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setembro 28, 2007
Exposição revela diversidade da produção dos anos 70, por Fabio Cypriano, Folha de São Paulo
Exposição revela diversidade da produção dos anos 70, por Fabio Cypriano
Matéria de Fabio Cypriano, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 28 de setembro de 2007
Mostra "Arte como Questão", em cartaz no Tomie Ohtake, acerta no recorte do intenso e variado período que revê
Os anos 60 e 70 foram decisivos para uma nova formulação da arte, marcada pelo que o crítico Mário Pedrosa (1900-1981) definiu como "o exercício experimental da liberdade". Enquanto na Europa e nos Estados Unidos a produção mais radical questionava as próprias instituições artísticas e mesmo as instituições de forma geral, no Brasil, tal orientação voltava-se também contra a ditadura que vigorava no país. "Há necessidade de tomada de posição em relação a problemas políticos, sociais e éticos", defendia Hélio Oiticica (1937-1980), naquele período.
Ambas as citações estão estampadas nas paredes da mostra "Arte como Questão Anos 70", no Instituto Tomie Ohtake (ITO), com curadoria de Glória Ferreira. Sem ser didática, mas contextualizando algumas das principais questões do período, a exposição consegue rever esse momento intenso na arte brasileira, sem torná-lo por demais contido ou institucionalizado, um dos problemas das revisões dessa época.
Nesse sentido, um dos acertos da curadoria foi apresentar um grande número de artistas (são mais de cem), e um grande número de obras (mais de 200). Com isso, revela-se a diversidade daquele período, identificada por uma vasta experimentação em meios como a fotografia e o vídeo, e mesmo em publicações de vários tipos, de cartões-postais a revistas.
Referências
Também foi correto evitar um destaque demasiado às produções de Hélio Oiticica e Lygia Clark, que hoje se tornaram as principais referências daquele momento, mas que, nos anos 60 e 70, estavam de fato inseridos no conjunto da produção.
Ambos participam com trabalhos bastante radicais, os "Objetos Sensoriais", no caso de Clark, e o filme "Agripina É Roma-Manhattan", de Oiticica, que alguns críticos nem sequer consideram trabalhos artísticos, evidente bobagem.
Senão, o que dizer de "Inserções Artísticas em Circuitos Ideológicos", de Cildo Meireles, bastante bem representado na mostra? Sua importância está justamente em representar as características que definiram aquela época, na discussão da arte e do contexto.
Mesmo a produção pop daquela época, em pinturas de Raimundo Colares, Geraldo de Barros e Nelson Leirner, entre outros, também está inserida nesse debate, pelo uso dos suportes, das tintas e dos temas. Mas o que acaba por se confirmar de fato na mostra, e nesses trabalhos pop isso se torna evidente, é que tal experimentação jamais deixou de se preocupar com sua formalização, ao contrário do que críticos da arte conceitual sempre insistiram em apontar.
setembro 5, 2007
Indicados nomes da Comissão de Projetos Culturais, por Edson Wander, Jornal O Popular, Goiânia
Indicados nomes da Comissão de Projetos Culturais
Matéria de Edson Wander, originalmente publicada no Jornal O Popular, no dia 5 de setembro de 2007
O prefeito Iris Rezende publicou, no dia 14 de agosto, o Decreto nº 1620 que traz as nomeações da Comissão de Projetos Culturais (CPC), encarregada de analisar os projetos candidatos aos benefícios da Lei de Incentivo à Cultura na capital. As nomeações foram publicadas um dia antes de terminar o prazo legal para a análise dos projetos inscritos. Entre os 11 indicados, seis são ligados ao Executivo Municipal (das secretarias de Cultura e Finanças - confira nesta página a lista dos nomeados). No dia 9 de agosto, O POPULAR publicou reportagem mostrando que o prefeito havia retomado a comissão em decreto, em resposta a uma citação do Ministério Público, sem no entanto nomeá-la.
A participação das entidades culturais da cidade nas indicações dos nomes indicados pelo prefeito já havia sido suprimida em decretos anteriores da Prefeitura, assim como a caracterização da CPC como entidade "independente e autônoma". Para o presidente da Associação Goiana de Cinema e Vídeo (AGCV), Eládio Garcia Sá Teles, "a lista materializa a vontade do secretário de nomear a comissão de acordo com os interesses dele". A AGCV e a Federação de Teatro de Goiás (Feteg) vêm questionando na Justiça ações da gestão de Kleber Adorno à frente da Secretaria Municipal de Cultura (Secult) desde o episódio da anulada Conferência Municipal de Cultura de 2005. A decisão final sobre a conferência completou um ano em junho passado sem o veredicto final da justiça.
Doracino Naves dos Santos, funcionário da Secult e presidente da nova comissão, rebate. Para ele, a participação das entidades está mantida, apesar de não haver mais as condições postas no decreto original que criou a CPC e o Conselho Municipal de Cultura. "O prefeito e o secretário têm atendido às indicações na medida do possível. Na nova comissão, há vários nomes indicados por entidades", diz Santos, referindo-se ao escritor Edival Lourenço de Oliveira, da União Brasileira de Escritores - seção Goiás (UBE-GO); Lindoberto Pereira Leão, o Beto Leão, da Associação Brasileira de Documentaristas - seção Goiás (ABD-GO), e Alex Gomes Gontijo, da Federação de Quadrilhas Juninas de Goiás (Fequaju-GO).
Doracino dos Santos citou também o jornalista Carlos Antônio Brandão como indicado de uma nova entidade de teatro da cidade, do qual Brandão é o primeiro presidente. Trata-se da Associação Goianiense de Artes Cênicas e Músicos (Procênica), mas Santos não lembrou o fato de Brandão, ex-diretor do Centro Cultural Martim Cererê, ser o atual diretor do Centro Municipal de Cultura Goiânia Ouro. "Nunca ouvi falar da maioria desses nomes e, especialmente no caso da ABD-GO, duvido que o nome de Beto Leão tenha saído de uma discussão aberta com as entidades do setor do audiovisual de Goiás, como a AGCV e instituto Icuman", protesta Eládio.
Se nem todos os nomes parecem ter tido unanimidade de indicação, pelo menos um deles, sugerido pelo próprio secretário, gerou conflitos para a Secult e à CPC imediatamente após a nomeação. A musicista Andréa Luisa de Oliveira Teixeira disse ao POPULAR que não poderá assumir a vaga na comissão por motivos profissionais, mas ela consta da lista publicada pelo prefeito. Andréa é pianista e pesquisadora da UCG, integrante do grupo Sons do Cerrado e professora da Escola de Música da UFG. A reportagem apurou que o secretário manteve o nome da musicista na lista por estar tendo dificuldades em encontrar um músico que pudesse assumir o cargo porque todos os sondados têm projetos inscritos para avaliação da CPC.
De acordo com Doracino dos Santos, mesmo com o atraso na nomeação dos integrantes da CPC, a comissão conseguirá analisar os 285 projetos protocolados dentro da prorrogação prevista - até o dia 15 de setembro. Esse montante concorre ao apoio de renúncia fiscal no valor de R$ 1,2 milhão da segunda etapa da lei para este ano. O Ministério Público, que tinha agido provocado pela AGCV e Feteg para que a prefeitura retomasse a CPC, arquivou o processo por entender agora que "não pode influenciar os atos do Executivo". Para a assessoria do promotor Humberto Machado, é prerrogativa do prefeito deliberar sobre a constituição da comissão.
As entidades que reclamaram ao MP sobre a questão "estranham" a decisão e informam que vão recorrer nas instâncias superiores da Justiça para desarquivar o processo e solicitar que um novo promotor seja nomeado para o caso. "Fechamos também um documento que será levado ao fórum sobre democracia que está sendo realizado na UFG", informou Eládio Teles, da AGCV.
Conferência segue sem veredicto final
Passado mais de um ano da decisão em primeira instância que anulou a realização da 3ª Conferência Municipal de Cultura, o caso ainda aguarda pelo chamado duplo grau de jurisdição do Tribunal de Justiça de Goiás, em relatoria sob os cuidados do desembargador Zacarias Neves Coelho, da 2ª Câmara Cível. Entidades do Fórum Permanente de Cultura prometem promover atos públicos e novas investidas legais para tentar obter a confirmação da decisão dada pela juiz Fabiano A. de Aragão Fernandes em junho do ano passado.
"É estranho essa demora. O normal é que um processo simples como esse, de 2ª instância, entre na pauta da justiça para apreciação em no máximo quatro meses", reclama Deolinda Moreira, integrante do Fórum Permanente de Cultura de Goiânia, composto por artistas e produtores da cidade. A briga na Justiça pela anulação da conferência começou no final de 2005, quando o fórum conseguiu liminar para anular a realização do evento sob críticas de "manipulação" na constituição dos novos membros do Conselho Municipal de Cultura.
A liminar foi derrubada em seguida pela Secretaria Municipal de Cultura sob alegação de que Goiânia precisava nomear representantes para participar da Conferência Nacional de Cultura. Mas o próprio Ministério da Cultura acabou invalidando a conferência para efeito de nomeação de representantes ao evento nacional. A assessoria do desembargador Zacarias Neves Coelho informou que o "processo deve entrar na pauta de votação neste mês, mas o julgamento propriamente dito pode ser realizado em outubro".
Mostra analisa caminho da arte a partir dos anos 70, por Fabio Cypriano, Folha de São Paulo
Mostra analisa caminho da arte a partir dos anos 70
Matéria de Fabio Cypriano, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 5 de setembro de 2007
Começa hoje, no Tomie Ohtake, "Arte Como Questão", com mais de 250 obras de cem artistas, todas produzidas no Brasil
Lygia Clark, Oiticica e Cildo Meireles são alguns dos nomes presentes na exposição, que reúne também publicações
Fotografias, vídeos, obras feitas em computador ou com materiais como garrafas, cartões postais, sacos plásticos ou pedras estão presentes em diversas mostras da mais recente produção, mas ainda continuam a gerar espanto. Todos esses materiais, entretanto, já fazem parte da história da arte há décadas, como se pode constatar, a partir de hoje, com a mostra "Arte Como Questão Anos 70", no Instituto Tomie Ohtake, com curadoria de Glória Ferreira.
Em mais de 250 obras de cerca de cem artistas, todas produzidas no Brasil, Glória Ferreira apresenta os diversos caminhos que a arte tomou a partir dos anos 60. A mostra encerra o ciclo que já havia analisado outros três momentos da produção nacional no instituto: "Pincelada Pintura e Método" (anos 50), "Geração da Virada" (anos 00) e "Modernos, Pós-Modernos etc." (anos 80 e 90). "A arte contemporânea surge, nos anos 70, colocando em questão o próprio valor da arte; o que se vê nesta exposição é o exercício dessa experiência", diz a curadora.
"Quebra" de limites
Por isso, grande parte dos trabalhos aborda questões intrínsecas ao próprio fazer artístico, como a noção de representação, por exemplo. Entre elas, está uma instalação pouco conhecida de Cildo Meireles, composta por 12 balanças, cada uma com um saco de tamanho diferente, todas apontando para o mesmo peso.
Não que o fazer artístico não tenha sido também uma questão para os modernos, afinal Picasso, com o cubismo, ou Mondrian, com a arte abstrata, só para citar dois casos, estavam também abordando a noção de como e se a arte pode representar algo. Entretanto, na opinião de Glória Ferreira, o que se viu anos 70 foi um passo mais radical: "Enquanto os modernos expandem os limites da arte, os contemporâneos quebram todos esse limites".
Entre as situações que apontam para o fim dessas fronteiras, os objetos relacionais de Lygia Clark serão vistos no ambiente onde a própria artista os utilizava, ou seja, em seu consultório, que é remontado para a mostra. Essas experiências radicais, criadas para expandir a noção de arte, não perdem seu sentido quando institucionalizadas?
"Há uma absorção pelas instituições, mas as próprias instituições tiveram que se alterar, hoje artistas podem quebrar paredes, ou, como no caso do consultório, as pessoas vão ficar deitadas, se esfregando no sofá", diz Ferreira.
Quando se fala em Lygia Clark, Hélio Oiticica também é citação obrigatória. Na mostra, ele aparece com um trabalho da série "Quasi cinemas", chamado "Helena Inventa Ângela Maria", um projeto não-realizado.
Na mostra "Arte Como Questão", eles são apenas mais dois artistas entre os que buscavam vincular arte e vida, um dos temas essenciais daquele momento. "Essa era uma questão daquela época, graças aos movimentos jovens, que questionavam os parâmetros institucionais e levavam o cotidiano para uma dimensão política", afirma a curadora.
Além de obras, a exposição reúne um grande número de publicações, nas quais artistas assumem o papel de críticos, rompendo, também aí, alguns limites tradicionais.