeira Bienal Internacional de São Paulo. Nos anos subsequentes, ele voltaria à mostra, já como artista, expondo gravuras que se tornavam cada vez mais abstratas.
Esse homem é Sérvulo Esmeraldo, artista que aos 82 anos -60 de carreira- ganha agora uma retrospectiva na Pinacoteca do Estado.
Com um percurso que partiu da gravura em direção à escultura, Sérvulo bebeu na fonte da arte cinética, movimento que eclodia em Paris, cidade em que viveu por quase 30 anos) -partiu como bolsista do governo francês em 1958 e só regressou de forma definitiva em 1975.
Uma foto de 1970 mostra um grupo de artistas sentados no jardim de Luxemburgo: Sérvulo com Flávio-Shiró, Lygia Clark, Rossini Peres, Arthur Luiz Piza, Sérgio Camargo.
Foi nesse cenário, e cercado em grande medida por esse grupo, que construiu uma trajetória ligada à geometria.
Como escreveu o curador Ricardo Resende: "Sérvulo não pertenceu ao grupo dos concretos e neoconcretos, período que coincide com sua residência na França, mas é fundamental para se pensar o abstracionismo geométrico e a arte cinética. O artista sempre observou o lado construtivo e o funcionamento das coisas".
O contato do curador com a obra de Sérvulo começou quando esteve à frente do Museu de Arte Contemporânea do Ceará. Na época, a instituição foi contemplada com um edital que permitia a aquisição de acervo, e Resende insistiu na necessidade de comprar obras de Sérvulo, "sem dúvida, o maior artista cearense vivo".
Das 117 obras agora reunidas, cerca de 40 vêm desse projeto de aquisição. Muitas são do acervo da Pinacoteca, e outras foram aparecendo a partir de pesquisa junto a colecionadores.
"A obra não está catalogada. Quando a retrospectiva foi anunciada, muita gente veio me dizer que tinha trabalhos do Sérvulo", contou Resende.
Para mostrar o rigor inventivo do artista, o curador montou uma exposição que acompanha cronologicamente suas experimentações. Um dos destaques é, sem dúvida, quadros e objetos da série de "excitáveis". Movidos por eletricidade eletrostática, interagem com a mão do espectador como se ganhassem vida.
REVISÃO CRÍTICA
Com a exposição, a obra de Sérvulo é tema de um livro organizado pela historiadora e crítica de arte Aracy Amaral. No volume estão textos críticos de Resende, Dodora Guimarães, Agnaldo Farias, entre outros, além de uma entrevista com Sérvulo feita por Lisette Lagnado.
Em boa hora, a iniciativa vem revisitar uma obra que passou os últimos 30 anos bastante circunscrita ao circuito de arte cearense.
A magia da geometria por Camila Molina, o Estado de S. Paulo
A magia da geometria
Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 17 de junho de 2011.
Quando menino, de uns 10 ou 12 anos, Sérvulo Esmeraldo gostava de criar coisas com os restos de materiais que eram usados para fazer tachos no engenho de cana de açúcar mascavo onde cresceu, no Crato, Ceará. "Também fazia objetos que funcionavam com o vento, como papagaios que já tinham formas cinéticas bem estudas", conta ainda o artista, hoje com 82 anos. Ele, brincando não saber a diferença entre "acidente e incidente", vê agora na Pinacoteca do Estado uma mostra que reúne 117 de suas obras, criadas desde a década de 1950. O percurso de Sérvulo Esmeraldo, como vai ver o visitante nessa retrospectiva, é o de um criador que consegue aliar a naturalidade à inteligência sensível em uma produção que se desdobra por esculturas, gravuras, desenhos e objetos.
O que une tudo na obra do artista é a geometria - "a linearidade, a síntese, a eloquência da beleza da forma", como afirma a historiadora Aracy Amaral em texto do livro Sérvulo Esmeraldo, que ela organizou e que acompanha a retrospectiva do cearense. Aracy, na citação, se refere a uma obra específica, Cinco Escamas, de 2001, mas as características ressaltadas pela crítica nesse excerto valem para o conjunto da produção diversificada e ao mesmo tempo tão própria do artista.
Sérvulo Esmeraldo nasceu no Crato, viveu em São Paulo e em Paris e depois quis se fixar mesmo em Fortaleza. Nesse percurso intenso, adotou a abstração geométrica, criou arte cinética, fez esculturas públicas. Fazia tempo que ele não realizava uma mostra em São Paulo e essa atual retrospectiva na Pinacoteca, proposta pelo curador Ricardo Resende, resgata o artista que estava "escondido no Ceará". "A exposição apresenta a dimensão da obra de Sérvulo, uma produção coerente que não tem altos e baixos", diz Resende.
O livro organizado por Aracy Amaral, editado pelo museu paulista, é mais um elemento importante nessa iniciativa de apresentação, análise e resgate da obra de um criador "já inscrito na historiografia da arte experimental brasileira do século 20", como define a historiadora. A publicação, ampla, traz textos de Aracy, Resende, João Rodolfo Stroeter, Frederico Morais, José Claudio da Silva, Matthieu Poirier, Dodora Guimarães, Fernando Cocchiarale, Ana Maria Belluzzo, Agnaldo Farias, carta do artista Julio Le Parc, entrevista com Sérvulo Esmeraldo feita por Lisette Lagnado, cronologia e imagens.
Desenhos espaciais. A exposição tem certo percurso cronológico, mas, na verdade, chega um momento em que essa cronologia se esvai. Na verdade, um pensamento gráfico perpassa todas as obras e já não importa mais saber o ano em que foram feitas. "A linha, a escultura, o desenho, eles vão acontecendo tudo junto. A gente não pensa, acontece", diz Sérvulo Esmeraldo sobre suas obras - "no fundo, os artistas são intuitivos", completa ele.
Na primeira sala da mostra, está uma pintura a óleo sobre madeira de 1950, uma marinha figurativa de Fortaleza. A obra quase clássica (com céu azul e mar) é única no seu gênero e faz contraste em relação ao restante da mostra. "É a única pintura minha que restou, as outras desapareceram", conta Sérvulo. Logo ao lado dela, há um desenho, também de 1950, em que os barcos estão em preto e branco, já geometrizados. Mais ainda, xilogravuras da mesma década, com motivos vegetais - representando folhas e sementes, por exemplo - já indicam, mais ainda, uma vontade de "formalização e limpeza", afirma o curador Ricardo Resende.
Em 1951, Sérvulo se mudou do Ceará para São Paulo e, como ele diz, quando veio para "outro meio", travou contato fundamental para sua trajetória ao conhecer artistas como Arnaldo Pedroso d"Horta, Livio Abramo, Marcello Grassmann e seu conterrâneo cearense Aldemir Martins. Em 1957, Sérvulo Esmeraldo faz sua primeira individual no MAM e, ainda nesse ano, ganha bolsa para residir em Paris.
A década de 1960 é ainda mais rica de experimentações para Sérvulo Esmeraldo. Em 1962, ele cria seu primeiro objeto cinético, O Escriba, e a partir de então suas obras passam do papel para o tridimensional e vice-versa - como define Frederico Morais, Sérvulo está "gravando esculturas/esculpindo gravuras" com poucas linhas, volumes, materiais diversos e em alguns casos, com o uso da cor.
Um dos destaques da mostra é o livro-objeto Trilogia, feito em parceria com o poeta Péricles Eugênio da Silva Ramos. Mas a experiência mais interessante do artista, como vemos na retrospectiva, são os chamados Excitáveis, trabalhos ativados por energia eletrostática que ele iniciou nos anos 1960 e que convidam à participação. "O primeiro deles foi inspirado no poema Anunciação, de Vinicius de Moraes", acrescenta Sérvulo Esmeraldo.
junho 20, 2011
Dança das cadeiras por Paula Alzugaray, Istoé
Dança das cadeiras
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 20 de junho de 2011.
Leia também as matérias e respostas que compõem o Dossiê MIS e Paço das Artes: A morte anunciada de um modelo de gestão.
Mudança de gestão do MIS-SP mais uma vez levanta dúvidas sobre como garantir a continuidade de um projeto institucional no Brasil
Um grupo de estudantes de 1º grau do ABC Paulista chega ao Museu da Imagem e do Som, na quinta, 9. "O que vocês acham que vão encontrar no MIS?", pergunta a monitora do museu. "Som, música, imagem", respondem as crianças. "Mas imagem não é tudo o que a gente vê?", indaga a monitora, gerando dúvidas e concordâncias. A conversa, além de uma estratégia pedagógica, é bastante ilustrativa do debate que surge diante da crise institucional que acomete o MIS-SP, após a demissão de sua diretora executiva, Daniela Bousso. O que é, afinal, um "museu da imagem e do som"? "Do século 19 para cá, já atravessamos cinco revoluções tecnológicas. É fácil constatar que aquilo que era chamado de Imagem e Som, nos anos 1970, quando reinavam as tecnologias eletromecânicas e eletroeletrônicas, não é mais aquilo em que se transformaram a Imagem e o Som em plena e fervescência da cultura do computador", afirma a pesquisadora Lucia Santaella em texto publicado no site canalcontemporâneo.
O texto é uma das respostas que diversos profissionais da área cultural tem publicado na rede, em contra-argumentação à decisão da Secretaria de Estado da Cultura de promover uma "volta às origens" da instituição paulista. Com a missão de "aproximar o MIS das pessoas" e "ampliar o seu público" – diretrizes declaradas pelo Secretário Andrea Matarazzo à Folha de S.Paulo – André Sturm assumiu na terça feira, 7. "Ampliar o publico não é encher de gente a qualquer custo", afirma Sturm, ex-proprietário do Cine Belas Artes e ex-coordenador de Fomento e Difusão Cultural da Secretaria de Estado da Cultura. "Falamos de ampliação do escopo. O que é feito aqui no campo das novas mídias é um bom trabalho e precisa ser mantido. O que o Secretário e eu achamos é que o MIS tem uma vocação mais ampla. Tenho como foco o audiovisu al de 1900 a 2020", diz ele.
O discurso de Sturm, na primeira semana à frente do MIS, parece sintonizado com o da antecessora. Ao assumir, em 2008, Daniela justificou assim o reposicionamento em relação às mídias digitais: "Tornou-se necessário reinventar o MIS, sem perder de vista o seu patrimônio já constituído, sempre buscando integrar memória e contemporaneidade". Mas, então, por que a mudança de direção? A afinação dos discursos indica que uma composição seria melhor solução.
"A melhor configuração para o MIS seria a composição de uma direção artística e uma executiva. Eu fiz essa proposta para o Conselho e a Secretaria parecia amigável para negociar", diz Eide Feldon, presidente do Conselho da Associação de Amigos do Paço das Artes Francisco Matarazzo Sobrinho, responsável pela gestão do MIS e do Paço das Artes. "Mas não deu tempo. De repente, a diretora teve que entregar o cargo, sob a ameaça de desqualificação da Organização Social. Foi uma posição autoritária, que influenciou o Conselho", afirma ela. Segundo Eide, desde fevereiro, o MIS operava com uma redução de 25% do orçamento, tendo tido que demitir oito pessoas e fazer cortes na programação.
"Bousso e o Conselho tentaram de fato negociar com o Secretário, ela escreveu em três dias uma proposta de reposicionamento do MIS depois de um reposicionamento que demorou três anos para se estruturar, sob o comando de João Sayad, com o esforço de representantes de várias áreas sociais. Nesse redesenho conciliador, contemplava todas as solicitações de Matarazzo no plano de atividades, estrutura, além de já ter admitido também os cortes e a mostra "90 em Folha" ", declara o conselheiro Rubens Machado Jr., critico de cinema e professor da ECA-USP.
O evento "90 em Folha" ocupa integralmente o MIS desde 18 de maio. Salas de exposições, midiateca, auditório, espaço redondo e até o restaurante – ainda não inaugurado – ostentam programação especial em comemoração aos 90 anos do jornal Folha de S.Paulo. É lamentável – para dizer o mínimo – que a íntegra da programação do museu tenha sido esvaziada de seu projeto original para atender aos interesses do Estado e de uma empresa de comunicação. "É uma curadoria do secretário", afirma a ex-diretora Daniela Bousso, que em novembro de 2010 teve que alterar o plano de trabalho previsto para 2011 mediante solicitação da Secretaria. (Vale apontar que apenas um mínimo da programação original foi preservada. Está anunciada na homepage do site do museu, por exemplo, uma oficina de audiovisual on-line, ministrada por Ananda Carvalho, que acontecerá de 9 a 30 de julho).
Ao só contemplar departamentos e profissionais vinculados a um meio de comunicação, a programação em cartaz assume uma tônica monotemática que definitivamente não atende ao argumento que vem sendo utilizado para a mudança de direção: "transformar o MIS novamente em referência no panorama cultural de São Paulo".
Como a edição 2111 da sessão de artes visuais de Istoé apurou, o MIS vinha desenvolvendo um projeto que posicionava a instituição cultural como um meio de comunicação em si. (Leia aqui).
Ao destinar o orçamento para promover um evento sobre o modus operandi de um jornal, o MIS teve seu projeto automaticamente corrompido.
A discussão que se instaura imediatamente é: uma referência cultural se mede mais por números que por credibilidade? A julgar por depoimentos de membros de nosso "panorama cultural", não necessariamente. "Comparar o Paço das Artes e o MIS com qualquer outra instituição é não levar em conta que, ao assumirem posturas francamente prospectivas no campo da arte, essas instituições jamais terão resultados imediatos junto ao público. O que não retira de ambas a importância singular que possuem no quadro das instituições de arte no Brasil", escreveu o critico e curador Tadeu Chiarelli, atual diretor do MAC-USP, em 20 de dezembro de 2010, em resposta à matéria do jornal Folha de S.Paulo que publicou dados comparativos sobre a visitação mensal da Pinacoteca e do MIS.
No que diz respeito a números, na gestão Daniela Bousso, depois de oito meses de reforma, o MIS recebeu 13 mil pessoas entre agosto e dezembro 2008. Em todo o ano de 2009, foram 51 mil e, em 2010, 80 mil pessoas. Mas esse crescimento não pareceu sustentável aos critérios públicos.
"É lamentável que esse pensamento de que cultura e arte se fazem apenas com números venha de onde não deveria vir", escreveu o artista e curador Lucas Bambozzi no artigo "A cultura como palco de carreira política", publicado no canalcontemporâneo.
"Enquanto as empresas privadas parecem disfarçar a ganância e, cada vez mais, aceitam fazer menos marketing e investir em situações processuais, laboratórios e pesquisa, o Estado deixa de dar bom exemplo e transforma em mercado o que deveria ser estimulado por vias de apoio e fomento. Não são filas que medem a qualidade de um serviço", afirma Bambozzi, que entre 1993 e 1995 coordenou o departamento de vídeo do MIS, na gestão de Amir Labaki.
A argumentação de Bambozzi ecoa uma preocupação crescente no "panorama cultural" paulista quanto ao perigo de desmantelamento de uma política de atuação voltada para o fomento dos campos experimentais da arte contemporânea, do audiovisual e das novas mídias. A proposta, inovadora e única no panorama cultural – dessa vez brasileiro – vinha se provando mais agregadora e transversal do que "hermética", como chegou a ser taxada.
Na opinião de Rubens Machado Jr, célebre pesquisador do Super-8 e do cinema marginal, o projeto que o MIS desenvolveu nos últimos dois anos se destacou por criar uma "interação entre forças" de diferentes disciplinas. "Historicamente, ciosos de demarcar o terreno, por razões diversas (mercadológicas, ideologias da inovação, corporativismo), críticos, curadores, artistas e cineastas preferiram se diferenciar", afirma o critico. "A ironia é que a tecnologia – antes brandida para afirmar separações – hoje esteja catalisando essa interação mais larga. Curadores, artistas, teóricos, agitadores culturais, todos cavamos este abismo que se exprime agora no episódio do MIS-SP. Como se houvesse sentido numa revanche de uma parte contra a outra, velho e novo, indústria e arte".
Embora tenha inovado em montar o primeiro laboratório de pesquisas na interseção entre arte, ciência e tecnologia, e em orientar boa parte de sua programação para linguagens de ponta, o "novo MIS" dos últimos dois anos e meio não descuidou do aspecto histórico do museu – realizou o inventário de 185 mil itens do acervo de 200 mil itens e iniciou sua digitalização – nem das mídias que, tradicionalmente, sempre foram atribuídas ao campo da "imagem e do som": o cinema e a fotografia. Só no segundo semestre de 2010, o MIS realizou quatro grandes exposições de fotografia, entre elas Chris Marker e Miguel Rio Branco, que teve visitação de 5.421 pessoas em dois meses. Paralelamente, trouxe os "cinemas do futuro" de Pipilotti Rist e Gary Hill e a mostra "Perceptum Mutantis", sobre a pesquisa tecnológica do Brasil e da Argentina, que atraiu 4.154 visitantes. Com menos de 900 pessoas em um mês de exibição, "90 em Folha" não se mostra tão popular quanto as anteriores.
André Sturm assume, portanto, um museu que atualizou as suas vocações e soube se reinventar, em face dos desafios e demandas da cultura contemporânea. O novo diretor se diz disposto ao diálogo e afirma que manterá o foco na reflexão, na capacitação e na diversidade de atividades relacionadas ao audiovisual contemporâneo e histórico.
"Precisamos de gestões que propiciem esta tendência, criem interação entre forças estanques. Por isso insistimos em negociar com o novo diretor, e o Sturm nos pareceu sensível a esta necessidade, certo convívio fértil de um novo MIS, mais experimental e artístico que, coordenado pela Daniela Bousso, se reposicionou admiravelmente como uma identidade sofisticada, que não pode ser abandonada", diz Rubens Machado Jr, participante da comissão de avaliação do acervo, da comissão de orientação artística e cultural, e finalmente da comissão administrativa da OS.
Contudo, vale lembrar que a crise do MIS está longe de ser um caso isolado. Para ficar no âmbito paulista, há não muito tempo atrás vivemos casos tão graves quanto a demissão do curador Ivo Mesquita da Bienal de São Paulo devido ao gerenciamento de fundos públicos para uma mostra privada, e, como lembra Lucas Bambozzi, o desmantelamento do acervo digital organizado por José Roberto Aguilar, frente à Casa das Rosas, por ingerência da então Secretária de Cultura Cláudia Costim.
Por que é impossível para um curador manter um projeto de longo prazo? Como garantir a continuidade de um projeto institucional no Brasil? Por que a programação cultural tem que ser tão imediatista? Por que uma Organização Social, cujo modelo de gestão foi criado recentemente para fazer valer um projeto institucional de representação civil face às eventuais intempéries dos governantes, corre agora o risco de perder a capacidade de gerência sobre seu próprio caminho? Sem que essas perguntas reverberem em contestações, corre-se o risco de perpetuar o ciclo perverso e inconseqüente da dança das cadeiras.
Intervenções urbanas espalham-se pelo Plano Piloto a partir de hoje por Nahima Maciel, Correio Braziliense
Intervenções urbanas espalham-se pelo Plano Piloto a partir de hoje
Matéria de Nahima Maciel originalmente publicada no caderno Diversão e arte do Correio Braziliense em 20 de junho de 2011.
Um cubo de isopor flutuará a partir de hoje pelo Lago Paranoá. Na Rodoviária, uma pintura de US$ 800 mil, isolada por vidro blindado, sugere jogar os políticos corruptos no fogo dos infernos. Na Universidade de Brasília (UnB), uma placa gigante em vidro traz fichas de estudantes que participaram do Congresso de Ibiúna durante a ditadura e, no CCBB, de uma Kombi colorida brotam palmeiras imperiais. O curador Wagner Barja quis transformar Brasília no museu a céu aberto tão proclamado e repetido por aí. Sim, a cidade é uma obra de arte arquitetônica dos anos 1960 e a contemporaneidade pode dar um toque humano, colorido e menos sisudo à capital do modernismo. Barja queria fazer isso há anos. Somente agora conseguiu viabilizar o Aberto Brasília, uma série de intervenções urbanas de autoria de 19 artistas da cidade, do Brasil e do exterior.
Barja não dorme tranquilo há alguns dias. “É o maior projeto em que já trabalhei”, justifica. É preciso uma equipe de produção duas vezes maior que aquelas destinadas a montagens de exposições para fazer um esquema desses funcionar. Também conta a boa vontade dos responsáveis pelo patrimônio — no caso, o Iphan —, mas Barja confessa ter conquistado total adesão do instituto. Da burocracia, não escapou. “Os grileiros agem aqui com liberdade e os artistas enfrentam uma burocracia imensa para trabalhar”, reclama. Tudo foi planejado especificamente para o Plano Piloto. “No geral, o projeto é uma proposta de busca da utopia, que foi o principal conceito de formação da cidade. Os trabalhos em espaços abertos tentam reviver o espírito de utopia.”
Comentários políticos aparecem em boa parte dos trabalhos. É como se Brasília guardasse um livro de visitas com espaço reservado para a crítica preenchido com muita elegância. Outros trabalhos dialogam visceralmente com a poesia, e os artistas aproveitam para mergulhar na subjetividade e nas licenças poéticas. As intervenções estão espalhadas pela cidade e pelos jardins do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no qual foi montada uma sala de vídeos com filmes sobre a trajetória e o processo de confecção da obra de cada artista. Hoje, durante a abertura, haverá uma série de performances. Às 20h, o carioca Waltercio Caldas percorrerá o Eixo Monumental com dois caminhões coloridos, de 20 metros de comprimento, a 20km/h. É a versão do artista para uma suposta pintura modernista.
Meia hora depois, Ronald Duarte, também do Rio de Janeiro, realiza um fumacê de descarrego para o CCBB com voluntários e 20 extintores. Também é dele a performance Peito de aço, série de imagens da Esplanada captadas por cinco helicópteros e transmitidas para a sala de vídeo do CCBB. Às 21h, o grupo brasiliense Corpos Informáticos assume o comando com uma performance seguida de intervenção dos ciclistas do Pedal Noturno, encarregados de fazer um halo de luz com os próprios capacetes em volta do Museu Nacional antes de seguir para o Setor de Clubes. Veja como foram projetados e idealizados alguns dos trabalhos do Aberto Brasília.
Crítica explícita
Cildo Meireles leu um artigo científico sobre a espessura da crosta terrestre e chegou ao Buraco para jogar políticos desonestos. No artigo, descobriu que o magma do centro da Terra está mais próximo da superfície no Planalto Central que em outros lugares. Na pintura, vê-se o Congresso ao fundo e a fenda que leva ao centro da terra aberta para receber os políticos. Avaliada em US$ 800 mil, a pintura foi instalada na Rodoviária, exatamente para contrastar e dialogar com a Esplanada. “Ser mais direto é impossível”, brinca o artista, um dos nomes mais conhecidos da arte brasileira contemporânea no exterior. “O recado é aquele que todo o Brasil tem na ponta da língua. Seria tão legal que a corrupção acabasse nesse país, mas é utopia.”
Um olho no Congresso
Rodrigo Paglieri não teve pudores: pendurou uma câmera entre as duas torres do Congresso Nacional. Suspenso em um pêndulo que realiza oscilações de 180°, o equipamento capta imagens da Esplanada e transmite em tempo real para um monitor no CCBB. O público também pode acompanhar a transmissão pelo link http://www.ustream.tv/ channel/panoramica-brasilia. A intenção de Paglieri, chileno radicado em Brasília, era apenas inverter o olhar da paisagem, sempre vista de frente com o Congresso ao fundo. “Não é uma crítica, mas claro que inverter o olhar convencional já diz bastante: trata-se do poder olhando para a paisagem, para a cidade que contém o povo.”
Cubo flutuante
Guto Lacaz (foto) observava um homem navegando em caixa de isopor na represa de Guarapiranga, na periferia de São Paulo, quando teve a ideia do OFNI, Objeto Flutuante Não Identificado. A versão brasiliense, idealizada para o Lago Paranoá, foi construída na semana passada com 79 caixas de isopor. O cubo tem seis metros de altura e cabine de direção com direito a motor de popa. “É um ready made”, avisa o paulistano. “Gosto muito do efeito físico da flutuação e de barcos, por isso pensei em fazer um barco diferente. O OFNI é uma escultura.” A precariedade inspira Lacaz, que já fez um auditório flutuante para o Ibirapuera.
Um canto em quatro pontos
A geografia brasiliense pareceu adequada ao carioca Nelson Félix. Ele imaginou quatro pontos na extremidade do X que demarca o Plano Piloto e concebeu ações às quais o público só terá acesso por meio de vídeos. Félix passou horas a desenhar e ler poesias no Lago Norte, Lago Sul, Setor de Oficinas e Parque Nacional. Deixou por lá um vaso (foto) com uma dormideira, chamou a performance de Um canto onde não há canto e foi embora depois de entender que havia entrado em comunhão com os espaços. “Brasília é uma cidade que não tem canto e proponho fazer um canto para ela”, explica.
Reflexos da paisagem
Também em comunhão com a natureza, os belgas do The Milena Principle ocuparam a Lagoa do Sapo, no Parque Olhos d’Água, com uma referência ao mito de Narciso: a foto gigante enterrada na água (foto) mostra um rosto de homem. A paisagem é tema ainda de Karina Dias, que construiu um cubo revestido de película espelhada no qual se pode ver o reflexo da paisagem. Instalado no jardim do CCBB, “[com]-Posição faz parte de uma pesquisa que já rendeu livro e vídeos. “A instalação provoca uma inversão e traz para a terra o que está em volta, sobretudo o céu”, explica Karina.
Duas homenagens
No CCBB, Paulo Bruscky faz homenagem a Vicente do Rêgo Monteiro com um cavalo encerrado em cercadinho e pintado de verde. A tinta é biológica e o animal tem supervisão do Ibama. Bruscky queria o quadrúpede porque Monteiro adorava o bicho.
E para entender o verde basta espiar as obras do homenageado: tonalidades esverdeadas permeiam as pinturas. Homenagem irônica — e sempre política — de Xico Chaves parece datada mas atrai atenção: uma imensa chapa de vidro lembra os estudantes presentes no Congresso de Ibiúna, símbolo da resistência contra a ditadura.
Artistas brasileiros têm boa recepção em Basileia por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Artistas brasileiros têm boa recepção em Basileia
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada da Folha de S. Paulo em 20 de junho de 2011.
Impulsionadas por grandes mostras, Maiolino e Mira Schendel se destacam
Waltercio Caldas, Nuno Ramos, Ernesto Neto e Vik Muniz também vendem na principal feira de arte do mundo
Na esteira do furacão Lygia Clark, outros brasileiros tiveram boas vendas na Art Basel, termômetro para o mercado global. Impulsionadas por grandes exposições, Anna Maria Maiolino e Mira Schendel (1919-1988) chamaram a atenção.
Uma obra de Maiolino, artista escalada para a próxima Documenta em Kassel, na Alemanha, foi vendida por US$ 80 mil, ou R$ 127 mil.
Depois de sua mostra no MoMA ao lado de Leon Ferrari e com uma retrospectiva marcada para 2013 na Tate, em Londres, Schendel teve desenhos vendidos por US$ 50 mil, cerca de R$ 80 mil.
Instituições privadas também focaram brasileiros.
Nuno Ramos teve duas instalações de US$ 100 mil (R$ 160 mil), compradas para o museu Thyssen-Bornemisza Art Contemporary, de Viena. Já Rivane Neuenschwander, agora com uma grande mostra em turnê mundial, teve uma obra de US$ 80 mil, ou R$ 127 mil, comprada para uma fundação de Miami.
Levado a Basileia por uma galeria estrangeira, a Elvira González (Madri), Waltercio Caldas foi um dos artistas mais comentados por sua instalação na Art Unlimited, parte da feira dedicada a obras monumentais -em tamanho e preço.
Galerias estrangeiras também venderam alguns nomes recorrentes no mercado.
Uma instalação de Ernesto Neto saiu por US$ 80 mil (R$ 127 mil), na Tanya Bonakdar, de Nova York.
Também foi comercializada uma fotografia de Vik Muniz por US$ 130 mil (R$ 207 mil), e uma pintura de Beatriz Milhazes à venda por US$ 1,8 milhão (R$ 2,9 milhões) terminou a feira reservada para um colecionador.
Clark Quente por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Clark Quente
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Ilustrada da Folha de S. Paulo em 20 de junho de 2011.
Obra vendida a preço recorde e mostra no MoMA tornam Lygia Clark a artista brasileira do momento
Lygia Clark (1920-1988) virou uma grife. Seu nome ainda se distorce na língua dos colecionadores estrangeiros, mas todos parecem saber quem foi a artista brasileira.
Em Basileia, reunidos para a maior feira de arte do mundo, a Art Basel, eles brigaram para comprar qualquer pedaço de sua obra.
Estampando a capa da revista "Flash Art" deste mês e com uma retrospectiva já confirmada para 2014 no MoMA, em Nova York, a obra de Clark parece ter engrenado uma espiral de valorização.
Seu "Abrigo Poético 3", obra de 1964, foi vendido no começo da Art Basel por 1,8 milhão de euros, cerca de R$ 4,1 milhões.
Esse é o valor mais alto já pago pela obra de um artista brasileiro de que se tem notícia, batendo uma pintura de Antônio Bandeira leiloada no ano passado em São Paulo por R$ 3,5 milhões.
Um "Bicho" de 1960 também foi vendido na feira suíça por 1,5 milhão de euros, ou R$ 3,4 milhões. Uma obra da mesma série de famosas esculturas de metal articulado à venda por R$ 2 milhões na SP Arte em maio passado não achou comprador.
Já na Art Basel, mesmo os estudos para seus "Bichos" foram arrematados por preços nada modestos -variando de 410 mil euros a 490 mil euros, ou de de R$ 936 mil a R$ 1,1 milhão.
"Esses são valores que chamam a atenção, mas a artista já atingiu esse patamar no mercado", disse Philip Abraham, da galeria britânica Alison Jacques, que representa o espólio de Clark, à Folha. "São preços que já consideramos normais."
Resposta do Secretário da Casa Civil do Estado de São Paulo sobre a intervenção no MIS
Mensagem do Secretário-Chefe da Casa Civil Sidney Estanislau Beraldo, enviada em 16 de junho de 2011, em resposta ao emeio de Juliano Fragoso, em nome da Mobilização SOS MIS, de 31 de maio de 2011.
Leia também as matérias e respostas que compõem o Dossiê MIS e Paço das Artes: A morte anunciada de um modelo de gestão.
Prezado Senhor Juliano,
O modelo de contrato de gestão com as Organizações Sociais de Cultura tem por finalidade garantir a realização das políticas públicas definidas pelo Governo do Estado para o setor.
Nesse sentido, cumpre ter presente que o Estado não transfere à entidade parceira a decisão sobre as diretrizes de trabalho, tampouco fica desonerado de interceder quando a instituição encontra dificuldades para cumprir seus objetivos.
O Museu da Imagem e do Som de São Paulo pertence ao povo paulista e a legitimidade para estabelecer normas de gestão desse notável patrimônio público é daqueles que o povo elegeu.
A Associação de Amigos do Paço das Artes Francisco Matarazzo Sobrinho – Organização Social de Cultura, enquanto entidade contratada pelo Estado para a gestão do MIS, é apenas a executora dos projetos definidos pelo Governo do Estado para o referido equipamento cultural.
No modelo de gestão de bens públicos por intermédio de OS, o Governo tem não só o poder como o dever de acompanhara atuação e os resultados da entidade, bem como o de zelar pela qualidade e amplo alcance do benefício social possibilitado pelo investimento público.
Bem por isso, sempre que surge necessidade, cumpre ao Governo, por intermédio da Secretaria de Estado da Cultura, agir em prol dos serviços e do patrimônio do povo de São Paulo.
Nessa perspectiva, a Secretaria da Cultura informa que, a partir do segundo semestre de 2010, tomou a iniciativa de dialogar com o Conselho de Administração da entidade parceira, visando à resolução de dois problemas centrais: 1) a crise instaurada em sua diretoria (cujos desdobramentos envolviam desde tensões e desentendimentos entre os diretores executivo e administrativo-financeiro até a demissão de conselheirose funcionários, com repercussão pública na grande imprensa paulista); e 2) a premente necessidade de uma revisão crítica do posicionamento do MIS, à luz dos resultados obtidos no período de 2008 a 2010.
Com o propósito de reverter o quadro de crise institucional, em busca de produtos mais consistentes e mais alinhados com o interesse público, foram realizadas reuniões com o Conselho de Administração no Gabinete do Secretário em 15/12/2010, 22/12/2010, 11/04/2011, 27/04/2011e 05/05/2011. O processo decisório se estendeu, justamente em respeito à autonomia da instituição, de modo a permitir que ela própria apresentasse soluções para a pendência. E foi assim que o Conselho, atento aos riscos para a adequada gestão do equipamento cultural, realizou assembleia dos associados em 30/05/2011, que culminou com a decisão de substituir a diretoria, como forma de assegurar o idealizado fortalecimento do Museu.
No que se refere à execução orçamentária, os atos praticados pela Secretaria de Estado da Cultura estão de acordo com a legislação que dispõe sobre a realização das despesas e a gestão da receita para o exercício de 2011 (Lei nº 14.309, de 27 de dezembro de2010; Decreto nº 56.644, de 03 de janeiro de 2011).
A Pasta constatou a necessidade de aditar redutivamente o valor de muitos de seus contratos, incluindo o valor doContrato SC n.º 39/2009, no tocante às despesas relativas a custeio e áreas meio, que passou de R$ 12.000.000,00 (doze milhões de reais) para R$ 9.291.006,33 (nove milhões, duzentos e noventa e um mil, seis reais e trinta e trêscentavos), atingindo aproximadamente 22,5% (vinte e dois e meio por cento) de redução financeira, de modo a adaptá-lo satisfatoriamente à mencionada legislação.
Por outro lado, a alegada suspensão do último pagamento do mesmo contrato (SC n.º 39/2009) simplesmente não aconteceu, pois a obrigação foi cumprida em 26/05/2011, quando da liquidação do valor de R$ 2.700.000,00 (dois milhões e setecentos mil reais), anteriormente à própria assembleia que decidiu pela substituição da diretoria da OS.
Enfim, mostra-se incensurável a conduta dos representantes do Governo do Estado de São Paulo nesse assunto, notadamente a do Secretário Andrea Matarazzo, aliás, em perfeita sintonia com o modelo de gestão previsto na Lei Complementar Estadual nº 846, de 04 de junhode 1998, e no Decreto Estadual nº 43.493, de 29 de setembro de 1998.
Era o que tinha a esclarecer.
Atenciosamente
Sidney Estanislau Beraldo
Secretário-Chefe da Casa Civil
Mensagem de Juliano Fragoso ao Secretário-Chefe da Casa Civil, enviada em 31 de maio de 2011
Assunto: Modelo de Gestão de OSs violentado por governo que deveria protegê-lo
Ao Secretário Estadual da Casa Civil.
Caro Sr. Sidney Beraldo,
Gostaríamos de denunciar a intervenção do Secretário de Estado da Cultura Andrea Matarazzo na Organização Social de Cultura gestora do Museu da Imagem e do Som e do Paço das Artes. A partir do uso de pressões políticas e financeiras, que incluíram corte orçamentário de 30%, manipulação de funcionários, suspensão do último pagamento, assédio moral e ameaças de desqualificação ao Conselho de Administração, o referido secretário realocou um de seus funcionários da administração direta para a Direção Executiva da OS.
Os governos do PSDB que antecederam o atual governo, incluindo o governo Alckmin anterior, sempre afirmaram que a grande missão deste modelo de gestão era promover a estabilidade das instituições de cultura e evitar as mudanças cíclicas de cunho político com as trocas de governo. No entanto, o que vemos agora é a interrupção de um projeto bem sucedido e bem realizado (com contas e relatórios aprovados) da maneira mais ditatorial possível para atender os interesses políticos do secretário de cultura.
Entendemos que se o Governador Alckmin for conivente com esta conduta estará definitivamente colocando em risco o modelo de gestão das Organizações Sociais, cuja ADIN contra a lei federal ainda transita no STF. Afinal, o que o PSDB pretende com as OSs?
Por favor, leiam o abaixo assinado SOS MIS - Contra a intervenção do Governo do Estado de São Paulo no Museu da Imagem e do Som - MIS-SP, iniciado em 25/05, que já conta com quase 800 assinaturas.
Atenciosamente,
Juliano Fragoso - SOS MIS
junho 17, 2011
Depoimento do conselheiro Rubens Machado Jr. sobre o MIS-SP a Paula Alzugaray
Depoimento de Rubens Machado Jr., professor da ECA-USP, que primeiramente participou Comissão de Avaliação do Acervo, depois foi membro do Conselho de Orientação Artística e agora é membro do Conselho de Administração da Organização Social de Cultura gestora do MIS e Paço das Artes, a jornalista e crítica de arte Paula Alzugaray.
Leia também as matérias e respostas que compõem o Dossiê MIS e Paço das Artes: A morte anunciada de um modelo de gestão.
Como você vê toda essa nova categoria audiovisual que surge da fusão das mídias, chamadas de pós-cinemas, cinemas do futuro, etc. Não podem ser compreendidos sob o chapéu do cinema?
Pessoalmente prefiro pensar o cinema compreendendo todas estas novas modalidades, incluindo o audiovisual do futuro e o do passado, a TV, o vídeo. Independente do nome que se queira dar, há uma forte tendência hoje em reunir os problemas comuns para melhor pensar as diferenças. O fato é que o que se deu historicamente foi o contrário disto. Ciosos de demarcar o terreno, por razões diversas (mercadológicas, ideologias da inovação, corporativismo), críticos, curadores, artistas e cineastas preferiram se diferenciar. Agravou-se a compartimentagem com os anos 80, e não só no Brasil. Gente dizendo que o cinema morreu, outros que este último só iria se afirmar como indústria no país se esquecesse o lado arte, vanguarda etc. O resultado está aí, cinema e arte esperaram décadas para agora voltarem a se atrair. Este divórcio se explica também por uma concepção redutora do que seja o Contemporâneo, em que a História não joga mais um grande papel, como se ele dependesse mais do presente e do futuro do que do passado. Muitos se surpreendem quando hoje, um Agamben retoma o Benjamin do entre-guerras para afirmar que o contemporâneo se vincula sempre e intempestivamente à compreensão da história. O problema é cultural e político. A ironia é que a tecnologia – antes brandida para afirmar separações – hoje esteja catalisando essa interação mais larga. Curadores, artistas, teóricos, agitadores culturais, todos cavamos este abismo que se exprime agora no episódio do MIS-SP. Como se houvesse sentido numa revanche de uma parte contra a outra, velho e novo, indústria e arte; e é até provável que assistamos a novas alternâncias em curto ou médio prazo. Hoje já começa a mudar, mas há processos de formação que exigem certo tempo: quantos críticos de arte hoje se sentem à vontade escrevendo sobre filmes, ainda que sejam de artistas? O contrário também acontece, e isso é significativo. Como experimentamos uma reversão deste processo, certamente aumentarão as trocas daqui para frente, mas paulatinamente. Precisamos de gestões que propiciem esta tendência, criem interação entre estas forças estanques. Por isso insistimos em negociar com o novo diretor, e o Sturm nos pareceu sensível a esta necessidade, certo convívio fértil de um novo MIS com este mais experimental e artístico que, coordenado pela Daniela Bousso, se reposicionou admiravelmente como uma identidade sofisticada, que não pode ser abandonada. Se não, será apenas um velho MIS ‑ turbinado, mas um velho MIS que já conhecemos, sem maior identidade, até mesmo um MIS macunaímico, no pior sentido do termo. É o que se revelou na sua história institucional, se bem observado, na análise que se pode fazer do seu acervo acumulado, sintomático de uma disparidade que vai do objeto museológico de valor até toda sorte de sobras e doações aceitas sem grande critério, devido à falta de continuidade entre gestões.
A ex-diretora alega ter realizado em março um plano de reposicionamento do museu, colocando em primeiro plano as areas de cinema e fotografia, plano esse que teria sido aprovado pelo Conselho, mas recusado pelo Secretário. Na sua opinião, o plano de reposicionamento era satisfatório ou não, por que?
Bousso e o Conselho tentaram de fato negociar com o Secretário, ela escreveu em 3 dias um reposicionamento do MIS dentro do reposicionamento que demorou 3 anos para se estruturar, sob o comando de João Sayad, com o esforço de representantes de várias áreas sociais. Nesse redesenho conciliador contemplava todas as solicitações de Matarazzo no plano de atividades, estrutura, além de já ter admitido também os cortes e a mostra da Folha de S. Paulo etc. O Secretário preferiu não discutir estas alternativas que lhe foram encaminhadas, a negociação acabou atropelada pela mera mudança forçada. Esperamos que o Sturm tenha a devida paciência e interesse de se apoiar nesse plano alternativo que propusemos para traçar o seu próprio. Ele tem uma reputação conquistada em sua atuação, um trajeto de quem sempre soube ouvir, negociar e encaminhar com grande fidelidade compromissos assumidos. Resta-nos cobrar dele uma prática de diálogo com o Conselho e, importante lembrar, fidelidade ao que já afirmou a propósito de manter o projeto anterior no bojo do novo. As OS têm um papel a cumprir, fazer valer a tradição dos desígnios da instituição que dirige face às eventuais intempéries dos governantes do momento ou desígnios estranhos à vocação definida pelo diálogo com a sociedade civil que se faz representar no Conselho. O modelo das OS é muito recente, está sendo testado e precisa ser aperfeiçoado, corresponde a anseios partilhados por partidos políticos importantes, como o PT e o PSDB. O diálogo e negociação das OS com os governantes, os secretários, entretanto, é condição de sua existência. Sem isso as OS perdem sua função social e já não representam nada, muito menos a sociedade civil. Na prática, a opinião pública pode respaldá-la em contrapartida saudável ao respaldo trazido pelo voto aos governantes do momento. Mas sabemos que de um lado temos estudiosos e gente que trabalha “por amor à arte”, sem ganhar nada, representando setores da sociedade civil no Conselho, e de outro lado estão políticos de carreira: ‑ o contrapeso é desigual. Estes últimos podem cortar verbas sufocando a instituição, podem se aliar a algum órgão de comunicação poderoso e desequilibrar o debate público. Gostaria de ouvir as vozes críticas da Folha de S. Paulo sobre a essa cobertura tendenciosa a partir do ano passado, gente que merece confiança, como a ombudsman Susana Singer. Ou o colunista Marcelo Coelho, que já escreveu páginas críticas admiráveis sobre a própria atuação do atual Secretário. Apostamos numa postura moderna e republicana de Matarazzo e Sturm, interessada em ouvir e discutir com o Conselho e a sociedade a respeito de diferentes visões do que possa vir a ser o MIS.
Governo Alckmin implode seu próprio projeto de Organização Social por Patricia Canetti
Governo Alckmin implode seu próprio projeto de Organização Social
Leia também as matérias e respostas que compõem o Dossiê MIS e Paço das Artes: A morte anunciada de um modelo de gestão.
Existe um fato novo neste episódio da mudança de direção do Museu da Imagem e do Som de São Paulo, que difere substancialmente da rotineira falta de compromisso de nossos governantes com as políticas públicas de cultura.
Não é a primeira vez, e nem será a última, que vemos um governo dar uma guinada em um projeto recém implantado, desperdiçando recursos públicos, recursos humanos, ignorando toda uma coletividade de profissionais e de fruidores que orbitam ao redor de uma instituição cultural. Sabemos que o respeito às instituições, sejam elas quais forem, não é o forte de nosso país. Mas, em relação aos museus especificamente, o cenário é devastador. Os museus simplesmente deixaram de ser trabalhados como instituições e hoje, esvaziados completamente do sentido social e simbólico, são tratados meramente como “equipamentos culturais”.
Este esvaziamento de sentido, este rompimento com a noção de organismo vivo, caminha de mãos dadas com os maus tratos sofridos por nossos museus e com a naturalidade com que eles sofrem desvios de função. Como “equipamentos” é natural vê-los a serviço de governos, e seus marketings eleitorais, e não mais a serviço da sociedade.
A perplexidade pela mudança na linha de um museu apenas recém-nascida e o interesse por aquilo que está por vir preenchem o espaço de discussão sobre o episódio, deixando de lado o fato novo e estarrecedor: a violação de uma parceria com a sociedade civil e o desmantelamento do modelo de gestão das Organizações Sociais, única possibilidade de participação social no governo do Estado de São Paulo.
Afinal que parceria é essa definida no modelo de gestão das Organizações Sociais?
O modelo criado no governo Fernando Henrique Cardoso em 1998, como resultado da Reforma da Gestão Pública de 1995, realizada pelo então Ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, estabelece uma parceria público-privada, com o objetivo de tornar a prestação de serviços não-exclusivos mais eficientes mediante controle social. Este último, sendo realizado por conselhos de administração e assembléias, dá à sociedade civil uma maior autonomia administrativa e também uma responsabilidade maior na gestão das instituições. O novo modelo propõe uma difícil evolução das partes envolvidas. À sociedade civil cabe evoluir de simples usuários a cidadãos participadores no controle das instituições e, ao Estado, cabe passar ao papel de fomentador de políticas públicas de médio e longo prazo e ao mesmo tempo aprender a negociá-las com a sociedade.
A grande crítica ao modelo até então era de que se tratava de uma “privatização branca” dos serviços públicos, com a supressão da exigência de concursos públicos para a contratação de pessoal e de licitação para a contratação de produtos e serviços. Uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN 1.923-DF), que foi ajuizada pelo PT e PDT, questiona a lei federal das OSs (Lei Nº 9.637/1998) em relação a estas questões e ainda está sendo votada no Supremo Tribunal Federal.
A perda de direitos estabelecidos - concursos, estabilidade e licitações - nos cegou para um debate mais urgente sobre a evolução necessária de ambas as partes, uma verdadeira mudança de cultura para com a gestão de nossas instituições, para que o novo modelo realmente viesse a funcionar satisfatoriamente. O episódio da intervenção do governo Alckmin na gestão do MIS e Paço das Artes é o resultado da falta deste debate. Por não conhecermos nossos direitos e deveres no novo modelo de gestão, a ingerência do Estado é aceita dentro de uma “normalidade”, que neste caso é, na verdade, uma ilegalidade.
O Governo Alckmin anterior dedicou-se a implantação das OSs de Cultura, mas o atual dedica-se a liquidá-las. Por quê?
“O Museu da Imagem e do Som (MIS) é um equipamento do Governo do Estado de São Paulo, mantido com recursos públicos. Uma das missões da Secretaria de Estado da Cultura é assegurar uma administração organizada, transparente e que, fundamentalmente, resulte em serviços de qualidade aos cidadãos.”Nota da Secretaria de Estado da Cultura publicada no Terra Magazine, em 1º de junho de 2011.
É possível a partir desta nota da secretaria perceber como o Governo Alckmin trata do episódio ignorando completamente a existência do modelo de gestão das OSs:
1 - O MIS não é um “equipamento” do Governo do Estado de São Paulo. Ele está sob responsabilidade de uma entidade privada, que foi qualificada pelo próprio governo para este fim.
2 - No modelo atual de gestão, “ser mantido com recursos públicos” significa que o Estado é o fomentador de uma ação/gestão, que está fora da Administração Pública (e por este motivo os votos do STF entendem que não há inconstitucionalidade na supressão das licitações).
3 - Sim, é missão da secretaria “assegurar uma administração organizada, transparente e que, fundamentalmente, resulte em serviços de qualidade aos cidadãos”, mas isso se dá através dos instrumentos do contrato de gestão, planos e metas, que são analisados e julgados trimestralmente. No caso específico desta OS, todas as prestações de contas e relatórios estavam devidamente atualizados e aprovados.
“Você enxerga ingerência do governo em sua nomeação? - Não. Acho que é função do Estado estabelecer políticas e metas. Cabe à OS administrar e dar andamento a isso.”Resposta de André Sturm, funcionário da Secretaria de Estado da Cultura realocado para a direção executiva da OS gestora do MIS e Paço das Artes, em entrevista à Folha, publicada em 5 de junho de 2011.
Novamente a representação do Estado age como se o modelo de gestão das Organizações Sociais de Cultura não existisse, como se não houvesse legislação, contratos e compromissos. Em suma, o atual Governo Alckmin simplesmente ignora as regras do novo modelo e não aceita o controle social por ele estabelecido.
A intervenção do Estado, com o objetivo de realocar funcionários da secretaria para a OS do MIS e Paço das Artes, aponta para um novo “uso” do modelo de gestão: o avanço da administração pública sobre a entidade privada e o aparelhamento da mesma por um partido político. Com este movimento, o Governo Alckmin decreta a morte do controle social e com ele enterra o modelo de gestão público-privada. E, portanto, voltando a ser Administração Pública, o novo “uso” das OSs de Cultura de São Paulo afeta inclusive os votos favoráveis ao modelo dos ministros do STF, pois sendo Administração Pública, retorna a exigência de concursos e licitações.
Um outro aspecto do desmonte do modelo vem a tona quando lemos o texto de Claudia Costin, publicado na Revista Administração em Diálogo, da PUC-SP, em 2005: a falta de concursos públicos, com salários compatíveis ao mercado, para atrair bons quadros para que o Estado cumpra a sua função de formular e coordenar a implantação das políticas públicas. Claudia Costin foi Ministra da Administração Federal e Reforma do Estado, na gestão Fernando Henrique Cardoso, e Secretária da Cultura do Estado de São Paulo, na gestão anterior de Geraldo Alckmin, e é uma entusiasta do modelo que ajudou a implantar em São Paulo. Neste artigo, além de apresentar uma análise histórica do funcionamento do Estado brasileiro, ela discorre sobre o novo modelo de gestão e os riscos para o Estado.
Portanto, o atual governo deveria estar se dedicando a melhorar e ampliar os quadros da Secretaria de Cultura, para dar continuidade à implantação do modelo de gestão das OSs, ao invés de ampliar vagas, usurpando o espaço da sociedade civil, para clientelismo político. Na análise histórica de Claudia Costin, encontramos um bom “recado” para o Governador Geraldo Alckmin:
“A terceira crise, a crise política do Estado, resulta de dois fenômenos interligados: a relativamente recente transição entre ditadura e democracia no Brasil e o incipiente exercício de cidadania e controle social nas comunidades. Até poucas décadas, o País vivia sob censura de imprensa, o que dificultava o controle social, direitos humanos eram gravemente desrespeitados e o cidadão não tinha voz. Mas, do ponto de vista da máquina pública, um problema adicional se interpunha: toda uma geração de técnicos de governo (entre os quais me incluo) não aprendeu a negociar, desenvolvendo uma arrogância tecnocrática própria de quem detém o monopólio da verdade. Tivemos no Brasil uma ditadura modernizante, apoiada, sob certos aspectos, numa aliança entre técnicos e militares. A verdade técnica foi erigida como a única legítima, como se pudesse ser totalmente neutra, e foi contraposta de forma muitas vezes artificial à de políticos considerados clientelistas.”
O prenúncio de uma nova “política” para os museus de São Paulo
O caso do MIS não está isolado. O primeiro sinal de rompimento com o modelo se deu ainda na gestão Serra, quando Andrea Matarazzo, já Secretário de Cultura, não renovou o contrato com a OS do Memorial do Imigrante. Apesar do contrato de gestão da OS estar vencendo, aqui também vemos sinais claros de impropriedade no trato da parceria com a sociedade civil.
Para adentrar o novo modelo, as Associações de Amigos dos Museus do Estado de São Paulo, com três anos de trabalho comprovado, foram qualificadas como Organizações Sociais de Cultura e assumiram, a partir de 2005, a gestão integral dos museus desde a direção até o corpo técnico-funcional, contratados pela CLT.
Ana Maria da Costa Leitão Vieira, Diretora Executiva da OS original do Memorial do Imigrante, no texto “As Organizações Sociais de Cultura - Um pouco de memória para um debate necessário”, publicado na Revista Museu, questiona o porquê da não renovação do contrato com a OS que vinha gerindo o Memorial do Imigrante há cinco anos, substituindo-a pela OS do Museu do Futebol. Ana Maria levanta algumas questões que merecem a nossa reflexão:
1 - Quais os critérios que justificam a escolha desta OSs no lugar da anterior?
O Museu do Futebol não tem acervo material e, portanto sua equipe não desenvolve serviço permanente de conservação, pesquisa e preservação de coleções histórico-culturais. Também não tem qualificação para o assunto de estudo do Memorial do Imigrante.
2 - Quem teria formatado a proposta de trabalho e orçamento apresentada pela OS do Museu do Futebol?
A Secretaria abriu licitação para nova parceria de gestão do Memorial com prazo de apresentação de propostas de cinco dias. (Recentemente o Ministério Público recomendou a necessidade de licitação para escolha de OSs para gerir determinado equipamento cultural. Sendo que a exigência de três anos de comprovação de trabalho junto ao equipamento foi suprimida da lei sem debate público, ignorando a especificidade do serviço museológico e a memória da Instituição.)
3 - A OS que vinha gerindo o Memorial do Imigrante já estava construindo o Plano de trabalho e orçamento junto com a Secretaria de Cultura para os próximos 4 ou 5 anos, quando foi surpreendida com carta do Secretário manifestando a intenção de não renovar o contrato de gestão. A carta determinava o encerramento de todos os contratos, convênios nacionais e internacionais em andamento na OS, incluindo recursos humanos, referentes ao Memorial.
4 - Em 30 anos de exercício profissional como museóloga, foi a primeira vez que assisti a substituição total de uma equipe de museu.
O assunto da demissão de toda a equipe do Memorial do Imigrante não interessou a imprensa e este primeiro ato aconteceu silenciosamente. Já em relação ao MIS, a imprensa fez parte diretamente do episódio.
A violação da OS do MIS e Paço das Artes
O caso da OS do MIS e Paço das Artes era mais complicado para a Secretaria de Cultura, porque o contrato de gestão estava em vigência, o que demandou um “trabalho” minucioso e persistente para que o objetivo de sua usuparção fosse bem sucedido. O governo estava disposto a tudo, inclusive “construir” a desqualificação da OS e externou esta ameaça diversas vezes aos conselheiros da OS.
Usando de artifícios escusos, como alegações não comprovadas de assédio moral contra a Diretora Executiva Daniela Bousso, e se aproveitando de uma fragilidade institucional, provocada por atritos entre a Direção Executiva e a Direção Financeira da OS, a Secretaria exigiu do Conselho de Administração que fosse feita uma pesquisa junto aos funcionários. Mas ao invés de uma pesquisa conduzida por uma empresa especializada e isenta, foi solicitado que a pesquisa fosse conduzida por uma comissão de funcionários... Enquanto isso, o Conselho da OS, atento às demandas e críticas da Secretaria, continuava a negociar seu plano de trabalho para 2011, cujo o orçamento estava sendo cortado em 30%, o que comprometia substancialmente a programação do museu. Fez parte também da negociação, o sequestro de 3 meses de programação para a mostra comemorativa dos 90 anos da Folha.
O questionário da referida pesquisa, formulado de maneira bastante tendenciosa, não chegou a construir números significativos, mas foi o suficiente para ser vasado para imprensa e resultar em matéria publicada na Folha de S. Paulo no final de dezembro de 2010. A matéria igualmente tendeciosa e rasa curiosamente já levantava aquilo que viria a ser o grande argumento do Secretário de Cultura para assaltar a OS: a quantidade de público visitante do MIS. (Outra curiosidade: veremos alguns dos ex-funcionários citados nesta matéria retornando a postos mais altos agora com a direção da OS entregue a Secretaria de Cultura.)
A matéria foi prontamente respondida diretamente à Folha ou na rede por profissionais da área e também pelos Conselhos de Administração e Orientação Artística da OS (ver dossiê no Canal) e um silêncio de cinco meses se seguiu... Enquanto isso, conselheiros deixavam o Conselho de Administração, por não aguentar a carga pesada de tantas reuniões, tantos problemas e tanta pressão da Secretaria de Cultura, cujo jogo incluía longas ligações telefônicas, até no período da noite.
Um novo reposicionamento dentro do reposicionamento foi apresentado ao Secretário de Cultura, atendendo todas as suas solicitações, mas este redesenho nem chegou a ser discutido por Andrea Matarazzo, como relata o conselheiro Rubens Machado Jr. Neste ponto, a Secretaria de Cultura ofereceu uma proposta conciliadora para a entrada de seu funcionário na Direção Executiva e a manutenção de Daniela Bousso como consultora da OS. Mas era um novo blefe. Na sequência, outra concessão foi feita pela OS, na tentativa de ainda preservar a sua Direção Executiva e o trabalho para o qual havia sido contratada no momento do reposicionamento do MIS. O Conselho de Administração aceitou novos conselheiros “sugeridos” pelo Secretário de Cultura. (Importante: o Estado não tem assento no Conselho de Administração das Organizações Sociais de Cultura de São Paulo, que deve ser formado exclusivamente pela representação da sociedade civil.
Em maio recomeçam as matérias na imprensa sobre a mudança de direção da OS e também se dá a abertura da exposição comemorativa da Folha no MIS, interrompendo toda a programação do museu por três meses. Em 30 de maio, o Conselho de Administração recebe uma comissão de profissionais (Regina Silveira, Lucia Santaella, Tânia Fraga, Anaisa Franco e Claudio Bueno) para lhe entregar o abaixo-assinado “SOS MIS Contra a intervenção do Governo do Estado de São Paulo no Museu da Imagem e do Som - MIS-SP” e, no mesmo dia, mesmo sem constar em pauta, votam pela demissão da Diretora Executiva Daniela Bousso.
Todo o processo, até o seu último ato, foi irregular ou impróprio, para dizer o mínimo. Temendo a conduta do Governo Alckmin, pois a farsa de uma desqualificação seria facilmente montada contra a OS, mesmo que totalmente descabida, o Conselho de Administração sucumbiu. E assim, com requintes de perversão, um governo que se pretende democrático violentou o controle social, criado pelo seu próprio partido para conter os abusos, que ele próprio acabou por cometer.
O que fazer diante deste tipo de Poder Público?
O mais interessante desta situação absurda que estamos vivenciando é que o próprio episódio narrado em detalhes comprova a ingerência e a intervenção na OS do MIS e Paço das Artes, que os representantes do Governo Alckmin querem negar. Afinal, se fosse de fato uma demanda regular, eles não precisariam ter feito tudo isso... E agora, podemos perguntar, que política é esta? O que pretende a Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo com a “parceria” com a sociedade civil? O que acontecerá com as outras Organizações Sociais de Cultura?
Alguém aqui acredita realmente que o cerne desta conduta voraz com as OSs tenha alguma coisa a ver com política cultural?
O aparelhamento das Organizações Sociais de Cultura pelo Governo do Estado de São Paulo já está em processo, tornando este modelo de gestão uma farsa. Como bem disse a ex-diretora do Memorial do Imigrante no texto já citado, “o modelo de gestão ainda atravessa uma delicada fase de aprendizagem e aperfeiçoamento por parte de todos os seus atores” e eu completo: do jeito que está - o que era uma parceria na origem virou uma guerra suja - não há condições para a sociedade civil fazer frente às pressões do Estado para exercer o seu papel de controle social.
O que temos hoje - ou mais realisticamente o que tínhamos - como espaço para a participação social neste início de modelo de gestão das Organizações Sociais de Cultura é ínfimo. Mas, ainda assim, é uma semente potente para uma profunda transformação nas instituições culturais e consequentemente nas políticas culturais. É esta potência de futuro que está sendo abortada agora.
Este espaço de participação social precisa ser defendido, ampliado e aperfeiçoado e cabe a nós denunciar e lutar contra quem o ameaça. Temos que nos mobilizar muito para reverter este quadro e impedir que todos os museus do Estado de São Paulo voltem a ser geridos por politicagem, clientelismo e “arrogância tecnocrática”. Precisamos acordar o Governador Geraldo Alckmin, chamar a atenção da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo e chegar ao Ministério Público, se for preciso.
Neste momento acho importante e inspirador lembrarmos de outra luta nossa contra uma ação governamental que também se travestia de política pública de cultura: a construção e manutenção por dez anos do museu Guggenheim no Rio de Janeiro totalmente financiado com recursos públicos. Naquela época, 2003, a comunidade do Canal Contemporâneo era infinitamente menor, ainda não existiam tantos blogs, nem Facebook e Twitter. Temos um arsenal valioso atualmente para chamar a atenção dos outros dois poderes para impedir o abuso do Poder Executivo, como ocorreu com a bem sucedida mobilização Guggenheim (Mantida liminar contra museu: STJ nega recurso contra suspensão de contrato, Jornal do Brasil).
Para finalizar, pego emprestado o último parágrafo da excelente matéria de Paula Alzugaray na Revista Istoé deste final de semana:
"Por que é impossível para um curador manter um projeto de longo prazo? Como garantir a continuidade de um projeto institucional no Brasil? Por que a programação cultural tem que ser tão imediatista? Por que uma Organização Social, cujo modelo de gestão foi criado recentemente para fazer valer um projeto institucional de representação civil face às eventuais intempéries dos governantes, corre agora o risco de perder a ingerência sobre seu próprio caminho? Sem que essas perguntas reverberem em contestações, corre-se o risco de perpetuar o ciclo perverso e inconseqüente da dança das cadeiras."
Patricia Canetti é artista, criadora e coordenadora do Canal Contemporâneo e Conselheira de Arte Digital no CNPC - Conselho Nacional de Política Cultural.
Canal Contemporâneo recomenda algumas ações mobilizadoras:
- Ler, assinar e compartilhar o abaixo-assinado em listas e redes;
- Ler, comentar e compartilhar as matérias do dossiê;
- Escrever e publicar em blogs;
- Escrever sobre o assunto para jornais, revistas, blogs e sites;
- Reclamar nas ouvidorias do Estado (ouvidoria@cultura.sp.gov.br / ouvidoriagestaopublica@sp.gov.br);
- Falar com parlamentares conhecidos;
- Estimular e convocar debates online e presenciais.
Referências
Legislação do Estado de São Paulo que regulamentam as Organizações Sociais de Cultura
Demissões revelam crise no MIS e Paço por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Depoimento do conselheiro Rubens Machado sobre o MIS-SP a Paula Alzugaray
Dossiê MIS e Paço das Artes: A morte anunciada de um modelo de gestão
junho 16, 2011
Divulgados finalistas a prêmio de artes plásticas por Agência Estado, O Estado de S. Paulo
Divulgados finalistas a prêmio de artes plásticas
Matéria originalmente publicada no caderno de cultura em 16 de junho de 2011.
Os paulistanos André Komatsu e Tatiana Blass, o carioca Eduardo Berliner e o alagoano Jonathas de Andrade são os finalistas do Prêmio Investidor Profissional de Arte (Pipa). É o mais vultoso do Brasil dado a um único artista plástico. O vencedor será anunciado em outubro, durante exposição de trabalhos dos quatro no Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio. Um júri especializado vai decidir quem receberá R$ 100 mil, valor que compreende uma residência no prestigioso programa da Gasworks de Londres, que recebe artistas promissores do mundo todo.
Os quatro são jovens - entre 29 e 33 anos -, têm formação universitária e já foram indicados para outros prêmios; inclusive entraram na seleção do Pipa do ano passado. Trabalham com pintura, escultura, instalação, vídeo e fotografia. Já expuseram em espaços importantes do Brasil individualmente e fizeram incursões no exterior.
O Pipa tem como objetivo justamente chamar a atenção para a consistência de suas produções, além de lhes dar recursos para desenvolver seu trabalho, possibilitando contornos mais ambiciosos. A iniciativa é da empresa Investidor Profissional Gestão de Recursos e do MAM.
Quem ganhar no voto popular (dos frequentadores da mostra que o MAM abrirá em setembro) receberá R$ 20 mil. O Pipa On-line, linkado com o Facebook, renderá R$ 10 mil. Os quatro nomes saíram de uma lista de 85, indicados por um comitê de colegas, críticos, galeristas e colecionadores, brasileiros e de fora. O vencedor será escolhido por outro júri, não definido ainda. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
junho 15, 2011
Percalços da Rouanet por Jotabê Medeiros, O Estado de S. Paulo
Percalços da Rouanet
Matéria de Jotabê Medeiros originalmente publicada no caderno Cultura do O Estado de S. Paulo em 15 de junho de 2011.
MinC se bate para preservar espírito da reforma do incentivo à cultura
No Congresso Nacional, um espectro ronda a nova Lei Rouanet, que pode nascer já desfigurada. Substitutivo da deputada Alice Portugal (PC do B/BA), aprovado no fim do ano passado, mudou em essência pontos cruciais da reforma, como a obrigatoriedade de o patrocinador colocar ao menos 20% do seu bolso no apoio a um projeto - tudo volta à estaca zero, aos 100% de dedução do imposto.
O retorno dos 100% de renúncia fiscal, que torna o Estado o único investidor real na cultura, foi possível mediante a adoção de mecanismo de contabilização do investimento como despesa operacional do investidor. "Ou seja, apesar de estar previsto o máximo de 80% de renúncia, a possibilidade dessa contabilização eleva o índice, facilmente, para 100%. Além disso, a proposta de pontuação inserida no substitutivo praticamente leva todos os projetos para 80% de renúncia, com o atingimento dos 100%, mas deixa o segmento de patrimônio cultural muito vulnerável, uma vez que nunca chegaria aos maiores índices de renúncia. Consideramos isso uma distorção, porque perpetuará a renúncia de 100%, para alguns setores, sem a efetiva participação dos recursos privados no sistema", avalia Henilton Menezes, secretário de Fomento e Incentivo à Cultura do MinC.
Segundo Menezes, o governo trabalha com a possibilidade da apresentação de outro texto substitutivo pelo deputado Pedro Eugênio (PT/PE), relator do projeto na Comissão de Finanças, que poderia consertar o estrago feito no texto amplamente debatido durante seis anos no governo Lula. A ministra da Cultura, Ana de Hollanda, esteve no último dia 19 na Câmara para conversar com o relator Pedro Eugênio. "Ela entende que o projeto já está numa forma bastante positiva; apenas está querendo passar um pente fino para verificar se não existe alguma possibilidade de alteração no sentido de melhorá-lo ainda mais", disse o deputado. Henilton Menezes, interlocutor do MinC na questão, diz que o texto atual "tem problemas" a serem corrigidos.
A espinha dorsal do texto encaminhado no governo Lula é a adoção do Fundo Nacional de Cultura como principal mecanismo de financiamento da lei, tirando dos departamentos de marketing das empresas a tarefa hoje exclusiva de decidir quais projetos serão financiados. Até isso parece ameaçado. "Isso está na proposta do substitutivo, mas teria que ser amplamente negociado com a Fazenda, pois implicaria um aumento de recursos para o FNC e, claro, para a cultura. Mas é um aumento de despesa para a União e, por lei, aumento de despesa tem que ser casado com aumento de receita. Essa pactuação deve ser feita pelo Parlamento, principalmente pelo relator da Comissão de Finanças", considera Menezes.
O substitutivo também elevou de 15% para 25% o limite para estabelecimento de despesas administrativas, incluindo captação de recursos (o chamado "atravessador"). "Se isso fica no texto da lei, teríamos 25% de todo o orçamento da Lei destinados a atividades não finalísticas, com o risco de todos esses recursos serem direcionados para captadores de recursos. Para 2011, por exemplo, estamos falando de 25% de R$ 1,35 bilhão", avalia Menezes.
MUDANÇAS POLÊMICAS EM DEBATE
1. MinC discorda da forma de participação por meio de colegiados setoriais porque "teria de fazer eleição direta no País todo" para escolher representantes.
2. Itens importantes do projeto, como acessibilidade gratuita, ainda não têm tratamento de relevo no texto proposto, e isso deve mudar.
3. Governo também discorda do MinC de Juca/Gil na questão dos Ficarts. Pelo texto original, atividades de retorno comercial terão 100% de renúncia.
4. MinC atual também pretende modificar lei no que diz respeito à produção independente, por achar que conceito de independente é "frágil".
5. Para o novo MinC, a pontuação estabelecida no texto para índices diferenciados de renúncia deveria ser assunto de decreto ou instrução normativa.
6. Elevação de 15% para 25% de despesas com o projeto, incluindo captação, poderá encarecer de novo o sistema, segundo o MinC.
junho 14, 2011
O Minc rumo à hegemonia da indústria cultural por Carlos Henrique, Trezentos
O Minc rumo à hegemonia da indústria cultural
Matéria de Carlos Henrique originalmente publicada no blog Trezentos em 13 de junho de 2011.
Uma das piores características da linha adotada pelo MinC de Ana de Hollanda, é a incapacidade de conviver e dialogar com a critica. Falta, no entanto saber se isso é um sintoma espontâneo ou tático. Hoje, eu chego à conclusão de que ele é friamente pensado.
Ana de Hollanda chegou à pasta da cultura pensando em construir no espaço público um mundo privado, pior, pelas formas mais duras e tradicionais das oligarquias globais.
Este momento horrível que atravessamos com a nova visão do MinC, onde a esperança de se ter um pacto nacional a partir da cultura do povo, a cada dia se perde num marasmo proposital em prol das forças dominantes.
Vamos perdendo a concepção de futuro para sermos jogados numa armadilha de consumo imediato, condenados a uma miopia do mercado cultural e mergulhados numa era de tecnicalidades sem virtudes políticas e sociais.
A clarividência mercadológica que chega com a secretaria da economia criativa é um arcabouço para quem sonhava ter um ponto de vista próprio a partir das nossas realidades, mas, sobretudo, das nossas formas de enxergar o mundo em que vivemos.
Tudo agora tende a correr pelos afluentes do neoliberalismo cultural. Comunidades inteiras serão estimuladas a subjugar suas culturas à matriz do espetáculo para gerar “emprego e renda”. O novo mercado cultural quer conquistar todo o território brasileiro exterminado sotaques e impondo uma agenda ditada pala globalização cultural.
Ana de Hollanda, com essa nova secretaria, demarca o território a partir de uma partilha comercial, onde a senha dos gestores corporativos é dada pela dominação institucional. Assim os saques das riquezas culturais de comunidades inteiras ficam autorizados a partir do modelo adotado pelo Estado.
O modelo neocolonial europeu transplantado para o Brasil será uma espécie de FMI da cultura em que se fará necessário sacrificar costumes, crenças e culturas espontâneas, tradicionais ou não, para cumprir uma agenda de universalização artificial.
A fragmentação do território será uma das lógicas desse “mundo melhor” que a economia criativa está prometendo. O desmonte dos Pontos de Cultura já está em franco andamento e, em seguida, o humanismo sairá de cena e o motor do desenvolvimento econômico pelo mercado cultural tratorará os sentidos da cultura cidadã. O fundamentalismo consumista entrará em cena e, com sua forma competitiva e acelerada, arrastará e arrasará culturas centenárias e ainda imporá uma agenda contemporânea onde o olhar para o futuro será ditado pelas planilhas das grandes corporações.
As técnicas comerciais serão implantadas nos territórios a partir das empresas que trazem as normas globais através de seus braços institucionais (institutos e fundações) que cada vez mais transformarão as políticas culturais de Estado em suas próprias políticas de expansão.
Sem aceitar críticas o debate dentro do MinC perde intelectualmente e se joga no colo da financeirização cultural. Tudo, a partir de então, no universo cultural brasileiro é regido pelo reino do dinheiro.
Se a mosca azul picar a comunidade cultural, isso se tornará irreversível e o território brasileiro será contaminado pela lógica de uma cultura que não pertence a nenhuma nação, estado, cidade, grupo ou tribo, mas sim a um sistema econômico mundializado pelo neoliberalismo cultural.
Impressiona como vem se movendo o novo MinC. A dimensão da nova ideologia capitalista é bem maior do que imaginamos. A história presente do MinC nos leva a valorizar a cultura pelo lucro que ela pode gerar e todo o processo contraditório parece não estar sendo percebido pelo governo Dilma.
A ortodoxia neoliberal está na principal pauta da Ministra Ana de Hollanda e, assim, dia após dia e de variadas formas as partes de um único sistema vão se transformando em rito silencioso e tomando corpo.
O MinC hoje segue uma doutrina absolutamente capitalista de cultura, correndo o risco de se tornar uma religião cheia de mandamentos daí, planilhas, cálculos e técnicas vão se transformando num mantra conformista e toda a crítica intelectual sofre uma lavagem civilizatória ditada pelas grandes corporações – nações que comandam esse sistema.
Muito se diz em palestras e conferências de gestão corporativa que estamos atrasados na forma de exploração cultural, ou seja, o modelo inglês que está vindo por aí com o surgimento da Secretaria da Economia Criativa chegará numa velocidade assustadora para tirar o atraso detectado pelos cult-capitalistas.
Ou o governo Dilma toma uma medida contra essa política neoliberalizante ou a cultura brasileira sofrerá um revés histórico e inédito com consequências desastrosas já que envolverá agora todo o território nacional.
No estofo da prática de autocomiseração, Ana avança militarizando a cultura, alimentando os motores com o intuito de superaquecer a moeda cultural e dar oxigênio suficiente à fusão do MinC com os agentes corporativos, e o pior, com combustível público. O mercado-modelo que a Secretaria da Economia Criativa está impondo à cultura brasileira chegará às matrizes culturais das regiões mais remotas do Brasil e, depois, em erupção, esse vulcão capitalista não encontrará obstáculos capazes de frear seu apetite e, então, se juntará as outras formas de globalização cultural, consolidando-se em todo o território brasileiro.
O NOVO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA CRIATIVA GLOBALIZADA
Todas as regras do novo mercado cultural terão que ser cumpridas. Uma a uma, as regras do mecanismo mundializado pelas grandes siglas globais ditam como se tornar útil dentro da aldeia global da indústria criativa. Daí em diante, as referências, práticas, a planificação, a seqüência de determinada manifestação se torna dócil ao guia completo e, então, uma nova formatação hegemônica se transforma numa questão de prática.
O fundamental para a indústria criativa é a concepção, as idéias, os gráficos e glossários com referências aos exercícios, perguntas e estudos sobre como será abordado, desenrolado e utilizado de forma exaustiva o mecanismo para servir ao neoliberalismo cultural. Portanto, este novo guia a favor das políticas da indústria cultural e ou criativa que o MinC oficialmente adota, é um modo de o Brasil ter acesso a um canal estratégico desta indústria.
Isso, se não fere de morte a nossa soberania, aleija a criatividade espontânea, sincera e, sobretudo humana de nossa cultura. Tudo para mergulharmos de cabeça no balcão global e sermos concebidos nessa feira de negócios a partir das necessárias implantações das regras do mercado internacional.
Por isso, a distinção Arte Profissional – Arte Amadora está em alta nos folhetins corporativos. Na verdade, o que está em jogo é a cultura como produto e, para tanto, este produto precisa estar embalado, encaixotado, formatado para servir, como disse Milton Santos, às lógicas do globaritarismo.
junho 13, 2011
Tradição de ruptura por Angélica de Moraes, Istoé
Tradição de ruptura
Matéria de Angélica de Moraes originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 10 de junho de 2011.
Sob a batuta de curadora suíça, a Bienal de Veneza tem uma edição eurocêntrica. Entre os destaques, obra de norte-americanos faz alusão e crítica à cultura da guerra
54ª Bienal de Veneza – ILLUMInations/ Giardini e Arsenale, Veneza, Itália/ até 27/11
No topo absoluto do ranking dos grandes eventos de artes visuais, a Bienal de Veneza consegue, como o protagonista do livro “O Leopardo”, de Tomasi di Lampedusa, transformar-se para garantir que o poder continue em suas mãos. A 54ª Bienal, que abriu no sábado 4, é a pioneira e matriz de centenas de bienais ao redor do mundo. Esta edição, com mais de dez mil metros quadrados de área expositiva, reúne elenco recorde de 83 artistas na curadoria principal, a cargo da crítica suíça Bice Curigan, e 89 países participantes.
Em 2009, os países eram 77. Mais uma vez, são as representações nacionais que garantem algumas das melhores atrações.
Entre as imagens fortes desta edição está a performance de atletas olímpicos dos EUA em uma esteira ergométrica acoplada e sincronizada a um tanque de guerra. O tanque-aparelho de ginástica, signo do império da força e da competição (extensível ao supostamente pacífico mundo das artes), é uma das excelentes obras que compõem a representação oficial americana. A autoria é da dupla Allora & Calzadilla, eles próprios símbolos da realidade cultural mutante destes novos tempos: Guillermo Calzadilla é cubano naturalizado americano e Jennifer Allora é americana da Pensilvânia. Moram em Porto Rico.
Donos de um humor quase anárquico, a dupla Allora & Calzadilla apresenta pelo menos outra masterpiece: “Algoritmo”, máquina de autoatendimento bancário 24 horas acoplada a um órgão. A música soa quando o visitante insere seu cartão de crédito na máquina. Se o cartão for aceito, saca notas de dinheiro de verdade. Fina ironia à fé e à sacralidade do sistema capitalista.
O Brasil, que na edição passada (2009) teve presença de vários jovens talentos e a impactante instalação de fios dourados, “Ttéia”, de Lygia Pape em lugar de honra, desta vez está fora do radar da curadoria central, em evidente falta de sincronia com a realidade do circuito, que desde o final dos anos 90 vem destacando a produção brasileira. A suíça Bice Curiger fez uma curadoria eurocêntrica. Com algumas pitadas de especiarias politicamente corretas vindas da África e da Ásia. O pavilhão brasileiro trouxe a obra de Artur Barrio em excelente mostra que contextualiza a contribuição do artista desde suas famosas performances antiditadura dos anos 60 até uma instalação feita especificamente para a ocasião. Barrio, que acaba de ganhar o Prêmio Velázquez, um dos maiores do gênero no mundo, concedido pelo governo espanhol, está em plena forma. Extraiu linhas de força das caixas de luz do pavilhão para amarrar todo o espaço, em composição que celebra a penosa trajetória do artista até a iluminação, ou seja, a criação.
“ILLUMinations” (Iluminações) é o título da curadoria central da 54ª Bienal, fazendo um jogo de palavras com nações e iluminações, apostando na improvável reciclagem do papel de guia cultural que a Europa ocupou desde o chamado Século das Luzes (século XVIII). Enquanto os livros de história da arte são reescritos para incorporar a produção de outras culturas e latitudes, Bice Curiger parece nostálgica da Europa como umbigo do mundo.
O resultado desse iluminismo requentado oscila entre o ótimo e o péssimo. O conjunto qualitativamente mais coeso está concentrado no pavilhão La Biennale, com elenco capitaneado por insólito conjunto de telas do mestre veneziano Tintoretto (1518-1594). Felizmente, os artistas sobrevivem a qualquer tese curatorial e garantem a festa dos olhos: a suíça Pipilotti Rist, o alemão Sigmar Polke e a americana Cindy Sherman são fortes presenças. O inglês Nathaniel Mellors apresenta escultura de duas cabeças animatrônicas “conversando”. Um dispositivo servo computadorizado movimenta as cabeças e as expressões faciais de fisionomias moldadas em látex.
No Arsenale há o ótimo suíço Urs Fischer, mas o destaque absoluto é do americano Christian Marclay com o filme “The Clock” (O Relógio), com duração de 24 horas e resultado de uma incrível pesquisa nos arquivos da história do cinema. Marclay reúne passagens de filmes antigos e famosos em que há relógios em cena. O detalhe é que o horário do filme corresponde ao horário real e em ordem cronológica. A obra acabou garantindo a Marclay o Leão de Ouro de melhor artista da exposição. À 54ª Bienal de Veneza não faltam polêmicas nem boa arte, como sempre.
SOS-Museu da Imagem e do Som-SP por Lucia Santaella
SOS-Museu da Imagem e do Som-SP
LUCIA SANTAELLA
Leia também as matérias e respostas que compõem o Dossiê MIS e Paço das Artes: A morte anunciada de um modelo de gestão.
O caso do MIS-SP, caso de calamidade pública, é prototípico do modo como funciona o gerenciamento da cultura neste país, sempre subjugada às jogatinas de políticos obscurantistas. O caso é muito triste, sério e não pode ser calado.
Compreender a complexidade dos processos culturais e artísticos não é questão para leigos. Por isso mesmo é lamentável quando cabem a leigos cargos políticos de delegação cultural, como se a cultura e a arte fossem questões de somenos importância.
Desde o final do século XIX, acentuando-se cada vez mais no decorrer do século XX até atingir um ponto de mutação a partir dos anos 1990, a cultura e a arte foram se tornando fenômenos tão hipercomplexos quanto a física quântica e a biologia molecular.
Do século XIX para cá, já atravessamos cinco revoluções tecnológicas que têm afetado diretamente a produção cultural e artística: a revolução das tecnologias eletro-mecânicas (telégrafo, fotografia, a explosão do jornal e o cinema), a revolução das tecnologias eletro-eletrônicas (rádio e televisão), as tecnologias do disponível (controle remoto, vídeo cassete, xerox, TV a cabo etc.). Estas últimas são tecnologias que foram abrindo o caminho para a grande reviravolta propiciada pela crescente onipresença do computador. Este embaralhou todas as cartas das revoluções anteriores ao introduzir a cultura do acesso e a cultura da conexão contínua permitida pelos dispositivos móveis cada vez mais inteligentes e geolocalizados.
Diante dessa seqüência de revoluções é muito fácil constatar que aquilo que era chamado de Imagem e Som, nos anos 1970, quando ainda reinavam as tecnologias eletro-mecânicas e as eletro-eletrônicas, não é mais aquilo em que se transformaram a Imagem e o Som em plena efervescência da cultura do computador, genericamente chamada de cultura midiática ou novas mídias. De um mero mastigador de números, há algumas décadas, hoje o computador devora todas as linguagens -- palavras, imagens, sons -- e as devolve em misturas inconsúteis (milagre!) na sua forma original para o nosso deleite e transmissão para quaisquer paragens do mundo.
Ora, a arte sempre foi e continua sendo a grande sinalizadora das mutações nas linguagens humanas. Nenhum museu poderia e deveria estar mais sintonizado com essas mutações do que o Museu da Imagem e do Som. Em 2007, Daniela Bousso foi indicada para recolocar esse Museu nos trilhos do tempo, um trilho que havia sido perdido devido às típicas mazelas que afetam as instituições públicas deste nosso país em que o desmando costuma tomar o papel da lei. Ninguém mais equipado do que Daniela Bousso para assumir esse cargo, com uma carreira muitíssimo bem sucedida de curadoria internacionalmente sintonizada e com um doutorado especializado nas artes de ponta da contemporaneidade.
Eis que muda o governo do Estado, muda o Secretário da Cultura e um projeto admirável ainda em curso, deitando suas raízes, de restauração física, ideativa e artística do MIS-SP é violentamente arrancado, do mesmo modo com que, sem piedade, se arranca do solo uma planta em crescimento. Toda essa violência simbólica por quê? Pelo simples fato, sempre ocultado e ideologicamente naturalizado, de que neste país as instituições culturais e artísticas não gozam da mesma autonomia dos países civilizados e ficam à mercê da barbárie, dos humores quase sempre obscurantistas de políticos que, mal conhecendo o b-a-b-a da cultura e da arte, estão sumariamente ignorantes e cegos à sua hipercomplexidade contemporânea.
SOS, como se sabe, quer dizer socorro. A sociedade civil, representada por artistas, pesquisadores, críticos e professores da cultura e da arte, hoje em mais de mil assinaturas que correm pela internet, está pedindo socorro contra o desmantelamento do projeto MIS-SP, perpetrado pelas típicas jogadas políticas, desmantelamento de um projeto que tinha tudo para crescer, frutificar e dignificar a cidade e o Estado de São Paulo.
Lucia Santaella é coordenadora do mestrado e doutorado em Tecnologias da Inteligência e Design Digital e professora titular na pós-graduação em Comunicação e Semiótica-PUCSP.
Canal Contemporâneo recomenda:
Leia e participe do abaixo-assinado SOS MIS - Contra a intervenção do Governo do Estado de São Paulo no Museu da Imagem e do Som - MIS-SP no Petição Pública.
junho 8, 2011
Bambozzi: retrospectiva no México por Nina Gazire, Istoé
Bambozzi: retrospectiva no México
Matéria de Nina Gazire originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 4 de junho de 2011.
Lucas Bambozzi - O espaço entre nós e os outros/ Laboratório de Arte Alameda, Cidade do México/ até 12/6
Entre os artistas da geração formada na década de 1990, Lucas Bambozzi está entre os mais atuantes e influentes pesquisadores das possibilidades artísticas das novas mídias. Trabalhou com diferentes tipos de suportes, desde os mais tradicionais – como o cinema – até os mais recentes, como a robótica. Atualmente, realiza sua primeira retrospectiva internacional no Laboratório de Arte Alameda, localizado no centro histórico da Cidade do México. Com curadoria de Christine Mello, a mostra abarca 20 anos de sua carreira, com obras produzidas entre 1992 e 2011, sendo que 12 delas são instalações e oito são obras em vídeo e cinema. “O importante dentro da mostra é perceber como as poéticas dos trabalhos foram mudando ao longo dos anos”, afirma Christine Mello, que trabalhou na seleção das obras em conjunto com o artista.
Com o título de “O Espaço entre nós e os outros”, o eixo da seleção curatorial está nas relações de poder entre o macro e o micropolítico, questões predominantes da obra de Bambozzi. Para o artista, problemas como a sociedade de controle e as mudanças geopolíticas aceleradas pelos novos meios de comunicação são questões políticas que se dão em sociedade, mas que igualmente atingem o indivíduo em seus espaços mais íntimos. Pensando nisso, toda a exposição foi montada de acordo com as características particulares do local expositivo, já que o edifício foi construído em 1571 para abrigar um convento. Um exemplo é a obra “Pêndulo” (foto), que foi montada pela primeira vez no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo, em 2005. Na obra, um objeto suspenso em forma de pêndulo projeta imagens de acordo com os ruídos do ambiente. Mas, na Cidade do México, que foi fundada pelos astecas sobre um lago – e por isso está afundando –, o Pêndulo de Bambozzi se encontra torto. “Esse foi um tipo de equalização muito interessante, já que essa questão política e histórica acaba por ser incorporada ao trabalho. Por estar torto, ele se torna a medida dessa característica da cidade e provoca o público visitante”, explica Lucas Bambozzi, que desde janeiro mantém um blog com toda a documentação da montagem e atividades educativas da mostra.
Arte de preencher o vazio por Paula Alzugaray, Istoé
Arte de preencher o vazio
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 4 de junho de 2011.
Coleção de arte contemporânea peruana do Museo de Arte de Lima viaja pela primeira vez ao Exterior. Estação Pinacoteca recebe a mostra
Nos anos 1950, seduzidas pela mesma promessa modernizante que no Brasil erigiu Brasília, as populações rurais do Peru migraram para as cidades. Vinte anos depois, o êxodo massivo levou a capital Lima a viver a explosão da economia informal e ao surgimento de uma nova categoria de postos de trabalho, apelidada “al paso” (de passagem). Em 1980, o coletivo de arte E.P.S. Huayco realizou o projeto “Arte al paso”, promovendo uma arte para ser consumida na rua. Hoje, reconhecida como uma das manifestações mais marcantes da arte peruana da segunda metade do século 20, a ação “Arte al paso” dá nome à exposição de arte contemporânea do Museo de Arte de Lima (Mali), que chega à São Paulo.
Essa é a primeira vez que parte da coleção do Mali é exposta no exterior. Para esse importante evento, os curadores Tatiana Cuevas e Rodrigo Quijano trazem 100 trabalhos que ao longo dos últimos 40 anos têm refletido sobre a paisagem sociopolítica e a situação de precariedade institucional no Peru. Enquanto o E.P.S. Huayco buscava estabelecer outros circuitos para a veiculação da arte, artistas como Emilio Hernandez Saavedra denunciavam o vazio de instituições culturais. Seu projeto “El museo de arte borrado” aponta para a ausência de um museu de arte moderna, em 1970.
Dispostos a preencher o vazio, os artistas peruanos têm criado instituições fictícias. Sandra Gamarra inventou o “Museo Limac” (2002), para o qual montou um acervo e um espaço físico. Suzana Torres criou o “Museo neo Inka” (1999-2011), cujo objetivo institucional é promover a desmistificação da identidade nacional. Fernando Bryce instituiu a “Huaco TV” (2002), em que uma cópia de cerâmica pré-colombiana é gravada por câmera de vídeo e transmitida ao vivo.
Por todo o percurso da exposição, encontram-se sinais de uma cultura que busca repensar-se a si mesma, considerando as relações entre um passado recente de violência política e militar e os efeitos de uma promessa de modernização. Em “Katatay (Temblar)”, Alfredo Márquez denuncia a ideia do atraso cultural, a que os países latino-americanos são frequentemente associados pela cultura européia. “Se eu dissesse que a América Latina sofreu a síndrome-da-modernidade-atrasada, eu estaria estimulando um terrível erro conceitual”, declarou o artista Armando Andrade Tudela quando expôs na 27ª Bienal de São Paulo, em 2006.
junho 7, 2011
Nem hoje nem amanhã? por Italo Nogueira, Folha de S. Paulo
Nem hoje nem amanhã?
Matéria de Italo Nogueira originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 6 de junho de 2011.
Estimativa de custo para a construção do Museu do Amanhã, no Rio, triplica em um ano e pode chegar a R$ 200 milhões
A estimativa de custo para a construção do Museu do Amanhã, projetado pelo arquiteto espanhol Santiago Calatrava, triplicou em apenas um ano.
O imóvel, a ser erguido na região portuária do Rio, é considerado a "âncora" da revitalização da área, prometida ao COI (Comitê Olímpico Internacional).
Em audiência pública na Câmara dos Vereadores, o secretário municipal de Obras, Alexandre Pinto, disse que a construção do imóvel, ainda não licitada, está estimada em R$ 200 milhões.
Quando o projeto foi apresentado, em fevereiro do ano passado, o ex-secretário de Desenvolvimento Econômico, Felipe Góes, havia dito que o teto imposto pelo prefeito Eduardo Paes para a obra era de R$ 65 milhões -excluídos gastos no entorno da área escolhida.
Paes temia que o projeto repetisse a construção da Cidade da Música, na Barra da Tijuca (zona oeste), cuja obra iniciou sem estimativa de custo definida e vai consumir mais de R$ 500 milhões.
Meses após o lançamento, foi divulgado que o custo do projeto do Museu do Amanhã seria R$ 130 milhões.
O valor inclui, além da obra em si, R$ 29,6 milhões pela elaboração do projeto e organização do acervo, feito pela Fundação Roberto Marinho, e R$ 22,3 milhões referente ao reforço estrutural e execução das fundações do píer onde ficará o museu.
A construção do imóvel, assim, passaria a custar R$ 78,1 milhões.
Mas, segundo Pinto, o custo pode subir em razão da cobertura metálica do edifício projetado por Calatrava.
Servidores foram a Milwaukee (EUA) para analisar o museu de arte da cidade, também projetado por Calatrava e com estrutura semelhante ao museu carioca.
"Descobriram que a cobertura foi trazida da Espanha de avião. Foi montada e testada na Espanha, colocada num avião e levada para lá [Milwaukee]. Mas o museu foi construído com recursos privados e públicos. Foi uma operação de alto custo", disse Pinto.
O edital de licitação da obra já está atrasado. A intenção inicial de Paes era fazer do Museu do Amanhã sede do encontro Rio +20, em 2012. Mas o secretário de Obras considera difícil a conclusão antes de 2013.
A Secretaria de Obras disse "que o custo para a execução do Museu do Amanhã ainda não está fechado".
Afirmou que estão sendo buscadas "soluções técnicas para viabilizar o projeto, que possui uma série de especificidades".
Choque de gestão por Morris Kachani, Folha de S. Paulo
Choque de gestão
Matéria de Morris Kachani originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 5 de junho de 2011.
Leia também as matérias e respostas que compõem o Dossiê MIS e Paço das Artes: A morte anunciada de um modelo de gestão.
André Sturm assume a direção do MIS e busca atrair mais público ao redefinir o foco da instituição
A recente indicação de André Sturm, ex-dono do Cine Belas Artes, para a direção do Museu da Imagem e do Som (MIS) de São Paulo trouxe à tona um questionamento sobre o foco da instituição.
A gestão anterior, apoiada por artistas como Regina Silveira e acadêmicos como Lucia Santaella (da PUC-SP), defendia uma reinvenção do museu com base na emergência das novas mídias tecnológicas, encorajando a experimentação em vários suportes e linguagens.
Em outras palavras, pesquisa e arte conceitual. "O MIS sempre foi associado à vanguarda. E vanguarda hoje é pesquisar todas as linguagens depois do computador", diz Santaella.
Andrea Matarazzo, secretário de Cultura, pensa diferente: "O MIS não pode ser tão hermético. Não se pode usar a verba de R$ 9 milhões para um público de só 80 mil pessoas, como em 2010".
Assim, indicou Sturm ao conselho da organização social, entidade sem fins lucrativos contratada pela secretaria para administrar o MIS.
A escolha de Sturm causou indignação e, semana passada, circulava uma petição pública somando quase mil assinaturas que falava em ingerência do governo e tentativa de transformar o MIS em "museu da televisão".
Sturm é figura conhecida entre os ativistas culturais ligados ao cinema. Pioneiro na distribuição de filmes independentes, trouxe nos anos 90 obras de diretores até então desconhecidos, como Krzysztof Kieslowski e Theo Angelopoulos.
Mais recentemente, esteve na unidade de Fomento e Difusão da Produção Cultural da Secretaria de Estado da Cultura, tendo se tornado praticamente um braço direito do ex-secretário João Sayad e do atual. Ele falou à Folha sobre seus planos.
Folha - O que pretende fazer à frente do MIS?
André Sturm - Oferecer programação de qualidade com muita gente interessada. Essa é a função do artista e do gestor cultural: tirar o que é bom do gueto. Fazer show da Ivete Sangalo e encher é fácil. O que sempre me orgulhou foi lançar um filme chinês como "2046" e deixá-lo um ano em cartaz.
O que acha das diretrizes da antiga gestão do museu?
O museu tem muito espaço e muitas possibilidades que não vinham sendo usadas. O trabalho anterior é de qualidade, mas muito restrito. Quantas pessoas se interessam por isso? Qual a repercussão social? Pretendo manter essa linha de novas mídias, mas quero fazer outras coisas também.
Como, se houve um corte de 25% da verba aproximadamente, de 2010 para 2011?
Vai ter que rever, eventualmente corrigir algumas questões. A missão é preservar o que existe e apontar para a frente. Só não dá para ficar apenas na vanguarda pela vanguarda, acho meio vazio.
Dê um exemplo.
Ontem fui dar uma volta completa no museu. Visitei o tal do LabMIS, que eu não sabia o que significava. Quando perguntei, me responderam: "É um conceito".
E o que é?
Trata-se de uma residência para quatro pessoas ficarem ali por três meses. Não tenho nada contra. Mas por que não receber 2.000 pessoas para fazer uso daqueles equipamentos maravilhosos em aulas e oficinas?
Há ilha de edição, computadores incríveis, softwares de animação, estúdio. Um projeto que pretendo realizar é um festival de videoclipes que não foram para a MTV. Vai ter de tudo. Som contemporâneo, comum...
E fotografia?
Não sou profundo conhecedor, mas é uma área que adoro. Pretendo dar muita visibilidade ao acervo e abrir o MIS para exposições.
E na área de cinema?
Festivais como É Tudo Verdade e a Mostra de Cinema devem ampliar sua participação. Apoiaremos os programas do governo. E pretendo exibir filmes mudos com música ao vivo no MIS.
Você é dono de uma distribuidora e produtora de filmes, e tinha salas de cinema. Não há conflito de interesses?
O Gil era ministro da Cultura e tinha uma empresa que se beneficiava da Lei Rouanet. É só um exemplo, não estou criticando ninguém. Meus negócios recuaram muito desde que entrei na secretaria. Não concorri em editais e só distribuí filmes sem relação com a secretaria. É um preço a pagar.
Você enxerga ingerência do governo em sua nomeação?
Não. Acho que é função do Estado estabelecer políticas e metas. Cabe à OS administrar e dar andamento a isso.
junho 2, 2011
Tempo de telas múltiplas por Paula Alzugaray, Istoé
Tempo de telas múltiplas
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 27 de maio de 2011.
Cultura da instantaneidade é celebrada e discutida em exposição que acontece simultaneamente em museu e na web
O fenômeno das salas multiplex, que nos anos 90 mudou a cara dos circuitos de cinema, foi um sinal dos tempos.
Hoje trabalhamos e nos divertimos com múltiplas telas abertas. “Tudo ao mesmo tempo, agora” é a palavra de ordem. Celebrar e questionar os efeitos de uma vida regida pelo imediatismo é o intuito do projeto “Agora/Ágora”, que acontece simultaneamente no Santander Cultural, em Porto Alegre, e na web.
Na exposição, a cultura da instantaneidade e da velocidade é particularmente bem interpretada pelos trabalhos que se utilizam das linguagens do vídeo e do cinema. Na entrada, a instalação “SuperCinema”, do artista baiano Rommulo Vieira Conceição, promove a sobreposição de dois espaços da vida cotidiana: o cinema e o supermercado. Isso significa que o público poderá consumir os produtos das gôndolas enquanto assiste a uma programação que inclui cults e blockbustes, como “Chinatown”, “Avatar” e “A Era do Gelo 3”. “O que diferencia um blockbusters de uma caixa de sucrilhos?”, pergunta a curadora Angélica de Moraes. “Queremos promover esse tipo de discussão, ocupando um espaço que é uma instituição financeira, que transaciona valores.”
O cinema é também a forma escolhida por Giselle Beiguelman, Wagner Morales, Perry Bard, Raquel Kogan e Lea van Steen para discurtir as descontinuidades da vida contemporânea. Em “Cinema Lascado”, Giselle documenta a paisagem fraturada de São Paulo. Em “Mamãe, Papai, Eu Sou...”, Wagner Morales aborda a identidade híbrida de uma família de coreanos. Mesmo a escultura “Túnel”, da dupla Rejane Cantoni e Leonardo Crescenti, promove as duplicidades e fantasmagorias próprias do cinema.
Embora o cinema se preste bem a essa discussão, a pintura, a escultura e a fotografia também se mostram, em “Agora/ Ágora”, linguagens híbridas e “fraturadas”. A pintura do artista gaúcho Frantz, por exemplo. Embora não seja “imediatista”, pode ser vista como resultado de um processo coletivo, em rede. “Frantz é um pintor que não pinta, mas se apropria dos resíduos da pintura de outros artistas”, explica Angélica de Moraes. Suas telas, antes de irem para as paredes, forravam o chão de ateliês de outros pintores. Ao dissociar seu processo pictórico das qualidades de manualidade e intensionalidade, Frantz dá à sua pintura um caráter conceitual e eminentemente atual.
A obra da artista nova-iorquina Perry Bard faz a ponte entre o espaço expositivo e o espaço web. Em “Um Homem com uma Câmera”, Perry convocou dezenas de artistas de todo o mundo a recriar o clássico de Dziga Vertov, de 1929. Os remakes podem ser acessados no site do projeto dziga.perrybard.net. Já o site da exposição (www.agora.art.br) oferece acesso a dez projetos de tecnologia social e artivismo, temas urgentes para se inteirar das ações colaborativas que proliferam na web.
Artur Barrio reflete sobre comunicação na Bienal de Veneza por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo
Artur Barrio reflete sobre comunicação na Bienal de Veneza
Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 2 de junho de 2011.
Artista de obra hermética e avesso a lobbies se define como "patinho feio" da exposição, que começa no sábado
Edição da mostra, com curadoria Bice Curiger, tem apenas 5% de participação de artistas latino-americanos
A presença de Artur Barrio, o representante brasileiro na 54ª Bienal de Veneza, é bastante improvável, especialmente numa mostra de caráter espetacular como a italiana.
Sua obra complexa e um tanto hermética, com frases incompletas e cabeças de peixe envolvidas em sal, fez com que vários visitantes torcessem o nariz, na abertura para a imprensa, anteontem.
"Eu sou o patinho feio", disse Barrio à Folha, perto de um dos canais que transpassa os Giardini, local onde está o pavilhão do Brasil.
O artista diz isso por estar entre os 5% de latino-americanos da mostra central, com curadoria de Bice Curiger, centrada em artistas norte-americanos e europeus.
Mas "patinho feio" é também uma boa definição para o artista, avesso a lobbies ou concessões.
Mesmo assim, ele já participou até da Documenta de Kassel, o Olimpo das artes plásticas, em 2002, onde chegou a criticar os próprios curadores do evento em sua sala, repleta de pó de café e paredes quebradas, escrevendo: "A curadoria é um mal desnecessário".
Outro fator que o torna único é que ele mesmo nunca sabe o que vai fazer até chegar ao local.
"Quando cheguei aqui, o produtor perguntou o que ele devia comprar, e eu disse que não sabia. O cara ficou preocupado, então eu falei para ele comprar uns barbantes", diz Barrio.
DIÁLOGO E MONÓLOGO
Agora, em Veneza, ele ocupa as duas salas do pavilhão brasileiro, uma com trabalhos históricos, com curadoria de Agnaldo Farias e Moacir dos Anjos, e outra com uma nova obra.
Nesta, criou dois espaços: a sala do diálogo e a sala do monólogo. "Vivemos uma era humana e desumana, na qual se pode comunicar de muitas formas, mas há pouca comunicação efetiva", diz.
Seu manifesto agora é "A sua pressa não é a minha pressa", que escreveu numa das paredes.
Na sala histórica, um tanto inadequada por seu caráter hiperinstitucional frente a um artista tão informal, estão fotos das trouxas ensanguentandas espalhadas num parque em Belo Horizonte, em 1970, que o caracterizaram como artista militante.
"Minha ideia nunca foi só política, nesse mesmo trabalho é possível ver outras relações com a própria história da arte", diz.
O atraso para a liberação da verba para seu trabalho, disponibilizada apenas na quarta da semana passada pelo Ministério da Cultura, não comprometeu o trabalho, mas ele levou a tensão que passou para o nome da obra, "Ex(tensões)...".
É nessa sala, em que ele recebe hoje a ministra da Cultura da Espanha, por conta do prêmio Velázquez, com o qual foi agraciado recentemente e pelo qual vai receber 120 mil euros. "Essa foi outra surpresa, jamais imaginei", diz, ainda vivendo seu momento de cisne branco.
Secretaria diz que MIS é "equipamento" do governo de SP por Claudio Leal e Marcela Rocha, Terra Magazine
Secretaria diz que MIS é "equipamento" do governo de SP
Matéria de Claudio Leal e Marcela Rocha originalmente publicada no Cultura do Terra Magazine em 1 de junho de 2011.
Leia também as matérias e respostas que compõem o Dossiê MIS e Paço das Artes: A morte anunciada de um modelo de gestão.
Questionada sobre as críticas da diretora Daniela Bousso à troca de comando no Museu da Imagem e do Som (MIS) de São Paulo, a Secretaria da Cultura garante que vai dar "continuidade" à gestão anterior, mas que trabalhará "mais a fotografia e o cinema em todos os multimeios". Administrado por uma organização social (OS), o MIS é considerado um "equipamento" estatal pelo secretário Andrea Matarazzo:
- O Museu da Imagem e do Som (MIS) é um equipamento do Governo do Estado de São Paulo, mantido com recursos públicos. Uma das missões da Secretaria de Estado da Cultura é assegurar uma administração organizada, transparente e que, fundamentalmente, resulte em serviços de qualidade aos cidadãos. - diz a nota enviada a Terra Magazine.
E prossegue:
- O objetivo da mudança da administração do MIS é dar continuidade ao trabalho realizado até agora, seguir investindo em novas mídias e, ao mesmo tempo, ampliar o foco de atuação do museu para atingir todas as possibilidades artísticas em imagem e som, trabalhando mais a fotografia e o cinema em todos os multimeios. Outra meta é levar o acervo do museu ao maior número de pessoas, por meio da integração com instituições no interior do Estado.
Em entrevista exclusiva a Terra Magazine, Daniela Bousso criticou as pressões sobre o museu, relatou que o governo não quis negociar e rebateu as críticas do secretário da Cultura. "Matarazzo está equivocado e promove um retrocesso de 30 anos ao querer que o MIS se volte somente para a fotografia e o cinema", cravou.
Matarazzo articulou a troca de comando do MIS e indicou o ex-proprietário do Cine Belas Artes, André Sturm, para ocupar o cargo de diretor-executivo. O conselho administrativo da organização social que cuida da gestão do MIS referendou a escolha de Sturm nesta segunda-feira (30). Os críticos da mudança consideram-na uma intervenção política no museu.
Em declarações à Folha de S.Paulo, Matarazzo revelou seu desejo de ver o museu se concentrar na fotografia e no cinema, além de ampliar seu público. "O MIS precisa dar um salto, não pode ser tão hermético. Não se pode pôr R$ 12 milhões por ano para um público de apenas 80 mil pessoas", asseverou.
Com mais de 800 assinaturas, um abaixo-assinado contra a "intervenção" no MIS circula na internet e será enviado ao governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Nos últimos anos, o MIS se voltou para a interação das mídias digitais com as artes. Agora, como determinou Matarazzo, ele deve se voltar "às suas origens".
Daniela Bousso questionou a formação técnica de André Sturm para sucedê-la no cargo. "O que diz ao conselho quando lhe perguntam como trabalhará no MIS, se não entende de artes nem de novas mídias? Ele responde que contratará pessoas. Outra conversa pra boi dormir. Com que critério ele contratará, se ele não entende de arte contemporânea e novas mídias?", atacou.
Abaixo-assinado SOS MIS: Comentários
Leia os comentários abaixo e veja a lista das primeiras 1.000 assinaturas em ordem alfabética, juntamente com o texto do abaixo-assinado. Para aderir, assine online no Petição Pública (depois confirme clicando na mensagem que lhe será enviada na sua caixa postal).
Leia também as matérias e respostas que compõem o Dossiê MIS e Paço das Artes: A morte anunciada de um modelo de gestão.
Adenilza Pereira da Silva;Osasco/SP;Boa Sorte e pode contar comigo
Adriana Matos Alves Duarte;São Paulo/SP;Daqui a pouco o governo vai querer intervir na minha, na sua ,na nossa Casa também.
Adriana Varella;New York/EUA;"Essas sao uma das razoes que sai do Brazil, nao ter espaco para experimentacao, risco e novas ideias...Isso e um absurdo a Daniella e uma das poucas pessoas no Brasil que apostam no novo e experimental...Ela ja faz isso a anos....Eu nao sei o que vai ser da cultura Brasileira com este tipo de mentalidade...temos que nos organizar e agir contra esta intervencao burra e autoritaria. ""SO TEM PODER AQUILO QUE AGENTE FAZ TER PODER""nos artistas temos que colocar este politicos oportunistas e desnecessarios para fora...."
Alexandra Gabriela da Rocha;São Paulo/SP;Chega de censura e autoritarismo. Abaixo a ditadura!
Ana Carolina Teixeira Chinen;São Paulo/SP;concordo plenamente com o que foi escrito no documento contra a intervenção do Governo do Estado
Ana Cordeiro;São Paulo/SP;Este espaço deve ser preservado com o atual nível internacional. Este cartão de visitas de SP deve continuar.
Ana Paula da Silva;Santos/SP;pense em seu próximo passo, sr governador: público inteligente também vota.
Anaisa Franco Nascimento;São Paulo/SP;é um absurdo tudo isto que esta acontecendo com o MIS. O LabMIS era o unico laboratório de criação do segmento das artes e tecnologia. Fotografia e cinema ja estão bastante disseminado em varias instituições. O que necessitamos é a abertura de novos centros de criação de arte e nao o encerramento dos mesmos. O encerramento do MIS vai prejudicar muito toda uma nova geração de artistas que estavam sendo formados em São Paulo/SP pelo LabMIS e pela Daniela Bousso.
Anderson Ferracini Gomes da Silva;Rio de Janeiro/RJ;tamanha falta de respeito com o publico e contribuintes não podem ficar impune.
André de Souza Parente;Rio de Janeiro/RJ;O Museu da Imagem e do Som d São Paulo é um espaço estratégico e de excelência no campo ampliado do cinema, das novas mídias e da arte contemporânea.
André Leal;São Paulo/SP;Gostaria de afirmar que não sou favorável à A garantia de autonomia para as Organizações Sociais de Cultura, condição básica para o funcionamento deste modelo compartilhado de gestão que visa preservar a estabilidade de nossas instituições culturais, porém neste caso considero a intervenção muito perigosa
Andreia Machado Oliveira;Porto Alegre/RS;concordo com o abaixo assinado
Angelica Neumaier;Criciúma/SC;o MIS sempre primou pelos melhores eventos e exposições de arte contemporanea e digital, precisamos preservar esta administração na pessoa de Daniela Buosso.
Anna Maria de Carvalho Barros;São Paulo/SP;contra intervenção do governo em território livre da arte
Antonio Monteiro de Barros Sobral;São Paulo/SP;que absurdo!!!! o MIS é altamente relevante no cenario institucional de arte contemporanea no Brasil, que já é mais do que atrasado e famigerado
Aparecido Araujo Lima;São Paulo/SP;Sou frequentador do MIS desde a década, nos últimos 20 anos está decadente, por conta da administração dos tucanos
Bernardo Domingos de Almeida;Rio de Janeiro/RJ;Basta um leve olhar sobre as atividades recentes do MIS-SP para ter noção do sucesso da atual gestão, principalmente em comparação com o antigo MIS.
Betty Leirner;São Paulo/SP;exmo.governador alckminapoio e assino esta peticao publica contra esta intervencao de cunho politico na gestao de cunho artistico do MIS-SP
Caetano Dias;Salvador/BA;Governador Geraldo Alckmin, o MIS hoje é a vanguarda do cinema, das artes visuais e da cultura digital em São Paulo e no Brasil. Impeça a desastrosa tentativa de golpe que o atual secretário de cultura tenta aplicar na comunidade artística contemporânea brasileira! Não ao retrocesso!
Carlos Alberto Aguilar;São Paulo/SP;Frequento o MIS desde 1975, gosto da sua forma alternativa de programação, fugindo co convencional, e acredito que não é a quantidade de público que irá determinar a qualidade da intenção deste Museu.
Carolina Caldeira Felix;São Paulo/SP;A sociedade sem arte é uma sociedade morta.
Cleber Tavano;São Paulo/SP;Um Museu não é uma indústria, em que sua produção possa ser medida por números. Uma exposição ser 'cheia' ou 'vazia' nunca deveria ser parâmetro de comparação entre instituições e muito menos desculpa para destituir do MIS quem o trouxe de volta à vida. Pela continuidade do Museu como espaço para as tendências mais recentes em arte, pela manutenção do Curso de História da Arte com sua visão híbrida e anti-elitista de Arte, e principalmente pela manutenção das Residências do LABMis que tem papel fundamental no fomento à arte contemporânea brasileira.
Clelia Ferraz Pereira de Queiroz;São Paulo/SP;em 1986 fizemos um abaixo assinadao em 1998 novamente conseguimos evitar, porém em 2002 em diante ficou mais difícil
Clodualdo de Oliveira Lima;Aracaju/SE;Se não empregais os vossos olhos para ver, ireis necessitá-los para chorar.J.Sartre.
Daisy Grisolia;São Paulo/SP;Sou a favor de todas as OS e contra a irracional caça às bruxas que vem se fazendo contra elas. OSs são a forma de garantir gestão inteligente onde o estado já fracassou faz tempo!
Daniela labra;Rio de Janeiro/RJ;a manipulaçao da cultura pela politica é um mal deste país para a area...
Denise Carvalho;Rio de Janeiro/RJ;Acho que e importante para as artes que se mantenham atraves de uma forma livre de articulacao de vanguarda para que as artes continuem nas maos de artistas, e nao de burocratas
Denise Mendes;São Paulo/SP;acompanho com muita tristeza o que está acontecendo com o projeto inovador do MIS
Dr. Michael Hohl;London/UK;It would be a big mistake to change such a world-class institution.
Edgard Antonio Dos Santos;São Paulo/SP;Absurdo as atitudes catastroficas deste paìs!!! sempre o poder em primeiro plano!!!
Edson chocolate;Santo André/SP;Sou contra a intervenção do estado no museu
Edson Luiz Marques;Recife/PE;Sou artista plástico,
Eduardo Cerqueira Roberto;Sorocaba/SP;Acho realmente um absurdo o quie estão fazendo e como frequentador do MIS e amante da cultura, estou decepcionado com o governo estadual.
Eduardo Luis de Oliveira Lopes;Brasília/DF;Adoro Sao Paulo, e quando morei ai, na decada de 90, o MIS era um dos meus lugares prediletos!!
Eduardo M. Oliveira;São Paulo/SP;O melhor museu diferenciado voltados para formas vanguardistas do uso de novas linguagens e tecnologias nas artes, acho muito triste este conceito acabar.
Eligilvan manoel dos santos;Pombos/PE;Pra Frente
Elsio Ferrari;Ribeirão Preto/SP;Descaso com a cultura no Brasil é comum, mas temos de dar um basta nisso. viva a liberdade!
Florival Oliveira Carvalho Filho;Riachão do Jacuípe/BA;Indiscutiveis ações de retrocesso.
Frank Roy Cintra Ferreira;São Paulo/SP;Pela democratização da cultura, pelo livre acesso à obra de arte para uso sem fins lucrativos, pelo fim do empreguismo, do aparelhismo e do fisiologismo disfarçados de eficiência administrativa
Genilson Soares da Silva;São Paulo/SP;Não há o que comentar. Todos nós sabemos o que passa na cabeçinha dos arautos templários.
Graziela Kunsch;São Paulo/SP;confesso que até hoje não sei ao certo como funcionam as OS e não posso dizer se tenho acordo com essa forma de gestão mas seguramente defendo um MIS aberto a experimentações as mais diversas no campo audiovisual e não pautado para número de visitantes e/ou projetos relacionados a grande mídia. é revoltante a presença de Andrea Matarazzo na Cultura, assim como foi revoltante a sua administração como secretário de Serviços e Obras (marcada por ações contra trabalhadores ambulantes, pessoas em situação de rua e uso de dinheiro público em obras como a reforma da rua oscar freire).
Guilherme Aguiar Schmidt;Pindamonhangaba/SP;matando a cultura dos nossos dias pra embolsar algum dinheiro com nada?
Haroldo Cunha Lourenção;São Paulo/SP;porque sempre que tem algo da Cultura de São Paulo que funciona de verdade o govêrno quer fechar?
Heberard de Souza Alves;São Paulo/SP;Acho que nossos governantes estao esquecendo qua a cultura antigamente fez muito por esse pais e ficou na história, e hoje nossos politicos só pensam no dinheiro.
Heidi Kumao;Ann Arbor, Michigan/EUA;This is one of the best museums in Brazil. I was honored in 1999 to show my work there and think that it is a very important venue for cutting edge work using the most contemporary art forms, technology and the fusion of image and sound.
Iêda Topanotti Teixeira;Criciúma/SC;Opatrimônio público é do povo,da cidade,do paìs...enfim,da humanidade.Um governo, é passageiro,a cultura não
Israel de Azevedo Lira;Recife/PE;Tamos Juntos
Jandira de Barros Saraiva;Recife/PE;os absurdos do Brasil !
João Marcelo Lima Simões;São Paulo/SP;Mais cultura e menos politicagem.
José Dario Vargas Parra;São Paulo/SP;pela cultura
Jose Eduardo do Nascimento Fernandes;São Paulo/SP;O Museu da Imagem e do Som esta fazendo um trabalho EXCELENTE que é fundamental para nossa cidade. estimular midias e expressões que vão na contra mão de veiculos que massificam nossos pensamentos e expressões . Isso cria dignidade, liberdade e auto estima em nossa comunidade
José Guedes;Fortaleza/CE;É inacreditável que postura tão retrógrada venha de um secretário de um estado como São Paulo. É lamentável!
Jose Renato Bergo G. Pinto;São Paulo/SP;Estamos cansados de falácia política! MAIS TÉCNICOS e MENOS POLITICOS!!!
Juliana Teixeira Nicolela;São Paulo/SP;O MIS renasceu das cinzas sob a atual diretoria, e acho absolutamente incompreensível essa nova direção que o senhor governador pretende dar. Sou uma das (felizes) frequentadoras deste museu, além de já ter exposto nele tanto antes quanto depois da reforma, e a diferença é gritante. Agora o museu tem uma identidade e projeto claros, tanto nas exposições quanto na parte educativa, e que atendem a uma carência enorme. É o único espaço de São Paulo que se dedica sistematicamente à arte do audiovisual e novas mídias. Mesmo que mudanças sejam necessárias, essa intervenção é um equívoco e um engodo..
Leandro Benedito Kespers;Mogi das Cruzes/SP;REVOLTANTE! REVOLTANTE! REVOLTANTE!
Leonor de Souza Azevedo;Rio de Janeiro/RJ;apoio integralmente a luta por liberdade - sempre
Lidia Yogui;São Paulo/SP;participo da atividades do Mis desde a sua reabertura e presencio desde então sua excelência administrativa e qualidade das ativdades
Lilian Moraes;São Paulo/SP;Que a OS seja respeitada! Ela trouxe muito sucesso ao MIS!
Luana Pereira Saggioro;São Paulo/SP;Lugar para Arte sempre falta, uma a menos é uma grande perda para todos.
Lucas Bambozzi;São Paulo/SP;Os argumentos apontados pelo Governador e Secretario de Cultura são falhos e fracos. A perspectiva para um museiu como o MIS deve levar em conta nao os meios existentes há 20 anos atrás, mas a intersecção entre áreas, o surgimento de novas mídias e um constante posicionamento crítico com relação ao uso das tecnologias.
Luis Andrade;Rio de Janeiro/RJ;Petição pública existe para atender ao público, que não pode ser privado... depois conversamos sobre ideologias...
M Beatriz G de Souza Dias;São Paulo/SP;O MIS está melhor do que jamais esteve. Acho lamentável que politicagens acabem com o excelente trabalho que vem sendo feito.
Maida Withers;Washington/EUA;Please do not disturb the MIS museum. It is an amazing testimony to the future generations. This museum is on the forefront of museums. Do not make the mistake of changing it now.
Marcos Kaiser Mori;São Paulo/SP;sem comentários, PSDB...
Margarita Schultz;Buenos Aires/Argentina;He conocido el MIS.SP y evaluado positivamente toda su labor cultural.
Maria Ap. Klinkerfus Bueno;Bragança Paulista/SP;Infelizmente todos os Museus carecem de apoio tanto a nível federal, estadual e municipal.
Mariane Cavalheiro;São Paulo/SP;É de grande importância o papel que o Museu de Imagem e Som vem buscando no circuito do Áudio Visual. O Museu vivia em completo abandono, a diretora Daniela Bousso trouxe a perspectiva de um museu ativo e de conectividade com o mundo. Sou professora e hoje busco no MIS a minha linha de pesquisa recebendo total apoio desta instituição que gera cursos de alto nível, além de proporcionar laboratórios e uma equipe excelente, preparada para uma geração que busca estar antenado com o resto do mundo.
Marina Reis Correa;São Paulo/SP;que governo é esse??????!!!!!!!!!!
Marta de Oliveira Fonterrada;Carapicuíba/SP;mais essa PSDB? Já foram os Teatros, a ULM, A TV Cultura e agora o MIS? A idéia é sucatear tudo?????
Marta Regina Rodrigues;São Paulo/SP;O MIS precisa continuar a ser um espaço de Vanguarda, um espaço de discussão e reflexão das novas mídias da arte contemporânea
Natercia Pacheco;Porto/Portugal;Vivo em Portugal, mas apoio inteiramente
Neusa Maria Mendes;Vitória/ES;Desrespeito do poder público, Desconhecimento das conquistas sobre os novos modelos de gestão,Retrocesso do conceito de cultura
Olívio Mendes Júnior;São Paulo/SP;A cultura deve ser fluir a todos, e não sofrer intervenções políticas de qualquer ordem.
Paula Alzugaray van Steen;São Paulo/SP;Os universos da cultura digital e da arte contemporânea são perfeitamente contempláveis sob a tipologia imagem e som. Cinema e fotografia, entendidos pelo secretário como a vocação original e tradiconal do museu, continuam sendo centrais no projeto de ponta do MIS, perfeitamente adequado ao contexto de uma cidade referencial como São Paulo.
Paula Priscila Braga;São Paulo/SP;Grandes exposições foram organizadas pelo MIS nos últimos anos, como Pippilotti Rist ou a recente Perceptum Mutantis. Que a nova diretoria ao menos preserve o espaço de exposição para arte e não para recortes de jornal.
Pedro da Mata Machado;Rio de Janeiro/RJ;contra a vã guarda-tradicional metropolitana
Raquel fonseca;Santa Maria/RS;chamo a atenção pelo descaso pela cultura /Não ao fechamento do MIS.
Renato Coppe;Rio de Janeiro/RJ;Lamento seriamente que as assim chamadas Políticas Públicas não correspondam nem mesmo sigam parâmetros necessáriamente fundamentais para uma diversidade cultural, quanto mais para uma significativa mudança de parâmetros para uma óbvia, necessária e abrangente educação do ponto de vista e além da visão de cultura neste nosso mau educado Brasil.
Rodolpho Ruffino de Souza Junior;São Paulo/SP;A vocação do MIS so pode ser definida por artistas e críticos. A missão do Estado no que diz respeito à cultura deve ser garantir que cada um dos seus equipamentos culturais possam efetivar a sua própria e específica missão. r
Ronaldo Ribeiro da Silva;Riacho Fundo/DF;O secretário de cultura é uma cavalgadura tradicionalista.
Rosangela da Silva Leote;São Paulo/SP;A cultura se faz surgir por si só. O papel do governo é apoiar as emergências, e não imputar procedimentos e demandas.
Sérgio Baptista;São Paulo/SP;Temos que impedir o desmonte da Cultura em todas as frentes!
Sheila Canevacci Ribeiro;São Paulo/SP;A mentalidade atual do MIS é de extrema importância para a sensibilização estética sobre o estar no mundo hoje. Inclusive para o entendimento dos governantes. Governantes, atualizem-se.
Simone Alves de Carvalho;São Paulo/SP;Prover o povo com cultura é obrigação de um governo que se pretende democrático.
Thais Juliana de Barros;São Paulo/SP;Sou contra o fechamento de qualquer Museu!
Valdenio Jose da Silva;São Paulo/SP;Chega desse PSDB!
Viviane de Oliveira Souza Gerardi;São Paulo/SP;Simplesmente um absurdo!!!
Wallace Roy Málaga;São Paulo/SP;MIS = MUSEU + IMAGEM (-SOM) = ?
Yiftah Peled;Florianópolis/SC;Eu só contra a intervenção do Governo.
Para aderir, assine online no Petição Pública (depois confirme clicando na mensagem que lhe será enviada na sua caixa postal).
junho 1, 2011
As polêmicas mudanças no MIS-SP, falacultura.com
As polêmicas mudanças no MIS-SP
Matéria originalmente publicada no falacultura.com em 31 de maioo de 2011.
Leia também as matérias e respostas que compõem o Dossiê MIS e Paço das Artes: A morte anunciada de um modelo de gestão.
Governo do Estado decide alterar a linha adotada pelo Museu, usando como medida de qualidade a quantidade de frequentadores. André Sturm, do Cine Belas Artes, é nomeado diretor. A mudança causa revolta.
O Museu da Imagem do Som, em São Paulo, está passando por dias atribulados. Há certo tempo, o secretário de Estado da Cultura, Andrea Matarazzo, já dava sinais claros de que deseja mudar os rumos da instituição. O Governo do Estado afirmava que a programação do MIS, sob a diretoria de Daniela Bousso, “estava muito hermética” – não atraindo grandes públicos.
Sua escolha para a substituição de Daniela – o antigo dono do Cine Belas Artes e coordenador de Fomento e Difusão da Produção Cultural da Secretaria de Estado da Cultura de SP, André Sturm - Matarazzo manteve a linha de “popularização” da programação do MIS: “Foi uma sugestão (da substituição) compatível com o que nós queremos. O MIS precisa aproximar-se mais das pessoas”.
A “nova cara” do MIS
Sinais do novo projeto para o MIS já começaram a aparecer. A começar pela exposição que atualmente ocupa o espaço: 90 anos da Folha. Completamente diferente das mostras anteriores do MIS, geralmente voltados para formas vanguardistas do uso de novas linguagens e tecnologias nas artes, a mostra dedica-se exclusivamente a traçar um panorama da história do país, refletido na própria história do jornal. Essa mostra levou ao cancelamento de toda a programação previamente definida do museu. A respeito, Matarazzo comentou: “Tenho certeza de que será o maior público que o MIS vai receber desde a década de 80″.
Quanto ao novo diretor, André Sturm – escolhido em assembleia do Conselho Administrativo da Organização Social responsável pela instituição realizada ontem (30), seu perfil diz muito sobre a linha que o Governo do Estado pretende implementar no Museu. André é uma personalidade mais voltada para o mercado, sobretudo de filmes. Seus projetos futuros para o museu incluem o CINE-MIS, com exibições, e maior preocupação com oficinas de fotografia.
A reação
A classe artística, sobretudo os indivíduos ligados à gestão do MIS, não calaram-se diante das intervenções do Governo do Estado.
Em entrevista ao Estado, a presidente do conselho administrativo da Associação de Amigos do Paço das Artes, a artista e designer Eide Feldon, afirmou que “André [Sturm] é a cara do mercado, de distribuição [de filmes]. E não é essa a missão do MIS. O museu tem uma vocação, todo um aspecto ligado ao fomento e à experimentação”
Também foi criado na internet o Abaixo-Assinado SOS MIS, que pede o reposicionamento do projeto do museu. Ele vocifera contra o desrespeito com as organizações da sociedade civil que auxiliam o Estado na manutenção dos espaços culturais, como aconteceu no caso, e contra a proposta de “vanguarda tradicional” forçada pelo Estado.
Momento FalaCultura: sobre a suposta “programação hermética”
Conforme expressei no post sobre os oito melhores museus da cidade, considero o MIS dotado de uma das melhores (se não a melhor) programação de São Paulo. Além das exposições únicas, e sempre surpreendentes, as palestras e mostras do museu sempre destacaram-se por seu caráter vanguardista e de experimentação. O MIS era um dos poucos espaços culturais públicos em que discutia-se e produzia-se arte além do tradicionalismo tedioso que o status quo adotado pelas políticas culturais estatais acabava impondo.
A verdade é que, antes de tomar conhecimento de toda essa controvéria, muito me surpreendeu que o MIS fosse abrigar a exposição 90 anos da Folha. Simplesmente não combinava com o museu. Uma exposição de caráter tão comercial e mesmo promocional, praticamente desprovido de inovação artística, simplesmente não combinava com a imagem do MIS – achei inclusive bastante vexatório para a bem construída reputação da instituição.
Agora que eu entendo o contexto maior em que a exposição insere-se, não consigo deixar de me perguntar como o governo consegue confundir quantidade com qualidade, almejando alcançar um maior público por meio do sacrifício de um projeto inovador – e extremamente necessário – para o avanço artístico em nossa cidade. Isso se o projeto do novo MIS, de fato, atingir um público maior – afinal, ele parte do pressuposto de que o público paulistano não compreende ou não interessa-se por manifestações artísticas de vanguarda, sendo condenado a conviver eternamente com o marasmo da mesmice.
A tempo: No dia 21, sexta-feira, o evento da dupla Test, agendado previamente para acontecer no auditório, foi realizado alternativamente na entrada do museu, enquanto o auditório era ocupado por quatro sessões de cinema programadas por André Sturm. Enquanto a dupla Test teve público de cem pessoas, todas as quatro sessões programadas por Sturm, somadas, contaram com duas pessoas no público.
Diretora: "Matarazzo promove retrocesso de 30 anos no MIS" por Claudio Leal, Terra Magazine
Diretora: "Matarazzo promove retrocesso de 30 anos no MIS"
Matéria de Claudio Leal originalmente publicada no Cultura do Terra Magazine em 1 de junho de 2011.
Leia também as matérias e respostas que compõem o Dossiê MIS e Paço das Artes: A morte anunciada de um modelo de gestão.
A substituição do comando do Museu da Imagem e do Som (MIS) de São Paulo - articulada pelo secretário estadual da Cultura, Andrea Matarazzo (PSDB) - parece não ter esgotado seu manancial de polêmica. Em entrevista exclusiva a Terra Magazine, a diretora do museu, Daniela Bousso, critica a decisão de Matarazzo de mudar o foco do MIS, com ênfase no cinema e na fotografia, desfazendo a tendência da atual gestão de trabalhar as artes com as mídias digitais.
"Matarazzo está equivocado e promove um retrocesso de 30 anos ao querer que o MIS se volte somente para a fotografia e o cinema. Isso é um absurdo, até porque temos várias instituições com acervos fotográficos em São Paulo e a Cinemateca voltada apenas para a área de cinema", ataca Daniela Bousso.
Matarazzo escolheu como sucessor o ex-proprietário do Cine Belas Artes, André Sturm. O conselho administrativo do MIS (uma organização social) referendou o nome nesta segunda-feira (30).
"É uma das coisas que a gente pretende no MIS. Não que ele abandone a vanguarda nem as novas mídias, mas que ele volte às suas origens e que amplie o seu público", anunciou o secretário da Cultura, em entrevista à Folha de S.Paulo, em 17 de maio. Dois dias depois, novos ataques: "O MIS precisa dar um salto, não pode ser tão hermético. Não se pode pôr R$ 12 milhões por ano para um público de apenas 80 mil pessoas".
A exposição "90 em Folha", comemorativa do aniversário do jornal paulista, escancarou as divergências entre Matarazzo e a diretora do MIS, que não participou da curadoria e teve de aceitar a imposição. Nos bastidores, a montagem é vista como uma intervenção do governo.
"É uma curadoria do secretário. Agora nós temos secretários curadores, que cedem espaços públicos para veículos de comunicação por 90 dias. Como num passe de mágica, transforma-se um jornal num veículo chapa-branca. E aí vai uma pergunta: estando uma exposição no MIS por 90 dias, a 'Folha de S.Paulo' teria isenção para analisar esta crise promovida pelo nosso secretário?", questiona Daniela.
Em resposta a Terra Magazine, o editor-executivo da Folha, Sérgio Dávila, rebate as críticas e reafirma o apartidarismo do jornal. "Sim, a Folha considera que tem isenção para tratar da crise do MIS, assim como teve isenção para tratar da crise da Osesp, mesmo tendo realizado sua festa de 90 anos na Sala São Paulo, sede da orquestra. A Redação do jornal é totalmente independente do seu departamento de eventos e de marketing e realiza jornalismo isento, crítico, pluralista e apartidário", diz Dávila.
Localizado na Avenida Europa, o MIS possui dez conselheiros, mas somente três não pertencem ao grupo governista. A ascendência de Matarazzo foi decisiva para a queda da crítica e curadora de arte contemporânea, Daniela Bousso, que trabalha desde 1987 no Paço das Artes. Nesta entrevista, ela contesta a formação de seu sucessor. "O que diz ao conselho quando lhe perguntam como trabalhará no MIS, se não entende de artes nem de novas mídias? Ele responde que contratará pessoas. Outra conversa pra boi dormir. Com que critério ele contratará, se ele não entende de arte contemporânea e novas mídias?", provoca.
Com mais de 800 assinaturas, um abaixo-assinado contra a "intervenção" no MIS foi dirigido ao governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. A diretora do museu confronta as cobranças de crescimento de público: "A partir do começo de 2011, era o momento de investir em comunicação, porque até agora só tínhamos trabalhado na infra-estrutura. Aí o Matarazzo corta 30% do orçamento e exige que tenhamos o mesmo público da Pinacoteca. Outro equívoco: o MIS e o Paço das Artes tratam de arte contemporânea de ponta e esses conteúdos são mais lentos em termos de assimilação".
Confira os principais trechos da entrevista de Daniela Bousso:
"Matarazzo não quis negociar"
"Tenho uma visão bastante diferente do Matarazzo. Acontece que as instituições culturais brasileiras são muito frágeis. E o são porque sofrem com a descontinuidade de seus projetos e programas a cada governo. As organizações sociais de cultura foram criadas para evitar que, quando houvesse mudanças políticas, ocorresse descontinuidade. Elas vieram, teoricamente, para garantir a continuidade, principalmente nas viradas e mudanças de governo. Obviamente, o Matarazzo vai defender a seguinte ideia: de que a política pública, ou seja, a Secretaria de Cultura, tem que dar as diretrizes. Concordo totalmente, só que tem um detalhe: tem que dar as diretrizes, mas têm que ser feito os ajustes a determinada missão ou projeto. No caso do Andrea Matarazzo, não há essa consideração. Não há, da parte dele, a disposição em negociar esse ajuste. Ele quer que o MIS mude de foco, e ponto final."
"MIS não tinha um público de 80 mil por ano no início dos anos 90"
"Ele não leva em conta que foram feitas benfeitorias em ciência e tecnologia no MIS e não reflete sobre a sua implantação em tempo recorde, a readequação de espaços, a reorganização de seu acervo, bem como a sua digitalização e a implantação de projetos. Não tem visão dos programas, nem o timing de implantação de cada coisa. O que ele persegue é o seu desejo pessoal e se esquece da coletividade. Não percebe como este projeto é importante para o Estado de São Paulo e para o Brasil e repete o que todo político brasileiro faz: só leva em conta seus desejos pessoais. Ninguém mais aguenta isso. Com o discurso subliminar, ele diz querer que o MIS volte ao brilhantismo dos anos 80 ou 90. Diz que quer fazer o MIS bombar. Só não diz como. Agora, o que é que fez o MIS 'bombar' na passagem dos anos 80 para os anos 90, até 1993, nos seus tempos áureos? Os anos 80 eram um outro momento. O Brasil vivia seu momento de desbunde cultural, havia, de certa forma, o renascimento de utopias, do ponto de vista político. Vernissages tinham 200 a 300 pessoas, no máximo. Naquele momento, isso era considerado um sucesso de público, mas não tinha um público de 80 mil por ano, tudo era uma escala muito menor. Se você fazia a exposição de um fotógrafo, vinha todo mundo do meio da fotografia. Mas, quanto é, em termos numéricos, esse 'todo mundo da fotografia'? No início dos anos 90, não existia também o trabalho massivo de visitas orientadas para as escolas."
"Conteúdo não é hermético"
"Ele faz uma comparação com tempos que são diferentes. Na passagem dos anos 80 para os 90, o trânsito em São Paulo era mais ameno. Hoje, o trânsito é infernal. Eu levo em conta os dados de pesquisas de público realizadas no MIS. Por que o MIS ainda não tem mais público? Eu diria duas coisas. Não é o "conteúdo hermético" a que ele se refere. As pesquisas de público indicam que quem vem, adora. O conteúdo não é hermético, é interativo. Fizemos exposição com grandes nomes, tais como Pipilotti Rist, Miguel Rio Branco, além dos jovens. Então, não é o conteúdo hermético. Você tem metrô na (avenida) Consolação com a (avenida) Paulista e você tem metrô na Rebouças com a Faria Lima, está certo? Entre esses dois pontos, está o MIS. A descida da Rua Augusta é, absolutamente, um horror de tanto trânsito. Não temos um metrô na porta, como na Pinacoteca do Estado, e tampouco temos um museu temático como o Museu do Futebol."
"Matarazzo promove um retrocesso de 30 anos"
"Quando ele fala da vanguarda, não sabe nem o teor da palavra que está citando. A vanguarda foi nos anos 1920, vem do Modernismo, quando ocorreram as vanguardas históricas. Entre os anos 1945-1970, vieram as vanguardas artísticas. E agora, temos o quê? Arte contemporânea. Ponto final. Inovação é a palavra-chave da contemporaneidade. Matarazzo está equivocado e promove um retrocesso de 30 anos ao querer que o MIS se volte somente para a fotografia e o cinema. Isso é um absurdo, até porque temos várias instituições com acervos fotográficos em São Paulo e a Cinemateca voltada apenas para a área de cinema. Esta é uma sobreposição que desperdiça dinheiro público e que enterra o desenvolvimento da inovação e da tecnologia na arte. Mas, se você checar direito, entre agosto de 2010 e março deste ano, nós fizemos quatro exposições de fotografia. Quatro exposições de fotografia em seis meses! Então, é tudo desculpa pra boi dormir. Se você for ver a mostra de cinema que está sendo organizada aqui pelo futuro diretor (André Sturm), os números de público são risíveis. As sessões de cinema têm tido 0,5 pessoa por sessão. Numa Sunset Party, levamos três mil pessoas para o MIS. Nossa equação é outra."
Exposição "90 em Folha"
"É uma curadoria do secretário (Andrea Matarazzo). Agora nós temos secretários curadores, que cedem espaços públicos para veículos de comunicação por 90 dias. Como num passe de mágica, transforma-se um jornal num veículo chapa-branca. E aí vai uma pergunta: estando uma exposição no MIS por 90 dias, a 'Folha de S.Paulo' teria isenção para analisar esta crise promovida pelo nosso secretário?"
"Público se fidelizou"
"Tínhamos R$12 milhões para o Paço das Artes e para o MIS. A partir do começo de 2011, era o momento de investir em comunicação, porque até agora só tínhamos trabalhado na infra-estrutura. Aí o Matarazzo corta 30% do orçamento e exige que tenhamos o mesmo público da Pinacoteca. Outro equívoco: o MIS e o Paço das Artes tratam de arte contemporânea de ponta e esses conteúdos são mais lentos em termos de assimilação. Mas isso não quer dizer que tenhamos que privar a população de ter acesso a esse conteúdo inovador. Se São Paulo não puder bancar este tipo de conteúdo cultural, Matarazzo ficará marcado na história por ter impedido, por ter vetado à população paulistana e ao Brasil a possibilidade de acessar a cultura de ponta. Em 2008, trabalhamos só no segundo semestre. Abrimos em agosto e tivemos 13 mil. Em 2009, 51 mil pessoas. No ano de 2010, 80 mil pessoas. Ora, o que isso significa? Houve um crescimento gradual e fidelizado. E assim que deveríamos continuar se Matarazzo não tivesse promovido tal impeachment."
"Como contratar sem entender a arte contemporânea?"
"O MIS é um espaço que tem funcionado como continuidade dos medialabs das universidades. Os jovens terminam a universidade e as escolas dizem a eles que não podem mais trabalhar dentro delas, senão faltará espaço para os novos alunos. Para onde eles vão? Para o MIS, que abriga e promove as artes com as mídias digitais. O que diz André Sturm ao conselho do MIS na sua entrevista de trabalho? Diz que, sinceramente, não entende nada de arte nem de novas mídias. E o que diz ao conselho quando lhe perguntam como trabalhará no MIS, se não entende de artes nem de novas mídias? Ele responde que contratará pessoas. Outra conversa pra boi dormir. Com que critério ele contratará, se ele não entende de arte contemporânea e novas mídias? Portanto, o projeto do MIS está fadado a desaparecer pela falta de uma ação competente para sua especificidade. E isso não tem nada a ver com gestão. Logo, podemos deduzir que ele vai contratar mal."
O acervo
"O acervo do MIS ainda não pode ser visto, porque, como a reserva técnica estava sendo construída, até o final do ano passado, os filmes e obras foram para um depósito climatizado para evitar fungos. O acervo não podia ser visto porque estava embalado em depósito. O acervo acabou de voltar, mas ainda não pode ser visto porque está sendo inventariado e tem que passar por conservação, higienização e restauro para depois ser pesquisado. Será que o próximo diretor vai querer passar um filme sujo, cheio de fungos? E é isso que pretendem levar para o interior de São Paulo? Pobre interior..."
"Sofremos de descontinuidade e de ignorância"
"Meu sentimento é de pesar. Mas é esse País que a gente tem. Moramos no Brasil e aqui sofremos de descontinuidade e de ignorância. É péssimo, fico super triste. Quando eu penso quantos jovens têm aproveitado e demandam o que o MIS têm oferecido... Além da importância desse projeto e do seu ineditismo pro Brasil, quero ressaltar o quanto é importante que a atividade cultural permaneça nas instituições, fortalecendo-as, ao invés do marketing raso de políticos que só pensam nos seus desejos pessoais. Cada vez mais, entendo que a cultura precisa ser gerida por gente da área cultural e não por marqueteiros ou políticos."